Justiça determina que Facebook e Instagram não permitam trabalho infantil artístico nas redes sociais sem autorização judicial.
* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

Entenda a decisão – Trabalho infantil artístico nas redes sociais
A juíza do Trabalho Juliana Petenate Salles, da 7ª vara do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, atendendo a um pedido do MPT, determinou que as plataformas Facebook e Instagram se abstenham de permitir trabalho infantil artístico sem prévia autorização judicial (Processo 1001427-41.2025.5.02.0007).
A decisão determinou que as plataformas Facebook e Instagram se abstenham de explorar trabalho infantil artístico sem prévia autorização judicial.
Segundo a magistrada, as empresas se beneficiam da atuação de crianças e adolescentes em conteúdos de natureza comercial sem observar as garantias previstas no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.
O que dizem a Constituição e a Convenção da OIT
O inquérito civil apresentado pelo Ministério Público do Trabalho apontou a existência de perfis de menores de idade em atividades remuneradas sem a devida autorização judicial, violando o art. 7º, XXXIII, da CF e a convenção 138 da OIT.
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: ... XXXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos; CF/88
A Convenção n.º 138 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) estabelece a idade mínima para admissão ao trabalho e visa à abolição do trabalho infantil. Ela exige que os países signatários estabeleçam uma idade mínima geral que não seja inferior a 15 anos (ou 14 em países com economias e ensino não desenvolvidos), além de uma idade mínima superior (18 anos) para trabalhos perigosos à saúde e segurança dos jovens.
A Convenção também prevê a necessidade de políticas nacionais para eliminar o trabalho infantil, como educação gratuita e obrigatória, e a promoção de empregos decentes para adultos.
Riscos do trabalho precoce e da superexposição digital
A magistrada foi direta:
“Manter crianças e adolescentes expostos na ‘internet’ para fins de lucro, sem devida avaliação das condições em que ocorre o trabalho artístico e sem autorização da Justiça, gera riscos sérios e imediatos”.
A juíza apontou os seguintes riscos decorrentes do trabalho precoce:
- Prejuízos à saúde física e mental;
- Exposição a ataques virtuais (haters);
- Uso indevido da imagem;
- Prejuízos na autoestima do menor;
- Impactos sociais e educacionais; e
- Possibilidade de danos irreversíveis pela circulação ilimitada de imagens na rede.
A dedicação precoce ao trabalho pode atrapalhar a escola, o que pode comprometer seu direito fundamental à educação e desenvolvimento, e de privar a criança de atividades típicas da infância.
A Constituição Federal prevê, ainda, em seu artigo 227, que:
“É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.
É dever de todos (família, comunidade, sociedade, poder público) assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida e à saúde de todas as crianças e adolescentes.
Dessa forma, o trabalho precoce ou a superexposição do menor nas redes sociais podem configurar uma violação desses direitos fundamentais (saúde, vida, privacidade, imagem).
A autorização dos pais não seria suficiente para permitir o trabalho do menor, já que sua autonomia não é absoluta e esse trabalho precoce ou a superexposição do filho nas redes sociais podem ser consideradas uma forma de abuso da imagem e da privacidade do menor, passível de sanção do Estado, como multa e revisão das condições de guarda e convivência.

Importante ressaltar: A perda e a suspensão do poder familiar serão decretadas judicialmente, em procedimento contraditório, nos casos previstos na legislação, bem como na hipótese de descumprimento injustificado dos deveres e obrigações de sustento, guarda e educação dos filhos menores.
A autonomia dos pais é um direito garantido pela legislação, mas encontra limites.
Os pais têm o dever de sustento, guarda e educação dos filhos, e devem buscar o melhor interesse da criança, assegurando seus direitos e proteção. A autonomia dos pais, no entanto, não é absoluta e pode ser restringida em casos de abuso, negligência ou quando o bem-estar da criança estiver em risco.
O papel do ECA na autorização judicial para menores
O artigo 17, do Estatuto da Criança e do Adolescente, prevê que o direito ao respeito do menor consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.
A liberdade de expressão e a autonomia dos pais, integrantes das liberdades públicas, não podem ser exercidas de maneira a ofender a dignidade humana do menor.
Nesse contexto, o artigo 149, do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, prevê a necessidade de autorização judicial, via alvará, para a participação de crianças e adolescentes em uma série de atividades e locais.
Art. 149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante alvará: I - a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou responsável, em: a) estádio, ginásio e campo desportivo; b) bailes ou promoções dançantes; c) boate ou congêneres; d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas; e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão. II - a participação de criança e adolescente em: a) espetáculos públicos e seus ensaios; b) certames de beleza. § 1º Para os fins do disposto neste artigo, a autoridade judiciária levará em conta, dentre outros fatores: a) os princípios desta Lei; b) as peculiaridades locais; c) a existência de instalações adequadas; d) o tipo de frequência habitual ao local; e) a adequação do ambiente a eventual participação ou frequência de crianças e adolescentes; f) a natureza do espetáculo. § 2º As medidas adotadas na conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de caráter geral. (ECA)
Em outra decisão, a Justiça do Acre vedou a superexposição do filho pelos pais nas redes sociais, prática conhecida como sharenting.
A decisão, que proibiu os pais de divulgarem imagens do filho nas redes sociais de forma excessiva, tem por objetivo proteger a intimidade e a dignidade do menor.
Sharenting: Combinação das palavras inglesas “share” (compartilhar) e “parenting” (paternidade/maternidade), refere-se à prática de pais que compartilham, de forma excessiva, informações, fotos ou vídeos de seus filhos nas redes sociais.
Essa prática, embora possa estar motivada pelo desejo de externar momentos importantes ou alegres da vida familiar, pode trazer riscos à privacidade e segurança das crianças, além de gerar consequências psicológicas.
Dentre os principais riscos à criança exposta ao Sharenting, podemos citar:
- Privacidade e segurança: o conteúdo compartilhado pode cair em mãos erradas, ser usado para fins maliciosos, ou se tornar permanente na internet, mesmo que o pai ou mãe apague a publicação.
- Identidade digital: a exposição excessiva pode afetar a construção da identidade digital da criança, que pode ter sua imagem definida pelos pais, em vez de construí-la por si só.
- Impacto psicológico: crianças podem sofrer bullying, constrangimento ou ter sua privacidade invadida ao terem suas vidas expostas publicamente.
- Riscos de exploração: a exposição excessiva pode aumentar o risco de crianças serem alvo de exploração infantil online, como a distribuição de imagens íntimas ou a criação de perfis falsos.
- Conflitos familiares: a exposição de conflitos intrafamiliares, mesmo que não intencional, pode gerar desconforto e prejudicar o relacionamento da criança com os pais.
“É dever de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou constrangedor.”
Ótimo tema para provas de ECA, e direito do trabalho. Portanto, muita atenção.
Ótimo tema para provas de direitos humanos, ECA e direito constitucional!
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