* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.
Entenda o que aconteceu

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que cabo de vassoura pode ser considerado arma branca.
A 5ª Turma do STJ tomou a decisão entendendo que um cabo de vassoura pode se classificar como arma branca imprópria, justificando assim o aumento de pena em casos de roubo com grave ameaça.
Arma branca

Exemplos de armas brancas impróprias:
- Garfo
- Foice
- Enxada
- Pedras
- Paus
- Tacos de beisebol
- Martelo
- Cabo de vassoura
Importante conceituar arma branca como sendo o objeto que pode causar lesões físicas sem utilização de pólvora ou fogo. O conceito, portanto, é residual. A arma que não for de fogo é arma branca.
O conceito de arma branca deve incluir as próprias e as impróprias, ou seja, todos aqueles objetos confeccionados sem finalidade bélica, mas capazes de intimidar ou ferir o próximo. A norma não faz distinção entre armas próprias e impróprias, não cabendo ao intérprete fazê-la (ubi lex non distinguit nec nos distinguere debemus).
A arma branca pode ser, portanto, própria ou imprópria. Vejamos então a principal diferença.
ARMA BRANCA PRÓPRIA | ARMA BRANCA IMPRÓPRIA |
Objeto cuja finalidade de fabricação é ofender a integridade física de outrem. | Aquele objeto que, embora não tenha finalidade específica de ofensa, pode ser usada para tal fim. |
Exemplos de armas brancas próprias:
- Espada
- Arco-e-flecha
- Soco-inglês
- Punhal
- Adaga
- Canivete
Porte de arma
O artigo 19 da Lei de Contravenções Penais (Decreto Lei 3.688/1941) classifica como contravenção penal o porte de arma fora de casa sem licença da autoridade competente. Enquanto os crimes são considerados como infrações penais mais graves, as contravenções são classificadas como mais leves e com penas menores.
LCP
Porte de arma
Art. 19. Trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta, sem licença da autoridade:
Pena – prisão simples, de quinze dias a seis meses, ou multa, de duzentos mil réis a três contos de réis, ou ambas cumulativamente.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal considerou, julgando o TEMA 857, que portar arma branca fora de casa e em atitude com potencial de causar lesões é uma conduta ilegal.
Pois bem, o entendimento é de que a proibição e a pena, previstas na Lei de Contravenções Penais, continuam válidas em relação a armas brancas.
O caso que gerou o TEMA 857, do STF, envolve a condenação de um homem ao pagamento de 15 dias-multa por essa contravenção. De acordo com os autos, ele tinha o hábito de, portando uma faca de cozinha, ficar em frente a uma padaria pedindo dinheiro a clientes e funcionários e se tornava agressivo quando não o atendiam.
No STF, a Defensoria sustentou que a conduta só poderia ser considerada criminosa se o dispositivo da Lei de Contravenções Penais que trata da licença da autoridade já tivesse sido regulamentado em relação às armas brancas.
Segundo o ministro Alexandre de Morais, cujo voto foi vencedor, exigia-se a autorização da autoridade competente apenas para o porte de armas de fogo, hoje regulado pelo Estatuto do Desarmamento. Não há necessidade, portanto, quanto às armas brancas.
Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin (relator), Gilmar Mendes e Nunes Marques, que, no caso concreto, absolviam o condenado em razão da falta de regulamentação.
Importante ressaltar que, em cada caso concreto, o juiz deve analisar a intenção da pessoa ao portar o objeto e a potencialidade lesiva ou de efetiva lesão.
A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte (TEMA 857):
“O art. 19 da Lei de Contravenções penais permanece válido e é aplicável ao porte de arma branca, cuja potencialidade lesiva deve ser aferida com base nas circunstâncias do caso concreto, tendo em conta, inclusive, o elemento subjetivo do agente”.
O caso do cabo de vassoura
No processo julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, que considerou o cabo de vassoura uma arma branca, houve a aplicação da causa de aumento de pena do artigo 157, parágrafo 2º, inciso VII, do Código Penal.
CP
Roubo
Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência:
Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa.
...
§ 2º A pena aumenta-se de 1/3 (um terço) até metade:
...
VII - se a violência ou grave ameaça é exercida com emprego de arma branca;
No caso concreto, um homem foi condenado por roubo majorado. Segundo as vítimas, o réu as ameaçava com uma barra de alumínio. Uma delas identificou o item como sendo um cabo de vassoura, outra concluiu que era um cabo de rodo.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais entendeu que o cabo de vassoura é uma arma branca imprópria — um objeto que, embora não seja feito para ataque ou defesa, foi usado dessa maneira na execução do crime.
Já no STJ, a Defensoria Pública do Distrito Federal apontou que o cabo de vassoura não tem potencial lesivo para se enquadrar como arma branca.
Com efeito, a relatora do recurso especial (AREsp 2.589.697), a ministra Daniela Teixeira, asseverou que:
“De fato, um cabo de vassoura pode ser considerado arma branca imprópria, com potencial lesivo suficiente para atrair a aplicação da causa de aumento do art. 157, parágrafo 2º, VII, do Código Penal... No caso, a lesividade pode ser atestada pelos depoimentos das vítimas, uma vez que o cabo de vassoura foi utilizado contra os pescoços das duas, comprovando tratar-se de objeto com potencialidade lesiva”.
A relatora foi clara ao afirmar que a jurisprudência do STJ considera que o conceito de arma branca inclui instrumentos capazes de causar dano à integridade física, mesmo que não fabricados especificamente para tal fim (arma branca imprópria), como no caso de um cabo de vassoura.
A apreensão e perícia da arma branca não são necessárias para a aplicação da majorante, podendo o julgador formar seu convencimento com base em outros elementos probatórios, como os depoimentos das vítimas.
No caso concreto, os depoimentos das vítimas confirmam o uso do cabo de vassoura de forma lesiva, justificando a aplicação da causa de aumento de pena.
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