Poder Judiciário concede até 120 dias de folgas para magistrados, além das férias de 60 dias e recesso forense

Poder Judiciário concede até 120 dias de folgas para magistrados, além das férias de 60 dias e recesso forense

*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.

Entenda o caso

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou e publicou a Resolução CNJ nº 528, de 20 de outubro de 2023. Tal Resolução prevê que os direitos e deveres validamente atribuídos aos membros da Magistratura ou do Ministério Público aplicam-se aos integrantes de ambas as carreiras, no que couber. Ou seja, houve a regulamentação da simetria constitucional entre as carreiras do Ministério Público e da Magistratura.

A Resolução resultou na criação de novo benefício a magistrados brasileiros chamada de licença compensatória. Isso possibilita aos magistrados do Brasil a gozarem ao equivalente a uma folga a cada três dias do ano.

Folgas magistrados

Com o benefício concedido aos juízes os membros do Poder Judiciário terão até 120 dias de folgas anuais, além dos 60 dias de férias aos quais os magistrados têm direito.

O benefício originou-se na Resolução nº 256/2023 do Conselho Nacional do Ministério Público que regulamentou que disciplinou a cumulação de acervo processual, procedimental ou administrativo no âmbito do Ministério Público da União.

De acordo com esta Resolução do CNMP essas folgas podem ser convertidas em pagamento, com caráter indenizatório, ficando, portanto, fora do teto constitucional.

Neste cenário, diversos Tribunais de Justiça do país se ajustaram à Resolução do Conselho Nacional de Justiça concedendo aos seus membros o benefício da licença compulsória, com a possibilidade de conversão em pecúnia. Tudo isso conforme trazido pela Resolução nº 256/2023 do Conselho Nacional do Ministério Público.

Por fim, vale destacar que, mediante apuração realizada pela ONG Transparência Brasil, o pagamento dos valores correspondentes à licença compensatória por acúmulo de acervo processual ou procedimental consumiu de dinheiro público, até maio de 2025, o montante de R$ 284 milhões de reais.

Análise Jurídica

Gratificações

Em 2015, houve a edição de duas leis federais e criou-se a Gratificação por Exercício Cumulativo de Jurisdição para os membros da Justiça Federal e do Trabalho. Se trata das Leis 13.093 e 13.095 que tem o seguinte conteúdo, respectivamente:      

Institui a gratificação por exercício cumulativo de jurisdição aos membros da Justiça Federal e dá outras providências.
Institui a Gratificação por Exercício Cumulativo de Jurisdição devida aos membros da Justiça do Trabalho e dá outras providências.

A legislação acima referida traz dois conceitos importantes:

  • Acumulação de juízo: o exercício da jurisdição em mais de um órgão jurisdicional da Justiça Federal, como nos casos de atuação simultânea em varas distintas, em juizados especiais e em turmas recursais; e
  • Acervo processual: o total de processos distribuídos e vinculados ao magistrado.

Ambas as leis preveem, nos seus artigos 4º, o valor da gratificação e a sua natureza jurídica:

Art. 4º O valor da gratificação corresponderá a 1/3 (um terço) do subsídio do magistrado designado à substituição para cada 30 (trinta) dias de exercício de designação cumulativa e será pago pro rata tempore.

Parágrafo único. A gratificação terá natureza remuneratória, não podendo o seu acréscimo ao subsídio mensal do magistrado implicar valor superior ao subsídio mensal dos Ministros do Supremo Tribunal Federal.

Destaco, ainda, que de acordo com as Leis 13.093 e 13.095 a gratificação por exercício cumulativo de jurisdição compreende a acumulação de juízo e a acumulação de acervo processual. Ou seja, para o recebimento do benefício era necessário que houvesse, simultaneamente, acumulação de juízo e acumulação de acervo processual.

Acúmulo de acervo processual, procedimental ou administrativo

Porém, na Resolução nº 256/2023 do Conselho Nacional do Ministério Público, foi alterado o formato da gratificação. Assim, ampliou substancialmente o que é “acúmulo de acervo processual, procedimental ou administrativo” e permitiu a conversão das folgas em pagamento, com caráter indenizatório, não sujeito, portanto, à limitação do teto constitucional, previsto no artigo 37, XI da Constituição Federal.

De acordo com a Resolução nº 256/2023 do CNMP considera-se acúmulo de acervo processual, procedimental ou administrativo:

I – a atuação extraordinária, segundo critérios quantitativos e qualitativos, nos feitos que tramitem nos ramos do Ministério Público da União; 
II – a cumulação de atividades administrativas e finalísticas extraordinárias, definidas nesta Resolução ou em ato do respectivo Conselho Superior; 
III – o exercício de função relevante singular, ainda que em exclusividade.

E continuando, a Resolução do CNMP possibilitou a conversão em pecúnia dos dias de licença compensatórios adquiridos, como verba indenizatória, de forma que não se sujeita à limitação do teto constitucional.

Art. 9º Observada a disponibilidade financeira e orçamentária, os ramos do Ministério Público da União, por ato do respectivo Procurador-Geral, poderão indenizar os dias de licença compensatória adquiridos com base na aplicação desta Resolução.

Teto constitucional

Importante explicar o que é o teto constitucional. Este trata-se do limite máximo de remuneração que os agentes públicos podem receber, estabelecido pela Constituição Federal de 1988 (CF/88). O objetivo é moralizar a administração pública e evitar que os servidores recebam remunerações desproporcionais ao trabalho realizado.

Vale lembrar que desde a Emenda Constitucional (EC) 19/1998, o STF firmou entendimento de que o teto constitucional abrange a integralidade das parcelas que compõem a remuneração do servidor público, independentemente da sua natureza variável ou da assiduidade de seu recebimento. De acordo com a Corte Suprema, a única exceção se dá em relação às parcelas de caráter indenizatório previstas em lei.

Aí é importante definir o que deve se considerar como verba de caráter indenizatório.

Neste sentido, o STF julgando o Recurso Extraordinário nº 650.898 (Tema 484) definiu o seguinte:

Para que se tipifique um gasto como indenizatório, não basta que a norma assim o considere. É indispensável que a dicção formal da norma guarde compatibilidade com a real natureza desse dispêndio. E indenização é conceito jurídico com alcance bem determinado na sua formulação. (RE nº 650.898-RG/RS, Rel. Min. Marco Aurélio, Red. do Acórdão Min. Roberto Barroso, j. 1º/02/2017, p. 24/08/2017 — Tema nº 484 do ementário da Repercussão Geral).
E como dito acima, o Poder Judiciário, através do Conselho Nacional de Justiça, mediante a Resolução CNJ nº 528, de 20 de outubro de 2023, garantiu que a gratificação por acumulação de acervo e a possibilidade de conversão dos dias de folga em pecúnia fosse igualmente aplicado aos membros da magistratura, tendo como fundamento central a alegada simetria constitucional existente entre as carreiras.

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