Ministro Alexandre de Moraes proíbe manifestação em Brasília
Foto: TV Globo

Ministro Alexandre de Moraes proíbe manifestação em Brasília

* Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. Defensor Público do estado de São Paulo. Professor de Direito Constitucional do Estratégia Carreiras Jurídicas.

O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, no dia 25 de julho de 2025, após pedido da Procuradoria Geral da República, no âmbito do Inquérito n. 4.781 (Inquérito das Fake News), proibiu manifestação que ocorria na Praça dos Três Poderes justamente para pressionar o Senado Federal a dar andamento aos pedidos de impeachment do referido ministro, em virtude de abusos em suas decisões.

Vejamos o que restou decidido

Na decisão, seguindo os pedidos da Procuradoria Geral da República, restou determinada:

A) a remoção imediata e proibição de acesso e permanência dos Deputados Federais Hélio Lopes, Sóstenes Cavalcante, Cabo Gilberto Silva, Coronel Chrisóstomo e Rodrigo da Zaeli, bem como de quaisquer outros indivíduos que se encontrem em frente ao Supremo Tribunal Federal participando de possível prática criminosa;

B) a prisão em flagrante com base na prática de resistência ou desobediência ao ato de autoridade pública, com o escopo de garantir a efetividade das probabilidades e a preservação da ordem pública na hipótese de resistência de indivíduos que, mesmo após intimados, insistirem em permanecer na via pública em manifestação de oposição à ordem;

C) a notificação da Polícia Militar do Distrito Federal e da Polícia Federal para imediato cumprimento da medida, competindo especialmente à Polícia Militar do Distrito Federal a adoção de todas as providências necessárias à efetiva remoção dos referidos indivíduos do local, sendo certo que a remoção deverá ser realizada imediatamente.

D) a intimação pessoal do governador do DF com a DETERMINAÇÃO DE NÃO PERMITIR NENHUM NOVO ACAMPAMENTO NA PRAÇA DOS 3 PODERES APÓS O CUMPRIMENTO DA PRESENTE DECISÃO.

Direito à liberdade

O Estado não pode impedir ações ou omissões, desde que não existam razões suficientes para justificar a restrição da liberdade, tal como direitos de terceiros ou interesses coletivos (liberdade formal). Além disso, em situações de colisão ou conflito, o valor relativo da “liberdade geral de ação” deve ser sopesado com maior densidade material (liberdade material).

Da noção de liberdade material decorre a Doutrina da Posição Preferencial, conferindo-se maior densidade axiológica ao direito a liberdade em caso de colisão de direitos. Importante destacar que temos inúmeros direitos fundamentais cujo objeto imediato é a liberdade, a exemplo da liberdade de ação, locomoção, profissional, pensamento, crença e manifestação.

Direito de manifestação

O direito de manifestação é um dos pilares do Estado de opção democrática. Após período autoritário na história brasileira, a Constituição de 1988, também conhecida como Constituição Cidadã, buscou fortalecer o direito fundamental à liberdade de manifestação, com destaque ao artigo 5°, incisos IV, IX e XVI, que garantem a livre manifestação do pensamento, a livre expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (independentemente de censura prévia), e o direito de reunião pacífica, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização (sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente). Vejamos:

Constituição Federal:

Art. 5º, IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato.

IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.

XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público, independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente.

A ideia é pluralizar, democratizar o debate e incrementar a cidadania, incluindo-se as opiniões e manifestações de grupos minoritários. Deve-se realizar eventuais restrições com cautela, notadamente para se evitar violação desse importante direito fundamental e culminar no denominado efeito resfriador, inibidor ou silenciador (Chilling Effect). Trata-se da inibição ou desencorajamento do exercício de legítimos direitos, culminando em autocensura no caso do direito à liberdade.

Assim, em virtude da ameaça de sanções jurídicas por parte do Poder Público, seja em virtude de ato do Poder Executivo, do Legislativo ou do Judiciário, ocorre um resfriamento da liberdade de expressão e do debate de ideias.

Decisão do ministro

Manifestação

De fato, estamos diante de um direito fundamental que não é absoluto, notadamente no caso de colisão com outros direitos fundamentais, da necessidade de manutenção da ordem pública e do bom funcionamento das instituições.

A decisão já está causando debates acalorados. É fundamental que eventuais restrições a esse direito fundamental sejam constitucionais, legais, proporcionais e respeite o núcleo essencial do direito à liberdade, imprescindível para a manutenção das liberdades democráticas, em especial após um período autoritário no país.

O princípio da proporcionalidade coaduna-se com ideais de justiça, harmonia e equilíbrio, buscando a proibição do excesso e a proibição de proteção insuficiente. Na análise do caso concreto, imprescindível a verificação dos subprincípios da proporcionalidade. A adequação pressupõe que as medidas devem ser aptas para atingir a finalidade pretendida. De acordo com a ideia de necessidade, não pode existir meio menos gravoso para atingir a finalidade pretendida. Por seu turno, a proporcionalidade em sentido estrito pressupõe uma análise da relação entre o custo da medida e os benefícios, trazendo a ideia de ponderação.

Critérios apontados pela doutrina

Seguindo essa linha de raciocínio, a comunicação prévia deve ser realizada em tempo proporcional, sem limitar excessivamente um direito fundamental essencial à democracia, sem que essa tenha ao menos a potencialidade de ferir direitos de terceiros, sendo certo que eventuais limitações devem ser interpretadas restritivamente. No RE n. 806339, fixou-se a tese de repercussão geral no seguinte sentido:

“A exigência constitucional de aviso prévio relativamente ao direito de reunião é satisfeita com a veiculação de informação que permita ao poder público zelar para que seu exercício se dê de forma pacífica ou para que não frustre outra reunião no mesmo local”.

O requisito da livre circulação de pedestres e do tráfego de veículos não poderá inviabilizar o direito fundamental de manifestação, pensamento e reunião, notadamente diante da possibilidade de efetivar meios menos gravosos de organizar a locomoção do trânsito e das pessoas.

Por seu turno, todos podem se reunir pacificamente e sem armas, conforme as diretrizes constitucionais, existindo a previsão na Constituição Federal e até mesmo na legislação penal brasileira sobre porte ilegal de armas e explosivos.

Por fim, ressalta-se que o direito à liberdade de reunião está previsto em tratados e convenções internacionais, a exemplo da Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 20) e do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 21), sendo certo que toda intervenção restritiva deverá ser realizada a luz da proporcionalidade. Pode-se extrair tal princípio tanto na ideia do Estado Democrático de Direito, como também do devido processo legal.

Oportunamente, destaca-se que o STF, no julgamento das denominadas “marcha das maconhas”, julgou constitucional a existência de um direito meio (liberdade de reunião) e um direito fim (liberdade de expressão), com o escopo de garantir a concretização desse importante direito fundamental.

Conclusões

De fato, o caso concreto merece uma análise com extrema cautela, notadamente para se evitar decisões de constitucionalidade duvidosa.

De um lado, eventuais defensores da decisão poderiam apontar que:

a) nenhum direito é absoluto;

b) as medidas foram adotadas para a segurança das pessoas e dos prédios públicos;

c) existe a necessidade de coibir eventuais ações que atentam contra a ordem pública e o Estado Democrático de Direito;

d) a experiência do 08 do janeiro justificaria a referida restrição.

Por outro lado, os críticos da decisão apontam:

a) cerceamento desproporcional do direito de manifestação, que estaria ocorrendo pacificamente;

b) perseguição à um determinado grupo político, silenciando aqueles que se opõe às decisões do ministro;

c) possibilidade de adoções de medidas preventivas menos gravosas;

d) inibição e efeito resfriador à liberdade de expressão e manifestação;

e) eventuais restrições devem ser pautadas na constitucionalidade, na legalidade e na proporcionalidade, o que não teria sido observado no caso concreto;

f) a situação também envolveria inconstitucionalidades relativas a prisão de parlamentares, a inconstitucionalidade do Inquérito das Fake News, bem como intromissões indevidas nas atribuições do governador, culminando por ferir o federalismo e a autonomia do Distrito Federal.

De fato, estamos diante de um hard case colocando, em linhas tênues, de um lado, a liberdade de expressão e manifestação e, de outro, a manutenção da ordem pública. Vamos acompanhar os desdobramentos do caso. Acompanhem o canal do Estratégia Carreiras Jurídicas para se manter sempre muito bem-informado!


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