A aplicação da Lei Maria da Penha a casais homoafetivos masculinos: uma análise da decisão proferida pelo STF

A aplicação da Lei Maria da Penha a casais homoafetivos masculinos: uma análise da decisão proferida pelo STF

O Supremo Tribunal Federal (STF), no Mandado de Injunção (MI) 7452, decidiu que as medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) podem se aplicar a casais homoafetivos masculinos e mulheres trans/travestis.

Essa decisão reconhece a vulnerabilidade desses grupos e a necessidade de proteção contra a violência doméstica. No entanto, é importante notar que essa extensão não abrange todo o conteúdo da Lei Maria da Penha, sendo restrita ao âmbito extrapenal, sem a criminalização de condutas.

Explicação do caso

Lei Maria da Penha a

A ação foi movida com o argumento de que a falta de previsão expressa na legislação resultava em um vácuo normativo, deixando homens gays e mulheres trans sem acesso às mesmas medidas protetivas concedidas a mulheres cisgênero.

O STF reconheceu essa omissão e determinou a possibilidade de concessão de medidas protetivas de urgência, como o afastamento do agressor e a proibição de contato, para vítimas nessas condições.

Contudo, a decisão não equiparou integralmente casais homoafetivos masculinos e mulheres trans às mulheres cis no que diz respeito à aplicação plena da Lei Maria da Penha.

Na prática, isso significa que, embora essas pessoas possam obter medidas protetivas com base na legislação, a violação dessas ordens não configura o crime do artigo 24-A da LMP (descumprimento de medida protetiva de urgência).

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Aspectos jurídicos relevantes

Proibição da Proteção Deficiente e limites da interpretação

O STF baseou sua decisão na proibição da proteção deficiente, um dos desdobramentos do princípio da proporcionalidade, que impõe ao Estado o dever de garantir uma tutela mínima a grupos em situação de risco. A violência doméstica contra casais homoafetivos masculinos e mulheres trans é uma realidade, e a ausência de proteção suficiente poderia estimular a impunidade.

No entanto, a decisão não foi além do necessário para corrigir essa lacuna. O tribunal não criou crimes nem ampliou as sanções penais da LMP para esses grupos. O entendimento foi meramente interpretativo, voltado para garantir a aplicação de medidas de urgência já previstas na legislação.

Diferença entre Normas Extrapenais e Penais

Outro ponto fundamental da decisão é que a analogia adotada pelo STF não se estende ao âmbito penal, pois a analogia in malam partem (em desfavor do réu) é vedada no direito penal brasileiro. Assim, o descumprimento de uma medida protetiva concedida a um homem gay, por exemplo, não configura o crime do artigo 24-A da LMP. Isso demonstra que, embora tenha havido um avanço na proteção dessas vítimas, a extensão da Lei Maria da Penha a esses grupos ainda não é completa.

Proteção da Família e interpretação constitucional

O artigo 226, § 8º, da Constituição Federal determina que o Estado deve criar mecanismos para coibir a violência no âmbito das relações familiares. Esse dispositivo foi um dos fundamentos da decisão do STF, que entendeu que não se deve combater a violência doméstica apenas quando ocorre contra mulheres cisgênero. Contudo, a falta de uma previsão legal mais ampla ainda gera descompassos na aplicação prática da norma.

Precedente do STJ sobre a aplicação da Lei Maria da Penha a Mulheres Trans

Antes mesmo da decisão do STF, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia se posicionado sobre a aplicação da Lei Maria da Penha a mulheres trans. Em abril de 2022, a Sexta Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que a referida lei é aplicável em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transexuais.

O Tribunal considerou que a lei trata de violência baseada em gênero, e não no sexo biológico, reconhecendo que o elemento diferenciador para a abrangência da Lei Maria da Penha é o gênero feminino, que nem sempre coincide com o sexo biológico. Essa decisão reforça a necessidade de proteção efetiva para todas as pessoas que se identificam com o gênero feminino, independentemente de sua conformação biológica.

Consequências da decisão

Proteção Limitada e Necessidade de Regulamentação

Embora a decisão represente um passo importante, a proteção conferida ainda é parcial. A inexistência de previsão expressa sobre as sanções aplicáveis a agressores nesses casos pode comprometer a efetividade das medidas protetivas. Isso evidencia a necessidade de mudanças legislativas, para que a proteção não fique restrita ao âmbito extrapenal.

Impacto no Judiciário e na Aplicação da Lei

A partir dessa decisão, delegacias e juizados especializados deverão se adaptar à nova realidade. Devem garantir que casais homoafetivos masculinos e mulheres trans tenham acesso a medidas protetivas. No entanto, o fato de o descumprimento dessas ordens não acarretar as mesmas consequências penais previstas na LMP pode dificultar a aplicação prática da proteção.

Comparação com a ADO 26 e outras decisões do STF

A decisão segue a lógica adotada pelo STF na ADO 26, que reconheceu a homofobia e a transfobia como crimes de racismo. Em ambos os casos, o tribunal preencheu lacunas legais por meio de interpretação constitucional, mas sem criar novas normas penais.

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Conclusão

O julgamento do MI 7452 representa um avanço na garantia de proteção contra a violência doméstica para grupos vulneráveis, permitindo que casais homoafetivos masculinos e mulheres trans tenham acesso a medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha. No entanto, essa extensão é limitada, pois não abrange as disposições penais da LMP, o que pode comprometer a efetividade da proteção concedida.

Além disso, a decisão não inovou na proteção às mulheres trans. Isso porque o STJ já havia reconhecido anteriormente a aplicabilidade da LMP a essa população. O reconhecimento da vulnerabilidade desses grupos é fundamental, mas sem uma regulamentação mais ampla, a decisão do STF pode ter eficácia reduzida na prática.

Dessa forma, o avanço proporcionado pela decisão não deve ser visto como uma solução definitiva, mas sim como um passo que evidencia a necessidade de reforma legislativa. O ideal é que o Congresso Nacional estabeleça normas claras e abrangentes, garantindo que todas as vítimas de violência doméstica tenham acesso a uma proteção efetiva e igualitária.


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