Fraude em concurso com 426 vagas: prisão em flagrante abala a lisura do certame do TSE

Fraude em concurso com 426 vagas: prisão em flagrante abala a lisura do certame do TSE

A notícia da prisão de um candidato flagrado com um ponto eletrônico durante o concurso unificado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em Recife trouxe à tona questões sobre fraudes em concursos públicos no Brasil.

Este tipo de conduta compromete a lisura do processo seletivo, violando princípios constitucionais da administração pública. Além disso, configura tanto infração penal, quanto ato de improbidade administrativa.

Neste artigo, examinaremos os aspectos jurídicos envolvidos, o impacto dessa prática e os desdobramentos necessários para apurar a responsabilidade dos envolvidos.

Fraude e o Enquadramento Jurídico

O candidato, de 31 anos, foi preso em flagrante ao utilizar um dispositivo eletrônico durante a realização da prova.

Essa conduta se enquadra no artigo 311-A do Código Penal, que criminaliza a utilização ou divulgação indevida de conteúdo sigiloso de concursos públicos.

O artigo 311-A dispõe:

"Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: I - concurso público; (...)."

No caso analisado, o uso do ponto eletrônico e a tentativa de fuga indicam, de forma clara, o dolo do agente. Ou seja, havia a vontade livre e consciente de praticar a conduta narrada no tipo penal, em prejuízo da fé pública. É bom lembrar que o crime em questão tem como objeto material a fé pública (Título X, do Código Penal).

A pena prevista é de reclusão de 1 a 4 anos e multa.

Cabe destacar que, conforme o § 3º do artigo, a pena pode ser aumentada em 1/3 caso o ato seja cometido por um funcionário público. Esse é o caso do acusado, que atua como orientador social em um município no interior de Pernambuco.

Interessante anotar que, do ponto de vista objetivo, a infração comportaria, em tese, o oferecimento de acordo de não persecução penal, em razão da quantidade de pena abstratamente cominada.

No entanto, nos parece que a solução negociada não seria adequada e suficiente para a reprovação e prevenção do crime, cuja gravidade é indiscutível diante da repercussão negativa de eventual fraude para os 600 mil candidatos inscritos.[1]

Violação dos Princípios da Administração Pública

A utilização de métodos fraudulentos em concursos públicos viola também princípios fundamentais da administração pública previstos no artigo 37, da Constituição Federal, como:

  • Isonomia: todos os candidatos devem concorrer em igualdade de condições, o que a fraude compromete diretamente;
  • Concurso Público: este princípio assegura que o acesso ao serviço público ocorra por critérios de mérito e capacidade.

A quebra desses princípios não apenas prejudica candidatos que se dedicaram honestamente, mas também mina a credibilidade do certame, gerando desconfiança na sociedade quanto à transparência dos processos seletivos.

Ato de Improbidade Administrativa

Além da responsabilidade penal, a conduta pode caracterizar ato de improbidade administrativa, conforme prevê o artigo 11, da Lei nº 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa). Este artigo define que constitui improbidade a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, imparcialidade e legalidade, como:

"Frustrar, em ofensa à imparcialidade, o caráter concorrencial de concurso público, de chamamento ou de procedimento licitatório, com vistas à obtenção de benefício próprio, direto ou indireto, ou de terceiros."

A demonstração do dolo é evidente, considerando que o uso do ponto eletrônico reflete a vontade livre e consciente de fraudar o concurso, frustrando seu caráter competitivo em benefício próprio.

Essa prática pode ensejar a responsabilização do agente em uma ação de improbidade administrativa, cujas sanções incluem perda do cargo público, suspensão dos direitos políticos e multa civil.

Investigações e Envolvimento de Terceiros

É imprescindível que as investigações prossigam para apurar se outros indivíduos estavam envolvidos na transmissão das respostas ao candidato.

Fraude, investigação

A existência de coautores ou até de um esquema organizado para fraudar concursos públicos (revelando estabilidade e permanência de um grupo composto por três ou mais pessoas) agrava ainda mais o caso, podendo configurar o crime de associação criminosa (artigo 288 do Código Penal).

A apuração deve examinar a origem e o alcance da fraude, incluindo possíveis falhas de segurança do certame, que podem ter facilitado o uso de dispositivos como o ponto eletrônico. É bom lembrar que as pessoas envolvidas nestas falhas que também responderiam pelos atos em questão, na qualidade de coautoras!

Impacto

Casos como este comprometem a confiança da sociedade na imparcialidade dos concursos públicos, pilares do serviço público no Brasil.

Ademais, a gravidade da conduta é reforçada pelas dimensões do concurso em questão, que oferecia 412 vagas em todo o Brasil, em 26 tribunais regionais eleitorais, com mais de 600 mil candidatos inscritos.

As bancas organizadoras têm adotado medidas tecnológicas avançadas para coibir fraudes, como detectores de metal e sistemas de vigilância, mas a sofisticação dos dispositivos utilizados pelos fraudadores impõe desafios constantes.


[1]BONOMI, Priscila. TSE registra mais de 600 mil inscritos em edital unificado. Estratégia Concursos. 2024. Disponível em: <https://www.estrategiaconcursos.com.br/blog/concurso-tse-unificado-inscritos-total/>.


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