Você acha que um “tique azul” do WhatsApp vale como citação judicial?

Você acha que um “tique azul” do WhatsApp vale como citação judicial?

Descubra nessa análise jurídica se o ‘tique azul’ do WhatsApp pode ser utilizado como citação judicial.

citação judicial

Entenda o caso

Imagine a seguinte cena:

Você recebe uma mensagem no WhatsApp de um número desconhecido.
Ao abrir, percebe que se trata de uma citação judicial. 
Sua reação imediata seria de desconfiança, certo? 

No dia 21 de agosto de 2024, a 1ª Vara Federal de Limeira/SP, proferiu uma decisão que repercutiu no mundo jurídico. 

No Cumprimento de Sentença nº 5001309-83.2019.4.03.6143, o judiciário validou uma citação realizada via WhatsApp, baseando-se na mudança de cor dos famosos “tiques” do aplicativo.

Em palavras jurídicas, o cenário é o seguinte: uma executada, em uma ação movida pela Caixa Econômica Federal, impugnou o cumprimento de sentença alegando, entre outros pontos, a nulidade da citação realizada na fase de conhecimento. 

O motivo? A citação judicial foi feita por meio do WhatsApp.

Mas a juíza pensou diferente. Ela não só considerou a citação válida como usou um argumento interessante…

Vamos aprofundar o tema.

Citação judicial pelo WhatsApp

A Justiça Federal baseou sua decisão nos seguintes dispositivos legais:

Art. 3º da OS DFORSP nº 23/2020:

    "Art. 3º As citações, intimações e notificações por whatsapp serão enviadas a partir do aparelho de telefonia móvel do Oficial de Justiça Avaliador Federal ou, eventualmente, pelo aparelho das unidades que o possuírem.
    
    § 1º Para o ato de comunicação o servidor encaminhará, via whatsapp, a imagem do mandado e de eventuais peças que o instruírem.
    
    § 2º O ato de comunicação processual será considerado realizado na data e hora da confirmação de recebimento pelo destinatário da mensagem”.

    Perceba, o artigo em questão regulamenta o uso do WhatsApp para citações, intimações e notificações no âmbito da Justiça Federal. 

    Especificamente, o §2º do art. 3º estabelece que “O ato de comunicação processual será considerado realizado na data e hora da confirmação de recebimento pelo destinatário da mensagem.”

    Assim, na data em que a pessoa certificou a leitura da mensagem, considera-se válida.

    Art. 4º da OS DFORSP nº 23/2020: 

      Art. 4º O Oficial de Justiça Avaliador Federal solicitará a confirmação do recebimento dos atos de comunicação processual, de forma a atestar que o destinatário foi devidamente cientificado do respectivo conteúdo, com a identificação de quem as recebeu.
      
      § 1º Recebida a resposta, por e-mail, whatsapp, telefone ou outro aplicativo ou meio, de que o destinatário recebeu o ato de comunicação processual, o Oficial de Justiça Avaliador Federal certificará nos autos eletrônicos ou no mandado físico a data e hora do recebimento da mensagem e quem a recebeu.
      
      § 2º Na hipótese de não confirmação do recebimento da mensagem pelo destinatário no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, o Oficial de Justiça Avaliador Federal deverá providenciar a citação, intimação ou notificação por outro meio legal."

      Em outras palavras, o dispositivo determina que o Oficial de Justiça deve solicitar a confirmação do recebimento dos atos de comunicação processual, certificando nos autos a data e hora do recebimento da mensagem e quem a recebeu.

      Isto é, o Oficial de Justiça deve comunicar que horas exatamente ocorreu a comunicação. Ou seja, quando ocorreu os “dois tiques”.

      Do ponto de vista legal, o Código de Processo Civil (CPC) já prevê a possibilidade de citação por meio eletrônico, conforme o artigo 246, inciso V. 

      Contudo, a regulamentação específica sobre o uso de aplicativos de mensagens como o WhatsApp ainda não está totalmente consolidada. A Lei nº 11.419/2006, que trata da informatização do processo judicial, exige o credenciamento de partes junto ao Poder Judiciário para a prática de atos processuais eletrônicos, o que nem sempre é viável no caso do WhatsApp​

      Os tribunais, no entanto, têm aceitado a citação por WhatsApp em algumas situações, desde que o objetivo da citação judicial seja alcançado de maneira inequívoca. 

      Casos relevantes sobre a validade de citações por WhatsApp

      Um exemplo é a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que reconheceu a validade de citações por WhatsApp, desde que a identidade do citando seja confirmada por métodos como número de telefone, mensagens escritas e até o envio de fotos:

      Existem decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça (HC 641.8774 e HDE 2.9355) admitindo a intimação por WhatsApp, desde que se possa ter certeza de que o número de telefone receptor da mensagem eletrônica, seja do destinatário ou se possa comprovar a autenticidade da identidade da parte a ser citada. Ainda existem outros casos análogos perante o STJ (HC 633.317/DF; HC 644.629/RJ; HC 644.544/DF; e HC 644.543/DF).

      Se você perceber os atos normativos são do ano de 2020, pense que, com a restrição da pandemia, muitos oficiais de justiça não puderam pessoalmente realizar os atos de citação/intimação.

      Assim, o Poder Judiciário foi inovador e também adaptativo a novas comunicações. 

      Decisões importantes no uso de WhatsApp para citações

      Inclusive, o TJGO foi um dos pioneiros na utilização do WhatsApp para citações e intimações. Em 2019, o tribunal validou uma citação realizada por esse meio. Veja as seguintes decisões no mesmo sentido:

      Em breve síntese, a justiça federal rejeitou a alegação de nulidade da citação por WhatsApp com base nos seguintes argumentos:

      1. O Oficial de Justiça certificou, por contato telefônico prévio, que o número contatado pertencia à executada.
      2. Os ícones de confirmação de leitura da mensagem no WhatsApp estavam na cor azul, o que, segundo a juíza, é de “amplo e notório conhecimento” que confirma a leitura da mensagem pelo destinatário.

      No fundo, essa decisão representa uma flexibilização das formalidades processuais, isto porque,  a decisão demonstra uma tendência de flexibilização das formalidades processuais em favor da celeridade e efetividade da prestação jurisdicional.

      Como o tema já caiu em provas:

      FCC – 2021 – DPE-SC – Defensor Público

      A respeito de recentes decisões do Superior Tribunal de Justiça e a utilização das novas ferramentas tecnológicas no Processo Penal:

      a) por ser instrumento do crime, é possível que o policial responsável pela prisão em flagrante acesse diretamente as conversas de WhatsApp da pessoa presa, sem necessidade de autorização judicial. 

      b) é nula a citação do réu solto por WhatsApp, em razão da forma presencial de tal ato estipulada no Código de Processo Penal.

      c) a citação do réu solto por WhatsApp é válida, bastando que o oficial de justiça, que possui fé pública, confirme ser o réu a pessoa citada. 

      d) o reconhecimento por foto, realizado pela vítima, se digital e em alta resolução, é instrumento capaz de embasar, por si, a condenação em um processo penal. 

      e) as mensagens obtidas por meio do print screen da tela da ferramenta WhatsApp Web, por poderem ter parte do conteúdo apagado sem deixar vestígios, devem ser consideradas provas ilícitas.

      GABARITO: Letra E


      Comentários

      A) Sem prévia autorização judicial, são nulas as provas obtidas pela polícia por meio da extração de dados e de conversas registradas no whatsapp presentes no celular do suposto autor de fato delituoso, ainda que o aparelho tenha sido apreendido no momento da prisão em flagrante. STJ. 6ª Turma. RHC 51.531-RO, Rel. Min. Nefi Cordeiro, julgado em 19/4/2016 (Info 583).

      B) É possível a utilização de WhatsApp para a citação de acusado, desde que sejam adotadas medidas suficientes para atestar a autenticidade do número telefônico, bem como a identidade do indivíduo destinatário do ato processual. STJ. 5ª Turma. HC 641.877/DF, Rel. Min. Ribeiro Dantas, julgado em 09/03/2021 (Info 688).

      C) Inf. 688: No caso concreto, o STJ decidiu anular a citação feita via WhatsApp, porque não houve nenhum comprovante quanto à autenticidade da identidade do citando, ressaltando, porém, a possibilidade de o comparecimento do acusado suprir o vício, bem como a possibilidade de se usar a referida tecnologia, desde que, com a adoção de medidas suficientes para atestar a identidade do indivíduo com quem se travou a conversa

      D) O reconhecimento do suspeito por mera exibição de fotografia(s) ao reconhecedor, a par de dever seguir o mesmo procedimento do reconhecimento pessoal, há de ser visto como etapa antecedente a eventual reconhecimento pessoal e, portanto, não pode servir como prova em ação penal, ainda que confirmado em juízo. STJ, 6ª TURMA, HC 598.886. 

      E) É nula decisão judicial que autoriza o espelhamento do WhatsApp via Código QR para acesso no WhatsApp Web. Também são nulas todas as provas e atos que dela diretamente dependam ou sejam consequência, ressalvadas eventuais fontes independentes. Não é possível aplicar a analogia entre o instituto da interceptação telefônica e o espelhamento, por meio do WhatsApp Web, das conversas realizadas pelo aplicativo WhatsApp. STJ. 6ª Turma. RHC 99.735-SC, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 27/11/2018 (Info 640).

      Referências – Citação judicial por WhatsApp

      • Citação e intimação judicial por meio do WhatsApp ou similares – Migalhas
      • XAVIER, R. M.; CARVALHO, F. F. Citações e intimações expedidas via WhatsApp: limites e possibilidades à luz das garantias processuais. Conteúdo Jurídico, 2023.
      • A possibilidade jurídica das citações eletrônicas por Whatsapp – Consultor Jurídico

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