STF decide que atividades físicas sem risco dispensam presença de profissional – Entenda!

STF decide que atividades físicas sem risco dispensam presença de profissional – Entenda!

STF decide que academias e clubes no RS não precisam manter profissional de educação física em tempo integral para atividades físicas sem risco.

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

atividades físicas

Decisão do STF

O Supremo Tribunal Federal decidiu, por maioria, afastar a exigência de permanência em tempo integral de profissionais de educação física em estabelecimentos de prática desportiva e atividade física do Rio Grande do Sul que não representem riscos excepcionais à saúde e à integridade física. 

A decisão foi tomada no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.399, ajuizada pela Confederação Nacional de Serviços.

A norma impugnada foi o artigo 2º, da Lei gaúcha nº 11.721/2002, que disciplina o funcionamento de clubes, academias e outros estabelecimentos que ministrem atividades de ginástica, lutas, musculação, artes marciais, esportes e demais atividades físico-desportivo-recreativas.

Lei estadual nº 11.721/2002

Art. 1º. Esta Lei se aplica às academias, clubes desportivos ou recreativos e outros estabelecimentos que ministrem atividades de ginástica, lutas, musculação, artes marciais, esportes e demais atividades físico-desportiva-recreativas ou similares, em funcionamento no Estado do Rio Grande do Sul. 

Art. 2º As pessoas jurídicas mencionadas no artigo anterior, para que possam funcionar regularmente, devem manter em tempo integral:

I - profissionais de Educação Física, devidamente registrados no Conselho Regional de Educação Física do Estado do Rio Grande do Sul, sendo um deles o responsável técnico, em seus quadros;

II - certificado de registro no Conselho Regional de Educação Física do Estado do Rio Grande do Sul;

A CNS argumentou que a Lei do Estado do Rio Grande do Sul fere o artigo 22, incisos I e XVI, da CF/88, os quais estabelecem ser da competência privativa da União legislar sobre sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões, o mesmo ocorrendo com direito do trabalho.

Constituição Federal

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

XVI - organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões.

A parte autora da ADI defendeu que a competência privativa exclui e impede a atuação legislativa dos Estados, seja de forma suplementar ou não. A lei estadual, portanto, teria sido confeccionada em estado de usurpação de competência privativa da União.

A Confederação Nacional de Serviços argumentou, também, que a lei estadual teria violado a liberdade de exercício de qualquer profissão (artigo 5º, XIII, da CF), ao exigir a contratação de profissionais de educação física ligados, obrigatoriamente, ao Conselho Regional de Educação Física do Estado do Rio Grande do Sul, beneficiando esse ente específico em detrimento dos demais.

Por último, a CNS apontou violação à livre iniciativa e à liberdade de exercer atividade econômica (artigo 170, caput e §único, da CF).

Constituição Federal

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
...

Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei. 
FUNDAMENTOS QUE EMBASARAM A INICIAL DA ADI 4.399
Invasão de competência privativa da União legislar sobre direito do trabalho, sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões (Artigo 22, incisos I e XVI, da CF/88)
Violação à liberdade de exercício de qualquer profissão (Artigo 5º, XIII, da CF/88)
Violação à livre iniciativa e à liberdade de exercer atividade econômica (Artigo 170, caput e §único, da CF/88).

De acordo com a ADI, clubes e academias estariam sendo notificados a firmar TACs – Termos de Ajustamento de Conduta para contratação dos profissionais exigidos, sob pena de sanções como multa e eventual fechamento.

A entidade argumenta que a obrigatoriedade imposta pela lei estadual representa ônus desproporcional e excessivo, especialmente para as academias de ginástica, artes marciais e atividades recreativas.

Voto Vencido

O ministro Nunes Marques, relator da ação, juntamente com os ministros Cristiano Zanin e Edson Fachin, votaram pela constitucionalidade da norma, destacando que a norma estadual não cria ou regulamenta a profissão, mas apenas aplica, no âmbito local, parâmetros previstos em legislação federal – como a lei 9.696/98 – com o objetivo de proteger a saúde e a segurança dos consumidores.

Portanto, a exigência prevista na lei gaúcha seria compatível com a competência concorrente dos Estados para legislar sobre desporto, saúde e defesa do consumidor.

Segundo os ministros vencidos, a exigência de qualificação profissional e registro não configura violação à liberdade de exercício profissional ou à livre iniciativa, uma vez que a atividade de educação física possui potencial lesivo se mal exercida, justificando o controle pelo Estado.

Voto Vencedor – Divergência

Ao apresentar seu voto-vista, o ministro Flávio Dino abriu divergência, ressaltando que, embora reconheça que a lei estadual busca conferir eficácia à legislação federal, como a lei 9.696/98 e a lei 6.839/80, a redação ampla da norma estadual abre margem para interpretações que violam garantias constitucionais.

Dino expressou entendimento de que a exigência de registro e de responsável técnico deve se restringir a atividades com riscos reais à saúde e segurança dos praticantes, como academias e clubes desportivos, não alcançando atividades de natureza exclusivamente lúdica ou recreativa.

Portanto, práticas voltadas à diversão, socialização e lazer, sem risco excepcional à integridade física, não devem ser submetidas a tais exigências, sob pena de violação às liberdades individuais e coletivas, o direito social ao lazer e à prática desportiva e, ainda, os princípios da livre iniciativa e da liberdade de exercício de atividades econômicas.  

Enfim, a norma estadual adotou uma redação excessivamente ampla, ferindo a Constituição Federal. 

A supervisão profissional imposta na legislação federal destina-se apenas a estabelecimentos cujas atividades envolvam, por sua própria natureza, riscos à saúde, à integridade física ou à segurança pessoal dos praticantes.

As atividades de natureza exclusivamente lúdica ou recreativa, voltadas à diversão, à socialização e ao lazer e que não oferecem riscos excepcionais à saúde não se submetem a exigências de registro profissional ou de supervisão especializada.

Ao final, a ADI foi julgada parcialmente procedente para dar interpretação conforme à CF a fim de afastar qualquer entendimento que obrigue estabelecimentos recreativos ou similares a cumprir os requisitos previstos na norma estadual impugnada, como registro no CREF e presença de profissional técnico em tempo integral.

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