Altura mínima em concursos para a PM: critério legítimo ou barreira inconstitucional? Tema 1.424 do STF

Altura mínima em concursos para a PM: critério legítimo ou barreira inconstitucional? Tema 1.424 do STF

Hoje, vamos discutir o caso que saiu no informativo 1190 do STF de 22/09/2025:

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O que aconteceu?

Em breve síntese, em 12 de setembro de 2025, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário 1.469.887/AL, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.424). 

Nessa linha, o processo teve origem em Alagoas, após a eliminação de uma candidata em concurso público da Polícia Militar por não atender à altura mínima de 1,65m exigida pela legislação estadual.

Por maioria, o Plenário do STF decidiu que a exigência de altura mínima superior à prevista para ingresso no Exército viola o princípio da razoabilidade, declarando inconstitucional a norma estadual. 

Isto porque, a Corte fixou a tese de que “a exigência de altura mínima para ingresso em cargo do Sistema Único de Segurança Pública pressupõe a existência de lei e a observância dos parâmetros fixados para a carreira do Exército (Lei Federal nº 12.705/2012, 1,60m para homens e 1,55m para mulheres)”.

A fundamentação jurídica

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Ora, o voto condutor, de relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, destacou que o Estado de Alagoas não poderia exigir altura mínima superior à prevista em lei federal, já que as polícias militares são, nos termos do art. 144, §6º da Constituição, “forças auxiliares e reserva do Exército”.

Nessa linha, o STF lembrou o precedente da ADI 5.044, em que se reconheceu a validade da exigência de altura mínima desde que compatível com as atribuições do cargo e dentro dos parâmetros adotados pelo Exército. 

Em contrapartida, o excesso legislativo estadual foi rechaçado: “A altura mínima fixada pelo legislador estadual não observou o parâmetro utilizado pelo STF para aferir a razoabilidade do requisito”.

Perceba, a decisão também se apoiou nos arts. 37, I e II, da Constituição Federal, que garantem igualdade de acesso a cargos públicos, e no princípio da proporcionalidade. 

Isto porque, a imposição de requisitos desarrazoados sem justificativa prática foi considerada restrição indevida ao direito de acesso a funções estatais.

O contexto jurisprudencial

A posição do Supremo não surgiu de maneira inédita. 

Nessa linha, em julgados recentes, como o ARE 1.459.395 AgR (Min. Luiz Fux), o RE 1.465.829 AgR (Min. Dias Toffoli) e o RE 1.480.201 (Min. Luiz Fux), a Corte já havia delimitado que a altura mínima para carreiras da segurança pública deve acompanhar os parâmetros da Lei nº 12.705/2012.

Além disso, em 2018, ao analisar a ADI 5.044, o Tribunal reconheceu a constitucionalidade da exigência de altura mínima para o Corpo de Bombeiros do DF, mas afastou o requisito para cargos sem atribuições operacionais, como capelães e oficiais de saúde. 

Inclusive, esse precedente sedimentou a ideia de que critérios físicos só se legitimam quando guardam pertinência com as funções a serem desempenhadas.

Vale salientar que, do ponto de vista processual, o recurso extraordinário foi admitido pelo Tribunal de Justiça de Alagoas como representativo de controvérsia, conforme o art. 1.036 do CPC/2015, dada a multiplicidade de casos semelhantes no país.

Assim, o reconhecimento da repercussão geral pelo STF visou uniformizar a jurisprudência e reduzir a litigiosidade sobre concursos públicos de segurança, fixando critério vinculante a todos os entes federativos.

E agora, o que acontece?

Primeiro, a decisão repercute diretamente nos concursos das polícias militares e corpos de bombeiros em todo o Brasil. 

Assim, Estados que ainda mantêm legislação mais rigorosa do que a prevista para o Exército terão de se adequar, sob pena de inconstitucionalidade.

Na prática, isso significa que nenhum edital poderá exigir altura mínima superior a 1,60m para homens e 1,55m para mulheres, salvo cargos específicos cujas funções justifiquem a exceção. 

Além disso, o julgado também reforça a necessidade de que critérios físicos em concursos sejam compatíveis com a atividade a ser desempenhada, sob risco de se configurarem barreiras discriminatórias.

Logo, com a tese vinculante do STF, cria-se um padrão nacional que deve ser observado por todas as corporações do Sistema Único de Segurança Pública.

Em síntese

O STF reafirmou a jurisprudência dominante ao decidir que a fixação de altura mínima em concursos para a Polícia Militar não é, por si só, inconstitucional, desde que observe os parâmetros fixados para o Exército

Mas, a tentativa de impor requisitos mais rigorosos por legislação estadual foi considerada desproporcional e violadora do princípio da razoabilidade.

Em síntese, a tese fixada no Tema 1.424 da repercussão geral é clara: a exigência de altura mínima em concursos para carreiras da segurança pública só é legítima quando prevista em lei e nos limites da Lei nº 12.705/2012

Outro julgados

Julgados correlatos:

É razoável, dada a natureza e as peculiaridades do cargo, exigir-se altura mínima para o ingresso em carreira militar, devendo esse requisito, contudo, encontrar previsão legal e não apenas editalícia.

A jurisprudência dos Tribunais Superiores é pacífica no sentido de que é constitucional a exigência de altura mínima para o ingresso em carreiras militares, desde que haja previsão legal específica.

Somente lei formal pode impor condições para o preenchimento de cargos, empregos ou funções públicas.

STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 1590450/PE, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 19/10/2017.

STF. 2ª Turma. ARE 1073375 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 23/03/2018.
Não fere direitos dos candidatos a disposição do edital do certame que prevê limites mínimo e máximo de idade para o ingresso na carreira militar, em razão da atividade peculiar nela exercida, desde que tal limitação esteja prevista em legislação específica.

STJ. 1ª Turma. AgInt no RMS 51864/SE, Rel. Min. Regina Helena Costa, julgado em 21/03/2017.

Vale ressaltar que somente a lei pode estabelecer limites de idade nos concursos das Forças Armadas, sendo vedado, diante do princípio constitucional da reserva legal, que a lei faculte tal regulamentação a atos administrativos expedidos pela Marinha, Exército ou Aeronáutica:

A limitação de idade em concurso público para ingresso nas Forças Armadas somente é válida se for prevista em lei em sentido formal, não sendo legítima a imposição de critério restritivo por meio de regulamento ou edital do certame.

STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag 1424804/RR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 10/03/2016.

O STF entende que a comprovação do requisito relativo ao limite de idade deve ser comprovada no momento da inscrição do concurso público, e não no ato da matrícula do curso de formação:

O limite de idade, quando regularmente fixado em lei e no edital de determinado concurso público, há de ser comprovado no momento da inscrição no certame.

STF. 1ª Turma. ARE 840.592/CE, Min. Roberto Barroso, julgado em 23/6/2015 (Info 791).

Vale ressaltar que a limitação de idade, sexo e altura, para ser válida, além de ter previsão na lei e no edital, deverá também ser razoável. Se for uma limitação ou diferenciação injustificada, será inválida, mesmo que prevista na lei e no edital. Assim, por exemplo, a vedação para mulheres deve ser justificada, proporcional e prevista em lei. Nesse sentido:

A imposição de discrímen de gênero para fins de participação em concurso público somente é compatível com a Constituição nos excepcionais casos em que demonstradas a fundamentação proporcional e a legalidade da imposição, sob pena de ofensa ao princípio da isonomia.

A CF/88 assegura, em seu art. 5º, I, que homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações.

Além disso, o Texto Constitucional determina que é proibido ao Administrador Público estabelecer diferenças nos critérios de admissão dos servidores públicos por motivo de sexo (art. 7º, XXX c/c art. 39, § 3º).

Desse modo, em regra, em um concurso público, não são permitidas discriminações entre homens e mulheres.

Excepcionalmente, são permitidas distinções de gênero para fins de participação em concurso público desde que seja demonstrado que esse discrímen é:

a) proporcional e
b) previsto em lei.

No caso concreto julgado, o concurso para oficial da Polícia Militar estabelecia que somente podiam participar candidatos do sexo masculino. Vale ressaltar que essa restrição era prevista tanto na lei como no edital do certame.

A 2ª Turma do STF entendeu que havia afronta ao princípio da isonomia, haja vista que tanto o edital quanto a lei não teriam definido qual a justificativa para não permitir que mulheres concorressem ao certame e ocupassem os quadros da Polícia Militar. Ora, como se sabe, existem muitas mulheres que integram a carreira policial e o simples fato de ser do sexo feminino não é empecilho para fazer parte da Polícia Militar.

STF. 2ª Turma. RE 528684/MS, rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 3/9/2013 (Info 718).

Entendimentos

Uma tabela massa para consolidarmos:

ProcessoRelatorEntendimento
ADI 5.044/DF (2018)Min. Alexandre de MoraesConstitucional altura mínima para Bombeiros (1,60/1,55), inconstitucional para saúde e capelães
ARE 1.459.395 AgR (2024)Min. Luiz FuxExigência deve observar parâmetros da Lei 12.705/2012
RE 1.465.829 AgR (2024)Min. Dias ToffoliExigência municipal deve seguir padrão das Forças Armadas
RE 1.480.201 (2024)Min. Luiz FuxReafirma parâmetros do Exército como teto
Antes da decisãoApós a decisão (Tema 1.424)
Estados podiam fixar requisitos mais rigorosos em leis própriasEstados e Municípios devem respeitar os limites da Lei 12.705/2012
Editais com altura acima de 1,65m/1,60m eram admitidos em alguns tribunaisEditais com altura superior a 1,60m (homens) e 1,55m (mulheres) serão inconstitucionais
Divergência entre tribunais locaisPadrão nacional uniforme, vinculante para todo o SUSP

Como o tema já caiu em provas

Prova: FCC - 2018 - ALESE - Analista Legislativo - Processo Legislativo

Com objetivo de recompor os quadros da Polícia Militar do Estado, o Governador autorizou a abertura de concurso público para o preenchimento de 200 cargos que se encontravam vagos. Ao elaborar o edital do referido concurso, a Polícia Militar do Estado, a despeito da inexistência de disposição nesse sentido em lei, incluiu entre os requisitos para a ocupação do cargo as alturas mínimas de 1,75 m para homens e 1,65 m para mulheres. Considerando o quanto disposto na Constituição da República, bem como a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a exigência feita se mostra

Alternativas

A) ilegítima, já que o princípio da isonomia veda qualquer espécie de discriminação, impondo tratamento igualitário a todos, por meio da chamada igualdade formal.

B) legítima, na medida em que se mostra razoável, quando analisadas as atividades inerentes aos cargos que se busca preencher através do concurso público que está sendo realizado.

C) ilegítima, uma vez que, embora prevista no edital do concurso, não havia lei em sentido formal e material amparando tal exigência.

D) legítima, pois, sendo a Polícia Militar organizada com base na hierarquia e disciplina, o seu Comandante goza da faculdade de condicionar o acesso à carreira ao preenchimento dos requisitos que entender pertinentes, desde que relacionados às atividades do cargo.

E) ilegítima, uma vez que estabelecida pela própria Polícia Militar, quando da elaboração do edital, e não pelo Governador, quando da concessão de autorização para abertura do concurso.

Gab.: C.
Provas: FGV - 2014 - PGM - Niterói - Procurador do Município, 3ª Categoria (P3)

A exigência de altura mínima para o acesso ao cargo público ofende os princípios da isonomia e da ampla concorrência. (Errado)

Referências

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A limitação de idade, sexo e altura para o ingresso na carreira militar é válida desde que haja previsão em lei específica e no edital do concurso público. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/5960/a-limitacao-de-idade-sexo-e-altura-para-o-ingresso-na-carreira-militar-e-valida-desde-que-haja-previsao-em-lei-especifica-e-no-edital-do-concurso-publico. Acesso em: 23/09/2025 – 09:48.


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