ADPF 1.037 do STF – Os Procuradores Municipais via concurso serão obrigatórios? A unicidade das PGMs na visão do STF – Análise jurídica

ADPF 1.037 do STF – Os Procuradores Municipais via concurso serão obrigatórios? A unicidade das PGMs na visão do STF – Análise jurídica

Introdução

O Supremo Tribunal Federal (STF) julgou recentemente a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 1037, trazendo importantes definições sobre a estruturação e funcionamento das Procuradorias Municipais.

A decisão, proferida em 19/08/2024, abordou a constitucionalidade de dispositivos da Lei Complementar 136/2020 do Município de Macapá/AP, que permitiam a nomeação de assessores jurídicos em cargos comissionados para exercer funções típicas de procuradores municipais.

Esta análise se concentrará nas implicações da decisão para a organização das Procuradorias Municipais, com ênfase no princípio da unicidade da Advocacia Pública.

Contexto da ADPF 1037

ADPF, assessoria

A Associação Nacional dos Procuradores Municipais (ANPM) propôs a ADPF 1037 contra o art. 43, V, §§ 4º e 5º, da Lei Complementar 136/2020 do Município de Macapá/AP.

Esses dispositivos previam a criação de Assessorias Jurídicas Setoriais, cujos titulares seriam nomeados em comissão, permitindo que exercessem funções de consultoria e assessoramento jurídico no âmbito da administração municipal.

A Decisão do STF

O STF, por unanimidade, julgou parcialmente procedente o pedido da ADPF 1037. A decisão estabeleceu que:

  1. Os Municípios não são obrigados a instituir Procuradorias Municipais, tendo liberdade de conformação nesse aspecto.
  2. Entretanto, uma vez criada a Procuradoria Municipal por concurso público, esta deve observar o princípio da unicidade institucional.
  3. Assim, veda-se que ocupantes de cargos em comissão, estranhos ao quadro da Procuradoria Municipal, exerçam funções próprias dos Procuradores Municipais.

O Princípio da Unicidade e as Procuradorias Municipais

Conceito de Unicidade

O princípio da unicidade da Advocacia Pública, embora não expressamente previsto na Constituição Federal, deriva da interpretação sistemática dos artigos 131 e 132. Tais dispositivos tratam da Advocacia-Geral da União e das Procuradorias dos Estados e do Distrito Federal, respectivamente.

Este princípio determina que as atividades de representação judicial e extrajudicial, bem como de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo, devem ser exercidas exclusivamente pelos membros da carreira, organizados em um órgão único.

Aplicação às Procuradorias Municipais

O STF, na ADPF 1037, estendeu a aplicação do princípio da unicidade às Procuradorias Municipais, quando instituídas.

Isso significa que, uma vez criada a Procuradoria Municipal por concurso público, esta deve seguir o modelo constitucional previsto para as outras esferas federativas.

O Ministro Gilmar Mendes, relator do caso, afirmou:

“Pontuo, desde logo, que, uma vez criada a Procuradoria Municipal, esta deve submeter-se ao regramento constitucional pertinente, de modo que a ela se aplica, igualmente, o art. 132 da Constituição Federal. Ou seja, embora não seja obrigatória a sua criação, sendo instituída a Procuradoria Municipal, a observância do regramento constitucional da Advocacia Pública mostra-se imperativa, notadamente a unicidade institucional.”

Implicações práticas

A decisão do STF tem importantes consequências para a organização das Procuradorias Municipais se elas fizerem concurso público:

  1. Exclusividade de funções: apenas os Procuradores Municipais concursados podem exercer as funções de representação judicial e extrajudicial, consultoria e assessoramento jurídico do Município.
  2. Vedação a estruturas paralelas: não se permite a criação de órgãos ou cargos paralelos à Procuradoria Municipal para exercer funções típicas de Advocacia Pública.
  3. Limitação dos cargos em comissão: os cargos em comissão na área jurídica devem se limitar a funções de direção, chefia e assessoramento. Eles não podem usurpar as atribuições dos Procuradores Municipais.

Distinção entre Municípios com e sem Procuradoria via concurso

É importante ressaltar que a decisão do STF mantém a liberdade dos Municípios para decidirem sobre a criação ou não de Procuradorias Municipais.

A aplicação do princípio da unicidade só ocorre quando o Município opta por instituir sua Procuradoria através de concurso público.

Para os Municípios que não possuem Procuradoria própria, permanece a possibilidade de organizar sua representação jurídica de outras formas. Permite-se, inclusive, a contratação de advogados particulares.

Exceções ao Princípio da Unicidade

Embora o STF tenha reafirmado a aplicação do princípio da unicidade às Procuradorias Municipais, é importante destacar que existem exceções a esse princípio, tanto no âmbito estadual quanto no municipal.

Então, com base na jurisprudência do STF e nas informações fornecidas, podemos identificar cinco principais exceções:

  1. Órgãos de consultoria jurídica pré-existentes (Art. 69 do ADCT): é permitido aos Estados e Municípios manterem consultorias jurídicas separadas de suas Procuradorias, desde que esses órgãos já existissem na data da promulgação da Constituição de 1988. Essas consultorias, no entanto, tornam-se carreiras em extinção e só podem desempenhar funções de consultoria jurídica, não de representação judicial.
  2. Poder Legislativo e Tribunal de Contas: é possível a criação de procuradorias vinculadas ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas, para a defesa de sua autonomia e independência perante os demais Poderes.
  3. Poder Judiciário: admite-se a existência de cargos efetivos de advogados no quadro administrativo do Poder Judiciário com finalidade de assessoramento jurídico e função postulatória, quando o objetivo for zelar pela independência funcional e as prerrogativas inerentes ao Poder.
  4. Contratação para causas especiais: é permitida a concessão de mandato ad judicia a advogados para causas especiais, em situações excepcionais.
  5. Universidades estaduais: o STF reconheceu que as universidades estaduais podem criar e organizar procuradorias jurídicas próprias, em razão de sua autonomia didático-científica, administrativa, financeira e patrimonial (art. 207, caput, CF/88).

É importante notar que essas exceções, originalmente desenvolvidas no contexto das Procuradorias Estaduais, são agora aplicáveis, por analogia, às Procuradorias Municipais, conforme a decisão do STF na ADPF 1037.

Implicações para carreiras paralelas existentes

Desse modo, a decisão do STF na ADPF 1037 levanta questões importantes sobre o destino das carreiras jurídicas paralelas já existentes em municípios que possuem Procuradoria Geral. Baseando-se em precedentes relacionados às Procuradorias Estaduais, podemos antecipar algumas possíveis soluções:

  • Modulação de efeitos: o STF pode optar por modular os efeitos de futuras decisões sobre carreiras paralelas municipais. Para isso, seria estabelecido um prazo para que os municípios se adaptem à nova realidade jurídica.
  • Transformação em carreiras em extinção: as carreiras paralelas existentes poderiam se transformar em carreiras em extinção, mantendo apenas funções de consultoria jurídica sob supervisão do Procurador-Geral do Município.
  • Incorporação à PGM: em alguns casos, pode-se considerar a possibilidade de incorporar os ocupantes de cargos paralelos à Procuradoria Geral do Município. Para isso, deve-se atender a certos requisitos de equivalência de atribuições, remuneração e forma de ingresso.
  • Manutenção temporária: o STF pode permitir a manutenção temporária dessas carreiras, estabelecendo um prazo para que os municípios reorganizem sua estrutura jurídica.

Como o tema já caiu em concursos

Ano: 2021 | Banca: FCC | Órgão: MANAUSPREV | Prova: FCC | 2021 - MANAUSPREV Procurador Autárquico

Em meio a estudos para reorganização do exercício da advocacia pública no âmbito de determinado Estado, cogitaram-se diversas ações, pressupondo cenários diametralmente opostos, de modo que algumas se prestariam à maior centralização, outras a uma descentralização dessas atribuições, ou ainda algumas a ampliar a margem de discricionariedade no preenchimento de cargos de chefia, e outras a fortalecer garantias individuais no exercício das funções, como se extrai das medidas a seguir aventadas. Seria compatível com a disciplina da matéria na Constituição Federal e a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal a adoção:

I. Atribuição de competência à Procuradoria-Geral do Estado para controle dos serviços jurídicos de entidades da administração indireta estadual, com possibilidade de avocação de processos administrativos e judiciais de empresas públicas e sociedades de economia mista. (Errado).

II. Criação e organização de procuradoria jurídica própria pela Universidade pública estadual. (Errado).

Conclusão

A decisão do STF na ADPF 1037 representa um marco significativo na organização das Procuradorias Municipais no Brasil, estendendo o princípio da unicidade da Advocacia Pública para a esfera municipal. Esta decisão fortalece a carreira de Procurador Municipal e promove maior segurança jurídica na atuação desses profissionais.

No entanto, a aplicação prática dessa decisão demandará um cuidadoso processo de adaptação por parte dos municípios que possuem estruturas jurídicas paralelas. Será necessário um equilíbrio entre o respeito à nova interpretação constitucional e a garantia de continuidade e eficiência dos serviços jurídicos municipais.

É provável que vejamos, nos próximos anos, uma série de ações judiciais e decisões do STF que irão detalhar e refinar a aplicação do princípio da unicidade no âmbito municipal, possivelmente incluindo modulações de efeitos e estabelecendo diretrizes para a transição das estruturas existentes.

Por fim, é importante ressaltar que esta decisão, ao mesmo tempo que uniformiza o tratamento das Procuradorias Municipais com as Estaduais, mantém a autonomia dos municípios para decidir sobre a criação ou não de suas Procuradorias. Isso permite uma adaptação mais flexível às realidades locais, desde que respeitado o princípio da unicidade onde houver PGM instituída por concurso público.


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