Tema 1086 – Pode símbolos religiosos em espaços públicos? Entre a “laicidade” vs tradição? Entenda o que está em jogo no STF.
Foto: Nelson Jr./SCO/STF

Tema 1086 – Pode símbolos religiosos em espaços públicos? Entre a “laicidade” vs tradição? Entenda o que está em jogo no STF.

Imagine que você entra num órgão público, e você enxerga um crucifixo, ora, fica fácil afirmar que temos no próprio órgão plenário do STF:

símbolos religiosos, stf
Foto: Gustavo Moreno/STF

Veja, a discussão sobre a presença de símbolos religiosos em espaços públicos ganhou nova dimensão quando o Ministério Público Federal ajuizou Ação Civil Pública contra a União Federal, buscando a retirada de crucifixos e demais símbolos religiosos dos prédios públicos federais no Estado de São Paulo.

O caso teve origem em representação formulada por Daniel Sottomaior Pereira junto à Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão. Ele questionou especificamente a presença de um crucifixo no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo.

A controvérsia jurídica transcende a mera discussão sobre ornamentação de espaços públicos, nessa linha foi admitido o tema 1086 de Repercussão Geral do STF.

Em outras palavras, no cerne do debate encontra-se a delimitação do alcance do princípio constitucional da laicidade estatal e sua harmonização com outros valores constitucionalmente protegidos, como a liberdade religiosa e a preservação do patrimônio cultural.

Surgem os questionamentos legítimos:

1) Como equilibrar a preservação de tradições culturais com o respeito à diversidade religiosa e quais os limites para a exposição de símbolos religiosos em espaços públicos?
2) Há como garantir a neutralidade estatal sem negar a dimensão cultural da religiosidade? Isto é, tem como assegurar que a preservação de tradições não resulte em discriminação velada?
3) Como estabelecer critérios objetivos para distinguir manifestações culturais legítimas de violações à laicidade? Ou seja, como interpretar o princípio da laicidade em uma sociedade culturalmente marcada pela religião?

Vamos ao caso concreto.

Em primeira instância, o pedido foi julgado improcedente pela 3ª Vara Federal de São Paulo.

Após recurso do Ministério Público Federal, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região manteve a decisão, gerando relevante precedente sobre os limites da interferência estatal em questões religiosas.

Quais são as teses em confronto?

Vamos explorar o que está em debate após uma análise das petições do processos que está cheio de Amicus Curiae querendo também somar ao presente debate.

Autor da ação – Ministério Público Federal – pela inconstitucionalidade dos símbolos religiosos em espaços públicos

O Ministério Público Federal estruturou sua argumentação de forma robusta, desenvolvendo três vertentes principais:

1) Houve violação ao Estado Laico:

A argumentação central do MPF baseia-se na interpretação do art. 19, I, da Constituição Federal. O dispositivo veda ao Estado “estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança”.

Na visão ministerial, a ostentação de símbolos religiosos em repartições públicas configura não apenas uma preferência estatal por determinada confissão religiosa, mas uma verdadeira institucionalização de símbolos confessionais no espaço público.

Ademais, o Parquet argumenta que a presença destes símbolos, especialmente em locais de destaque, transmite uma mensagem implícita de oficialidade religiosa, incompatível com a neutralidade que deve caracterizar o Estado laico.

Assim, esta situação seria particularmente grave em espaços destinados à prestação de serviços públicos, onde o cidadão deveria encontrar um ambiente neutro e acolhedor para todas as crenças.

2) Houve violação aos princípios administrativos:

No que tange aos princípios administrativos, o MPF desenvolve uma argumentação tríplice:

2.1) Quanto à impessoalidade, sustenta que a identificação do Estado com símbolos de uma religião específica compromete a necessária neutralidade da administração pública, criando uma associação indevida entre função pública e confissão religiosa.

2.2) Em relação à legalidade, argumenta que não existe qualquer amparo legal para a colocação destes símbolos em repartições públicas, lembrando que a administração pública está vinculada ao princípio da legalidade estrita.

2.3) No tocante à moralidade administrativa, defende que a confusão entre esfera pública e religiosa compromete a integridade e lisura que devem caracterizar a atuação estatal.

3) Há ofensa em proteger as minorias:

Um aspecto particularmente relevante da argumentação ministerial refere-se à proteção das minorias religiosas.

O MPF sustenta que a exposição de símbolos religiosos majoritários em espaços públicos configura uma forma de coerção simbólica sobre cidadãos que professam outras religiões ou que não professam nenhuma fé.

símbolos religiosos

Nesse sentido, a situação seria especialmente grave considerando o caráter multicultural e plurirreligioso da sociedade brasileira contemporânea.

Logo, o Ministério Público enfatiza que o Estado deve atuar como garantidor da diversidade religiosa, e não como promotor de uma tradição religiosa específica, ainda que majoritária.

A defesa da União Federal – pela improcedência da ação

A União Federal, por sua vez, apresentou uma defesa no seguinte sentido:

1) Dimensão Cultural:

O argumento central da União baseia-se no reconhecimento dos símbolos religiosos como elementos fundamentais da formação histórica e cultural brasileira.

Em outras palavras, enfatiza que os símbolos religiosos, especialmente o crucifixo, transcenderam sua dimensão meramente confessional para se tornarem expressões de uma herança cultural comum.

Isto é, a União invoca o art. 216 da Constituição Federal, que protege o patrimônio cultural brasileiro, argumentando que a presença destes símbolos em espaços públicos representa uma manifestação cultural que merece proteção constitucional.

Em resumo, a retirada dos símbolos representaria não apenas um empobrecimento cultural, mas uma negação da própria história brasileira.

2) Interpretação adequada do princípio da Laicidade:

A União desenvolve uma interpretação especial do princípio da laicidade estatal, diferenciando um Estado laico de um Estado laicista.

Enquanto o primeiro respeita e convive harmoniosamente com as manifestações religiosas, o segundo adota uma postura de hostilidade à religião.

Argumenta-se que a Constituição brasileira optou pelo modelo de laicidade que não exclui a religião da esfera pública, mas apenas impede o Estado de professar ou privilegiar uma religião específica.

Face ao exposto, a mera presença de símbolos religiosos, nesta perspectiva, não configuraria violação à laicidade, desde que não implique em proselitismo ou discriminação.

3) Ausência de prejuízo concreto:

Ademais, um terceiro pilar da defesa concentra-se na ausência de demonstração de prejuízos concretos decorrentes da presença dos símbolos religiosos. A União argumenta que:

  • A simples presença dos símbolos não interfere na qualidade ou imparcialidade dos serviços públicos prestados;
  • Não há evidências de discriminação ou tratamento diferenciado em função de crenças religiosas;
  • O caráter estático e não proselitista da exposição não configura coerção ou constrangimento.

O que esperar do STF?

Bom, eu vou optar por não defender nenhuma corrente, apenas, acho estranho que o STF tenha um crucifixo no plenário e não tenha tirado se todos acham que isso é inconstitucional.

Fato que, essa tese, cairá nas provas!


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