O Supremo Tribunal Federal mudou completamente de entendimento sobre taxas de segurança em eventos.
Lembre qual era o entendimento tradicional:
É inconstitucional a cobrança de taxa de segurança para eventos, visto que a segurança pública deve ser remunerada por meio de impostos, já que constitui serviço geral e indivisível, devido a todos os cidadãos, independentemente de contraprestação.
STF. Plenário. ADI 2692/DF, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 30/9/2022 (Informativo 1070).
Assim, depois de declarar inconstitucional uma lei similar do Distrito Federal em 2022, a Corte agora validou a cobrança dessa taxa para eventos esportivos e de lazer que vendem ingressos.
Nessa linha, a decisão tem uma repercussão imensa nos concursos.
A diferença entre os dois casos chamou atenção.
Inclusive, em 2022, quando analisou a lei do Distrito Federal, o STF foi unânime em dizer que era inconstitucional cobrar taxa de segurança para eventos.
O entendimento tradicional
A situação já julgada foi a seguinte:
No Distrito Federal, editou-se a Lei distrital nº 1.732/97, regulamentada pelo Decreto nº 19.972/98, que instituiu a taxa de segurança para eventos.
Confira a redação da Lei:
Lei nº 1.732/97:
Art. 1º Fica instituída, no âmbito do Distrito Federal, a taxa de segurança para eventos – TSE.
Art. 2º A taxa de segurança para eventos – TSE – tem como fato gerador a prestação de serviços em eventos de fins lucrativos e promocionais pela Polícia Civil, pela Polícia Militar, pelo Corpo de Bombeiros Militar ou pelo Departamento de Trânsito.
Parágrafo único. Consideram-se de fins lucrativos os eventos para os quais são cobrados ingressos com o objetivo de auferir lucros e promocionais os destinados à publicidade de empresas privadas ou de seus produtos.
Art. 3º A taxa de segurança para eventos – TSE – será paga antecipadamente à efetivação do ato e é devida pelos promotores sob pena de não ser autorizada a realização do evento.
Art. 4º A taxa instituída por esta Lei será calculada em função do local de realização do evento, da capacidade de público e do número de policiais e equipamentos necessários.
Art. 5º Os recursos provenientes da cobrança da taxa de segurança para eventos – TSE – serão destinados exclusivamente à manutenção e à aquisição de equipamentos para a Polícia Civil, para a Polícia Militar, para o Corpo de Bombeiros Militar ou para o Departamento de Trânsito.
Art. 6º O Poder Executivo regulamentará a cobrança da taxa de segurança para eventos no prazo de trinta dias.
Art. 7º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 8º Revogam-se as disposições em contrário.
A previsão dessa taxa é válida?
NÃO.
O fato gerador desse tributo (taxa) é a prestação, em eventos com fins lucrativos e promocionais, de serviços da Polícia Civil, da Polícia Militar, do Corpo de Bombeiros Militar ou do Departamento de Trânsito (art. 2º da Lei distrital nº 1.732/97).
Em palavras mais simples: a lei permite que o Distrito Federal cobre uma taxa a ser paga pelo contribuinte diretamente beneficiado pela segurança garantida em eventos particulares por agentes do Estado. É uma taxa para que as Polícias, os Bombeiros e o DETRAN realizem suas atribuições no local.
Isso não é permitido pela Constituição Federal.
O serviço de segurança pública tem natureza universal e é prestado a toda a coletividade, mesmo na hipótese de o Estado se ver na contingência de fornecer condições específicas de segurança a certo grupo.

Como a sua finalidade é a preservação da ordem pública e da incolumidade pessoal e patrimonial (art. 144 da CF/88), é dever do Estado atuar com os seus próprios recursos, ou seja, sem exigir contraprestação específica dos cidadãos.
Descabe, portanto, condicionar a realização do serviço ao pagamento de taxa, sob pena de admitir-se a existência de espaços de desordem e dano, na hipótese de inadimplemento. Imagine, por exemplo, a realização de um show. Se o promotor do evento não pagasse a taxa, a polícia militar e o DETRAN não iram ao local? Isso não seria algo aceitável.
É dever do Estado agir em qualquer situação na qual haja potencial violação da ordem e da incolumidade, fazendo-o por seus recursos próprios, isto é, sem exigir contraprestação específica dos cidadãos.
As condições objetivas para a consecução das políticas públicas de segurança devem ser criadas pelo Estado ainda que se refiram a pessoas determinadas, sem que se possa exigir contraprestação específica nessas situações.
Nesse contexto, é inviável remunerá-lo mediante taxa, sob pena de violar disposição constitucional expressa que preceitua a possibilidade desse tributo ser cobrado em virtude do exercício do poder de polícia ou da utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição (art. 145, II, da CF/88).
Em suma:
É inconstitucional a cobrança de taxa de segurança para eventos, visto que a segurança pública deve ser remunerada por meio de impostos, já que constitui serviço geral e indivisível, devido a todos os cidadãos, independentemente de contraprestação.
STF. Plenário. ADI 2692/DF, Rel. Min. Nunes Marques, julgado em 30/9/2022 (Informativo 1070).
E agora, o que mudou?
Obs.: no julgamento do Tema 1.282, o STF afirmou que nem todos os serviços desempenhados pelos órgãos de segurança pública são universais (uti universi), ou seja, voltadas indistintamente para toda a coletividade. Há serviços com natureza específica (destinados a um contribuinte ou grupo determinado) e divisível (passíveis de utilização individualizada), o que permite a cobrança de taxas — tributo vinculado e previsto no art. 145, II, da CF.
Tese fixada: São constitucionais as taxas estaduais pela utilização, efetiva ou potencial, dos serviços públicos de prevenção e combate a incêndios, busca, salvamento ou resgate prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição pelos corpos de bombeiros militares.
STF. Plenário. RE 1.417.155/RN, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 26/03/2025 (Repercussão Geral – Tema 1.282) (Informativo 1171).
Assim, o STF reafirmou que “Nem todo serviço oferecido pelos órgãos de segurança pública é indivisível”, argumentou Moraes.
Dessa maneira,existe diferença clara entre o policiamento ostensivo normal, que protege toda a sociedade, e operações específicas montadas para eventos particulares com fins lucrativos.
“A operação logística necessária para garantir a segurança em eventos de grande porte que ostentam finalidade lucrativa não pode ser imputada à sociedade como um todo”, disse o Min. Moraes
Essa separação foi o ponto central da mudança.
Em outras palavras, Moraes mostrou que o precedente de 2022 se aplicava ao policiamento preventivo geral, mas não necessariamente a todas as atividades que órgãos de segurança podem fazer.
Assim como no caso dos Bombeiros, o que se fez foi uma leitura diferente da Constituição, que abriu espaço para cobrar taxa em situações específicas.
A conta que não fecha
Inclusive, Moraes trouxe dados para justificar sua posição.
Citou um estudo sobre a final do campeonato goiano de futebol em 2018, que precisou de 387 policiais trabalhando sete horas, mais 31 viaturas e dezenas de cavalos da polícia montada.
O custo total passou de R$ 60 mil.
“Por que toda a sociedade deveria pagar essa conta?”, questionou o ministro.
Para ele, quando um evento privado gera lucro vendendo ingressos, é justo que os organizadores arquem com os custos extras de segurança que eles mesmos criaram. É diferente de um policiamento comum, que protege a todos independentemente de quem pague.
Essa argumentação econômica convenceu a maioria dos ministros.
A ideia é simples: se alguém organiza um evento para ganhar dinheiro e isso gera custos específicos para o Estado, essa pessoa pode ser cobrada por esses custos extras.
O que muda na prática
A decisão não libera geral para cobrar taxa de segurança.
O STF foi bem específico.
No caso do Paraná, só valeu para eventos esportivos e de lazer que cobram ingresso – exatamente o que está no item 1.1.2 da lei do Paraná.
Todo o resto continua inconstitucional, isto é, não pode uma cobrança “geral”.
Não pode cobrar taxa para segurança de bancos, lojas, empresas ou sistemas de alarme conectados à polícia.
Isso continua sendo policiamento ostensivo normal, que toda a sociedade deve pagar via impostos.
A decisão também protegeu o direito de pedir certidões e atestados de graça, conforme a Constituição garante.
Na prática, significa que estádios de futebol, shows, rodeios, circos e eventos similares que vendem ingresso podem ter que pagar uma taxa pela segurança específica que o Estado oferece.
Mas essa cobrança tem que ser proporcional ao serviço prestado e não pode virar confisco.
Uma mudança com precedentes
Moraes não inventou essa interpretação do nada. Ele lembrou que o próprio STF já tinha validado outras taxas relacionadas à segurança pública.
Por exemplo, a Corte considera constitucional cobrar taxa para reboque de veículos apreendidos, para prevenção de incêndios e para fiscalização de estabelecimentos que vendem armas.
Esses precedentes mostravam que nem toda atividade de órgão de segurança tem o mesmo tratamento.
Quando o serviço é específico, pode ser individualizado e tem um beneficiário identificável, a cobrança de taxa se torna possível.
A novidade foi aplicar essa lógica aos eventos com ingresso.
A tese que ficou estabelecida diz “órgãos de segurança pública podem exercer atividades administrativas específicas e divisíveis, hipótese em que a lei pode instituir a cobrança de taxas”.
Dessa maneira, outros estados que têm leis parecidas agora têm um caminho mais claro.
Podem cobrar taxa para eventos com ingresso, mas precisam respeitar os limites que o STF estabeleceu. Não pode ser qualquer tipo de evento nem qualquer tipo de serviço de segurança.
Como o tema já foi cobrado em concursos
(PGM RECIFE-PE CEBRASPE - 2022) Julgue os seguintes itens em relação à possibilidade de cada uma das taxas mencionadas poder ser instituída pelo município para aumentar a arrecadação de receitas tributárias, conforme a CF e a jurisprudência do STF.
I - taxa a ser cobrada em contrapartida à disponibilização de serviço público de prevenção (errado, penso que poderia estar certo hoje).
(ENAM, FGV, 2024) O Município Alfa instituiu taxa municipal de combate a incêndio, de modo a auxiliar no custeio das atividades da Defesa Civil municipal. Contudo, o Estado Beta, em que estava situado o Município Alfa, também cobrava uma taxa estadual de combate a incêndio, voltada a custear as atividades de seu Corpo de Bombeiros Militar.
Sobre essa situação de cobrança, à luz da jurisprudência dominante do STF sobre o tema, assinale a afirmativa correta.
a)Viola a especificidade e a divisibilidade do serviço público, pressupostos necessários à cobrança de taxas, razão pela qual nenhum dos dois entes poderia fazer a cobrança dessa taxa (certo, hoje, estaria errado).
(Consulplan - 2024 - Prefeitura de Santa Maria de Jetibá - ES - Auditor Fiscal de Tributos Municipais) Com base na jurisprudência dos Tribunais Superiores, assinale a afirmativa correta. A) A atividade de segurança pública pode ser remunerada mediante Taxa de Segurança para Eventos (errado, hoje, estaria certo).
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