AGU pede ao STF que ressarcimento de fraudes no INSS fique fora de regra fiscal
Imagem: Luis Lima Jr./Divulgação

AGU pede ao STF que ressarcimento de fraudes no INSS fique fora de regra fiscal

*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.

Entenda o caso

Na quinta-feira, dia 12/06/25, a Advocacia-Geral da União (AGU) protocolou uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF) com o objetivo de garantir que aposentados e pensionistas prejudicados por descontos fraudulentos em benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) sejam ressarcidos de forma administrativa, sem a necessidade de recorrer ao Judiciário.

O instrumento processual utilizado foi a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1236, e a relatoria é do Ministro Dias Toffoli. Na ação, o Presidente da República requer a suspensão do andamento dos processos judiciais em curso no País e da eficácia das decisões judiciais que tratam da responsabilização da União e do INSS pelos descontos indevidos realizados por meio dos atos fraudulentos de terceiros.

Operação Sem Desconto

A motivação do pedido foi o fato do aumento expressivo da judicialização sobre o tema após a revelação da fraude, praticada por entidades associativas contra o sistema de Previdência Social que teriam desviado mais de R$ 6 bilhões entre 2019 e 2024, afetando milhões de beneficiários. De acordo com a Advocacia-Geral da União, há decisões conflitantes sobre os temas na Justiça, e algumas delas têm imputado à União e ao INSS o pagamento em dobro do valor a ser ressarcido pelos descontos ilegais.

Assim se colhe da petição inicial:

Até a deflagração da Operação "Sem Desconto", o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) mantinha um ambiente relativamente controlado de judicialização relacionado aos descontos associativos, com cerca de 52 mil ações individuais mapeadas, ajuizadas por beneficiários contra entidades associativas e o próprio INSS, nas quais, em geral, se pleiteava a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, além da indenização por eventuais danos morais.

O governo argumenta que essa medida é fundamental para evitar uma sobrecarga do Judiciário — atualmente já existem mais de 4,1 milhões de ações previdenciárias em tramitação — e para impedir que decisões conflitantes prejudiquem a segurança jurídica e a capacidade operacional do INSS.

Na ADPF 1236, alegou-se violação aos seguintes preceitos fundamentais:

  • Dignidade da pessoa humana (art. 1°, III);
  • Contraditório, ampla defesa e devido processo legal substancial (art. 5°: e incisos LIV e LV, da CF);
  • Legalidade e responsabilidade objetiva estatal (art. 37, caput; e § 6°, da CF);
  • Segurança jurídica (art. 5°, XXXVI, da CRB);
  • Segurança orçamentária (art. 167, § 3°) e
  • Integridade das políticas de previdência social (arts. 6°; 7°, XXIV; e 201 da CF).

Ademais, outro ponto central do pedido é a solicitação de autorização para abertura de crédito extraordinário, fora do teto de gastos, permitindo que o governo federal utilize recursos adicionais para ressarcir as vítimas sem comprometer as metas fiscais de 2025 e 2026. A AGU justifica a necessidade desse crédito devido à imprevisibilidade e à gravidade das fraudes, além do elevado interesse social em garantir a rápida devolução dos valores desviados.

Litigância de Massa

INSS

De acordo com o Advogado-Geral da União, o objetivo é evitar a chamada “litigância de massa”, que poderia não só comprometer o orçamento público, mas também colocar em risco a sustentabilidade das políticas previdenciárias.

Segundo a AGU, cerca de 9 milhões de descontos associativos foram implementados nos benefícios do INSS nos últimos cinco anos. Isso evidencia o potencial de aumento no volume de litígios caso não se adote a solução administrativa.

Além disso, a AGU pede que o STF reconheça a inconstitucionalidade de decisões judiciais que determinam o pagamento em dobro dos valores descontados, alegando que essa prática é incompatível com a natureza administrativa do caso e viola o princípio da legalidade. O pedido foi direcionado ao ministro Dias Toffoli, que já é relator de outro processo sobre descontos indevidos no INSS, para evitar decisões conflitantes.

Em síntese, para a AGU, a medida busca proteger os direitos dos segurados, garantir a devolução dos valores de maneira mais ágil e evitar um colapso no sistema de Justiça e na administração da Previdência Social.

Análise Jurídica

No caso apresentado acima, é importante destacarmos algumas nuances jurídicas relevantes para a sua preparação.

ADPF

Primeiramente, destaco a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) prevista no art. 102, parágrafo primeiro da CF/88, ação que compõe o microssistema de controle concentrado de constitucionalidade e é julgada pelo Supremo Tribunal Federal.

A lei nº 9.882/1999 é que rege tal ação constitucional. Dessa forma, os legitimados ativos para a propositura da ADPF são:

  • o Presidente da República;
  • a Mesa do Senado Federal;
  • a Mesa da Câmara dos Deputados;
  • a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
  • o Governador de Estado ou do Distrito Federal;
  • o Procurador-Geral da República;
  • o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
  • partido político com representação no Congresso Nacional e;
  • a confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

A ADPF tem cabimento para evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público, bem como quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição.

A decisão, nesse tipo de ação constitucional, terá eficácia contra todos (erga omnes) e efeito vinculante relativamente aos demais órgãos do Poder Público, além de efeitos retroativos (ex tunc). Aliás, válido ressaltar que cabe pedido de liminar (e houve tal pedido na ADPF em questão).

O Presidente da República e o Advogado Geral da União assinam a peça inicial, e isso a Constituição Federal explica. Assim, nos termos do artigo 131 da Carta Magna,

"a Advocacia-Geral da União (AGU) é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo."

Créditos adicionais

A ADPF trata, entre seus diversos pedidos, da possibilidade de abertura de créditos extraordinários. Eles são os créditos destinados a atender despesas imprevisíveis e urgentes em casos de guerra, comoção interna ou calamidade pública, nos termos do art. 167, parágrafo terceiro, da CF/88, que tem a seguinte redação:

“A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62”.

Existem outros créditos adicionais, sendo sua definição a seguinte: são créditos adicionais as autorizações de despesas não computadas ou insuficientemente dotadas na Lei de Orçamento.

Eles têm previsão na Lei nº 4.230/64, que trata das normas gerais de direito financeiro. Então, são eles: os suplementares (destinados a reforço de dotação orçamentária); os especiais (destinados a despesas para as quais não haja dotação orçamentária específica) e; os que estamos tratando, que são os extraordinários. Esses últimos destinam-se a despesas urgentes e imprevistas, em caso de guerra, comoção intestina ou calamidade pública.

Além disso, a AGU defende que embora não previsto expressamente no corpo da legislação fiscal, o elemento de imprevisibilidade avaliado na ocasião autorizaria a inclusão do pagamento do passivo de precatórios entre as excepcionalidades do art. 3°, § 2°, da Lei Complementar 200/23, afastando-se as consequências da discrepância entre despesas e receitas quando da satisfação dos referidos créditos, excluindo as despesas para o ressarcimento do teto de gasto previsto na LC 200/2023.


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