STJ muda o jogo: renúncia à prescrição reabre prazo integral de 5 anos contra a Fazenda. Entenda por que isso importa nos concursos públicos jurídicos.
* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

Decisão do STJ – Renúncia à prescrição pela Fazenda Pública
O Superior Tribunal de Justiça decidiu, no julgamento dos EDcl no AgInt no REsp nº 2.023.087, que o reconhecimento administrativo do direito, após decorrido por inteiro o prazo prescricional, implica renúncia à prescrição, reiniciando-se a contagem do prazo prescricional em sua integralidade em desfavor da administração, e não pela metade.
Portanto, segundo entendimento do STJ, prevalece o artigo 191 do código civil, que prevê que a renúncia da prescrição pode ser expressa ou tácita, e só valerá, sendo feita, sem prejuízo de terceiro, depois que a prescrição se consumar (renúncia tácita é quando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com a prescrição), e não o artigo 9º, do Decreto nº 20.910/32, que trata da prescrição em face da Fazenda Pública, prevendo que a prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.
A Corte de origem entendeu, no caso concreto, que houve renúncia à prescrição no que diz respeito a créditos já consumados pelo prazo prescricional, assim como houve interrupção do prazo prescricional no que diz respeito a créditos ainda não atingidos pelo fato extintivo, atribuindo a ambos os institutos os mesmos efeitos: retomando-se a contagem prescritiva pela metade tanto na renúncia, quanto na interrupção do lustro, nos termos do artigo 9º do Decreto n. 20.910/1932.
O STJ, não concordou com esse entendimento. Vejamos.
- Artigo 9º, do Decreto nº 20.910/32 (A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo) 🡪 Esse dispositivo aplica-se apenas para casos de interrupção da prescrição, ou seja, hipótese na qual o prazo prescricional ainda está em curso, e algum ato interrompe sua contagem.
- Artigo 191, código civil (Renúncia da prescrição após sua consumação) 🡪 O reconhecimento do direito pela Administração Pública, após a consumação da prescrição, reabre integralmente o prazo quinquenal de prescrição, ou seja, 5 anos, e não 2 anos e meio.
A renúncia à prescrição pela Administração Pública se caracteriza quando há ato formal ou conduta inequívoca de reconhecimento de um direito que já estava fulminado pela prescrição.
A prescrição pode ser conceituada como a extinção de uma pretensão (a possibilidade de exigir judicialmente um direito) pelo decurso do tempo. Ela não se confunde com a decadência, que é a extinção do próprio direito.
A prescrição não extingue o direito em si, mas sim a possibilidade de buscar judicialmente sua satisfação.
A existência da prescrição deita raízes nos seguintes fundamentos:
- Segurança jurídica: a prescrição, ao estabelecer prazos para o exercício de direitos, garante a segurança jurídica ao evitar que situações jurídicas permaneçam indefinidas por tempo indeterminado. Essa estabilidade é fundamental para a previsibilidade das relações sociais e econômicas, permitindo que as pessoas ajam com base na expectativa de que as consequências de seus atos e fatos sejam conhecidas e respeitadas.
- Prevenção da eternização de conflitos: a prescrição evita que processos judiciais se prolonguem indefinidamente, permitindo que as partes envolvidas tenham seus conflitos resolvidos dentro de um prazo razoável.
- Estímulo à atuação tempestiva: ao fixar prazos para o exercício de direitos, a prescrição incentiva as pessoas a agirem com celeridade e a buscarem a resolução de seus problemas de forma mais rápida.
- Proteção contra a perda de provas: com o passar do tempo, a produção de provas se torna cada vez mais difícil, e pode haver perda de documentos, testemunhos e outras evidências importantes para a defesa de um direito.
- Consolidação de situações de fato: a prescrição pode consolidar, em alguns casos, situações de fato que se estabeleceram ao longo do tempo, mesmo que tenham se originado de um ato ilícito (teoria do fato consumado).

Teoria do Fato Consumado
Teoria que reconhece a estabilidade de situações fáticas consolidadas pelo tempo, mesmo que tenham se originado de atos irregulares ou ilegais, em prestígio aos princípios da segurança jurídica e da estabilidade social.
O principal diploma que regula a prescrição contra a Fazenda Pública é o Decreto nº 20.910/1932, que dispõe que as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem.
O Superior Tribunal de Justiça, julgando o TEMA 1.109, decidiu que
TEMA 1.109: “Não ocorre renúncia tácita à prescrição (art. 191 do Código Civil), a ensejar o pagamento retroativo de parcelas anteriores à mudança de orientação jurídica, quando a Administração Pública, inexistindo lei que, no caso concreto, autorize a mencionada retroação, reconhece administrativamente o direito pleiteado pelo interessado”.
O STJ, portanto, entendeu que é necessária lei autorizando a retroação. Ou seja, a edição de prévia lei autorizativa é condição necessária para a renúncia à prescrição que venha a importar na produção de efeitos retroativos que extrapolem a legislação ordinária de regência.
ATENÇÃO: Mas não podemos confundir o entendimento do STJ no TEMA 1.109 com o presente caso. São hipóteses distintas.
O TEMA 1.109 trata da possibilidade de renúncia tácita à prescrição pela Administração Pública (que precisa de lei prévia autorizativa), enquanto o caso ora analisado versa sobre a forma de contagem do novo prazo prescricional após a renúncia: se deve ser contado pela metade (2 anos e meio) ou se deve ser contado integralmente (5 anos). Vimos que deve ser contado integralmente.
Ótimo tema para provas envolvendo a Fazenda Pública em juízo. Portanto, muita atenção.
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