Queda de braço: STF x Congresso Nacional
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Queda de braço: STF x Congresso Nacional

Sou o professor Marcos Gomes, Defensor Público do Estado de São Paulo, Coordenador da Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto e Especialista em Direito Público.

Trouxe abaixo uma análise para reflexão sobre o tema: Queda de braço: STF x Congresso Nacional.

Nos últimos anos, o Poder Judiciário ganhou maior notoriedade. O Supremo Tribunal Federal subiu ao palco central, estando no centro de inúmeras decisões extremamente polêmicas na sociedade brasileira.

O maior protagonismo do Poder Judiciário, seja por meio do controle de políticas públicas, seja por meio do controle de constitucionalidade, não deve ser confundido com o denominado “ativismo judicial”, que está relacionado ao exagero na intervenção do Poder Judiciário, podendo até mesmo violar o princípio da separação dos poderes. Umas das possíveis reações contra esse ativismo judicial é justamente o “efeito backlash”.

Mas o que vem a ser o denominado efeito backlash? Trata-se de uma forte reação da sociedade ou de algum dos Poderes à algum ato do Poder Público – seja uma decisão judicial, ato administrativo ou lei emanada do legislativo[1]. Em questões polêmicas decididas pelo Poder Judiciário, trata-se de uma intensa rejeição pública ou de algum dos Poderes a uma decisão judicial. Apenas de forma exemplificativa, podemos citar o caso envolvendo a vaquejada e, mais recentemente, o marco temporal e o aborto.

Na ADI 4983, a Suprema Corte proibiu a vaquejada, tendo em vista a crueldade manifesta contra os animais. Em reação a decisão do Poder Judiciário, o Congresso Nacional aprovou alteração constitucional por meio da EC n. 96/2017, que acrescentou o parágrafo 7º ao art. 225, CF, aduzindo que “não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais (…)”.  

No ponto, importante destacar que as ações de controle abstrato perante o Supremo Tribunal Federal possuem eficácia erga omnes e efeito vinculante. Em que pese atingirem os particulares e o Poder Público, não vincula o Poder Legislativo em sua função precípua de legislar.   

Em caso extremamente polêmico, o Supremo Tribunal Federal condenou um deputado federal, dentre outros crimes, por estimular atos antidemocráticos. Ato contínuo, no dia seguinte, o Presidente da República anunciou a concessão de graça (art. 84, XII, CF) ao referido deputado, o que demonstra evidente reação do Poder Executivo em relação à atos do Judiciário.

Recentemente, o STF se debruçou sobre inúmeros casos polêmicos, a exemplo da descriminalização das drogas, aborto e marco temporal. Por um lado, muitos ministros da Suprema Corte entendem que a Suprema Corte é obrigada a enfrentar qualquer tema jurídico quando provocado, não podendo ficar anestesiada diante de lesão ou ameaça de direitos – seja de grupos majoritários ou minoritários. Por outro lado, muitos juristas e políticos enxergam um exagero nas decisões do Poder Judiciário, que estaria invadindo o espaço democrático de diálogo dos representantes do povo eleitos no Congresso Nacional.

De fato, há muito, nota-se uma dificuldade no diálogo institucional entre os Poderes da República, notadamente diante de pautas e temas sensíveis. Não por outro motivo, recentemente, o Senado Federal, em resposta ao julgamento do marco temporal pelo Poder Judiciário, aprovou urgência ao projeto de lei sobre o tema e pretende aprová-lo com a maior agilidade possível. Como se não bastasse, alguns congressistas já estão falando no trancamento da pauta legislativa em virtude da usurpação de competências do Poder Legislativo pelo Supremo Tribunal Federal.

A questão que se levante é a seguinte: o Judiciário deve se atentar ao possível efeito backlash para proferir suas decisões ou deve apenas decidir de acordo com suas convicções, pouco se importando com eventuais fortes reações? De fato, o papel contramajoritário da Corte Suprema, em um Estado de opção democrática, é extremamente importante, uma vez que a democracia significa não só o respeito da vontade da maioria, mas também a garantia dos direitos fundamentais da minoria. Porém, em uma época de um constitucionalismo democrático e de uma sociedade aberta dos intérpretes, o STF deve ouvir a população, notadamente em temas que podem influir sobremaneira na vida da sociedade.

O efeito backlash, que fique claro, é apenas um dos elementos interpretativos a ser eventualmente levado em consideração no momento da decisão, evitando-se o denominado conflito desnecessário e o tumulto social. Porém, é certo que o Judiciário, nem mesmo qualquer função essencial à justiça, não deve sofrer pressões indevidas na sua atividade fim, devendo possuir liberdade para atuar na defesa da força normativa da Constituição, notadamente na defesa dos direitos fundamentais das minorias.

Um tema extremamente sensível envolvendo o efeito backlash refere-se aos atos de 07 de setembro (2022). Apoiadores de um Presidente da República se reúnem na Avenida Paulista e em diversos outros locais do território nacional, durante o feriado de independência do Brasil, para se manifestar, preponderantemente, contra atos do Supremo Tribunal Federal. Em apertada síntese, manifestantes se reúnem em prol do direito à liberdade, pelo voto auditável, contra o ativismo judicial exagerado, prisões arbitrárias e inquéritos ilegais conduzidos pelo Supremo Tribunal Federal. Concordando ou não com os atos, independentemente de ideologia, trata-se de um efeito backlash que possui como protagonistas parte da população e o Poder Executivo contra atos do Poder Judiciário.

E o que se espera sobre o tema? A divergência de posicionamentos e o debate de ideias é salutar em um Estado de opção democrática. Entrementes, é imprescindível o diálogo institucional entre os Poderes e, principalmente, a sociedade deve participar das decisões políticas e jurídicas. Diante do denominado constitucionalismo democrático e de uma sociedade aberta dos intérpretes, o STF deve ouvir os jurisdicionados, notadamente em temas que podem influir sobremaneira na vida da sociedade.

O Constitucionalismo Democrático tem fundamento no pluralismo e na participação popular. A ideia principal seria a maior participação e legitimação do povo nas instituições e nas decisões do Poder Judiciário, o qual deverá estar antenado aos anseios sociais.


[1] Nesse sentido MARTINS, Flávio. Curso de Direito Constitucional. 3ª Edição. São Paulo: Saraiva Educação, 2019, p. 74.

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