Olá, pessoal, tudo certo?!
Em 10/03/2024, foi aplicada a prova objetiva do concurso público para o Ministério Público do estado do Rio de Janeiro. Assim que divulgados o caderno de provas e o gabarito preliminar oficial, nosso time de professores analisou cada uma das questões que agora serão apresentadas em nossa PROVA COMENTADA.
Este material visa a auxiliá-los na aferição das notas, elaboração de eventuais recursos, verificação das chances de avanço para fase discursiva, bem como na revisão do conteúdo cobrado no certame.
Desde já, destacamos que nosso time de professores identificou 1 questão passível de recurso e/ou que deve ser anulada, por apresentarem duas ou nenhuma alternativa correta, como veremos adiante. No tipo de prova comentado, trata-se da questão 9.
De modo complementar, elaboramos também o RANKING do MP-RJ, em que nossos alunos e seguidores poderão inserir suas respostas à prova, e, ao final, aferir sua nota, de acordo com o gabarito elaborado por nossos professores. Através do ranking, também poderemos estimar a nota de corte da 1º fase. Essa ferramenta é gratuita e, para participar, basta clicar no link abaixo:
Além disso, montamos um caderno para nossos seguidores, alunos ou não, verem os comentários e comentar as questões da prova: confira AQUI!
Por fim, comentaremos a prova, as questões mais polêmicas, as possibilidades de recurso, bem como a estimativa da nota de corte no TERMÔMETRO PÓS-PROVA, no nosso canal do Youtube. Inscreva-se e ative as notificações! Estratégia Carreira Jurídica – YouTube
Confira AQUI os comentários de todas as disciplinas deste certame!
Prova Comentada Direito Processual Penal
QUESTÃO 13. Sobre o foro por prerrogativa de função, é correto afirmar que:
a) o foro por prerrogativa de função se estende a magistrado aposentado.
b) a competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente por Constituição Estadual.
c) compete ao Supremo Tribunal Federal o processamento e julgamento de parlamentar federal por crime comum, praticado quando já diplomado, ainda que não relacionado à função.
d) a instauração de inquérito policial e demais atos investigativos, inclusive os promovidos pelo Ministério Público, em face de agentes detentores de foro por prerrogativa da função, necessita de prévia autorização do órgão judiciário competente para processar e julgar a ação originária.
e) compete ao Superior Tribunal de Justiça o processamento e julgamento de desembargador, por crime comum, desde que relacionado à função judicante.
Comentários
A alternativa correta é a letra B. A questão trata sobre competência processual penal.
A alternativa A está incorreta. O STJ entende que a superveniente aposentadoria da autoridade detentora do foro por prerrogativa de função cessa a competência do Superior Tribunal de Justiça para o processamento e julgamento do feito, mesmo que o fato delituoso tenha ocorrido quando o agente ainda era detentor de prerrogativa de foro.
A alternativa B está correta. A súmula vinculante nº 45 preconiza que a competência constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecido exclusivamente por Constituição Estadual.
A alternativa C está incorreta. O foro por prerrogativa de função aplica-se apenas aos crimes cometidos durante o exercício do cargo e relacionados às funções desempenhadas, conforme entendimento pacificado do STF (AP 937).
A alternativa D está incorreta. Sobre a necessidade de prévia autorização para instauração de atos de investigação, como regra geral, a jurisprudência não exige a atuação da Corte responsável pelo julgamento: “3. Diferentemente das autoridades sujeitas ao regime de prerrogativa de foro nesta Suprema Corte, onde há norma regimental expressa a condicionar a instauração do inquérito à determinação/autorização do Ministro Relator (artigo 21, XV, do RISTF), não existe disciplina normativa equivalente com relação aos Prefeitos Municipais (artigo 29, X, da CF), que se sujeitam, quanto à instauração do inquérito, às normas comuns do CPP. Por outro lado, os inquéritos instaurados contra Prefeitos submetem-se à supervisão judicial, sob a consequência de invalidade dos atos investigativos colhidos contra o detentor da prerrogativa. (…) Já quanto aos Prefeitos, a norma do artigo 29, X, da CF, garante apenas o “julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça”, e nada dispõe a respeito de autorização/determinação judicial para o início das investigações. Submetem-se os Prefeitos Municipais, desse modo, quanto à instauração do inquérito, às normas ordinárias do CPP, aplicável à generalidade dos cidadãos, as quais não exigem autorização jurisdicional para a mera abertura de investigações preliminares. (…) 26.1. Em outros termos, é desnecessária autorização judicial para o início das investigações, porém, é imprescindível que o inquérito tramite sob supervisão judicial – registrado e distribuído no Tribunal competente para o julgamento do titular da prerrogativa de foro -, sob a consequência de invalidade dos elementos probatórios colhidos contra o detentor da prerrogativa. (STF, AP 912/PB, 1ª T, J. 07/03/2017)”;
“2. A jurisprudência tanto do Pretório Excelso quanto deste Sodalício é assente no sentido da desnecessidade de prévia autorização do Judiciário para a instauração de inquérito ou procedimento investigatório criminal contra agente com foro por prerrogativa de função, dada a inexistência de norma constitucional ou infraconstitucional nesse sentido, conclusão que revela a observância ao sistema acusatório adotado pelo Brasil, que prima pela distribuição das funções de acusar, defender e julgar a órgãos distintos. 3. O Superior Tribunal de Justiça assentou o entendimento de que o mero indiciamento em inquérito policial, desde que não seja abusivo e ocorra antes do recebimento da exordial acusatória, não constitui manifesto constrangimento ilegal a ser sanável na via estreita do writ. (STJ, AgRg no HC 404228 / RJ, 5ª T, 01/03/2018)”.
Destaca-se que, quando a prerrogativa de foro é do próprio STF há necessidade desta autorização: “5. A Polícia Federal não está autorizada a abrir de ofício inquérito policial para apurar a conduta de parlamentares federais ou do próprio Presidente da República (no caso do STF). No exercício de competência penal originária do STF (CF, art. 102, I, “b” c/c Lei nº 8.038/1990, art. 2º e RI/STF, arts. 230 a 234), a atividade de supervisão judicial deve ser constitucionalmente desempenhada durante toda a tramitação das investigações desde a abertura dos procedimentos investigatórios até o eventual oferecimento, ou não, de denúncia pelo dominus litis. 6. Questão de ordem resolvida no sentido de anular o ato formal de indiciamento promovido pela autoridade policial em face do parlamentar investigado. (STF, Inq. 2.411QO/MT, Pleno, J. 10/10/2007)”
A alternativa E está incorreta. O STJ entende que o crime cometido por desembargador, mesmo que não esteja relacionado com suas funções, deverá ser julgado pelo STJ se a remessa para a 1ª instância significar que o réu seria julgado por um juiz de 1º grau vinculado ao mesmo tribunal que o desembargador (APn 878-DF).
QUESTÃO 15. Sônia sempre manteve uma vida correta. Contudo, em virtude da perda do emprego, no período da crise sanitária de covid-19, se viu em uma situação econômica bastante delicada, razão pela qual decidiu se aventurar e adquirir, para revenda, milhares de cigarros estrangeiros, sem registro na ANVISA, para seu azar, quando estava voltando do Paraguai, já no Brasil, é instada a parar em uma Blitz da Polícia Militar do Estado do Paraná. Desesperada, com medo de ser presa, não atende à ordem, arrancando para cima da polícia, atropelando e matando um deles. Embora presa em flagrante delito, é solta, na audiência de custódia, sendo-lhe concedida liberdade provisória, com condições. Pelos fatos acima, é acusada da prática de homicídio duplamente qualificado (art. 121, § 2o, incisos V e VII, CP), além de contrabando (334-a, II, CP) e resistência, perante o Tribunal do Júri, na esfera federal. Ao final da primeira fase do procedimento, é pronunciada pelos três crimes. Perante o Plenário, é absolvida pelo Júri, com base na negativa ao quesito da autoria (2º quesito), sendo os demais delitos, contudo, diante da absolvição do crime doloso contra a- vida, analisados e julgados pelo Juiz Presidente, que condenou a ré à pena de 2 meses, pela resistência, além de 2 anos, pelo contrabando. A acusação recorre apenas sob a alegação de que a absolvição foi manifestamente contrária à prova dos autos. A defesa, por seu turno, apela das condenações, alegando que o Júri popular deveria apreciar também os demais crimes, e não o Juiz Presidente. O tribunal deu provimento a ambos os apelos, anulando tudo. Em novo julgamento, a acusada é condenada pelos três crimes, no Júri popular, sendo aplicadas as penas de 13 anos e 10 meses, pelo homicídio duplamente qualificado, além de 3 anos, pelo contrabando, e de 4 meses, pela resistência, tendo a sua prisão sido decretada, no ato, por força da condenação final à pena igual ou superior a 15 anos.
Acerca do caso, assinale a alternativa correta.
a) Ainda que tenha havido novo julgamento, as penas anteriormente fixadas para os crimes de resistência e contrabando, considerando a inexistência de recurso ministerial para majorá-las, não poderiam ter sido exasperadas, sob pena de reformatio in pejus indireta.
b) Ainda que a absolvição, pela negativa da autoria, fosse manifestamente contrária à prova dos autos, incabível o recurso para anular o julgamento, dada a soberania dos veredictos e a decisão mais favorável ao réu, conforme julgados do Supremo Tribunal Federal, que, inclusive, reconheceu a repercussão geral da matéria.
c) Dada a inexistência de interesse da União, sendo o homicídio praticado contra um policial militar da esfera estadual, bem como a falta de conexão entre os crimes, a competência para apurar o crime doloso contra a vida, além da resistência, deveria tramitar no Tribunal do Júri, na esfera estadual, havendo desmembramento quanto ao contrabando, cuja apuração deve tramitar perante a Justiça Federal.
d) Havendo absolvição do crime doloso contra a vida, a competência dos jurados cessa para julgar os demais crimes, sendo a anulação do julgamento equivocada.
e) A decretação da prisão imediata não observou a lei infraconstitucional, pois a condenação, para fins de execução, apenas leva em consideração a condenação pelo crime doloso contra a vida, que foi inferior.
Comentários
A alternativa correta é a letra A. A questão trata sobre competência do tribunal do júri.
A alternativa A está correta. O artigo 617 traz a proibição da reforma da decisão em prejuízo do réu recorrente, quando ausente recurso da acusação, tal dispositivo enuncia o princípio basilar recursal da “non reformatio in pejus”, o qual traz garantias mínimas para o acusado recorrente.
Proíbe-se, também e como consectário lógico, a reformatio in pejus indireta, impedindo que, nos casos em que a decisão impugnada pelo acusado seja anulada pelo tribunal, a nova decisão venha a ser mais gravosa aos interesses da defesa. Nestes casos, a primeira sentença gera um efeito prodrômico em relação à segunda, visto que, no segundo julgamento, o órgão julgador tem como patamar máximo a pena imposta na primeira sentença. Sendo assim, a alternativa está correta.
A alternativa B está incorreta. A garantia constitucional da soberania dos veredictos do júri (art. 5º, XXXVIII, c, da CF) tem como reflexo a imutabilidade relativa da decisão tomada pelos jurados, pois somente aos juízes leigos é dado deliberar sobre a procedência ou improcedência da pretensão punitiva estatal. O postulado constitucional é temperado, todavia, pela possibilidade de interposição de apelação contra a decisão do júri, na hipótese de o veredicto revelar-se manifestamente contrário à prova dos autos (art. 593, III, d, do CPP).
A alternativa C está incorreta. O CPP dispõe, no seu art. 78, I, que o júri exerce força atrativa para julgar os crimes conexos e continentes, salvo se militares ou eleitorais. Dessa forma, os crimes federais conexos com crimes dolosos contra a vida de competência estadual serão julgados pelo Tribunal do Júri.
A alternativa D está incorreta. Se os jurados absolveram o acusado do crime principal doloso contra vida, afere-se que reconheceram sua competência para julgamento, logo sobre eles também recairá a competência de julgar o crime conexo.
A alternativa E está incorreta. A Lei nº 13.964/19 (Pacote Anticrime) promoveu alterações ao artigo 492 e seus parágrafos, tratando da sentença no Tribunal do Júri. Destarte, conferiu nova redação à alínea “e”, do inciso I, do artigo 492 do CPP, prevendo que, em caso de condenação pelo Tribunal do Júri, quando for aplicada pena igual ou superior a 15 (quinze) anos de reclusão, a regra será a execução provisória das penas, com expedição do mandado de prisão, se for o caso, sem prejuízo do conhecimento de recursos que vierem a ser interpostos. O dispositivo legal em análise menciona “execução provisória das penas” no plural e não no singular. Isso porque pode haver concurso de crimes dolosos contra a vida e delitos conexos que também serão julgados pelo Tribunal do Júri. Desse modo, se a soma das penas do crime comum com aquele da competência do Tribunal do Júri ou a pena aplicada ao crime doloso contra a vida for igual ou superior a 15 anos de reclusão, a regra será a execução provisória da pena.
QUESTÃO 16. Semprônia mulher trans, mantém um relacionamento amoroso com Caio, homem cis, há alguns anos. Recentemente, em virtude da perda do emprego, Caio, devido a quadro depressivo, passou a se dar ao hábito de beber além do razoável, tomando-se uma pessoa mais agressiva e violenta. Diante disso, Semprônia resolve encerrar o relacionamento, sendo que, desde então, Caio passa a ameaçá-la, dizendo que, se eles não reatassem, iria dar cabo de sua vida e depois da sua própria. Diante disso, temerosa de que a situação pudesse se concretizar, comparece perante o Juizado da Vara de violência doméstica e familiar contra a mulher, na sua região, e subscreve, de próprio punho, uma breve exposição dos fatos, fazendo pedido para que a Justiça a proteja, sendo que, diante disso, o juiz, com base nas suas declarações, concede as medidas protetivas de urgência, consistentes na proibição de aproximação da ofendida, bem como de contato com ela, fixando o prazo de 180 dias para reavaliação da situação. Após a concessão das medidas protetivas, Semprônia registra boletim de ocorrência e representa pelos fatos, sendo então instaurado o inquérito policial, levando ao oferecimento de denúncia pelo crime de ameaça (art. 147, caput, CP). Antes de proceder à análise do juízo de admissibilidade da inicial, o juiz, a pedido do acusado, designa audiência virtual, para que a vítima confirme, ou não, a sua representação. Em referida audiência, a vítima manifesta o desejo de desistir da apuração, mediante renúncia, requerendo, contudo, a manutenção das medidas protetivas, sendo ambos os pedidos acatados pelo juiz. No que concerne ao exemplo hipotético trazido, assinale a alternativa correta.
a) Embora a Lei no 11.340/2006 não imponha um limite temporal máximo para vigência das medidas protetivas, deve-se observar o prazo mínimo de 90 dias, para reavaliação, conforme sistemática das medidas cautelares penais, sob pena de revogação imediata.
b) Embora possível a designação de audiência com a finalidade específica quanto à verificação da renúncia da representação, tal ato só pode ocorrer mediante pedido da ofendida e não da outra parte.
c) Uma vez encerrada a investigação criminal, por arquivamento, sem oferecimento de acusação, ou extinta a punibilidade do ofensor, as eventuais medidas protetivas concedidas deverão ser extintas, por falta de cautelaridade, independentemente da oitiva da vítima.
d) As medidas protetivas de urgência podem ser concedidas independentemente da tipificação do fato, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial, embora fosse necessário o registro anterior de boletim de ocorrência.
e) A ofendida, por se tratar de pessoa trans, não faria jus às medidas protetivas de urgência previstas na lei de violência doméstica e familiar contra a mulher, dado que a legislação leva em consideração apenas o sexo biológico, e não o gênero, da vítima.
Comentários
A alternativa correta é a letra B. A questão trata sobre a lei 11.340/2006.
A alternativa A está incorreta. A redação originária da Lei Maria da Penha não previu prazo de duração para as medidas protetivas de urgência deferidas em favor da vítima de violência doméstica. Nada obstante, a Lei 14.550/2023, que acrescentou o § 6º ao art. 19 daquela norma especial, preconizou a vigência “enquanto persistir risco à integridade física, psicológica, sexual, patrimonial ou moral da ofendida e de seus dependentes”. Desse modo, cabe ao juiz analisar as particularidades de cada caso a fim de manter tais medidas por um período adequado e suficiente a garantir a proteção da mulher.
A alternativa B está correta. O STF realizou interpretação conforme a CF desse dispositivo e concluiu que apenas a vítima pode requerer a audiência prevista no art. 16 para a renúncia de sua representação, sendo vedado ao poder judiciário designá-la de ofício ou a requerimento de outra parte (ADI 7267).
A alternativa C está incorreta. A Terceira Seção do STJ decidiu que, independentemente da extinção da punibilidade do autor, a mulher em situação de violência deve ser ouvida acerca da necessidade da manutenção de medidas protetivas de urgência, antes de sua cessação (REsp 1.775.341).
A alternativa D está incorreta. Conforme o art. 18, §5º, do CP, as medidas protetivas de urgência serão concedidas independentemente da tipificação penal da violência, do ajuizamento de ação penal ou cível, da existência de inquérito policial ou do registro de boletim de ocorrência.
A alternativa E está incorreta. A Sexta Turma do STJ estabeleceu que a Lei 11.340/2006 também deve ser aplicada aos casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgênero.
QUESTÃO 17. Quanto à conduta que o magistrado deve adotar, em prol do devido processo legal e da regularidade formal do procedimento, assinale a alternativa correta.
a) Uma vez ofertada denúncia, havendo alegação defensiva de recusa injustificada de proposta de acordo de não persecução penal, por parte do promotor de justiça, o magistrado, verificando sua plausibilidade, deverá ofertar o benefício, garantindo a fruição deste direito pelo imputado.
b) Tratando-se de ação penal por de crime de estelionato, por fatos ocorridos antes da Lei no 13.964/2019, quando não se exigia representação, por denúncia formulada após a entrada em vigor, o juiz, verificando a ausência de manifestação inequívoca da vítima quanto ao interesse na persecução, deve intimá-la, para que, no prazo de 30 dias, represente, para prosseguimento.
c) Uma vez ofertada denúncia, havendo alegação defensiva de recusa injustificada de proposta de acordo de não persecução penal, por parte do promotor de justiça, o magistrado, verificando sua plausibilidade, deverá rejeitar a acusação, com base na falta de interesse processual.
d) Constatada ofensa de correlação entre acusação e sentença, o tribunal, de ofício, em recurso exclusivo da defesa, deverá anular a condenação, a fim de que a acusação possa emendar a inicial, para que outra sentença seja proferida.
e) Uma vez constatada a inépcia da inicial, em vez de rejeitar, de plano, a acusação, o juiz deve encaminhar o feito, para emenda do órgão acusador.
Comentários
A alternativa correta é a letra B. A questão trata sobre o devido processo legal.
A alternativa A está incorreta. O STF entende que “não cabe ao Poder Judiciário, que não detém atribuição para participar de negociações na seara investigatória, impor ao MP a celebração de acordos.” (HC 194677/SP, veiculado no informativo 1017). Neste sentido, quando o magistrado não concorda com o não oferecimento do ANPP, este deve utilizar o artigo 28-A,§14, o qual estabelece a remessa dos autos ao órgão superior, nos termos do artigo 28 do CPP.
A alternativa B está correta. O STF entende que há retroatividade da lei penal no que tange a necessidade de representação no delito de estelionato, visto que tal norma tem natureza híbrida, pois trata de tema processual penal, mas também afeta o poder de punir estatal. Sendo assim, “a aplicação da nova norma deve ocorrer nos processos em andamento ,mesmo após o oferecimento da denúncia, mas desde que antes do trânsito em julgado” HC 208.817/RJ.
O prazo de 30 dias para oferecer a representação foi extraído do artigo 91 da lei 9.099/95: “quando não houver inequívoca manifestação de vontade da vítima no sentido do interesse na persecução criminal, cumpre intimar a pessoa ofendida para oferecer representação, nos moldes do previsto no art. 91 da Lei 9.099/95, aplicado por analogia”. (HC 180.421AgR/SP).
A alternativa C está incorreta. Conforme comentários da alternativa A.
A alternativa D está incorreta. Conforme entendimento do STJ, quando o Tribunal, em recurso exclusivo da defesa, reconhece ofensa ao princípio da correlação, deverá anular a sentença e absolver o réu e não determinar o retorno dos autos para o juízo a quo: “Reconhecido, em recurso exclusivo da defesa, que a sentença condenou o réu por fatos que não estavam descritos na denúncia, cabe ao Tribunal somente anular a sentença e absolver o réu, mas não determinar o retorno dos autos ao primeiro grau. (AgRg no HC 559.214/SP)
A alternativa E está incorreta. Diferentemente do que é afirmado pela alternativa, o juízo não deve determinar o retorno dos autos ao MP, mas sim rejeitar a acusação: “Resulta forçoso concluir que a necessária consequência do reconhecimento da inépcia de denúncia, ante a ausência de individualização da conduta do paciente, deve ser a rejeição da peça acusatória, impondo-se o trancamento da ação penal, ainda que possibilitando ao órgão acusatório, a proposição de nova inicial. Ordem concedida, em consonância com o parecer ministerial, para, reconhecida a inépcia da denúncia, determinar o trancamento da Ação Penal n. 0009215-17.2015.8.03.0001, em trâmite perante o Tribunal de Justiça do Estado do Amapá, sem prejuízo de que o Ministério Público ofereça nova denúncia contra o paciente, se preenchidos os requisitos mínimos do art. 41 do CPP e observados os prazos prescricionais aplicáveis.” (HC 347.748/AP).
QUESTÃO 18. Acerca do julgamento quanto à constitucionalidade do juiz de garantias, implementado pela Lei no 13.964/2019, no Supremo Tribunal Federal, e da interpretação conferida pela Suprema Corte à lei e de sua repercussão no processo, assinale a alternativa correta.
a) O juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão.
b) O juiz de garantias não se aplica aos processos de competência originária dos tribunais, processos de competência do tribunal do júri, aos casos de violência doméstica e familiar e aos casos de menor potencial ofensivo.
c) Após o recebimento da denúncia ou queixa, o juiz da instrução e julgamento deverá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de quinze dias.
d) Ordenado o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público comunicará a vítima, o investigado e a autoridade policial, não podendo o magistrado submeter o arquivamento à revisão da instância competente do órgão ministerial.
e) O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências do juiz de garantias ficará impedido de funcionar no processo.
Comentários
A alternativa correta é a letra B. A questão trata sobre juiz de garantias.
A alternativa A está incorreta. A alternativa traz a literalidade do artigo 157, §5º, do CPP, que dispõe: “O juiz que conhecer do conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou acórdão.”. Tal dispositivo foi declarado inconstitucional no julgamento das ADIs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF pelo STF.
A alternativa B está correta. No julgamento das ADIs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF, pelo STF, tópico X restou determinado que: “por unanimidade, atribuir interpretação conforme à primeira parte do caput do art. 3º-C do CPP, para esclarecer que as normas relativas ao juiz das garantias não se aplicam às seguintes situações: (a) processos de competência originária dos tribunais, os quais são regidos pela Lei 8.038/1990; (b) processos de competência do tribunal do júri; (c) casos de violência doméstica e familiar; e (d) infrações penais de menor potencial ofensivo;”.
A alternativa C está incorreta. O STF, no julgamento das ADIs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF, declarou a inconstitucionalidade do termo “recebimento” contido no § 2º do art. 3º-C do CPP, e atribuiu interpretação conforme ao dispositivo para assentar que, após o oferecimento da denúncia ou queixa, o juiz da instrução e julgamento deverá reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de dez dias.
A alternativa D está incorreta. O STF, no julgamento das ADIs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF, por maioria, atribuiu interpretação conforme ao caput do art. 28 do CPP, para assentar que, ao se manifestar pelo arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer elementos informativos da mesma natureza, o órgão do Ministério Público submeterá sua manifestação ao juiz competente e comunicará à vítima, ao investigado e à autoridade policial, podendo encaminhar os autos para o Procurador-Geral ou para a instância de revisão ministerial, quando houver, para fins de homologação, na forma da lei.
A alternativa E está incorreta. O STF, no julgamento das ADIs 6.298/DF, 6.299/DF, 6.300/DF e 6.305/DF, declarou a inconstitucionalidade do caput do artigo 3º-D do CPP, que estabelecia: “O juiz que, na fase de investigação, praticar qualquer ato incluído nas competências dos arts. 4º e 5º deste Código ficará impedido de funcionar no processo.”.
QUESTÃO 19. Tício, denunciado pelo crime de tráfico de drogas (art. 33, caput, da Lei no 11.343/2006), encerrada a instrução penal, teve a conduta desclassificada para o tráfico privilegiado (art. 33, parágrafo 4, da Lei no 11.343/2006). Por força da desclassificação, o Juiz determinou que o Ministério Público se manifestasse a respeito da proposta de acordo de não persecução penal, embora Tício, ao longo de toda a instrução, tenha negado a prática delitiva. O Ministério Público apresentou a proposta de não persecução penal, que foi aceita por Tício, que se comprometeu a uma série de obrigações, dentre as quais, manter atualizado o endereço residencial. Homologado judicialmente o acordo, Tício não foi localizado no endereço então fornecido, para dar início ao cumprimento do acordo. Intimado o defensor, para fins de atualização do endereço, este informou ter perdido contato com o cliente, pleiteando a intimação, por edital. Dada a não localização de Tício, o Ministério Público manifestou-se pela rescisão do acordo de não persecução penal, pleito acatado pelo Juiz.
Diante da situação hipotética e, considerando a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, assinale a alternativa correta.
a) Uma vez que não se oportunizou a Tício justificar o inadimplemento das obrigações a que se comprometeu, através de intimação válida é equivocada a rescisão do acordo de não persecução penal.
b) Uma vez que o acordo de não persecução penal é inaplicável a qualquer modalidade de tráfico é equivocada a proposta de acordo de não persecução a Tício.
c) Não tendo confessado a prática delitiva ao longo de toda a instrução é equivocada a proposta de acordo de não persecução penal a Tício.
d) A confissão, embora requisito ao acordo de não persecução penal, pode ser colhida na oportunidade da celebração do acordo, razão pela qual a negativa de autoria de Tício, ao longo da instrução, não implicou obstáculo à propositura e homologação do ato negocial.
e) Uma vez que o acordo de não persecução penal é ato negocial preliminar à ação penal é equivocada a proposta de acordo de não persecução penal a Tício, visto que a desclassificação se deu apenas após encerrada a instrução.
Comentários
A alternativa correta é a letra D. A questão trata sobre o acordo de não persecução penal (ANPP).
A alternativa A está incorreta. Conforme entendimento do STJ, o artigo 28-A do CPP, que estabelece regras acerca do ANPP, não exige intimação do investigado, para justificar as razões do descumprimento do acordo: “Prevê o §10 do art. 28-A do Código de Processo Penal que o descumprimento das condições impostas no acordo de não persecução penal implica a revogação do benefício, devendo o Ministério Público comunicar o fato ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia, não havendo previsão legal para que o investigado seja intimado, mesmo que por edital, para justificar o descumprimento das condições pactuadas, tampouco sendo o caso de aplicação analógica do art. 118, §2º, da Lei de Execuções Penais, visto que o paciente não se encontra em situação de execução de pena privativa de liberdade.” HC nº 809.639/GO.
A alternativa B está incorreta. O STJ entende cabível a aplicação do ANPP ao tráfico privilegiado: “Uma vez reconhecida a aplicação da minorante do tráfico privilegiado, os patamares abstratos de pena estabelecidos na lei situam-se dentro do limite de 4 anos para a pena mínima, previsto no art. 28-A do CPP. Além disso, com a aplicação da minorante neste STJ, o acusado tem direito ao ANPP, mesmo se o Parquet tiver descrito os fatos na denúncia de maneira imperfeita, pois o excesso de acusação (overcharging) não deve prejudicar o acusado. No caso dos autos estão presentes os requisitos para proposta do ANPP, quais sejam: 1) confissão formal e circunstanciada; 2) infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos; e 3) necessidade e suficiente para reprovação e prevenção do crime.” (HC 822.947/GO)
A alternativa C está incorreta. A jurisprudência do STF e do STJ entendem que a confissão, em sede do ANPP, é formal e circunstanciada, sendo exigida apenas quando do oferecimento deste, e não como requisito prévio. Neste sentido, o STJ asseverou que: “Deve-se, por conseguinte, diferenciar a postura legítima do réu que nega envolvimento com crime apurado em ação penal com a posição de parte do ANPP, certamente muito mais favorável do que aquela que lhe valeria o cumprimento de pena privativa de liberdade nos estabelecimentos penais à disposição nesse país, devendo lhe ser permitida a confissão, tal qual àquele que nega a conduta no interrogatório policial e, em juízo, a confessa, contradição que não impossibilita o reconhecimento da atenuante em seu favor. A dúvida remanescente residiria sobre o momento a formalização da confissão para fins do ANPP diferido, ao que se responde prontamente: no ato da assinatura do acordo. O Código de Processo Penal, em seu art. 28-A, não determinou quando a confissão deve ser colhida, apenas que ela deve ser formal e circunstanciada. Isso pode ser providenciado pelo próprio órgão ministerial, se decidir propor o acordo, devendo o beneficiário, no momento de firmá-lo, se assim o quiser, confessar formal e circunstanciadamente, perante o Parquet, o cometimento do crime.” HC 837.239/RJ.
A alternativa D está correta. Conforme já destacado no comentário anterior, o STJ entende que é possível colher a confissão apenas no momento em que o ANPP torna-se viável: “O Código de Processo Penal, em seu art. 28-A, não determinou quando a confissão deve ser colhida, apenas que ela deve ser formal e circunstanciada. Isso pode ser providenciado pelo próprio órgão ministerial, se decidir propor o acordo, devendo o beneficiário, no momento de firmá-lo, se assim o quiser, confessar formal e circunstanciadamente, perante o Parquet, o cometimento do crime.” HC 837.239/RJ.
A alternativa E está incorreta. No precedente do AgRg no REsp 2.016.905/SP, a Quinta Turma do STJ estabeleceu que, em casos de alteração do enquadramento jurídico ou desclassificação do delito, é possível aplicar o ANPP, desde que preenchidos os requisitos legais. Esse precedente reconheceu a aplicação adaptada da Súmula 337/STJ, que prevê ser cabível a suspensão condicional do processo na desclassificação do crime e procedência parcial da pretensão punitiva.
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