Prerrogativas institucionais em conflito: o caso Cantanhede

Prerrogativas institucionais em conflito: o caso Cantanhede

No dia 14 de maio de 2025, uma situação inusitada chamou atenção no interior do Maranhão. Durante uma sessão do Tribunal do Júri em Cantanhede, um conflito entre uma juíza e o promotor acabou suspendendo o julgamento.

De início, a princípio pode parecer uma briga menor sobre “quem senta onde”, mas a questão vai muito além disso.

Entretanto, o episódio dividiu opiniões nas redes sociais de forma impressionante. Analisando os comentários, encontramos uma verdadeira radiografia da percepção pública sobre nosso sistema de justiça:

  • 28% das pessoas viram o conflito como pura “guerra de egos”;
  • 22% criticaram duramente o judiciário como um todo;
  • 14% apoiaram especificamente o promotor, citando base legal;
  • 11% compararam a situação a comportamento infantil.

Por outro lado, os números revelam algo interessante: enquanto muitos criticaram ambos os lados, quem tinha conhecimento jurídico tendeu a apoiar o promotor.

Os comentários nas redes sociais ficaram bem divididos:

Audiência de caso criminal é suspensa após promotor se recusar a sentar longe da juíza

O vídeo na íntegra pode ser acessado aqui:

https://www.youtube.com/watch?v=tQQVCJ3_pOY

E o crime?

Ora, mas o que realmente estava em jogo? O caso era sério: Loriano Ribeiro Fonseca respondia por mandar matar João Batista Soares em 2017. A acusação era de homicídio por ciúmes – Loriano teria descoberto que João Batista mantinha um relacionamento com sua companheira.

Nessa linha, vale ressaltar que não estamos falando de qualquer processo. Crimes contra a vida têm julgamento pelo júri popular garantido pela Constituição. Dessa maneira, quando sessões assim são suspensas, toda a sociedade perde.

Como começou?

Assistindo ao vídeo (que ficou disponível no YouTube), vemos exatamente como a situação escalou. A juíza foi direta: “eu aqui digo quem fica em qualquer lugar… aqui quem manda sou eu”.

O promotor, por sua vez, manteve a calma e citou a legislação específica: “a lei complementar 75/93 artigo 18 inciso primeiro bem como a lei 8625/93 artigo 41 inciso 11… a ADI 4768 determina que o promotor de justiça se sente à direita do juiz“.

Dessa maneira, enquanto um invocou autoridade pessoal, o outro se baseou na lei.

O que diz a lei?

Nessa linha, aqui chegamos ao ponto central da questão.

Isto porque, o promotor não estava inventando regras.

De fato, existe base legal sólida para sua posição.

Por outro lado, primeiramente, os juízes realmente dirigem o processo.

Isto porque, o artigo 125 do Código de Processo Civil é claro sobre isso.

Dessa forma, eles decidem como conduzir audiências e podem organizar aspectos formais dos atos processuais.

Logo, essa prerrogativa é real e importante.

Mas, – e aqui está o “mas” fundamental – existe legislação específica sobre onde o Ministério Público deve se posicionar durante as sessões. Não é capricho ou tradição: é lei federal.

Em outras palavras, as Leis Complementares 75/1993 e 8.625/1993 estabelecem que promotores sentam à direita dos magistrados. E isso é importante? pode parecer detalhe sem importância, mas tem razão de ser.

ADI 4768

A prerrogativa atribuída aos membros do Ministério Público de situar-se no mesmo plano e imediatamente à direita dos magistrados nas audiências e sessões de julgamento (Lei Complementar 75/1993, art. 18, I, “a”; e Lei 8.625/1993, art. 41, XI) não fere os princípios da isonomia, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório (CF/1988, art. 5º, I, LIV e LV) nem compromete a necessária paridade de armas que deve existir entre a defesa e a acusação.

STF. Plenário ADI 4768/DF, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 23/11/2022 (Informativo 1077).

Vale ressaltar que em 2022, o Supremo Tribunal Federal analisou exatamente essa questão.

A OAB havia questionado se essa prerrogativa do MP violava a igualdade entre acusação e defesa.

Qual foi o resultado?

O STF manteve a regra por maioria.

Promotores

A decisão foi clara: a proximidade física entre promotor e juiz não compromete a imparcialidade nem viola a paridade processual.

Em outras palavras, a Ministra Cármen Lúcia, relatora do caso, explicou que a posição dos participantes no processo reflete suas funções institucionais.

Dessa maneira, o ambiente judicial é naturalmente simbólico, e essa disposição representa a estrutura do sistema de justiça brasileiro.

O STF fundamentou três pontos principais:

1) O simbolismo importa. A organização física das audiências não é mero protocolo, mas reflete como o Estado conduz a justiça.

2) O Ministério Público tem função diferenciada. Não é apenas uma “parte” como qualquer outra – representa toda a sociedade na busca pela aplicação da lei.

3) Igualdade real não é igualdade de aparências. O que importa são as oportunidades efetivas de defesa e acusação apresentarem seus argumentos.

Questões de gênero

Por outro lado, um aspecto delicado do caso foram as acusações de machismo estrutural feitas pela magistrada.

Dessa maneira, trata-se de um tema sério que merece tratamento cuidadoso.

Por um lado, sabemos que o sistema de justiça ainda enfrenta desafios relacionados à igualdade de gênero. Isto porque, mulheres em posições de autoridade às vezes enfrentam questionamentos que homens não enfrentariam.

Dessa forma, o caso merece maior aprofundamento.

Fica o detalhe para reflexões futuras.


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