Post polêmico de advogada pode causar a volta de Nego Di à prisão. Saiba como uma medida cautelar do STJ e alegações de estelionato estão no centro dessa controvérsia.
* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.
Reviravolta no caso Nego Di?
O influencer e ex-BBB conhecido como Nego Di, que estava preso sob suspeita de participar de fraude em rifa virtual (estelionato), obteve liberdade provisória no Superior Tribunal de Justiça.
Ocorre que um post publicado por sua advogada pode levar Nego Di de volta para a cadeia, e isso porque uma das medidas cautelares impostas pelo STJ o proíbe de utilizar redes sociais até o julgamento do mérito de seu HC.
No post publicado pela advogada, Nego Di aparece ao lado dela, sorrindo. A foto traz, ainda, a seguinte legenda: “Como esperamos para postar este retrato“.
A advogada Tatiana Borsa, que representava o influencer, foi demitida após esse post polêmico.
Conforme a atual defesa de Nego Di, a destituição da advogada “foi uma decisão do cliente, externando seu descontentamento pela postagem sem autorização e pela conduta desta pós repercussão negativa do fato“.
Entenda o Caso
Em julho de 2024, Nego Di foi acusado de ter cometido estelionato ao vender rifas e não entregar o prêmio, que seria uma Porsche avaliada em meio milhão de reais.
Assim reza o Código Penal:
Estelionato
Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:
Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis.
Fraude eletrônica
§ 2º-A. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se a fraude é cometida com a utilização de informações fornecidas pela vítima ou por terceiro induzido a erro por meio de redes sociais, contatos telefônicos ou envio de correio eletrônico fraudulento, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
As investigações apontaram que Nego Di e o sócio ofereciam produtos como TVs, celulares e ar-condicionado com preços bem abaixo do valor de mercado, mas as mercadorias nunca eram entregues aos clientes.
Suspeita-se que ele tenha cometido em torno de 370 crimes de estelionato.
A quebra do sigilo bancário do influencer mostrou, ainda, que ele mentiu ao dizer que doou R$1 milhão a uma vaquinha destinada a ajudar as vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul, quando, na verdade, só doou R$100.
Ao final, ele foi denunciado por estelionato, lavagem de dinheiro e uso de documento falso, e estava preso desde 17 de julho de 2024.
Ao manter a prisão, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul destacou que o influenciador – que à época tinha mais de dez milhões de seguidores – usava a sua imagem para divulgar em redes sociais produtos de uma empresa que, na verdade, seria utilizada para a prática de golpes.
Polêmicas envolvendo Nego Di
Esse fato da fraude na rifa virtual e a falsa doação aos desabrigados das enchentes do Rio Grande do Sul não são as únicas polêmicas envolvendo Nego Di.
O ex-BBB também foi acusado de espalhar fake News (desinformação) ao afirmar que o governo do Rio Grande do Sul e a brigada militar estariam impedindo que barcos e jet-skis realizassem salvamentos e resgates.
A justiça gaúcha proibiu Nego Di de reiterar essas alegações falsas, sob pena de multa de R$100 mil.
A juíza do caso, levando em conta a situação de calamidade pública, foi incisiva:
“A disseminação de informações inverídicas, sem embasamento na realidade sobre a atuação estatal, atrapalha o delicado trabalho de socorro, gerando incerteza e insegurança à população, com potencial de desestimular a ajuda da sociedade civil.”
Nego Di pode voltar para a cadeia?
O Superior Tribunal de Justiça concedeu, através de liminar da lavra do Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, liberdade provisória ao ex-BBB Dilson Alves da Silva Neto, conhecido como Nego Di (HC 963675).
Para a soltura de Nego Di, o ministro Reynaldo Fonseca levou em consideração os seguintes argumentos:
- Apesar do número de registros policiais citado pelo TJRS, a denúncia contra o influenciador aponta apenas 18 vítimas – e, segundo a defesa, essas pessoas foram ressarcidas dos prejuízos com as compras;
- Em relação a um possível risco de continuidade das atividades tidas por criminosas, destacou que o tribunal estadual não conseguiu descrever com precisão quais práticas diretamente relacionadas a Nego Di justificariam a manutenção de sua prisão.
- Os fatos denunciados são de 2022, a investigação já foi concluída, a ação penal está em curso e os supostos crimes não envolveram violência ou grave ameaça.
- O influencer demonstra condições pessoais favoráveis, tais como primariedade e residência fixa.
O ministro, porém, fixou uma série de medidas cautelares para a soltura de Nego Di. Vejamos:
- Comparecimento periódico em juízo para justificar suas atividades;
- Proibição de mudar de endereço sem autorização judicial;
- Proibição de se ausentar da comarca sem prévia comunicação ao juízo;
- Proibição de frequentar/usar redes sociais;
- Recolhimento do passaporte
Aqui é onde começa a polémica! |
O post publicado pela advogada de Nego Di pode ser considerado uma quebra da medida cautelar de proibição de frequentar/usar redes sociais?
Se a resposta for sim, como pode entender o Ministério Público do Rio Grande do Sul, o influencer pode ser considerado como descumpridor das condicionantes de sua liberdade, podendo, em tese, voltar para a cadeia.
Se a resposta for não, como entende sua defesa, Nego Di permanece em liberdade provisória.
A advogada Tatiana Borsa, autora do post, afirmou ao jornal O Globo que não via problema na publicação, já que foi feita em seu próprio perfil, não na conta de Nego Di.
Quem defende que o influencer não descumpriu a medida cautelar, a exemplo do advogado especialista em Direito Digital Luiz Augusto D’Urso, argumenta que o fato de a publicação ter sido feita na conta de um terceiro (no caso, sua advogada), é suficiente para afastar sua responsabilidade. Ele não teria usado a rede social.
Nesses casos, o juiz deveria avaliar se o réu está se utilizando da conta de terceiro para burlar a determinação judicial: “Isso não parece ser o caso aqui. Ele apenas aparece em um vídeo publicado pelas advogadas, sem evidências de que utilizou o espaço para se manifestar ou driblar a ordem judicial”.
Já quem defende que Nego Di descumpriu a medida cautelar de não usar redes sociais argumenta que ele se utilizou de terceiro (sua advogada) para mandar um recado, uma mensagem, desobedecendo a ordem judicial de se abster de utilizar as redes sociais.
Na verdade, caberá ao magistrado avaliar, no caso concreto, se está patente essa intenção de quebra da medida cautelar.
O STJ tem entendido que as medidas cautelares diversas da prisão podem durar por tempo indeterminado, enquanto se mantiverem os requisitos do artigo 282 do Código de Processo Penal, observadas as particularidades do caso e do acusado.
Tema muito interessante, e que pode ser cobrado principalmente em prova de direito processual penal. Recomendo acompanhar o desenrolar do processo (HC 963675).
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