Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ

Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ

O presente artigo baseia-se em uma recente e detalhada publicação feita pelo Superior Tribunal de Justiça em seu portal de notícias intitulada “Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ”, disponível em:

Crime, castigo e perdão: o instituto do perdão judicial na jurisprudência do STJ

Em breve síntese, o material apresenta uma síntese de jurisprudências do STJ relevantes sobre o perdão judicial, instituto previsto no artigo 107, parágrafo IX, do Código Penal.

A partir do tema, analisaremos os principais entendimentos consolidados pelo tribunal e como o conteúdo pode ser cobrado em provas de concursos públicos.

No Direito Penal, a regra é clara: quando um crime é provado, a consequência natural é a aplicação de uma sanção. Contudo, o próprio ordenamento jurídico prevê algumas situações em que, mesmo que haja comprovação da autoria e materialidade de um delito, o Estado pode optar por não aplicar uma pena. Uma dessas situações é o perdão judicial.

O que é o perdão judicial

O instituto do perdão judicial, como já mencionamos, permite que o Estado deixe de aplicar uma pena em determinadas situações, mesmo que se reconheça a culpa do réu.

perdão judicial

É uma medida de caráter excepcional, inspirada em princípios de humanidade e razoabilidade, que exige o atendimento de requisitos legais específicos e uma avaliação cuidadosa por parte do Judiciário.

Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a concessão do benefício depende de uma análise criteriosa do juiz no momento da dosimetria da pena.

Cabe ao magistrado verificar se os elementos dos autos se enquadram nos requisitos legais para aplicar ou não o instituto.

Não basta presumir que o agente sofreu um abalo físico ou emocional para que receba o benefício. É necessário a demonstração concreta de que o sofrimento foi real e significativo.

Assim, o perdão judicial é prerrogativa do juiz que mesmo reconhecendo a prática do crime deixa de aplicar a pena, desde que, preenchidas as circunstâncias da lei e quando as consequências do delito atinjam o agente, de tal forma que o seu sofrimento por si só, já seja punição suficiente. É direito do indivíduo, uma vez presentes os requisitos legais.

Qual é sua natureza jurídica?

Quanto à natureza jurídica da decisão que concede o perdão judicial, o STJ se manifestou por meio da Súmula 18, in verbis: “A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório”.

Quais são as hipóteses de admissão?

Primeiramente, é importante destacar que o perdão judicial não é um instituto aplicável a qualquer crime, mas tão somente a predeterminados crimes previstos em lei.

Hipóteses que admitem concessão do perdão judicial explicitamente:

  • art. 121 CP, § 5º (homicídio culposo);
  • art. 129 CP, § 8º (lesão corporal culposa);
  • art. 140 CP, § 1º, I e II (injúria);
  • art. 168-A CP, § 3º (apropriação indébita previdenciária);
  • art. 337-A CP, § 2º, II (sonegação de contribuição previdenciária);
  • art. 176 CP, parágrafo único (outras fraudes);
  • art. 180 CP, § 5º, primeira parte (receptação culposa);
  • art. 242 CP, parágrafo único (“adoção à brasileira”);
  • art. 249 CP, § 2º (subtração de incapazes).

Entendimentos recentes do Superior Tribunal de Justiça

Acidente de trânsito

Em um julgado recente, o Superior Tribunal de Justiça analisou um caso envolvendo um acidente de trânsito no qual o passageiro, que era amigo do condutor, faleceu e manteve a decisão das instâncias ordinárias que negaram a concessão do perdão judicial. O ministro destacou que a aplicação do benefício dependeria da reanálise das provas do processo, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ.

Homicídio culposo

Na mesma linha, o tribunal manteve a negativa do perdão judicial a um homem condenado por homicídio culposo na direção de veículo que resultou na morte de seu primo, por entender que o sofrimento emocional não pode ser presumido apenas pelo parentesco com a vítima.

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça admitiu a aplicação do benefício a um réu que havia perdido o irmão em um homicídio culposo. O réu havia atingido seu próprio irmão enquanto tentava atingir um desafeto. O ministro entendeu que o vínculo entre irmãos e o desgaste emocional vivido foram suficientes para aplicar o perdão judicial.

Também houve um caso em que o tribunal analisou um pedido feito por um ex-servidor público que havia celebrado colaboração premiada. A Corte manteve a decisão das instâncias anteriores, que reduziram a pena, mas não concederam o benefício. O ministro ressaltou que a concessão do perdão exige a análise de diversos elementos, como a personalidade do réu, a gravidade e a repercussão do crime, conforme art. 4º, parágrafo 1º, da Lei 12.850/2013.

Em outra ocasião, ao analisar um caso de duplo homicídio culposo no trânsito que envolveu a morte do namorado e de um amigo do réu, o tribunal decidiu que o perdão judicial concedido pela morte do namorado não se estendia à morte do amigo. Aqui se firmou o entendimento de que, mesmo em concurso formal, o perdão judicial deve ser avaliado individualmente para cada crime.

Roubo

Encerrando os julgados, a defesa de um homem condenado por roubo pediu a aplicação do perdão, sob o argumento de que, durante o crime, ele foi baleado por um guarda municipal e ficou paraplégico. O tribunal, contudo, negou o pedido. O relator reforçou que as hipóteses de aplicação do instituto constituem um rol taxativo, não podendo a lista ser ampliada pelo julgador. Ele esclareceu que não há previsão legal para a concessão do perdão judicial no crime de roubo, portanto, não cabe ao juiz criar novas hipóteses de perdão.

A impossibilidade de concessão na fase de inquérito

O Superior Tribunal de Justiça definiu que o perdão judicial não pode ser concedido durante a fase de investigação. O benefício pressupõe a existência de um processo judicial completo, onde a culpa do agente é analisada individualmente, para então avaliar se os requisitos estão presentes.

Consequentemente, o perdão judicial não pode ser usado para encerrar um caso antes mesmo que ele comece. Assim, o delegado não pode pedir o arquivamento de um inquérito, nem o Ministério Público pode deixar de oferecer a denúncia, com base no perdão judicial. A análise é de competência do magistrado, após o término da instrução processual.

Reincidência

O art. 120 do CP dispõe que “A sentença que conceder perdão judicial não será considerada para efeitos de reincidência”. Se a natureza da sentença não fosse condenatória, o dispositivo seria redundante. Outra corrente sustenta que a sentença concessiva do perdão é extintiva da punibilidade, razão pela qual também se exclui qualquer efeito penal, inclusive a reincidência (súmula 18 do STJ).

Como o tema pode cair em provas

Prova: CESPE / CEBRASPE - 2024 - TSE - Técnico Judiciário - Área: Administrativa - Especialidade: Agente da Polícia Judicial

Em relação aos crimes contra a pessoa, contra a administração pública e contra a fé pública, julgue o item subsequente, de acordo com o Código Penal.

Considere que um cirurgião, ao realizar procedimento médico em seu filho recém-nascido, tenha cometido um erro técnico que tenha resultado na morte da criança. Nessa hipótese, caso o cirurgião seja condenado por homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar-lhe a pena, se constatar que a sanção é desnecessária. (CERTO).
Prova: INSTITUTO AOCP - 2022 - PC-GO - Delegado de Polícia Substituto

Se da prática do fato criminoso surge o direito de punir – jus puniendi –, certo é que, de outro lado, tal direito pode ser perdido pelo Estado se preenchidas algumas hipóteses legais. Considerando o tema Extinção da Punibilidade, assinale a alternativa correta.

A) Para efeitos de reincidência, a sentença que conceder perdão judicial não será considerada (Certo)
Prova: VUNESP - 2022 - PC-SP - Delegado de Polícia

Júpiter está arrumando a ligação elétrica de sua casa, com ajuda de Jano, seu amigo, que lhe segura a escada. Deixando de observar um dever objetivo de cuidado, Júpiter faz uma ligação equivocada e recebe uma alta descarga de energia, sofrendo inutilização permanente de membro. No mesmo incidente, Jano sofre uma lesão corporal leve. Em outro cenário, Saturno, pai dedicado e amoroso, está dando banho em seu filho, Nemestrino. Imprudentemente, Saturno deixa Nemestrino cair no chão, o que causa a morte imediata do bebê. No que concerne à lesão corporal sofrida por Jano e ao homicídio praticado por Saturno, o perdão judicial, ao menos em tese:

Alternativas

A) aplica-se ao primeiro caso e depende de concordância da mãe de Nemestrino para aplicação ao segundo.

B) aplica-se ao segundo caso, mas não ao primeiro.

C) não se aplica a nenhum dos casos.

D) aplica-se a ambos os casos.

E) aplica-se ao primeiro caso, mas não ao segundo.

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