Ministra do TSE é vítima de racismo em evento público

Ministra do TSE é vítima de racismo em evento público

*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.

Entenda o caso

A ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Vera Lúcia Santana Araújo, foi barrada na entrada de prédio público federal, em Brasília, no dia 16 de maio de 2025, mesmo após se identificar como palestrante do XXV Seminário Ética na Gestão, promovido pela Comissão de Ética Pública da Presidência da República.

Vera Lúcia era uma das palestrantes do evento e foi impedida de entrar no auditório do evento mesmo após apresentar a carteira funcional de ministra. A sua liberação só ocorreu após a ministra solicitar providências para resolver a situação.

Na abertura da sessão plenária do TSE, do dia 20 de maio de 2025, a ministra Presidente da Corte Eleitoral, Ministra Carmén Lúcia, manifestou indignação com o ocorrido. Ela disse o seguinte:

“Gostaria de dar início tornando pública uma ocorrência dotada de muita gravidade e infelicidade […] Uma das integrantes desse Tribunal Superior Eleitoral foi centro de uma inaceitável conduta de discriminação, racismo, num destratamento indigno, quando ela se apresentava atendendo um convite como palestrante do 25º seminário da Comissão de Ética da República”.

A magistrada estava confirmada como palestrante do evento e falaria em um painel sobre prevenção e enfrentamento do assédio e da discriminação.

Em manifestação após o ocorrido, a Ministra Vera Lúcia informou que nenhuma das atendentes sequer se dispôs a verificar os documentos.

“Uma delas, inclusive, limitou-se a sugerir que eu procurasse a organização por conta própria. Foi uma situação profundamente humilhante. Senti-me desprezada, desrespeitada, reduzida a uma condição de total indignidade. É um tipo de tratamento que fere não apenas os direitos, mas a própria dignidade da pessoa humana”.

Após o fato, o Advogado-Geral da União encaminhou solicitação à Polícia Federal para apuração, com a máxima urgência, dos fatos ocorridos e a identificação dos responsáveis para a aplicação das penalidades previstas na legislação.

Análise jurídica

Igualdade de todos

Durante séculos, o Brasil institucionalizou a desigualdade. Ergueu-se como o último país do Ocidente a abolir formalmente a escravidão, mas foi também um dos primeiros a converter o racismo estrutural em silêncio legal, omitindo-se quanto à inclusão concreta da população negra na sociedade. O direito brasileiro, por muito tempo, foi cego — mas não à cor da pele, e sim à dor que ela carregava.

A Constituição de 1988 foi o primeiro marco jurídico de ruptura com esse silêncio. Ao proclamar no artigo 1º a dignidade da pessoa humana como fundamento da República, e ao enunciar, no artigo 5º, a igualdade de todos perante a lei “sem distinção de qualquer natureza”, a Carta Magna rompeu simbolicamente com a tradição excludente. Contudo, o símbolo por si só não basta: era preciso normatizar, punir e, sobretudo, educar.

Ministra

Nesse sentido, o ordenamento brasileiro avançou com a criminalização do racismo como crime inafiançável e imprescritível, nos termos do inciso XLII do art. 5º da Constituição.

A Lei nº 7.716/1989 deu concretude a esse mandamento constitucional, definindo os crimes resultantes de preconceito de raça ou cor, e sendo posteriormente ampliada para abarcar discriminações religiosas, étnicas e nacionais. Essa legislação, por seu rigor, tem valor paradigmático: o Brasil não apenas reconhece o racismo como crime, mas o posiciona como uma das mais graves formas de violação à ordem constitucional e à humanidade.

Mais recentemente, o Supremo Tribunal Federal protagonizou decisões emblemáticas, como a equiparação da homotransfobia ao crime de racismo (ADO 26 e MI 4733), reconhecendo que o preconceito, qualquer que seja sua roupagem, nega a própria essência da dignidade humana.

Em outra frente, a Lei nº 12.288/2010, que institui o Estatuto da Igualdade Racial, buscou consolidar políticas públicas de promoção da equidade. Isso representou um passo importante rumo à reparação histórica.

Racismo

O racismo é um crime que atinge coletivamente um grupo ou uma coletividade de pessoas, com base na raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Ele se manifesta quando alguém nega direitos, exclui ou inferioriza um grupo inteiro, por causa dessas características.

Assim, são exemplos de práticas racistas:

  • Impedir o acesso de pessoas negras a eventos, restaurantes, transporte público, entre outros.
  • Não contratar alguém por ser nordestino, declarando isso publicamente.
  • Fazer propaganda que incite o ódio contra judeus.

O crime de racismo não se confunde com o delito de injúria racial. Este crime é praticado contra a honra individual, em que se ofende alguém utilizando elementos raciais, étnicos, religiosos ou de origem como forma de xingamento ou humilhação.

São exemplos de injúria racial:

  • Chamar alguém de forma pejorativa com referência à sua cor ou origem (“macaco”, “preto imundo”, “baiano folgado” etc.).
  • Ofender uma pessoa dizendo que ela tem “cara de bandido” por ser negra.

Analisando os fatos narrados pelos veículos de comunicação, os fatos ocorridos com a Ministra do TSE, em tese, têm potencial para tipificar o crime de racismo e deverão ser apurados pelas autoridades policiais competentes.


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