Temos, de fato, uma grande decisão aqui.
Isto porque, uma decisão que acolheu a existência de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal deve mudar radicalmente a forma como o Ministério Público atua na cobrança de danos ao erário.
Isto porque, os Ministros reconheceram repercussão geral na discussão sobre responsabilidade do MP por custas e honorários quando sai derrotado em processos judiciais.
Como assim?
Vamos explicar de maneira simples: uma execução de R$ 29.481,97 movida pelo Ministério Público de São Paulo contra um ex-vereador de Jandira chegou ao Supremo Tribunal Federal e pode alterar definitivamente as regras sobre responsabilidade sucumbencial do órgão ministerial.
Em síntese, o caso nasceu em 2008, quando o parquet paulista executou Cícero Amadeu Romero Duca baseando-se em decisão do Tribunal de Contas estadual.
Isto porque, o TCE havia condenado o ex-presidente da Câmara Municipal a ressarcir gastos irregulares: R$ 23.592,45 com participação de vereadores no 45º Congresso Estadual de Municípios em 2001 e R$ 5.889,52 recebidos indevidamente como subsídios.
Inicialmente, o processo seguiu seu curso normal com a penhora de três imóveis do executado.
Porém, Duca reagiu com embargos à execução que mudaram completamente o rumo da disputa.
Alegou que um dos bens era impenhorável por constituir bem de família e outro estava dado em garantia fiduciária à Caixa Econômica Federal.
Nessa linha, o Tribunal de Justiça de São Paulo acolheu integralmente os argumentos.
Entretanto, além de desconstituir a penhora, condenou o Ministério Público ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% “sobre a diferença entre o valor constante da certidão de penhora e o valor apontado pelo embargante como devido na inicial”.
Ora, esta condenação motivou o recurso extraordinário que chegou ao STF.
Isto porque, o MP paulista sustenta que a decisão “viola a Constituição, comprometendo sua autonomia funcional” e invoca clara violação aos artigos 127 e 128, § 5º, II, “a” da Constituição Federal.
Argumento da simetria fundamenta tese ministerial
O Recurso Extraordinário do Ministério Público baseia-se no que chama de “princípio da simetria“.
Dessa maneira, o órgão argumenta que “se o Parquet não pode receber tais encargos quando vencedor, por simetria, lógica processual e razoabilidade, não pode pagá-los quando vencido”.

Inclusive, o fundamento encontra respaldo no artigo 128, § 5º, II, “a” da Constituição, que expressamente veda aos membros do Ministério Público “receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais”.
Logo, na petição recursal, o MP defende que essa vedação constitucional deveria funcionar nos dois sentidos.
Vale ressaltar que a tese ministerial ganha força com precedente do Superior Tribunal de Justiça.
Isto porque, no julgamento do REsp 678969/PB, envolvendo caso similar na Paraíba, a Primeira Turma reconheceu a impossibilidade de condenação do MP quando “objetivou proteger o patrimônio público, com a cobrança do devido ressarcimento dos prejuízos causados ao erário municipal, o que configura função institucional típica do ente ministerial”.
Argumentação a favor da decisão do TJ-SP
A argumentação pró-responsabilização sustenta que a submissão às regras gerais de sucumbência funcionaria como freio natural contra ações temerárias.
Sem esse controle, o MP poderia atuar de forma menos criteriosa, sabendo que eventual derrota não acarretaria consequências financeiras.
De um lado, Marcio Berti, especialista em Direito Público, alerta para outro risco: a isenção pode “desestimular a atuação proativa do órgão em ações civis públicas ou de ressarcimento ao erário”, justamente áreas onde a atuação ministerial é fundamental para controle da administração pública. Por outro lado, vale ressaltar que constitucionalistas manifestam preocupação com as consequências da decisão1.
Isto porque, a isenção total significaria transferir o ônus financeiro diretamente aos contribuintes, já que eventuais indenizações sairiam dos cofres públicos.
Alessandro Chiarottino, professor de Direito Constitucional da USP, questiona a efetividade da medida proposta pelo MP: “De que adianta multar uma entidade na qual o dinheiro é público?”.
Dessa maneira, o especialista defende alternativa mais eficaz através da responsabilização individual de procuradores e promotores que abusarem da função.
Por outro lado, André Marsiglia vai além e critica a ausência de mecanismos efetivos de controle. Para ele, “as leis de abuso de autoridade deveriam se tornar mais ativas e mais severas. Simplesmente indenizar as pessoas com dinheiro público não vai modificar a conduta abusiva de juízes e procuradores”.
Repercussão geral acolhida
Logo, em março de 2025, os ministros reconheceram por maioria a repercussão geral da matéria, vencido apenas Edson Fachin.
Alexandre de Moraes, relator do caso, destacou que a controvérsia “revela especial relevância” pela necessidade de definir a possibilidade de condenação do MP considerando “seu papel constitucional de defesa do patrimônio público, que deve exercê-lo com autonomia, independência e imparcialidade”.
Assim, a decisão final do STF consolidará entendimento sobre os limites entre as garantias institucionais do Ministério Público e os princípios gerais da responsabilidade processual.
E você o que acha? Isso limita o MP ou seria uma medida isonômica?
- MANFRIN, Juliet. STF pode transferir à população custo de derrotas do Ministério Público em ações judiciais. Gazeta do Povo. Disponível em: <https://www.gazetadopovo.com.br/republica/stf-pode-transferir-a-populacao-custo-de-derrotas-do-ministerio-publico-em-acoes-judiciais/>. ↩︎
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