Indulto de Natal deste ano concede liberdade a presos com doenças graves, reforçando critérios humanitários, mas exclui condenados por atos antidemocráticos. Entenda mais no artigo abaixo.
*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.
Entenda o caso – Indulto de Natal
Foi publicado em edição extraordinária do DOU, no dia 23/12/2024, o Decreto presidencial nº 12.338/2024 que concede indulto natalino e comulta penas de diversas pessoas condenadas por diferentes crimes.
O indulto de natal é, na prática, o perdão da pena concedido aos presos no período natalino. É diferente, portanto, do chamado saidão ou saída temporária, no qual as pessoas privadas de liberdade deixam os presídios temporariamente.
De acordo com o Decreto do Presidente da República o benefício que permite o perdão da pena será concedido a mulheres com gravidez de alto risco e portadores de HIV em estágio terminal. A medida também contempla doenças graves, crônicas ou que sejam altamente contagiosas e não possam ser tratadas no sistema prisional.
Pelo texto do decreto do presidente Lula ele não se aplica para condenados por crimes contra o Estado Democrático de Direito (como os atos golpistas de 8 de janeiro), por crimes hediondos, tortura, terrorismo, racismo, lavagem de dinheiro, ocultação de bens, violência contra a mulher, crianças e adolescentes.
Além disso, integrantes de facções criminosas, pessoas condenadas por abuso de autoridade e que assinaram acordos de delação premiada também estão excluídas do indulto.
Análise Jurídica – Indulto de Natal
O indulto de natal é um ato de clemência presidencial, previsto na Constituição Federal de 1988 e tem natureza jurídica de extinção da punibilidade. Trata-se de uma exceção à lei penal, pois distingue os condenados que serão exonerados de cumprir a pena.
A medida excepcional é destinada a um grupo indeterminado de condenados e delimitado pela natureza do crime e quantidade da pena aplicada, além de outros requisitos que o diploma legal pode estabelecer. É um benefício coletivo, de competência exclusiva do Presidente da República. Ou seja, no exercício da competência privativa que lhe confere o art. 84, inciso XII, da Constituição Federal de 1988:
Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: (...) XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;
Importante destacar que o Presidente da República pode delegar a competência para concessão do indulto aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, na forma do parágrafo único do artigo 84 da Constituição.
A concessão do Indulto extingue a pena na sua totalidade ou parcialmente, de acordo com o texto decretado pelo Presidente da República, como forma de permitir a reintegração do apenado à sociedade. Os efeitos da condenação não perdem totalmente seu alcance, uma vez que o beneficiado não retornará à condição de primariedade.
De acordo com o professor e doutrinador Mirabete:
O indulto coletivo abrange sempre um grupo de sentenciados e normalmente inclui os beneficiários tendo em visto a duração das penas que lhe foram aplicadas, embora se exija certos requisitos subjetivos (primariedade, etc.) e objetivos (cumprimento de parte da pena, exclusão dos autores da prática de algumas espécies de crimes, etc.).
Diferenças entre Indulto, Graça e Anistia
Importante distinguir 3 institutos comumente confundidos e que tem requisitos específicos:
Indulto: é o perdão da pena concedido pelo Presidente da República. É destinado aos sentenciados indistintamente que cumprem pena privativa de liberdade e que se enquadrarem nas hipóteses previstas no Decreto Presidencial, dentre elas o alcance de determinado lapso temporal e comportamento carcerário satisfatório;
Graça: perdão da pena de um condenado, que se destina a um ou mais condenados, desde que devidamente individualizados. O motivo pode ter incidências diversas, como por exemplo, um ato humanitário;
Anistia: abrange todos os efeitos penais decorrentes da prática do crime, referindo-se, assim, a fatos e não a pessoas. Pode ser concedida antes ou depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, beneficiando todas as pessoas que participaram do crime ou excluindo algumas delas, por exigir requisitos pessoais.
A principal consequência jurídica do indulto é a extinção da punibilidade dos delitos previstos no decreto presidencial, na forma do artigo 107, II do Código Penal brasileiro.
É importante frisar que o sistema de extinção de punibilidade aplica-se somente à pena criminal. Na esfera cível, como prisão por falta de depósito de alimentos, não se aplicam as causas de extinção, pois não se revestem do mesmo caráter da pena criminal, tendo apenas caráter coercitivo, destinado a forçar o cumprimento da obrigação civil.
No Decreto nº 12.338/2024 vale destacar que o Presidente da República, expressamente, excluiu dos benefícios do indulto àqueles condenados pelos crimes contra o Estado Democrático de Direito previstos nos arts. 359-I a art. 359-R do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal; pelos crimes de abuso de autoridade previstos na Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019; e também pelos crimes de violência contra a mulher.
Decisões do STF e Repercussão Geral sobre Indultos
O Supremo Tribunal Federal já foi acionado para analisar a constitucionalidade de decretos presidenciais que concederam indultos de natal. Vale aqui destacar a decisão proferida no bojo da ADI 5874 na qual a Corte Suprema fixou o seguinte entendimento:
(…) possibilidade de o Poder Judiciário analisar somente a constitucionalidade da concessão da clementia principis, e não o mérito, que deve ser entendido como juízo de conveniência e oportunidade do Presidente da República, que poderá, entre as hipóteses legais e moralmente admissíveis, escolher aquela que entender como a melhor para o interesse público no âmbito da Justiça Criminal.
Além da ADI acima referida, o STF reconheceu a existência de repercussão geral no RE 1.450.100 (Tema 1267), onde será decidida a constitucionalidade da concessão de indulto natalino, nos moldes previstos no art. 5º, caput e parágrafo único, do Decreto Presidencial 11.302/2022, às pessoas condenadas por crime cuja pena privativa de liberdade máxima em abstrato não seja superior a cinco anos.
Quer saber quais serão os próximos concursos?
Confira nossos artigos para Carreiras Jurídicas!