Entendimento dos Tribunais sobre restrição ao uso de banheiro

Entendimento dos Tribunais sobre restrição ao uso de banheiro

A valorização do trabalho e o respeito à dignidade humana são fundamentos da República Federativa do Brasil, conforme estabelecido no artigo 1º da Constituição Federal. Esses princípios têm implicações diretas nas relações de trabalho, especialmente no que tange ao tratamento digno dos trabalhadores em seu ambiente laboral.

Um aspecto controverso nesse contexto é o controle de idas ao banheiro, prática que vem sendo objeto de diversas discussões jurídicas.

Uso do banheiro é direito do trabalhador

A Norma Regulamentadora 17 (NR 17), em seu item 6.7, estabelece que as empresas devem permitir que os operadores saiam de seus postos de trabalho a qualquer momento da jornada para satisfazer suas necessidades fisiológicas, sem que isso repercuta negativamente em suas avaliações ou remunerações. Esse dispositivo reforça a ideia de que não se pode comprometer a dignidade do trabalhador por regras que limitem o acesso ao banheiro.

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) possui o entendimento de que a restrição ao uso do banheiro fere o princípio da dignidade da pessoa humana. Isso está em conformidade com o disposto no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal.

Segundo o TST, tal prática configura abuso do poder diretivo do empregador (art. 2º da CLT) e resulta em dano moral, que é presumido (in re ipsa), ou seja, independe de prova do sofrimento ou angústia. Nesse sentido, cita-se o seguinte precedente:

[…] O Tribunal Superior do Trabalho tem entendido que a restrição pelo empregador ao uso de banheiro pelos seus empregados fere o princípio da dignidade da pessoa humana, tutelado no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, traduzindo-se em verdadeiro abuso no exercício do poder diretivo da empresa (artigo 2º da CLT), o que configura ato ilícito, sendo, assim, indenizável o dano moral sofrido pelos empregados. Por outro lado, cabe salientar que a ofensa à honra subjetiva do reclamante se revela in re ipsa, ou seja, presume-se, sendo desnecessário qualquer tipo de prova para demonstrar o abalo moral sofrido em decorrência da restrição ao uso do banheiro a que o trabalhador estava submetido. Isso significa afirmar que o dano moral se configura independentemente de seus efeitos, já que a dor, o sofrimento, a angústia, a tristeza ou o abalo psíquico da vítima não são passíveis de serem demonstrados, bastando que ocorra violação efetiva de um direito da personalidade e da dignidade da pessoa humana para que o dano moral esteja configurado. Agravo desprovido. (TST – Ag-RRAg: 0001178-17.2018.5.09.0021, Relator: Jose Roberto Freire Pimenta, Data de Julgamento: 13/12/2023, 3ª Turma, Data de Publicação: 18/12/2023)

Correntes a favor do controle de uso do banheiro

Por outro lado, há correntes jurisprudenciais que defendem que o controle de idas ao banheiro não constitui, por si só, violação à dignidade humana.

Para essa corrente, a organização do trabalho, inclusive a definição de pausas para o uso do banheiro, é parte do poder diretivo do empregador. Dessa forma, não se configura dano moral, desde que respeitadas as condições médicas e as necessidades individuais dos empregados.

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O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT2)1 já adotou esse entendimento. No acórdão, o Tribunal julgou improcedente o pedido de indenização por dano moral a uma trabalhadora de telemarketing. Ela alegou que era impedida de usar o banheiro fora dos intervalos estabelecidos e que, frequentemente, sua autorização para ir ao local era negada pelos supervisores.

O TRT2, todavia, considerou que a organização dos horários era necessária para a eficiência do serviço. Assim, isso não se configurava impedimento ao uso do sanitário, especialmente considerando que os operadores de telemarketing têm jornada de 6 horas. Dentro dessas horas há duas pausas de 10 minutos após os primeiros e antes dos últimos 60 minutos de trabalho, além de intervalo de repouso e alimentação de 20 minutos no curso da jornada – itens 6.4.1 e 6.4.2 da NR 17 do MTE.

Equilíbrio entre eficiência e direitos humanos básicos

Portanto, o tema do controle de idas ao banheiro no ambiente de trabalho revela uma tensão entre o poder diretivo do empregador e os direitos fundamentais do trabalhador.

Embora o TST adote uma postura protetiva, enfatizando a dignidade do trabalhador, há entendimentos que privilegiam a organização do trabalho dentro dos limites da razoabilidade e do respeito às condições humanas.

Cabe destacar que as condições específicas de cada situação devem ser avaliadas no caso concreto, em que o equilíbrio entre os interesses da eficiência organizacional e os direitos humanos básicos deverá ser cuidadosamente ponderado pelo Judiciário.

Como o tema pode surgir em provas de concursos

Seria possível abordar o tema sobre o controle de idas ao banheiro no ambiente de trabalho em provas de concursos públicos de diversas maneiras.

Um exemplo seria por meio de questões discursivas ou objetivas que abordem a aplicação do princípio da dignidade humana e o poder diretivo do empregador. O candidato poderia apresentar seu entendimento ao discutir a legalidade e os limites dessas práticas com base em precedentes do Tribunal Superior do Trabalho e nas normas regulamentadoras, como a NR 17.

Além disso, também seria possível exigir respostas que analisem a divergência jurisprudencial sobre o tema. Ou seja, cobraria que o candidato demonstrasse a capacidade de interpretar e aplicar a legislação e a jurisprudência a situações práticas, como em casos concretos envolvendo alegações de dano moral decorrente de restrições ao uso do banheiro.


  1. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/quentes/412643/trt-2-nega-indenizacao-a-funcionaria-por-limitacao-no-uso-do-banheiro>. ↩︎

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