Defensoria Pública e Controle Concentrado de Constitucionalidade no STF

Defensoria Pública e Controle Concentrado de Constitucionalidade no STF

Sou o professor Marcos Gomes, Defensor Público do Estado de São Paulo, Coordenador da Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto e Especialista em Direito Público.

Trouxe abaixo uma análise para reflexão sobre o tema: Defensoria Pública e Controle Concentrado de Constitucionalidade no STF.

Panorama Constitucional:

            A legitimidade para as ações de controle concentrado de constitucionalidade perante o STF está disciplinada no art. 103 da Constituição Federal. Vejamos:

Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:      

I – o Presidente da República;

II – a Mesa do Senado Federal;

III – a Mesa da Câmara dos Deputados;

IV – a Mesa de Assembléia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;        

V – o Governador de Estado ou do Distrito Federal;        

VI – o Procurador-Geral da República;

VII – o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;

VIII – partido político com representação no Congresso Nacional;

IX – confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

Note que a Defensoria Pública, nos termos do art. 103, não possui legitimidade para ajuizar ações de controle concentrado perante o STF. O Supremo Tribunal Federal, por seu turno, considera que o referido rol é taxativo (ADI 1.875 AgR). Oportunamente destaca-se que, atualmente, está em trâmite no Congresso Nacional a PEC 31/2017, a qual almeja atribuir ao defensor público-geral federal poder para propor Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC).

Nova Interpretação defensorial:

        Hodiernamente, existe a necessidade de democratização do acesso da população vulnerável ao controle abstrato de constitucionalidade. Não por outro motivo, já há doutrina defensorial defendendo a legitimidade da Defensoria Pública para a propositura de ação de controle concentrado de constitucionalidade, a par da ausência de previsão constitucional explícita.

        Como se sabe, a Defensoria Pública é a instituição que possui a missão constitucional de tutelar os direitos humanos dos vulneráveis (art. 134, CF). Assim, defende-se a pluralização do debate constitucional aos vulneráveis por meio de um círculo aberto de intérpretes que alcance também os mais necessitados. Seguindo essa linha de raciocínio, levando-se também em consideração as evoluções jurídicas e sociais, a referida doutrina defende um processo de mutação constitucional do art. 103, da Constituição Federal, que não prevê representante da Defensoria Pública no rol de legitimados.

        Assim, não faria sentido a Defensoria Pública ser legitimada para ações coletivas e para provocar a edição, revisão ou cancelamento dos enunciados da súmula vinculante, mas não possuir legitimado para o controle abstrato de constitucionalidade. Como se não bastasse, imprescindível se faz uma equiparação com outras instituições essenciais a justiça, a exemplo da OAB e do Ministério Público, que possuem tal legitimidade. Imprescindível que o aluno conheça o presente posicionamento, notadamente para provas dissertativas e orais da Instituição. Seguindo essa linha de raciocínio, diante das argumentações acima expostas, bem como diante da normativa defensorial (art. 134, CF c/c LC n. 80/94, art. 4º, X e XI), defende-se a possibilidade de legitimação da instituição.

STF admite intervenção Custos Vulnerabilis:

Em nosso curso de Direito Constitucional para Defensorias[1], defendemos a possibilidade de intervenção custos vulnerabilis nos processos de controle concentrado de constitucionalidade perante o STF. A atribuição/função custos vulnerabilis, que não se confunde com a figura do amicus curiae, consiste em uma atuação ou intervenção constitucional, autônoma e institucional, que tem como objetivo garantir o acesso ao direito, equilibrar o contraditório e a ampla defesa, bem como promover os direitos humanos de pessoas ou grupos em situação de vulnerabilidade.

A referida intervenção foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 709[2]. Podemos destacar argumentos legais, interpretativos, hermenêuticos e doutrinários. Sublinhe-se:

  • Fundamento Legal: art. 134, CF (EC n. 80/94) c/c art. 4º, X e XI, LC n. 80/94.
  • Interpretação: máxima efetividade da Constituição e dos direitos humanos.
  • Hermenêutica: círculo aberto dos intérpretes e maior legitimidade democrática.
  • Doutrinário: concretização do acesso à justiça.

Na decisão do ministro relator acerca do ingresso da Defensoria Pública na ADPF n. 709, foram destacados alguns requisitos, os quais merecem uma atenção especial dos nossos leitores. Vejamos:

“Além disso, a doutrina vem exigindo, para o acolhimento do instituto, a presença de alguns requisitos, a saber: (i) a vulnerabilidade dos destinatários da prestação jurisdicional; (ii) o elevado grau de desproteção judiciária dos interesses que se pretende defender; (iii) a formulação do requerimento por defensores com atribuição para a matéria; e (iv) a pertinência da atuação com uma estratégia de cunho institucional, que se expressa na relevância do direito e/ou no impacto do caso sobre um amplo universo de representados8. Tais requisitos asseguram um uso razoável e não excessivo do instituto. Embora a análise de alguns deles compita à própria instituição, o Poder Judiciário em princípio poderá aferir, como etapa prévia à admissão do ingresso, ao menos os três primeiros acima elencados”[3].

Vale destacar que foi a Defensoria Pública da União quem solicitou a intervenção custos vulnerabilis na ADPF n. 109. A referida ação refere-se à proteção de terras e grupos indígenas, pessoas claramente em situação de vulnerabilidade. Assim, entende-se que, claramente, andou bem o ministro relator ao deferir a intervenção custos vulnerabilis da Defensoria Pública, pluralizando e democratizando eventual decisão da Corte Suprema.

Ademais, acreditamos que, diante da referida decisão, futuramente, poderá o Supremo Tribunal federal flexibilizar seu entendimento acerca do art. 103 da Constituição Federal, admitindo-se – nos termos das fundamentações apresentadas acima – a legitimidade defensorial para o ajuizamento das ações de controle concentrado de constitucionalidade perante a Suprema Corte.


[1] https://cj.estrategia.com/curso/defensoria-publica-pacote-teorico-2023-regular/?utm_source=google&utm_medium=cpc&utm_campaign=ecj-jur-vd-gsh-DSAECJ&gclid=EAIaIQobChMIn_icqNaAggMV78rCBB22Zw7PEAAYASAAEgJiP_D_BwE

[2] https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=515918&ori=1

[3] Disponível em https://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5952986. Acesso em 18 de outubro de 2023.

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