Defensoria Pública como custos vulnerabilis: A decisão mais importante do ano sobre defensorias

Defensoria Pública como custos vulnerabilis: A decisão mais importante do ano sobre defensorias

Defensoria Pública

* Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. Defensor Público do estado de São Paulo. Professor de Direito Constitucional do Estratégia Carreiras Jurídicas.

O STF, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 635 – Rio de Janeiro, por meio do voto do relator Edson Fachin, admitiu a Defensoria Pública como custos vulnerabilis. Trata-se de ação conhecida como ADPF das Favelas, que trata da letalidade policial no Rio de Janeiro.

A ação se refere a um pedido da Defensoria Pública para migrar da figura do amicus curiae para custos vulnerabilis, com o objetivo de garantir uma atuação mais abrangente, garantindo prerrogativas processuais ampliadas e em consonância com o caráter estrutural da presente ADPF.

Custos Vulnerabilis em Ação de Controle Concentrado

Em nosso curso de Direito Constitucional para Defensorias, defendemos a possibilidade de intervenção custos vulnerabilis nos processos de controle concentrado de constitucionalidade perante o STF.

A atribuição/função custos vulnerabilis, que não se confunde com a figura do amicus curiae, consiste em uma atuação ou intervenção constitucional, autônoma e institucional, que tem como objetivo garantir o acesso ao direito, equilibrar o contraditório e a ampla defesa, bem como promover os direitos humanos de pessoas ou grupos em situação de vulnerabilidade.


A referida intervenção foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal na ADPF n. 709 e, agora, na ADPF n. 635. Podemos destacar argumentos legais, interpretativos, hermenêuticos e doutrinários. Sublinhe-se:

  1. Fundamento Legal: Art. 134, CF (EC n. 80/94) c/c art. 4º, X e XI, LC n. 80/94.
  2. Interpretação: Máxima efetividade da Constituição e dos direitos humanos.
  3. Hermenêutica: Círculo aberto dos intérpretes e maior legitimidade democrática.
  4. Doutrinário: Concretização do acesso à justiça. 

    Na decisão do ministro relator acerca do ingresso da Defensoria Pública na ADPF n. 709, foram destacados alguns requisitos, os quais merecem uma atenção especial dos nossos leitores.

    Vejamos:

    “Além disso, a doutrina vem exigindo, para o acolhimento do instituto, a presença de alguns requisitos, a saber:

    (i) a vulnerabilidade dos destinatários da prestação jurisdicional;
    (ii) o elevado grau de desproteção judiciária dos interesses que se pretende defender; (iii) a formulação do requerimento por defensores com atribuição para a matéria; e
    (iv) a pertinência da atuação com uma estratégia de cunho institucional, que se expressa na relevância do direito e/ou no impacto do caso sobre um amplo universo de representados.

    Tais requisitos asseguram um uso razoável e não excessivo do instituto. Embora a análise de alguns deles compita à própria instituição, o Poder Judiciário em princípio poderá aferir, como etapa prévia à admissão do ingresso, ao menos os três primeiros acima elencados”.

    Vale destacar que foi a Defensoria Pública da União quem solicitou a intervenção custos vulnerabilis na ADPF n. 109. A referida ação refere-se à proteção de terras e grupos indígenas, pessoas claramente em situação de vulnerabilidade. Assim, entende-se que, claramente, andou bem o ministro relator ao deferir a intervenção custos vulnerabilis da Defensoria Pública, pluralizando e democratizando eventual decisão da Corte Suprema. 

    Ademais, acreditamos que, diante da referida decisão, futuramente, poderá o Supremo Tribunal federal flexibilizar seu entendimento acerca do art. 103 da Constituição Federal, admitindo-se – nos termos das fundamentações apresentadas acima – a legitimidade defensorial para o ajuizamento das ações de controle concentrado de constitucionalidade perante a Suprema Corte.

    Panorama Constitucional

    A legitimidade para as ações de controle concentrado de constitucionalidade perante o STF está disciplinada no art. 103 da Constituição Federal. Vejamos:

    Art. 103. Podem propor a ação direta de inconstitucionalidade e a ação declaratória de constitucionalidade:       
    
    I - o Presidente da República;
    
    II - a Mesa do Senado Federal;
    
    III - a Mesa da Câmara dos Deputados;
    
    IV - a Mesa de Assembleia Legislativa ou da Câmara Legislativa do Distrito Federal;         
    
    V - o Governador de Estado ou do Distrito Federal;         
    
    VI - o Procurador-Geral da República;
    
    VII - o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil;
    
    VIII - partido político com representação no Congresso Nacional;
    
    IX - confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional.

    Note que a Defensoria Pública, nos termos do art. 103, não possui legitimidade para ajuizar ações de controle concentrado perante o STF. O Supremo Tribunal Federal, por seu turno, considera que o referido rol é taxativo (ADI 1.875 AgR). Oportunamente destaca-se que, atualmente, está em trâmite no Congresso Nacional a PEC 31/2017, a qual almeja atribuir ao defensor público-geral federal poder para propor Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) e Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC).

    Nova Interpretação defensorial

    Hodiernamente, existe a necessidade de democratização do acesso da população vulnerável ao controle abstrato de constitucionalidade. Não por outro motivo, já há doutrina defensorial defendendo a legitimidade da Defensoria Pública para a propositura de ação de controle concentrado de constitucionalidade, a par da ausência de previsão constitucional explícita. 

    Como se sabe, a Defensoria Pública é a instituição que possui a missão constitucional de tutelar os direitos humanos dos vulneráveis (art. 134, CF).

    Assim, defende-se a pluralização do debate constitucional aos vulneráveis por meio de um círculo aberto de intérpretes que alcance também os mais necessitados.

    Seguindo essa linha de raciocínio, levando-se também em consideração as evoluções jurídicas e sociais, a referida doutrina defende um processo de mutação constitucional do art. 103, da Constituição Federal, que não prevê representante da Defensoria Pública no rol de legitimados. 

    Assim, não faria sentido a Defensoria Pública ser legitimada para ações coletivas e para provocar a edição, revisão ou cancelamento dos enunciados da súmula vinculante, mas não possuir legitimidade para o controle abstrato de constitucionalidade.

    Como se não bastasse, imprescindível se faz uma equiparação com outras instituições essenciais à justiça, a exemplo da OAB e do Ministério Público, que possuem tal legitimidade.

    Imprescindível que o aluno conheça o presente posicionamento, notadamente para provas dissertativas e orais da Instituição. Seguindo essa linha de raciocínio, diante das argumentações acima expostas, bem como diante da normativa defensorial (art. 134, CF c/c LC n. 80/94, art. 4º, X e XI), defende-se a possibilidade de legitimação da instituição.


    Referências

    ¹ Portal STF – ADPF 635

    ² STF amplia poderes da DPU em processo sobre proteção aos povos indígenas

    ³ Portal STF – Processo: ADPF/709

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