Candidato a prefeito preso por jogar dinheiro para eleitores no Amazonas

Candidato a prefeito preso por jogar dinheiro para eleitores no Amazonas

Imagine uma cena digna de filme: um candidato a prefeito, próximo das eleições, jogando dinheiro para a multidão em plena praça pública.

Parece surreal, não é?

Você pode ver o vídeo aqui:

Candidato a prefeito é preso por jogar dinheiro para eleitores no AM; veja.

Antigamente, dizem as más línguas, que isso acontecia direto… era prática corriqueira. Lá onde meus avós moram, em Tacaratu-PE, dizem que esse fato era bem normal nos interiores do nosso Brasil…

Pois foi exatamente o que aconteceu em Coari, no coração do Estado do Amazonas, deixando a comunidade jurídica e a população de cabelo em pé.

Isto porque, este episódio não apenas chocou os moradores locais, mas também acendeu um debate sobre os limites éticos e legais na busca pelo poder político.

Candidato a

Nessa linha, o protagonista dessa história, Dr. Raione Cabral, candidato a prefeito pelo partido Mobiliza, transformou um comício em um espetáculo controverso ao distribuir cédulas de dinheiro para potenciais eleitores.

Veja, o que ele talvez não esperasse era que esse gesto, aparentemente “generoso”, o levaria direto para “trás das grades”, isto porque, o candidato foi preso em flagrante.

Beleza, professor… passado essa notícia de fofoca…

Mas afinal, quais leis foram infringidas nesse ato de “fazer chover dinheiro”? Alguns colegas dirão, que esse episódio é típico do Silvio Santos.

E quais as possíveis consequências para o nosso candidato?

Veja, se ele fosse um apresentador de TV, não tinha problemas…

Agora, vamos entender as implicações desse caso que parece ter saído de um roteiro de série política, ou melhor, como diria meus avós, lá do interior de Pernambuco: “eita, rai da peste”…

Infrações ao Código Eleitoral

O primeiro e mais óbvio artigo do Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965) que parece ser violado é o famoso artigo 299, que trata da corrupção eleitoral.

Vamos dar uma olhada na letra da lei:

"Art. 299. Dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita:

Pena - reclusão até quatro anos e pagamento de cinco a quinze dias-multa."

Esse artigo é o pesadelo de qualquer candidato que pensa em “comprar” votos.

No caso do nosso “Robin Hood” eleitoral, a ação de jogar dinheiro se encaixa perfeitamente no “dar” ou “oferecer” mencionados no artigo.

Isto porque, o ato de “jogar dinheiro para eleitores” poderia ser interpretado como uma forma de “dar” ou “oferecer” vantagem pecuniária com o intuito de obter votos.

Mas e se ele apenas resolveu “dar dinheiro” sem pedir voto?

Não importa!

É importante ressaltar que, para a configuração deste crime, não é necessário que o eleitor efetivamente vote no candidato; basta a oferta com esta finalidade.

Já houve inclusive decisão do TRE afirmando: “não há necessidade de resultado naturalístico”.

É indiferente se a pessoa vai votar nele, ou se ele não pediu “diretamente” o voto do eleitor.

Ademais, o STF já decidiu que

“o crime de corrupção eleitoral ativa é crime instantâneo, cuja consumação é imediata, ocorrendo com a simples prática de um dos núcleos do tipo (dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber), bem como se qualifica como crime formal, pois a consumação independe do resultado, da efetiva entrega da benesse em troca do voto ou da abstenção, sendo irrelevante se o eleitor corrompido efetivamente votou no candidato indicado”.

(Agravo de Instrumento nº 20903, Acórdão, Relator(a) Min. Gilmar Ferreira Mendes, Publicação:  DJE – Diário de justiça eletrônico, Tomo  43, Data 05/03/2015, Página 44/45)

Numa situação parecida, o TRE-RS constatou que houve candidato enchendo o combustível do eleitor, incorrendo em crime do art. 299:

O tipo previsto no art. 299 do Código Eleitoral é crime formal, não necessitando da ocorrência do resultado naturalístico, como o efetivo voto ou abstenção em favor do corruptor. Exigido, outrossim, para sua caracterização, a presença do chamado dolo específico, que, no caso, é a intenção de obter ou dar voto ou prometer ou conseguir abstenção. No caso, o acusado, com a finalidade de obter votos para o seu irmão, ofereceu vantagem a eleitor, incidindo, assim, nas penas do delito de corrupção eleitoral. Comprovada, mediante provas documentais e testemunhais, a distribuição de vale-combustível em troca de voto em favor de candidato a vereador. Configuradas a materialidade e a autoria delitivas. Condenação. Provimento.

(TRE-RS – RC: 47594 TAPEJARA – RS, Relator: LUCIANO ANDRÉ LOSEKANN, Data de Julgamento: 18/09/2018, Data de Publicação: DEJERS – Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 172, Data 21/09/2018, Página 5)

E se ninguém pegou o dinheiro?

Também não importa. O Crime é formal, mesmo que as pessoas ali não tenham ligado, ele ofereceu. Trata-se de crime formal.

Calma, mas não para por aí. O artigo 237 do mesmo Código também pode ter sido infringido:

"Art. 237. A interferência do poder econômico e o desvio ou abuso do poder de autoridade, em desfavor da liberdade do voto, serão coibidos e punidos."

Esse artigo é mais amplo e trata do abuso do poder econômico, que parece ser exatamente o que aconteceu em Coari.

Além do Código Eleitoral, a Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) também tem algo a dizer sobre o assunto.

O artigo 41-A é particularmente relevante:

"Art. 41-A. Ressalvado o disposto no art. 26 e seus incisos, constitui captação de sufrágio, vedada por esta Lei, o candidato doar, oferecer, prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa de mil a cinquenta mil Ufir, e cassação do registro ou do diploma, observado o procedimento previsto no art. 22 da Lei Complementar no 64, de 18 de maio de 1990."

Possíveis punições

Agora, vamos ao que interessa: quais podem ser as consequências para nosso candidato “generoso”?

Como vimos, o artigo 299 do Código Eleitoral prevê pena de reclusão de até quatro anos. Além da prisão, há previsão de multa tanto no Código Eleitoral quanto na Lei das Eleições.

Por fim, é possível a cassação do registro de candidatura ou do diploma, isto porque, se eleito, o candidato pode ter seu diploma cassado.

Ademais, ainda podemos falar em inelegibilidade, veja que a Lei da Ficha Limpa (Lei Complementar nº 135/2010) prevê que condenados por corrupção eleitoral fiquem inelegíveis por 8 anos após o cumprimento da pena.

Em conclusão, o que parecia ser uma “chuva de bênçãos” para os eleitores de Coari pode se transformar em uma tempestade jurídica para o Dr. Raione Cabral.

Como o tema já caiu em concursos

CESPE - 2007 - DPU - Defensor Público Federal

A corrupção eleitoral é considerada um dos males dos processos eleitorais. O Código Eleitoral tipifica, no art. 299, esse delito. O Tribunal Superior Eleitoral e o STF têm consolidada jurisprudência a esse respeito. Quanto ao crime de corrupção eleitoral, julgue o item abaixo.

Trata-se de crime formal que independe de consumação. (Errado)

Comentário: aqui temos uma pegadinha.

O erro da assertiva talvez tenha mais relação com a parte geral de direito penal que com direito eleitoral penal.

O correto seria: “Trata-se de crime formal que independe de resultado“.

A questão diz que o crime formal independe de consumação, essa afirmação está errada.

O crime formal independe do resultado, mas depende que o agente realmente consuma o crime, no caso que dê, ofereça, prometa, solicite, receba… etc..

Os crimes materiais, são de ação e resultado, o momento consumativo é o da produção deste. Assim, consuma-se o homicídio com a morte da vítima. Já os crimes formais, a consumação ocorre com a ação da conduta típica, independentemente da produção do resultado descrito no tipo.

Em resumo: o CESPE mais uma vez com uma pegadinha super inteligente: confundindo CONSUMAÇÃO com RESULTADO. De fato, como bem explicado pelos colegas, o crime formal independe de “RESULTADO”, mas depende de CONSUMAÇÃO. Logo, o gabarito está CORRETO, pois o crime formal DEPENDE de consumação.

VUNESP - 2016 - Prefeitura de Rosana - SP - Procurador do Município

O crime de corrupção ativa e passiva eleitoral, tipificado no artigo 299 do Código Eleitoral, é

Alternativas

A) crime material, tem como objetividade jurídica o livre exercício do voto, caracteriza-se com a promessa de vantagem que precisa ser aceita e sua consumação depende do resultado das eleições.

B) crime formal, caracteriza-se com a promessa de vantagem que não precisa ser aceita, sendo necessária que a solicitação ou recebimento de dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem se vincule à promessa de voto e sua consumação independe do resultado das eleições.

C) crime formal, tem como objetividade jurídica o livre exercício do voto, caracteriza-se com a promessa de vantagem que não precisa ser aceita e sua consumação depende do resultado das eleições.

D) crime material, sendo desnecessária que a solicitação ou recebimento de dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem se vincule à promessa de voto e sua consumação independe do resultado das eleições.

E) crime formal, caracteriza-se com a promessa de vantagem que não precisa ser aceita, sendo desnecessária que a solicitação ou recebimento de dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem se vincule à promessa de voto e sua consumação independe do resultado das eleições.

Gabarito: B

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