Balão gigante causa destruição em São Paulo

Balão gigante causa destruição em São Paulo

Um balão gigante arrasta carro, pega fogo e cai, causando enormes estragos na zona leste de São Paulo, e deixando 400 mil pessoas sem energia.

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

Entenda o caso

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Um balão gigante caiu na Zona Leste de São Paulo, pegou fogo e atingiu imóveis, incluindo uma creche. Mas antes de cair, causou bastante destruição: arrastou e tombou um carro, ergueu uma moto até a fiação elétrica aérea de um poste e deixou 400 mil pessoas sem energia.

A prática de soltar balões é muito comum nessa época do ano, e é considerada um crime ambiental, previsto no artigo 42 da Lei de Crimes Ambientais. A pena é de detenção de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Também pode-se enquadrar essa prática como crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo, previsto no artigo 261 do Código Penal. A pena é de reclusão, de dois a cinco anos.

Para se ter uma ideia da gravidade do caso, o balão tinha nada mais nada menos que 75 metros de altura, equivalente a um prédio de 25 andares, e ainda carregava fogos de artifício.

Grupos de baloeiros intitulados “Sandu Mosaico” e “Balão Mágico & Domínio” foram apontados como os responsáveis pelo balão.

Os aeroportos de Congonhas e Guarulhos, na Grande São Paulo, registraram 30 ocorrências envolvendo balões nas áreas aeroportuárias somente de janeiro a julho de 2024.

Segundo a concessionária elétrica (ENEL), o balão afetou três linhas de alta tensão. Além disso, ele atingiu outros circuitos de média tensão também.

Análise jurídica

Agora que entendemos o que aconteceu, vamos analisar as repercussões jurídicas dos fatos.

Os balões juninos, de ar quente, inflamáveis e não tripulados, quando caem tem o potencial de provocar incêndios tanto na vegetação quanto em áreas urbanas (residências, comércio, órgãos públicos etc.). Em decorrência desse risco a legislação ambiental prevê o fato tanto como crime ambiental como infração administrativa ambiental.

Crime ambiental e infração administrativa ambiental

O crime ambiental está tipificado no artigo 42, da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98):

Lei nº 9.605/98

Art. 42. Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano:

Pena - detenção de um a três anos ou multa, ou ambas as penas cumulativamente.

Perceba que basta o simples fato de fabricar o balão para o agente incorrer no crime do artigo 42. Ou seja, o dano ambiental é irrelevante para a tipificação do fato. Trata-se de crime de perigo que pode, eventualmente, ocasionar danos, como o ocorrido em São Paulo.

Além do mais, o decreto nº 6.514/2008 também prevê o fato como infração administrativa ambiental no artigo 59:

Decreto nº 6.514/2008

Art. 59. Fabricar, vender, transportar ou soltar balões que possam provocar incêndios nas florestas e demais formas de vegetação, em áreas urbanas ou qualquer tipo de assentamento humano:

Multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais), por unidade.

Importante ressaltar que a responsabilidade ambiental possui fundamento no artigo 225, §3º da Constituição Federal:

CF/88

Art. 225...

§3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

O artigo 225, §3º da Constituição Federal, portanto, impõe aos infratores três espécies distintas de responsabilidades pelo dano ambiental, quais sejam:

balão, responsabilização ambiental

E essas instâncias de responsabilização são independentes uma das outras, ou seja, um mesmo fato pode atrair a tríplice responsabilização.

No caso do balão gigante de SP, o autor poderá responder por crime ambiental, infração administrativa ambiental e ainda ser condenado a reparar os danos causados (responsabilidade civil ambiental).

No Código Penal

Fugindo da legislação ambiental, ainda assim, também pode-se considerar o fato de soltar balões um crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo. Assim prevê o artigo 261, do Código Penal:

Código Penal

Art. 261 - Expor a perigo embarcação ou aeronave, própria ou alheia, ou praticar qualquer ato tendente a impedir ou dificultar navegação marítima, fluvial ou aérea:

Pena - reclusão, de dois a cinco anos.

O balão junino, ao ser solto, acaba por expor a perigo aeronave, além de dificultar a navegação aérea. Essa é uma das principais reclamações dos operadores aeroportuários nessa época do ano (período junino), o que pode atrair o tipo penal do artigo 261 do Código Penal.

O balão pode colidir com um avião ou um helicóptero, causando um desastre de enormes proporções, ou mesmo atrapalhar a visão dos pilotos, colocando em risco todo o voo.

Parte da doutrina advoga, ainda, que mesmo o fato de soltar balão sem fogo continua sendo crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo, haja vista que o risco para o transporte aéreo não se resume ao incêndio. A não dirigibilidade (falta de controle humano sobre o balão) já é suficiente para colocar o sistema de transporte aéreo em alerta.

“No entanto, a característica de não dirigibilidade dos balões sem fogo mantém íntegro o risco de acidente aeronáutico, em razão do lançamento de obstáculo no espaço aéreo, sem capacidade de controle humano.

Explico. A soltura de um balão de ar quente não dirigível representa a inserção de objeto perigoso no espaço aéreo, tendo em vista a ausência de controle da rota em que o mesmo irá trafegar, tanto que se emprega o verbo soltar, à medida que inexiste controle sob o artefato baloeiro após a sua liberação. Com isso, o Sistema de Controle do Espaço Aéreo tem que redobrar a atenção, assim como os aeronavegantes, no intuito de evitar uma colisão da aeronave com o balão.

O perigo decorre da probabilidade da ocorrência de impacto de um balão de ar quente com uma aeronave. Ainda que tal artefato tenha baixa densidade, a colisão pode representar situação catastrófica, em razão da velocidade em que geralmente se deslocam as aeronaves no nível de voo dos balões. O cenário torna-se ainda mais crítico se o balão atingir algum dos motores da aeronave, pois que as paletas compressoras de ar possuem alta velocidade circular, imprimindo maior energia à colisão…

Todos estes aspectos demonstram que o perigo baloeiro representa sério problema para aviação, gerando, no mínimo, dificuldade para a navegação aérea, tanto que torres de controle e notificações escritas de aeroportos emitem advertências aos aeronavegantes quanto à ocorrência de balões nas áreas de aproximação de aeroportos de São Paulo e Rio de Janeiro.” (Honorato, Marcelo, Soltura de balões sem fogo: a inconstitucionalidade de leis municipais que autorizam essa prática e a tipicidade criminal da conduta, R. TRF1 Brasília v. 26 n. 9/10 set./out. 2014)

Leis locais

Para essa parte da doutrina, que considera a soltura de balão sem fogo crime de atentado ao transporte aéreo, as leis locais que permitem tal prática são inconstitucionais, do ponto de vista formal, por invadirem a competência da União para legislar sobre direito aeronáutico, previsto no artigo 22, I, e por interferir no regime de navegação aeroespacial, previsto no artigo 22, X, ambos da Constituição Federal.

CF/88

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

...

X - regime dos portos, navegação lacustre, fluvial, marítima, aérea e aeroespacial;

Assim destaca o festejado Marcelo Honorato:

Sob essa ótica é que devem ser analisadas as normas municipais que vem autorizando a soltura de balões sem fogo, como a Lei 5.511, de 17 de agosto de 2012, do Município do Rio de Janeiro, portanto, o Poder Legislativo municipal legislando sobre Direito Aeronáutico, competência privativa da União…

É que da simples leitura da Lei Municipal 5.511/2012, observa-se que a norma ingressou em matéria típica de Direito Aeronáutico, pois permitiu a soltura de determinado tipo de balão no espaço aéreo, definiu as dimensões dos balões a figurarem no espaço aéreo e, por fim, estabeleceu os horários em que tais objetos poderão voar, ou seja, ingressarem e permanecerem no espaço aéreo.

Logicamente que não se está diante de norma que regula o uso do solo, essa sim, competência do Poder Legislativo municipal. Pelas características acima discriminadas, constata-se que os efeitos da lei municipal são produzidos inteiramente no espaço aéreo, criando direitos e deveres em relação ao uso de tal dimensão espacial, portanto, matéria típica de Direito Aeronáutico.

Além disso, a autorização de soltura de balões e a estipulação de horários para o voo de tais artefatos baloeiros interferem igualmente na operação dos demais vetores aéreos, consequentemente, representa inovação às regras de navegação aérea, cuja competência legislativa é também privativa da União Federal (art. 22, inciso X, da CF/1988).

Combate e punição

Portanto, deve-se combater e punir severamente a prática de soltar balões juninos, com ou sem fogo, tanto com a aplicação da legislação penal quanto da legislação administrativa, haja vista que coloca em risco o transporte aéreo, a vegetação e os núcleos urbanos, com alto potencial para desastres.

Já houve a cobrança do tema em provas de carreiras jurídicas, a exemplo da prova para Delegado de Pernambuco, de 2024. Portanto, muita atenção!


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