A Judicialização do Direito à Saúde

A Judicialização do Direito à Saúde

A Judicialização do Direito à Saúde

Os temas do direito constitucional à saúde têm ganhado especial relevância no sistema jurídico brasileiro nos últimos tempos. Desde a sua elevação a Direito Fundamental, com a Constituição de 1998, observa-se uma forte judicialização do direito à saúde.

Atualmente a jurisprudência tem atuado na definição dos contornos do direito à saúde brasileiro, criando uma verdadeira doutrina do direito à saúde por meio de seus precedentes, que direcionam a aplicação da legislação e a atuação dos gestores públicos.

Diante da grande atuação dos juízes, promotores, defensores e procuradores em ações relacionadas ao direito à saúde, esse tema tem sido frequente em provas objetivas e subjetivas das carreiras jurídicas de todo país.

Pensando nisso, compilamos neste artigo algumas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) referentes à promoção do Direito à Saúde, principalmente no que tange ao fornecimento de medicamentos, que serão úteis tanto para provas de concurso quanto para a atuação prática dos futuros aprovados.

A Judicialização do Direito à Saúde Pública

Vamos conhecer os principais temas relacionados à promoção da saúde pública que foram objeto de judicialização no direito brasileiro nos últimos tempos.

Fornecimento de Medicamentos pelo poder público

Via de regra, o poder público tem o dever de fornecer medicamentos para quem deles necessite. Esta regra diz respeito aos medicamentos incorporados em atos normativos do SUS. Existem situações excepcionais em que o Estado deve fornecer medicamentos mesmo que não sejam incorporados ao SUS e até mesmo sem registro na ANVISA, conforme entendimento fixado pelo STF e STJ.

Trata-se dos seguintes casos:

Medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS

STJ – TEMA 106

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

(i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento,  assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;

(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;

(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento (observados os usos autorizados por ela – vedou o uso off lable [situações de uso para casos que estão fora da bula – exceto se a própria ANVISA autorizar o uso off lable]).”).

Obs.1: cabe exceção quanto esse item, conforme veremos a frente.

Obs.2: fornecimento de medicamentos off lable:

a) SUS: em regra, o poder público não é obrigado a fornecer medicamento off label;

b) Saúde suplementar: em regra, o plano de saúde não pode negar tratamento prescrito pelo médico, mesmo sendo off label. STJ.

Obs.3: Nos embargos de declaração do julgado, houve duas mudanças importantes: o STJ modulou os efeitos da decisão supracitada, estabelecendo que:

a) Os três requisitos cumulativos estabelecidos no acórdão (REsp 1.657.156-RJ) são aplicáveis a todos os processos distribuídos na primeira instância a partir de 4/5/18;

b) Quanto aos processos pendentes, com distribuição anterior a 4/5/18, é exigível apenas um requisito que se encontrava sedimentado na jurisprudência do STJ: a demonstração da imprescindibilidade do medicamento.

Medicamentos sem registro na ANVISA

STF – TEMA 500

1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) impede, como regra geral, o fornecimento de medicamentos por decisão judicial.

3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da Anvisa em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos:

a) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultra raras);

b) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e

c) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.

4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na Anvisa deverão necessariamente ser propostas em face da União. STF. (Entendimento desse item está suspenso, sendo vedado o redirecionamento pelo juiz até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral).

Medicamentos com importação autorizada

STF – TEMA 1161

Em 2021, o STF criou mais uma exceção além daquelas elencadas no julgado acima (Tema 500), permitindo que medicamento não registrado na ANVISA seja importado onerosamente pelo interessado.

Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na Anvisa, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS. STF.

Medicamentos de alto custo

STF – TEMA 006

O STF fixou, em 11/03/20 que o Estado não é obrigado a fornecer judicialmente medicamentos de alto custo quando não estiverem previstos na relação do Programa de Dispensacão de Medicamentos em Caráter Excepcional do Sistema Único de Saúde SUS. Todavia, os ministros admitiram hipóteses excepcionais em que isso seria possível.

Poderes do juiz

Tratando-se de fornecimento de medicamentos, cabe ao Juiz adotar medidas eficazes à efetivação de suas decisões, podendo fixar multa diária (astreintes) e, se necessário, determinar sequestro de valores do devedor (bloqueio), segundo o seu prudente arbítrio, e sempre com adequada fundamentação. STJ.

O valor da multa cominatória imposta em razão do descumprimento da obrigação de fornecer tratamento e medicamentos adequados ao portador de doença grave deve ser revertido em favor do credor independentemente do recebimento de perdas e danos. É possível o reconhecimento do direito de sucessores ao recebimento de multa diária imposta em demandas cujo objetivo é a efetivação do direito à saúde, pois referido valor não se reveste da mesma natureza personalíssima que possui a pretensão principal, tratando-se de crédito patrimonial, portanto, transmissível aos herdeiros.

Também é possível conceder a antecipação dos efeitos da tutela contra a Fazenda Pública para obrigá-la ao fornecimento de medicamentos. STJ.

Ademais, a Administração Pública pode ser obrigada, por decisão do Poder Judiciário, a manter estoque mínimo de determinado medicamento utilizado no combate a certa doença grave, de modo a evitar novas interrupções no tratamento. Não há violação ao princípio da separação dos poderes no caso. Isso porque com essa decisão o Poder Judiciário não está determinando metas nem prioridades do Estado, nem tampouco interferindo na gestão de suas verbas.

O que se está fazendo é controlar os atos e serviços da Administração Pública que, neste caso, se mostraram ilegais ou abusivos já que, mesmo o Poder Público se comprometendo a adquirir os medicamentos, há falta em seu estoque, ocasionando graves prejuízos aos pacientes. STJ.

Processo Judicial

Nas ações em que se busca o fornecimento de medicamentos, a escolha do fármaco compete a médico habilitado e conhecedor do quadro clínico do paciente, podendo ser tanto um profissional particular quanto um da rede pública.

A substituição ou complementação do medicamento pleiteado na inicial não configura inovação do pedido ou da causa de pedir, mas mera adequação do tratamento para a cura da enfermidade do paciente. STJ

Não incorre em condenação genérica a decisão que determina ao Estado o fornecimento de medicamento especificado na inicial, bem como de outros que se mostrem necessários no decorrer do tratamento da doença objeto da ação, desde que devidamente comprovada a necessidade.

O STJ decidiu que, em ação civil pública na qual se postula medicamento para um específico paciente, revela-se possível, havendo pedido expresso, a prolação de decisão com eficácia erga omnes, permitindo que, posteriormente, cada paciente interessado, incumbindo-se do ônus de comprovar o seu enquadramento clínico à hipótese prevista no comando judicial, possa pleitear e obter o mesmo remédio nele indicado

Serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde

É constitucional o ressarcimento previsto no art. 32 da Lei nº 9.656/98 (cobrança das operadoras de saúde pelos serviços utilizados por seus consumidores em instituições integrantes do Sistema Único de Saúde), o qual é aplicável aos procedimentos médicos, hospitalares ou ambulatoriais custeados pelo SUS e posteriores a 4.6.1998, assegurados o contraditório e a ampla defesa, no âmbito administrativo, em todos os marcos jurídicos. STF.

O ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde. A tabela da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) deve servir de parâmetro para o pagamento dos serviços de saúde prestados por hospital particular, em cumprimento de ordem judicial, em favor de pacientes do SUS.

É constitucional a regra que veda, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, a internação em acomodações superiores, bem como o atendimento diferenciado por médico do próprio SUS, ou por médico conveniado, mediante o pagamento da diferença dos valores correspondentes. STF.

Legitimidade do MP em demandas de saúde

O Ministério Público é parte legítima para pleitear tratamento médico ou entrega de medicamentos nas demandas de saúde propostas contra os entes federativos, mesmo quando se tratar de feitos contendo beneficiários individualizados, porque se refere a direitos individuais indisponíveis, na forma do art. 1º da Lei n. 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público). (Tese julgada sob o rito do art. 1.036 do CPC/2015 – TEMA 766)

Bons estudos!

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Até o próximo artigo!

Ana Luiza Tibúrcio.

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