Tema 1.226 do STJ – O reconhecimento da natureza mercantil das Stock Options e as consequências para fins de imposto de renda

Tema 1.226 do STJ – O reconhecimento da natureza mercantil das Stock Options e as consequências para fins de imposto de renda

Stock Options

Em 18/09/2024, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu um novo entendimento sobre a natureza jurídica e a tributação dos planos de opção de compra de ações, conhecidos como stock options.

Ok, professor, mas o que são stock options? 

Definição de Stock Options

Stock options são programas oferecidos por empresas a seus executivos e funcionários, permitindo que estes comprem ações da companhia por um preço pré-determinado em uma data futura. 

Trata-se de um mecanismo de incentivo de longo prazo, utilizado pelas empresas para alinhamento de interesses entre os colaboradores e a organização. A ideia é que, ao se tornarem acionistas, os funcionários tenham maior interesse no sucesso da empresa, pois isso pode resultar na valorização das ações que eles adquirirem a preços mais baixos do que os de mercado.

Juridicamente, há previsão no art. 168 da Lei 6/404/1976:

Art. 168. O estatuto pode conter autorização para aumento do capital social independentemente de reforma estatutária.

§ 3º O estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembleia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.

Para fins de imposto de renda, a relevância das stock options está relacionada ao momento em que o benefício é exercido e ao fato de envolver remuneração indireta

Aspectos principais da tributação sobre stock options

A tributação sobre stock options pode ser analisada sob dois aspectos principais:

  1. Tributação como ganho de capital:
    Quando o funcionário exerce a opção de compra das ações, ele pode adquirir essas ações por um preço inferior ao valor de mercado. O lucro obtido na futura venda das ações. Ou seja, a diferença entre o preço de venda e o valor de compra (preço de exercício), poderá ser tributado como ganho de capital. O ganho de capital sobre ações está sujeito ao imposto de renda, conforme as alíquotas previstas para essas operações.
  2. Tributação como remuneração:
    Dependendo da estrutura do plano de stock options e da interpretação jurídica aplicada, o Supremo Tribunal Federal (STF) ou o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pode determinar que as stock options sejam consideradas parte da remuneração dos colaboradores, caso o benefício seja utilizado como substituto de salários. Nesse caso, o valor referente à diferença entre o preço de exercício e o valor de mercado no momento da concessão pode ser tributado como renda tributável, sujeita ao imposto de renda na fonte (IRRF), como ocorre com o salário e outros rendimentos.

Ok, agora vamos falar em termos financeiros, contábeis, o que muda, e o que esteve em jogo na discussão do STJ no Tema 1.226.

Entendimento da Fazenda Nacional – Tributação como remuneração

Até então, a Fazenda Nacional considerava os ganhos obtidos com stock options como rendimentos do trabalho “remuneração”.

Segundo essa visão, o fato gerador do imposto ocorria no momento do exercício da opção de compra das ações, quando o beneficiário adquiria as ações por um valor inferior ao de mercado.

Vamos analisar a diferença prática entre os dois entendimentos usando o cenário de venda por R$30,00 por ação:

Momento da tributação: No exercício da opção

Valor tributável: (R$30 – R$10) x 10.000 = R$200.000

Tributação: Como rendimento do trabalho, alíquotas do IRPF até 27,5%

Imposto devido: Até R$55.000 (27,5% de R$200.000)

Entendimento do STJ – Tributação como ganho de capital

Momento da tributação: Na venda das ações

Valor da venda: R$30 x 10.000 = R$300.000

Custo de aquisição: R$10 x 10.000 = R$100.000

Ganho de capital: R$300.000 – R$100.000 = R$200.000

Tributação: Como ganho de capital, alíquota de 15% a 22,5%

Imposto devido: Entre R$30.000 (15% de R$200.000) e R$45.000 (22,5% de R$200.000.

O que muda então? 

  • Momento da tributação: No entendimento da Fazenda, a tributação ocorre no exercício da opção. No entendimento do STJ, apenas na venda das ações.
  • Valor tributado: Coincidentemente, neste exemplo específico, o valor tributável é o mesmo (R$200.000). Porém, isso ocorre porque o preço de venda (R$30) é igual ao valor de mercado no momento do exercício da opção.
  • Alíquotas: Entretanto, a diferença nas alíquotas é patente. A Fazenda aplicaria as alíquotas progressivas do IRPF (até 27,5%). Enquanto o pensamento do STJ determina a aplicação das alíquotas de ganho de capital (15% a 22,5%) – que é bem menor.
  • Montante do imposto devido: No entendimento da Fazenda, o imposto poderia chegar a R$55.000. No entendimento do STJ, o imposto ficaria entre R$30.000 e R$45.000.

Argumentos jurídicos

Quais eram os argumentos da Fazenda Nacional (posição vencida):

Primeiramente,  a Fazenda Nacional argumentava veementemente que as stock options constituem, em essência, uma forma sofisticada de remuneração variável (natureza remuneratória)

O cerne desse argumento reside no fato de que esses planos são oferecidos exclusivamente em razão do vínculo empregatício ou da relação de trabalho existente entre a empresa e o beneficiário. Não se trata, portanto, de uma operação de mercado aberta a qualquer investidor, mas sim de um benefício restrito a um grupo seleto de colaboradores. Além disso, a Fazenda destacava que o objetivo primordial desses planos é recompensar e reter talentos, funções típicas de políticas remuneratórias. 

O fato de o valor do benefício estar atrelado ao desempenho da empresa e, consequentemente, à valorização de suas ações, não descaracterizaria sua natureza remuneratória, apenas o qualificaria como uma forma mais elaborada de participação nos lucros ou resultados.

Momento de incidência do imposto

Ademais, no entendimento da Fazenda Nacional, o momento crucial para a incidência do imposto de renda seria o exercício da opção de compra das ações (disponibilidade econômica). 

É nesse instante que se materializa um acréscimo patrimonial real e mensurável para o beneficiário, representado pela diferença entre o valor de mercado das ações e o preço de exercício pago.

Para ilustrar, imaginemos no nosso exemplo um executivo que recebe o direito de comprar ações a R$ 10, quando o valor de mercado é R$ 30. Ao exercer esse direito, ele imediatamente incorpora ao seu patrimônio um ganho de R$ 20 por ação.  A Fazenda argumentava que esse ganho, ainda que não realizado em espécie, já configura renda tributável, pois representa uma vantagem econômica concreta e quantificável.

Assim, esse pensamento se alinha com o conceito de disponibilidade econômica previsto no art. 43 do Código Tributário Nacional, que não exige a conversão imediata do ganho em dinheiro para que se configure o fato gerador do imposto de renda.

Isonomia tributária e riscos de postergar a tributação

De mais a mais, um dos pilares da argumentação fazendária era o princípio constitucional da isonomia tributária. A Fazenda sustentava que não tributar as stock options como rendimentos do trabalho criaria uma disparidade injustificável no tratamento fiscal de diferentes formas de remuneração.Por que, questionava a Fazenda, um bônus em dinheiro deveria ser tributado na fonte, enquanto um ganho potencialmente muito maior, obtido através de stock options, ficaria isento de tributação imediata? Essa diferenciação poderia levar a distorções no mercado de trabalho, incentivando empresas a estruturarem pacotes de remuneração de forma a minimizar a carga tributária de seus executivos, em detrimento da arrecadação e da justiça fiscal.

Lado outro, a Fazenda argumentava que postergar a tributação para o momento da venda das ações poderia resultar em situações onde grandes fortunas seriam acumuladas sem a devida contribuição fiscal. Isso porque o beneficiário poderia optar por manter as ações indefinidamente, usufruindo de dividendos e outros benefícios, sem nunca realizar o ganho de capital e, consequentemente, sem pagar o imposto correspondente.

Por fim, a Fazenda Nacional contestava veementemente a alegação de que as stock options envolveriam riscos equiparáveis aos de operações normais de mercado. O argumento era que os executivos e funcionários beneficiários desses planos possuem um conhecimento privilegiado sobre as perspectivas e estratégias da empresa, o que mitiga significativamente o risco do investimento.

Além disso, muitos planos de stock options são estruturados de forma a proteger o beneficiário contra quedas no valor das ações, seja através de períodos de carência flexíveis, possibilidade de reajuste no preço de exercício, ou outras cláusulas de salvaguarda. Essas características, na visão da Fazenda, descaracterizariam a natureza de risco típica das operações de mercado.

Entendimento do STJ sobre os Stock Options

O STJ, em sua decisão, reconheceu que os planos de stock options, apesar de oferecidos no contexto de uma relação de trabalho, possuem características intrínsecas que os aproximam mais de negócios mercantis do que de formas tradicionais de remuneração. 

O STJ indicou três elementos fundamentais:

  • Voluntariedade: A adesão ao plano é uma decisão do empregado, que pode optar por não participar sem prejuízo de sua relação de trabalho.
  • Onerosidade: Ao contrário de outras formas de remuneração, as stock options exigem um desembolso efetivo por parte do beneficiário para adquirir as ações.
  • Risco: O valor do benefício está sujeito às flutuações do mercado acionário, podendo resultar em ganhos expressivos ou em perdas para o participante.

Assim, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que esses elementos, em conjunto, conferem às stock options uma natureza híbrida, mais próxima de um investimento do que de uma simples remuneração.

Além disso, houve a constatação de que não existe, no ordenamento jurídico brasileiro, uma norma que enquadre explicitamente as stock options como remuneração para fins tributários. O tribunal argumentou que, em matéria tributária, a interpretação deve ser restritiva, não cabendo ao Judiciário criar hipóteses de incidência não previstas expressamente em lei.

Ademais, contrariando o entendimento da Fazenda Nacional, o STJ considerou que não há renda efetivamente realizada no momento do exercício das opções. O tribunal argumentou que, nesse momento, o beneficiário está apenas trocando dinheiro por ações, sem que haja um ingresso real de recursos em seu patrimônio.

Alinhamento com Práticas Internacionais e Impactos no Brasil

De outro lado, o STJ deu considerável peso ao argumento de que o tratamento das stock options como operações de natureza mercantil está mais alinhado com as práticas adotadas em outros países, especialmente nos Estados Unidos e em nações da União Europeia.

A Corte considerou que, em um mundo globalizado, onde empresas multinacionais frequentemente oferecem planos de stock options a executivos em diferentes países, é importante que o tratamento tributário brasileiro não destoe significativamente das práticas internacionais. Isso não só facilita a administração desses planos por parte das empresas, mas também torna o Brasil um destino mais atrativo para investimentos e para a atração de talentos internacionais.

Por fim, o STJ levou em conta as possíveis consequências práticas de sua decisão. A Corte entendeu que reconhecer a natureza mercantil das stock options, com a consequente postergação da tributação para o momento da venda das ações, pode incentivar a adoção mais ampla desses planos pelas empresas brasileiras.

IMPORTANTE! O STJ argumentou que os planos de stock options são uma ferramenta importante para alinhar os interesses de longo prazo dos executivos e funcionários aos dos acionistas, promovendo uma gestão mais responsável e focada na criação de valor sustentável. Além disso, em um cenário de crescente competição global por talentos, esses planos podem ser cruciais para que empresas brasileiras atraiam e retenham profissionais de alto nível.

Como o tema já caiu em concursos:

FGV – 2024 – AL-PR – Analista Legislativo – Advogado

Brenno, que trabalha em Colombo/PR, acertou com o empregador que parte da sua remuneração seria paga com stock options e o obreiro fez a opção pela compra. Tempos depois, quando Brenno optou pela venda porque necessitava de dinheiro para compromissos pessoais assumidos, acabou tendo prejuízo porque as contingências de mercado acabaram gerando uma tendência de baixa nas ações do seu empregador.

Considerando o caso retratado e o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, marque a alternativa correta.

a)O empregador deverá pagar a diferença a Brenno porque é seu o risco do negócio, não podendo transferi-lo.

b)O exercício de venda precisa ser feito em favor do próprio empregador, garantido no mínimo o preço da compra.

c)Brenno arcará com o prejuízo porque a stock options envolve pela sua natureza um risco. 

d)Eventual cláusula limitando período de aquisição ou de venda das ações pelo empregado será nula de pleno direito.

e)A empresa deverá arcar com metade do prejuízo experimentado por Brenno.

Gab: Letra C

De acordo com o entendimento do Tribunal Superior do Trabalho (TST), o plano de stock options tem caráter mercantil. E, portanto, os ganhos ou perdas resultantes não são considerados como remuneração salarial. Isso significa que o risco do negócio, neste caso, não é transferido para o empregador, e o empregado que opta pela compra e posterior venda das ações deve arcar com os riscos inerentes ao mercado.

Conclusão – Stock Options

Agora, fica mais fácil entender a tese do Tema 1.226 do STJ e suas consequências:

  • No regime do Stock Option Plan (art. 168, § 3º, da Lei n. 6.404/1976), porque revestido de natureza mercantil, não incide o imposto de renda pessoa física/IRPF quando da efetiva aquisição de ações, junto à companhia outorgante da opção de compra, dada a inexistência de acréscimo patrimonial em prol do optante adquirente.
  • Incidirá o imposto de renda pessoa física/IRPF, porém, quando o adquirente de ações no Stock Option Plan vier a revendê-las com apurado ganho de capital.

O STJ definiu que os planos de stock options têm natureza mercantil. Por esse motivo, são tributados com IRPF (Imposto de Renda Pessoa Física) sobre o ganho de capital no momento da venda das ações, pago pelo executivo. 

Nesse caso, a alíquota é de 15% para valores de até R$ 5 milhões.

A Fazenda Nacional defendia que esses planos fossem tratados como remuneração, com imposto cobrado pela tabela progressiva de zero a 27,5%, na folha de pagamento da empresa, no momento da compra dos mesmos papeis —junto com outros encargos salariais.

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