STJ define que menor de 18 anos não pode fazer exame EJA para concluir ensino médio e entrar na faculdade.
* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.
O Superior Tribunal de Justiça, em decisão recente e sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.127), estabeleceu que o menor de 18 anos não pode se submeter ao exame da Educação de Jovens e Adultos (EJA) para obter o certificado de conclusão do ensino médio e, assim, poder entrar mais cedo no nível superior. Muitos jovens têm utilizado esse atalho; assim, eles conseguem aprovação no concurso para ingresso na universidade antes de terminarem o ensino médio regular.
Para garantir segurança jurídica, entretanto, a Corte modulou o julgamento, preservando as decisões judiciais proferidas antes do julgamento do tema e que permitiram a inscrição do menor no EJA.
Vamos analisar melhor o que aconteceu.
Entendendo o caso
Um jovem aprovado no ensino superior precisa, necessariamente, ter concluído o ensino médio. Ocorre que, muitas vezes, esse jovem obtém a aprovação na faculdade mas ainda não conseguiu concluir o ensino médio. Isso o impede de cursar a universidade.
Nesses casos, esse menor se inscrevia no EJA para abreviar a conclusão do ensino médio e assim poder cursar o ensino superior sem problemas. Ele pegava, portanto, uma espécie de atalho para a faculdade.
A lei veda essa inscrição para menores de 18 anos, motivo pelo qual os jovens acabavam buscando o judiciário para obter a autorização da inscrição no sistema supletivo. Uma parte dos juízes concedia essa autorização e outra parte negava. Esse impasse interpretativo ocasionou a afetação do tema no STJ, a fim de resolver isso, de uma vez por todas.
Vamos entender um pouco esse tipo de ensino e o que decidiu o Superior Tribunal de Justiça.
EJA
O EJA (antigo exame supletivo) é uma modalidade de ensino da rede pública que abrange tanto o ensino fundamental quanto o ensino médio, e é destinada aos jovens, adultos e idosos que não tiveram acesso à educação na escola convencional na idade apropriada, ou seja, permite que o aluno retome os estudos e os conclua em menos tempo, possibilitando melhores condições de competição no mercado de trabalho, conforme previsto no artigo 37, da Lei nº 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB).
O EJA tem como diferencial a redução da carga horária, a utilização dos meios tecnológicos para reduzir a necessidade de aulas presenciais e o direcionamento para a educação técnica/profissional. Portanto, não equivale ao ensino regular.
Características
Temos, portanto:
EJA Ensino Fundamental: destinada a jovens a partir de 15 anos que não completaram a etapa entre o 1º e o 9° ano. Tem duração média de 2 anos para a conclusão, e é realizada pelas secretarias municipais ou estaduais de educação.
EJA Ensino Médio: destinada a alunos maiores de 18 anos que não completaram o Ensino Médio. Ao concluir essa etapa, o aluno está preparado para realizar provas de vestibular e Enem e para ingressar em universidades. O tempo médio de conclusão é de 18 meses, e é realizada pelas secretarias municipais ou estaduais de educação.
O artigo 38, da LDB, traz as idades mínimas para inscrição tanto no EJA ensino fundamental quanto no EJA ensino médio. Vejamos:
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular. § 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão: I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos; II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos. § 2º Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais serão aferidos e reconhecidos mediante exames.
Ou seja, pela letra fria da lei um menor de 18 anos não poderia se inscrever nesse sistema de educação. Ele foi pensado e concebido para acolher aqueles que não conseguiram acompanhar a evolução escolar. Ou seja, é direcionado àqueles que não concluíram o ensino médio na idade adequada. Enfim, o EJA ensino médio foi pensado para os maiores de 18 anos que querem concluir os estudos em um menor tempo.
Entendimentos do STJ
Muitos magistrados entendem que a legislação veda apenas a conclusão do EJA antes dos 18 anos, sendo possível, portanto, a inscrição inicial antes da maioridade. Para eles, impedir o ingresso do jovem menor de 18 anos no EJA pelo simples critério etário é uma medida discriminatória e, portanto, inconstitucional.
O STJ, entretanto, fixou entendimento (com caráter vinculante) diferente.
Vejamos os principais argumentos que serviram de base para a tese acima:
Argumentos
1º) Previsão legal expressa: o artigo 38 da LDB prevê que os exames supletivos devem ser apenas para pessoas maiores de 15 anos, no nível de conclusão do ensino fundamental, e para maiores de 18, no nível de conclusão do ensino médio;
2º) Regulamentação normativa: a Resolução CNE/CEB 3, de 15 de junho de 2010, do Ministério da Educação, prevê que o curso de educação de jovens e adultos do ensino médio se destina às pessoas maiores de 18 anos;
3º) Objetivo da norma: a educação de jovens e adultos tem por finalidade viabilizar o acesso ao ensino a quem não teve possibilidade de ingresso na idade própria e recuperar o tempo perdido, e não antecipar a possibilidade de jovens ingressarem na universidade;
4º) Separação dos poderes: não cabe ao Poder Judiciário desconsiderar a estrutura educacional planejada e desenvolvida no âmbito do Legislativo e do Executivo. Tal estrutura estabelece as diversas etapas do processo de formação escolar e tem o sistema EJA como uma exceção destinada àqueles que, por diferentes razões, não tiveram acesso ao ensino regular na idade adequada;
5º) Distinguishing entre o artigo 24 e o artigo 38, da LDB: o artigo 24 da LDB não faz referência à possibilidade de “saltos de séries educacionais” por simples vontade do estudante. O que está expresso no dispositivo é a possibilidade de a própria escola constatar que o aluno, em razão de sua maturidade pessoal e intelectual, tem aptidão para passar a um nível mais alto do que o previsto para a sua idade, independentemente de escolarização anterior. Nesses casos, a própria instituição de ensino, e não o Judiciário, avaliará o aprendizado e o aproveitamento de estudos concluídos com êxito, e definirá o nível ou a série adequada para o aluno.
LDB – arts. 24 e 38
Importante não confundir a previsão do artigo 24 com a previsão do artigo 38, ambos da Lei 9.394/1996. Vejamos:
Os arts. 24 e 38, ambos da Lei 9.394/1996, tratam de dois institutos diversos. Isso porque o art. 24 regulamenta a possibilidade de avanço nas séries por meio da aferição do rendimento, desenvolvimento e capacidade intelectual do aluno feito pela própria instituição de ensino. O art. 38, por sua vez, dispõe sobre educação de jovens e adultos que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria, podendo, para tanto, frequentar os cursos e exames supletivos.
Atalho negado
Com base nesses fundamentos o STJ considerou constitucional a limitação etária de 18 anos para a inscrição no EJA ensino médio. Assim, não há que se falar em restrição de acesso ao sistema educacional, muito menos em ofensa ao princípio da razoabilidade e da proporcionalidade.
Para o STJ, portanto, nada de atalho para ingressar no tão sonhado ensino superior!
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