Roubo impróprio: STJ define os limites do “logo depois” e revoluciona a aplicação do art. 157, §1º, do CP

Roubo impróprio: STJ define os limites do “logo depois” e revoluciona a aplicação do art. 157, §1º, do CP

Introdução: o erro de enquadramento que pode custar sua aprovação

Imagine a seguinte situação: um ladrão furta uma motocicleta estacionada na rua. A vítima presencia o crime e sai correndo imediatamente no encalço do autor. Após percorrer várias quadras, consegue alcançar o ladrão e segurá-lo firmemente para impedir a fuga. Nesse momento, o criminoso desfere um golpe violento na cabeça da vítima, solta-se e foge com o veículo.

A pergunta que separa candidatos aprovados de reprovados é: isso é roubo impróprio (art. 157, § 1º, CP) ou furto em concurso material com lesão corporal (art. 155 c/c art. 129, CP)? Se você respondeu "depende de quanto tempo passou entre o furto e a violência", você acertou parcialmente. Mas se não souber exatamente o que o STJ decidiu no Informativo 873 (AgRg no REsp 2.098.118-MG, outubro/2025), pode errar uma questão que vale pontos decisivos.

Por décadas, os Tribunais brasileiros divergiram radicalmente sobre essa questão. Alguns exigiam que a violência ocorresse praticamente no mesmo segundo da subtração. Outros admitiam intervalos maiores. O resultado? Caos jurisprudencial absoluto: casos idênticos recebiam tratamentos penais completamente diferentes dependendo da comarca, do juiz ou do Estado. Um réu podia ser condenado por roubo impróprio (pena de 4 a 10 anos) em São Paulo, enquanto outro, em situação idêntica, recebia condenação por furto + lesão corporal (penas bem menores) no Rio Grande do Sul.

Em outubro de 2025, o Superior Tribunal de Justiça finalmente pacificou a controvérsia. E a decisão surpreendeu até operadores experientes: o Tribunal adotou interpretação ampliativa da expressão “logo depois”, utilizando argumento hermenêutico sofisticado baseado na conexão sistemática com o instituto do flagrante presumido do Código de Processo Penal.

Essa decisão tem repercussão gigantesca para concursos de todas as carreiras jurídicas. Ela exige compreensão profunda da estrutura dogmática do roubo impróprio, domínio técnico da diferença entre roubo próprio e impróprio, conhecimento sobre quando se admite (ou não) violência imprópria, e capacidade de aplicar interpretação sistemática entre Código Penal e Código de Processo Penal — elementos que as bancas adoram cobrar.

Neste artigo, você vai dominar a estrutura completa do art. 157 do CP, compreender o critério definitivo fixado pelo STJ para o “logo depois”, e aprender a aplicar esse conhecimento em questões objetivas e peças práticas. Preparado para transformar conhecimento técnico em sua aprovação? Vamos começar.

A estrutura do art. 157 do CP: roubo próprio vs. roubo impróprio

O caput: roubo próprio e sua lógica estrutural

O art. 157, caput, do Código Penal estabelece: "Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa."

Este é o roubo próprio: a violência ou grave ameaça é empregada como meio para subtrair a coisa. A força viabiliza a apropriação. O agente usa intimidação ou agressão antes ou durante a subtração patrimonial. Há nexo instrumental direto: a violência serve para conseguir o bem.

Exemplo clássico de roubo próprio: João aborda Maria na rua, aponta uma faca e diz “me dá a bolsa ou te esfaqueio”. Maria, intimidada, entrega a bolsa. Sequência: grave ameaça → subtração. A ameaça viabilizou a apropriação.

Estrutura lógica do roubo próprio:

  1. Primeiro: violência ou grave ameaça
  2. Depois: subtração
  3. Nexo: a violência é o meio que viabiliza a subtração

O § 1º: roubo impróprio e sua lógica invertida

O art. 157, § 1º, do Código Penal prevê: "Na mesma pena incorre quem, logo depois de subtraída a coisa, emprega violência ou grave ameaça contra pessoa, a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro."

Este é o roubo impróprio: o crime começa como furto simples. O agente subtrai coisa alheia móvel sem empregar violência ou grave ameaça. Num segundo momento, após já consumado o furto, o agente emprega violência ou grave ameaça contra pessoa. Mas atenção: essa violência posterior não serve para subtrair (a subtração já ocorreu), mas sim para assegurar a impunidade ou garantir a posse da coisa.

Exemplo clássico de roubo impróprio: Pedro entra furtivamente em residência e subtrai notebook da mesa. Ao sair, é surpreendido pelo morador. Pedro empurra violentamente o morador, derrubando-o no chão, e foge com o notebook. Sequência: subtração → violência. A violência assegurou a fuga e manteve a posse.

Estrutura lógica do roubo impróprio:

  1. Primeiro: subtração (furto consumado)
  2. Depois: violência ou grave ameaça (“logo depois”)
  3. Nexo: a violência visa assegurar impunidade ou garantir posse

Quadro comparativo essencial

AspectoRoubo próprio (caput)Roubo impróprio (§ 1º)
Ordem dos eventosViolência/ameaça → SubtraçãoSubtração → Violência/ameaça
Momento da violênciaAntes ou durante a subtraçãoDepois da subtração
Finalidade da violênciaViabilizar a subtraçãoAssegurar impunidade ou posse
Crime inicialJá nasce como rouboComeça como furto
Violência própria✓ Admitida✓ Admitida
Grave ameaça✓ Admitida✓ Admitida
Violência imprópria✓ Admitida✗ Não admitida
Exemplo típicoAssalto à mão armadaFurto seguido de agressão ao perseguidor

A grande confusão: grave ameaça também configura roubo impróprio

Um erro comum de candidatos é pensar que o roubo impróprio exige necessariamente violência física. Isso é falso. O § 1º é claro: “emprega violência ou grave ameaça. Portanto, se o ladrão, após consumar o furto, ameaça a vítima que tenta detê-lo, há roubo impróprio.

Exemplo de grave ameaça no roubo impróprio: Marcos furta celular de dentro de carro estacionado. O proprietário chega e tenta impedir a fuga. Marcos saca faca, aponta e diz “se vier atrás de mim, eu volto e te esfaqueio”. O proprietário, intimidado, não persegue. Marcos foge. Resultado: roubo impróprio por grave ameaça posterior à subtração.

O que é violência imprópria e por que NÃO cabe no roubo impróprio

⚠️ Atenção para concursos: Este é um ponto técnico que pode definir uma questão.

A doutrina distingue:

Violência própria: Agressão física direta contra a pessoa (socos, chutes, empurrões, estrangulamento). Admitida tanto no roubo próprio quanto no impróprio.

Violência imprópria: Emprego de meios químicos, farmacológicos ou outros artifícios que reduzem ou anulam a capacidade de resistência da vítima, deixando-a inconsciente ou sem condições de reagir (soníferos, clorofórmio, “boa noite Cinderela”). Admitida apenas no roubo próprio.

Por que violência imprópria não cabe no roubo impróprio?

Porque a violência imprópria tem como objetivo anular a resistência da vítima para viabilizar a subtração. Ela é um meio que deve ser empregado antes ou durante a apropriação, nunca depois. Uma vez consumado o furto, não faz sentido lógico nem cronológico empregar violência imprópria — a vítima já não está em condições de resistir e o bem já foi subtraído.

Exemplo ilustrativo: Imagine que alguém furte um relógio e, ao ser perseguido, jogue clorofórmio na vítima para desmaiar e garantir a fuga. Além de improvável (violência imprópria exige preparação e tempo), essa conduta é dogmaticamente inadequada ao roubo impróprio, pois a violência imprópria está conceitualmente ligada à ideia de viabilizar a subtração, não de garantir a fuga posterior.

Portanto, no roubo impróprio (§ 1º), cabem: ✓ Violência própria (agressão física direta) ✓ Grave ameaça (intimidação verbal, exibição de arma)

Não cabe: ✗ Violência imprópria (meios químicos, farmacológicos)

O elemento finalístico indispensável

⚠️ Ponto crucial: A violência ou grave ameaça posterior deve ser empregada “a fim de assegurar a impunidade do crime ou a detenção da coisa para si ou para terceiro”. Esse elemento finalístico é indispensável para configurar roubo impróprio.

roubo impróprio

Se a violência posterior tiver qualquer outro objetivo (vingança, raiva, humilhação), não haverá roubo impróprio, mas furto em concurso com lesão corporal.

Exemplo de ausência do elemento finalístico: Roberto furta carteira de Antônio em ônibus. Horas depois, encontram-se casualmente. Antônio o reconhece e chama-o de ladrão. Roberto, irritado, agride Antônio. Resultado: Furto consumado + lesão corporal (não há roubo impróprio porque a violência não visava assegurar impunidade ou posse — o furto já estava consumado há horas e não havia perseguição).

Exemplo com elemento finalístico presente: Mesma situação, mas Antônio tenta segurar Roberto e gritar por ajuda para chamar a polícia. Roberto agride Antônio para se soltar e fugir. Resultado: Roubo impróprio (a violência visava assegurar a impunidade, evitando detenção).

O problema do “logo depois”: conceito jurídico indeterminado que gerou caos

A divergência jurisprudencial que dividiu o Brasil

A expressão “logo depois” do art. 157, § 1º, é um típico conceito jurídico indeterminado que exige preenchimento valorativo. A lei não estabelece se significa segundos, minutos, horas ou dias. Durante décadas, essa lacuna gerou três correntes radicalmente divergentes:

Corrente ultrarestritiva (minoritária): Exigia imediatidade absoluta. A violência deveria ocorrer praticamente no mesmo instante da subtração, no mesmo contexto espacial, sem qualquer solução de continuidade. Qualquer intervalo superior a poucos segundos descaracterizava o roubo impróprio.

Exemplo prático: Ladrão furta notebook em biblioteca. Vítima percebe, corre atrás. O ladrão desce três lances de escada, vítima o alcança no térreo (1 minuto depois), ladrão a empurra. Para essa corrente: 1 minuto já descaracteriza o “logo depois” → furto + lesão corporal.

Corrente intermediária (majoritária): Admitia algum lapso temporal, desde que houvesse razoabilidade e continuidade situacional. Analisava caso a caso. Se houvesse perseguição ininterrupta por algumas quadras, a violência ainda seria “logo depois”.

Exemplo prático: Ladrão furta mochila em praça. Vítima persegue por quatro quarteirões gritando “pega ladrão!” (3-4 minutos). Ladrão é encurralado, desfere soco e foge. Para essa corrente: Ainda é “logo depois” porque houve perseguição contínua → roubo impróprio.

Corrente ampliativa (progressista): Defendia que “logo depois” abrangeria todo o período de flagrância, baseando-se no conceito de flagrante presumido do CPP (art. 302, IV). Enquanto o agente estivesse sendo perseguido ou em situação que presumisse autoria, a violência seria “logo depois”.

Exemplo prático: Ladrão furta carro às 14h. Quinze minutos depois, policiais o localizam dirigindo o veículo. Durante perseguição, joga carro contra viatura, causando lesões. Para essa corrente: Ainda é “logo depois” porque estava em flagrante presumido → roubo impróprio.

O resultado prático: insegurança jurídica total

A divergência era devastadora. Um mesmo fato concreto recebia enquadramentos completamente diferentes:

  • Estado A: Roubo impróprio (pena de 4 a 10 anos)
  • Estado B: Furto + lesão corporal (penas bem menores em concurso material)

Réus em situações idênticas recebiam penas completamente diferentes. Promotores não sabiam qual crime denunciar. Defensores exploravam a insegurança para pleitear desclassificações. Juízes ficavam sem parâmetros.

A decisão do STJ: interpretação sistemática que mudou tudo

O caso concreto que chegou ao STJ

Fatos: O réu furtou motocicleta da vítima. A vítima presenciou e imediatamente saiu no encalço. Posteriormente (com lapso temporal suficiente para deslocamento), a vítima conseguiu alcançar o réu e detê-lo fisicamente para impedir a fuga. Nesse momento, o réu desferiu golpe violento na cabeça da vítima e fugiu com a motocicleta.

Decisão do Tribunal de origem: Desclassificou de roubo impróprio para furto + lesão corporal, entendendo que o lapso temporal era incompatível com “logo depois”.

Recurso do MP ao STJ: Sustentou que havia roubo impróprio, pois houve perseguição contínua e a violência visava assegurar impunidade.

Decisão do STJ (Quinta Turma, por unanimidade): Deu razão ao MP, reformou o acórdão estadual e restabeleceu a condenação por roubo impróprio.

A tese que revolucionou o tema

O Ministro Messod Azulay Neto fixou o seguinte entendimento (Informativo 873):

"A expressão 'logo depois' utilizada no art. 157, § 1º, do Código Penal não exige que a violência ocorra imediatamente após a subtração, admitindo-se algum lapso temporal entre os eventos, desde que vise garantir a posse do bem ou a impunidade do delito."

Consequências práticas da tese:

  1. Afasta definitivamente a interpretação ultrarestritiva que exigia imediatidade absoluta
  2. Estabelece critério objetivo: O que importa não é quanto tempo passou, mas se a violência visava assegurar impunidade ou posse
  3. O elemento temporal cede lugar ao elemento finalístico como critério decisivo
  4. Admite-se lapso temporal desde que haja continuidade situacional e finalidade específica

Aplicação prática: Ladrão furta laptop em café. Vítima persegue por seis quarteirões (5 minutos), encontra-o em estacionamento tentando se esconder. Vítima tenta segurá-lo. Ladrão ameaça com chave de fenda: “solta ou eu te furo”. Vítima solta, ladrão foge. Resultado pela tese do STJ: Roubo impróprio (embora 5 minutos, houve perseguição contínua e ameaça visava assegurar impunidade).

O argumento hermenêutico decisivo: conexão com flagrante presumido

O grande diferencial da decisão foi utilizar interpretação sistemática entre Código Penal e Código de Processo Penal.

O raciocínio do STJ:

O art. 302, inciso IV, do CPP utiliza exatamente a mesma expressão "logo depois" ao definir flagrante presumido: "Considera-se em flagrante delito quem é perseguido, logo depois, pela autoridade, pelo ofendido ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser autor da infração."

⚠️ Ponto crucial: No contexto do flagrante presumido, ninguém sustenta que “logo depois” exige imediatidade absoluta. A jurisprudência pacífica admite prisão em flagrante presumido mesmo horas após o crime, desde que haja perseguição ou situação que presuma autoria.

Exemplos de flagrante presumido com lapso temporal:

Caso 1: 14h – furto em supermercado. 14h40 (40 minutos depois) – suspeito localizado a 3 km, com mercadorias, sendo acompanhado por funcionários. Prisão válida em flagrante presumido.

Caso 2: 22h – furto de joias em residência. 23h30 (1h30 depois) – suspeito encontrado em sua casa com as joias. Prisão válida em flagrante presumido.

A lógica perfeita do argumento sistemático

Premissa 1: O CPP usa “logo depois” no art. 302, IV (flagrante presumido) e admite lapso temporal significativo

Premissa 2: O CP usa “logo depois” no art. 157, § 1º (roubo impróprio)

Premissa 3: O ordenamento jurídico é uno e coerente; a mesma expressão deve ter sentido harmônico em diferentes diplomas

Conclusão: Se “logo depois” no CPP admite lapso temporal, “logo depois” no CP também deve admitir

Aplicação ao caso concreto: O réu que furtou a motocicleta foi perseguido pela vítima e foi encontrado “logo depois”. Se ele podia ser preso em flagrante presumido naquele momento (art. 302, IV, CPP), então a violência empregada naquele mesmo momento também é “logo depois” para fins de roubo impróprio (art. 157, § 1º, CP). A coerência sistemática é perfeita.

Esse argumento de interpretação sistemática foi o grande diferencial. O STJ não apenas decidiu o caso, mas ofereceu fundamento dogmático robusto que dá coerência ao sistema penal como um todo.

O novo critério: finalidade, não cronômetro

A mudança de paradigma na análise

Antes da decisão do STJ: Primeira pergunta = Quanto tempo passou?

Depois da decisão do STJ: Primeira pergunta = Qual era a finalidade da violência?

Exemplos comparativos para fixar o novo critério

Situação A: Ladrão furta celular. 2 minutos depois, ao ser alcançado pela vítima que tenta detê-lo, empurra violentamente e foge. → Roubo impróprio (pouco tempo + finalidade de assegurar impunidade)

Situação B: Ladrão furta celular. 10 minutos depois, ao ser alcançado pela vítima em perseguição contínua, empurra violentamente e foge. → Roubo impróprio (mais tempo, mas continuidade situacional + finalidade de assegurar impunidade)

Situação C: Ladrão furta celular e consegue fugir completamente. 3 dias depois, encontra vítima na rua. Vítima o reconhece e xinga. Ladrão, irritado, agride. → Furto + lesão corporal (muito tempo + ausência de continuidade + finalidade diversa — agressão por raiva, não para assegurar impunidade)

Situação D (limítrofe): Ladrão furta celular, chega em casa. 1 hora depois, vítima descobre onde ele mora e vai até lá tentar recuperar. Ladrão ameaça com faca para impedir entrada. → Controvérsia (lapso maior + mudança de contexto espacial, MAS ameaça visa garantir posse. Pela tese do STJ, poderia ser roubo impróprio se finalidade persiste. Defesa argumentaria rompimento de continuidade)

Situações limítrofes que podem cair em sua prova

Caso 1 — Violência contra terceiro: Ladrão furta bolsa. Vítima grita por ajuda. Transeunte tenta deter. Ladrão empurra violentamente o transeunte (não a vítima) e foge. → É roubo impróprio? SIM. Violência não precisa ser contra vítima do furto; pode ser contra qualquer pessoa que impeça fuga ou recuperação. Elemento finalístico presente.

Caso 2 — Grave ameaça verbal: Ladrão furta notebook em biblioteca. Segurança tenta barrar saída. Ladrão diz “sai da frente ou eu volto e acabo com você”. Segurança, intimidado, deixa passar. → É roubo impróprio? SIM. Grave ameaça posterior à subtração, com finalidade de assegurar impunidade. Não requer violência física.

Caso 3 — Violência sem finalidade específica: Ladrão furta carteira e consegue fugir completamente. Horas depois, vítima o encontra casualmente e confronta verbalmente. Ladrão, nervoso, agride. → É roubo impróprio? NÃO. Falta elemento finalístico. Violência não visava assegurar impunidade (já havia fugido) nem garantir posse (já estava com carteira há horas). Furto consumado + lesão corporal.

Caso 4 — Tentativa de roubo impróprio: Ladrão furta relógio. Vítima persegue. Ladrão tenta agredir para fugir, mas vítima desvia e consegue detê-lo com ajuda de terceiros. → É tentativa de roubo impróprio? SIM. Furto consumou, mas roubo impróprio ficou na tentativa (violência empregada mas não alcançou objetivo).

Conexão com concursos: questão simulada comentada

(Banca Simulada — Estilo CESPE/FCC — Magistratura/MP/Delegado)

Carlos subtraiu bicicleta estacionada em frente a lanchonete. Roberto, proprietário, percebeu o furto e imediatamente saiu no encalço. Após percorrer aproximadamente quatro quarteirões, Roberto conseguiu alcançar Carlos e segurou seu braço firmemente para impedir a fuga. Nesse momento, Carlos, com o objetivo de evitar sua detenção, empurrou Roberto violentamente, causando queda ao solo e lesões corporais de natureza leve. Carlos então fugiu levando a bicicleta. Minutos depois, foi preso em flagrante presumido por policiais.

Com base na decisão do STJ no Informativo 873 (AgRg no REsp 2.098.118-MG, julgado em 29/10/2025), assinale a alternativa CORRETA sobre a qualificação jurídica da conduta:

(A) A conduta configura roubo próprio (art. 157, caput, CP), pois houve emprego de violência durante a ação criminosa, independentemente do momento específico em que foi empregada em relação à subtração.

(B) A conduta deve ser qualificada como furto (art. 155, CP) em concurso material com lesão corporal (art. 129, CP), pois o lapso temporal de quatro quarteirões entre a subtração e a violência é incompatível com a expressão "logo depois" prevista no art. 157, § 1º, do Código Penal.

(C) A conduta configura roubo impróprio (art. 157, § 1º, CP), pois a expressão "logo depois" não exige imediatidade absoluta, admitindo-se lapso temporal entre a subtração e a violência, desde que esta vise assegurar a impunidade do crime ou garantir a posse da coisa, conforme interpretação sistemática com o flagrante presumido do art. 302, IV, do CPP.

(D) A conduta configura apenas furto qualificado (art. 155, § 4º, CP), pois a violência empregada após a consumação do furto não tem o condão de alterar a tipificação do delito patrimonial já consumado.

(E) Não houve roubo impróprio porque Carlos empregou violência própria (empurrão), quando o tipo penal do art. 157, § 1º, só admite violência imprópria (meios químicos ou farmacológicos) ou grave ameaça na modalidade imprópria.

GABARITO: LETRA C

Por que a alternativa C está correta:

Esta é a aplicação exata da tese do Informativo 873. O enunciado apresenta todos os elementos do roubo impróprio:

  1. Subtração inicial (furto da bicicleta)
  2. Violência posterior (empurrão que causou lesões)
  3. Finalidade específica expressa (“com o objetivo de evitar sua detenção” = assegurar impunidade)
  4. Lapso temporal admissível segundo o STJ (quatro quarteirões com perseguição contínua)

A alternativa menciona corretamente o fundamento da interpretação sistemática com o flagrante presumido do CPP, que foi o argumento-chave do STJ. Além disso, o próprio enunciado reforça: Carlos foi preso em flagrante presumido minutos depois — se o CPP admite “logo depois” com esse intervalo, o CP também admite no mesmo contexto.

Aplicação prática: Se você fosse o juiz, deveria condenar Carlos por roubo impróprio (art. 157, § 1º), fundamentando na decisão do STJ e explicando que o lapso de quatro quarteirões não afasta o crime porque houve perseguição contínua e a violência visava assegurar a impunidade.

Por que as demais estão incorretas:

Alternativa A — INCORRETA: Demonstra incompreensão da diferença estrutural entre roubo próprio e impróprio. O roubo próprio exige que violência ou grave ameaça seja empregada como meio para subtrair. No caso, Carlos primeiro subtraiu (furto) e somente depois empregou violência quando foi detido. A violência não foi meio para subtrair — veio posteriormente para evitar captura. Isso caracteriza roubo impróprio, não próprio.

Sequência que configura roubo próprio: Violência → subtração Sequência do caso: Subtração → violência = roubo impróprio

Alternativa B — INCORRETA: Esta era exatamente a interpretação que o STJ rejeitou no Informativo 873. O Tribunal de origem havia desclassificado para furto + lesão corporal com base no lapso temporal, mas o STJ reformou a decisão. A tese aprovada é clara: “a expressão ‘logo depois’ não exige que a violência ocorra imediatamente após a subtração, admitindo-se algum lapso temporal“.

O percurso de quatro quarteirões, por si só, não descaracteriza o roubo impróprio quando há:

• Continuidade situacional (perseguição ininterrupta)
• Violência visando assegurar impunidade
    Detalhe importante: O enunciado menciona que Carlos foi preso em flagrante presumido minutos depois, reforçando a tese do STJ: se o CPP admite flagrante "logo depois" com esse intervalo, o CP também admite violência "logo depois" no mesmo contexto.

    Alternativa D — INCORRETA: Contém dois erros graves:

    Primeiro erro: Não existe “furto qualificado” pela violência posterior. As qualificadoras do furto (§ 4º) são:

    • Destruição/rompimento de obstáculo
    • Abuso de confiança
    • Fraude, escalada ou destreza
    • Chave falsa
    • Concurso de pessoas

    Violência posterior não é qualificadora do furto.

    Segundo erro: A violência empregada “logo depois” da subtração, com finalidade de assegurar impunidade ou posse, transforma retroativamente o crime de furto em roubo impróprio, por expressa previsão legal (art. 157, § 1º). A consumação do furto não impede essa transformação — ao contrário, é exatamente isso que caracteriza o roubo impróprio: um furto que se transforma em roubo pela violência superveniente.

    Analogia didática: É como se o crime “nascesse” furto mas “crescesse” e se tornasse roubo quando a violência é empregada com a finalidade específica do tipo.

    Alternativa E — INCORRETA: Esta alternativa inverte completamente a realidade jurídica e tenta confundir com conceitos técnicos.

    Como explicado na parte teórica, o roubo impróprio admite tanto violência própria quanto grave ameaça, conforme expressamente previsto no § 1º do art. 157 ("emprega violência ou grave ameaça").
    O que NÃO se admite no roubo impróprio é a violência imprópria (meios químicos, farmacológicos), pois essa modalidade só faz sentido antes ou durante a subtração (para anular resistência e viabilizar apropriação), não depois.

    Exemplos corretos:

    • Carlos ameaçar Roberto verbalmente (“sai ou eu te mato”) = roubo impróprio ✓
    • Carlos jogar clorofórmio em Roberto antes de furtar = roubo próprio com violência imprópria ✓
    • Carlos empurrar Roberto depois do furto = violência própria no roubo impróprio ✓

    Memorização estratégica para sua prova

    Quadro-resumo: art. 157 do CP

    DispositivoNomeEstruturaLapso temporal
    CaputRoubo próprioViolência → SubtraçãoNão se aplica
    § 1ºRoubo impróprioSubtração → Violência“Logo depois” = admite intervalo (STJ)

    Checklist mental para análise

    🟧 Passo 1: Identificar a ordem cronológica

    • Violência antes/durante subtração? → Roubo próprio
    • Subtração antes, violência depois? → Roubo impróprio (se preenchidos requisitos)

    🔶 Passo 2: Verificar o elemento temporal

    • Houve perseguição contínua? → Favorece roubo impróprio
    • Rompimento total de continuidade? → Favorece furto + lesão

    🟧 Passo 3: Verificar o elemento finalístico (DECISIVO)

    • Violência visava assegurar impunidade ou posse? → Roubo impróprio
    • Violência tinha outra motivação? → Furto + lesão

    🔶 Passo 4: Aplicar interpretação sistemática

    • Seria flagrante presumido naquele momento? (art. 302, IV, CPP)
    • Se SIM → também é “logo depois” para roubo impróprio

    O que você DEVE memorizar

    “Logo depois” não exige imediatidade — admite lapso temporal (Informativo 873, STJ)

    Critério decisivo: Finalidade da violência (assegurar impunidade ou posse), não cronômetro

    Fundamento: Interpretação sistemática com flagrante presumido (art. 302, IV, CPP)

    Roubo impróprio admite: Violência própria + grave ameaça

    Roubo impróprio NÃO admite: Violência imprópria (meios químicos)

    Conclusão: o conhecimento que vale pontos decisivos

    A decisão do STJ no Informativo 873 reúne todos os elementos que bancas examinadoras adoram: é recente (outubro/2025), envolve tema clássico (roubo), resolve controvérsia antiga, traz fundamento dogmático sofisticado (interpretação sistemática CP-CPP), e tem enorme repercussão prática.

    Dominar essa decisão não significa apenas decorar a tese. Significa compreender:

    • A distinção estrutural entre roubo próprio e impróprio
    • Por que violência imprópria não cabe no roubo impróprio
    • O critério finalístico como elemento decisivo
    • O argumento hermenêutico do flagrante presumido

    Esse conhecimento multidimensional é o que separa candidatos medianos de candidatos aprovados.

    Quando você estiver diante da sua prova e surgir questão sobre roubo, lembre-se: não procure o cronômetro, procure a finalidade. E se o examinador mencionar “logo depois”, conecte mentalmente com o flagrante presumido. Essa associação mental, que poucos candidatos farão, pode ser o diferencial entre acertar e errar uma questão que vale pontos preciosos para sua aprovação.


    Quer saber quais serão os próximos concursos?

    Confira nossos artigos para Carreiras Jurídicas!
    0 Shares:
    Você pode gostar também