Responsabilidade de empresa aérea por morte de pet. Entenda!

Responsabilidade de empresa aérea por morte de pet. Entenda!

Cachorro morre em voo da Gol. E agora, qual a responsabilidade da empresa?

Olá, pessoal!

Sou o professor Thiago Leite, procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia Carreiras Jurídicas e trouxe abaixo alguns pontos sobre o tema: Responsabilidade de empresa aérea por morte de pet.

Uma recente e triste notícia povoou o noticiário em nosso país: a morte do cãozinho Joca, um Golden Retriever de 4 anos, que morreu após um voo pela companhia aérea. O cão embarcou em Guarulhos (SP), com destino a Sinop (MR), mas foi parar em Fortaleza. Ao constatar o erro, a empresa (GOL) enviou o animal para Guarulhos, mas ele chegou morto ao local.

A notícia causa grande indignação não só no dono do animal como também nas entidades voltadas à proteção dos animais. Até mesmo o presidente Lula cobrou da ANAC e do Ministério da Justiça uma pronta resposta ao ocorrido, além de homenagear o cãozinho ao usar uma gravata com desenho de cachorro.

Após a morte do pet, a GOL suspendeu por um mês o transporte de cães no porão das aeronaves para ‘se dedicar totalmente ao processo de investigação deste evento’.

Como fica a responsabilidade, na seara do direito ambiental, da companhia aérea diante da morte desse animal em decorrência de uma falha no transporte? É o que veremos aqui.

A nossa fauna é composta pelos animais silvestres, exóticos e domésticos. Estes últimos são aqueles animais que através de processos tradicionais e sistematizados de manejo e melhoramento zootécnico tornaram-se domésticas, possuindo características biológicas e comportamentais em estreita dependência do homem, podendo inclusive apresentar aparência diferente da espécie silvestre que os originou.

Há, no Brasil, três correntes doutrinárias sobre a natureza jurídica dos animais domésticos:

1) A corrente clássica ou tradicional, que entende que o animal é um bem semovente, com fundamento antes mesmo do Código Civil;

2) A corrente moderna, que entende que o animal deve ser considerado como um ser sujeito de direito;

3) A corrente intermediária, adotada pelo STJ, pela qual os animais de estimação seriam um “terceiro gênero“. Para o ministro Luís Felipe Salomão, não se trata de humanizar o animal, tampouco de equiparar a posse dos bichos com a guarda de filhos, mas de considerar que o direito de propriedade sobre eles não pode ser exercido de maneira idêntica àquele relativo às coisas inanimadas ou que não são dotadas de sensibilidade. Portanto, os animais seriam seres dotados de sensibilidade. Conferir o REsp 1.944.228.

“2. A solução de questões que envolvem a ruptura da entidade familiar e o seu animal de estimação não pode, de modo algum, desconsiderar o ordenamento jurídico posto – o qual, sem prejuízo de vindouro e oportuno aperfeiçoamento legislativo, não apresenta lacuna e dá respostas aceitáveis a tais demandas –, devendo, todavia, o julgador, ao aplicá-lo, tomar como indispensável balizamento o aspecto afetivo que envolve a relação das pessoas com o seu animal de estimação, bem como a proteção à incolumidade física e à segurança do pet, concebido como ser dotado de sensibilidade e protegido de qualquer forma de crueldade.

2.1 A relação entre o dono e o seu animal de estimação encontra-se inserida no direito de propriedade e no direito das coisas, com o correspondente reflexo nas normas que definem o regime de bens (no caso, o da união estável). A aplicação de tais regramentos, contudo, submete-se a um filtro de compatibilidade de seus termos com a natureza particular dos animais de estimação, seres que são dotados de sensibilidade, com ênfase na proteção do afeto humano para com os animais.”

A CF/88, em seu artigo 225, §1º, VII, aduz que é dever do poder público proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

Já a lei de crimes ambientais (Lei nº 9.605/98) prevê como crime, em seu artigo 32, o ato de “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”, com pena de detenção, de três meses a um ano, e multa. Já quando se tratar de cão ou gato, a pena para as condutas acima descritas será de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, multa e proibição da guarda, sendo esta pena aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

O artigo 225, §3º, da Constituição Federal impõe aos infratores três espécies distintas de responsabilidades pelo dano ambiental (o que inclui danos aos animais), quais sejam: a responsabilidade civil, a responsabilidade administrativa e a responsabilidade penal, senão vejamos:

CF/88

“Art. 225…

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”

Portanto, em tese a companhia aérea poderia responder pela morte do animal nas três esferas acima citadas: civil, administrativa e penal.

O que fundamenta a possibilidade de imposição de sanções administrativas ao infrator é o poder de polícia, que é a prerrogativa que a Administração Pública detém de impor limitações às liberdades individuais em prol do interesse público. Portanto, para garantir a prevalência do interesse público a Administração Pública edita normas que limitam as liberdades individuais, e caso estas normas sejam descumpridas surge o dever de impor as sanções correspondentes. Em se comprovando o cometimento de uma infração à norma administrativa, a empresa seria responsabilizada, desde que demonstrado o elemento subjetivo (culpa ou dolo).

O mesmo raciocínio se aplica à responsabilidade penal. Caso se comprove que houve maus-tratos ou abuso ao cachorro, tanto as pessoas físicas envolvidas quanto a própria pessoa jurídica poderá ser responsabilizada criminalmente, desde que cumpridos os requisitos legais (elencados na lei de crimes ambientais). Em relação à responsabilidade criminal da pessoa jurídica não podemos deixar de elencar os dois requisitos legais exigidos no caput do artigo 3º, da Lei nº 9.605/98, quais sejam:

1 – A infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado;

2 – Ato praticado no interesse ou benefício da sua entidade (PJ).

Já em relação à responsabilidade civil (obrigação de reparar os danos causados), é de se ressaltar que não há necessidade da comprovação do elemento subjetivo (dolo ou culpa), já que ela é objetiva, ou seja, basta que se comprove o dano ambiental e haja a presença do nexo de causalidade, ligando esse resultado ao causador do dano.

Também devemos pontuar que a responsabilidade civil pelo dano ambiental é calcada na teoria do risco integral, que é uma teoria extremada do risco, onde o nexo de causalidade é fortalecido (ver informativo STJ nº 545), afastando excludentes de responsabilidade como o caso fortuito, a força maior, a culpa de terceiro ou a culpa da vítima. Mesmo atos lícitos podem ensejar a responsabilização.

Em resumo, podemos dizer que a repercussão da morte do cachorro Joca no âmbito do direito ambiental poderá atrair a tríplice responsabilização (civil, administrativa e penal) da empresa (GOL), mas com pouquíssimas chances da configuração da prática de crime ambiental, já que, a princípio, não estariam presentes os requisitos exigidos na lei de crimes ambientais (infração cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado e ato praticado no interesse ou benefício da sua entidade – PJ).

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