Responsabilidade ambiental por dano decorrente de queda de ponte

Responsabilidade ambiental por dano decorrente de queda de ponte

A queda da ponte Juscelino Kubitschek causou danos ambientais significativos no Rio Tocantins. Confira os detalhes no artigo abaixo sobre a responsabilidade pela reparação dos danos, com base na Constituição e na Lei Ambiental.

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

Responsabilidade ambiental

Entenda o que aconteceu

Queda de ponte

A ponte Juscelino Kubitschek, inaugurada em 1960, e que liga os estados de Tocantins e Maranhão, desabou de forma trágica, levando consigo vários automóveis que passavam na hora. O desastre deixou mortos, e ainda há desaparecidos.

Segundo o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), do governo federal, o desabamento ocorreu porque o vão central da ponte cedeu, mas as causas do colapso ainda não estão esclarecidas.

A ponte já apresentava uma série de rachaduras, tanto é que um vereador de Aguiarnópolis (TO) filmava essas rachaduras no momento em que a estrutura começou a ceder.

O acidente causou, também, significativo dano ambiental, e isso porque, na hora do desabamento, passavam dois caminhões carregados de ácido sulfúrico, e um caminhão com defensivos agrícolas, e todo esse material potencialmente perigoso foi despejado no rio Tocantins.

Ao todo, foram jogados no rio 76 toneladas de ácido sulfúrico e 22 mil litros de defensivos agrícolas

O Estado do Maranhão já orientou a suspensão da captação de água para abastecimento público nos municípios banhados pelo rio Tocantins que ficam abaixo do desabamento no curso do rio, na direção onde a água flui, até que se determine que a pluma (massa) de contaminantes tenha se diluído e não ofereça perigo ao consumo da água.

A Agência Nacional de Águas (ANA), em conjunto com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos Naturais do Maranhão (Sema/MA), estão realizando uma avaliação constante da qualidade da água, coletando amostras de água em cinco pontos desde a barragem da usina hidrelétrica de Estreito até o município de Imperatriz.

A Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb/SP), que é referência em análise de qualidade de água no Brasil, se prontificou em auxiliar nas análises.

Pelo menos 19 Municípios podem ter sido impactados com a poluição das águas do Rio Tocantins: Aguiarnópolis, Carrasco Bonito, Cidelândia, Esperantina, Itaguatins, Maurilândia do Tocantins, Praia Norte, Sampaio, São Miguel do Tocantins, São Sebastião do Tocantins, Tocantinópolis, Campestre do Maranhão, Estreito, Governador Edison Lobão, Imperatriz, Porto Franco, Ribamar Fiquene, São Pedro da Água Branca e Vila Nova dos Martírios.

    Análise Jurídica – queda de ponte

    Importante ressaltar que a responsabilidade ambiental possui fundamento no artigo 225, §3º da Constituição Federal:

    Art. 225...
    
    §3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.”
    CF/88

    Tríplice Responsabilização queda de ponte

    O artigo 225, §3º, da Constituição Federal, impõe aos infratores três espécies distintas de responsabilidades pelo dano ambiental, quais sejam:

    E essas instâncias de responsabilização são independentes umas das outras, ou seja, um mesmo fato pode atrair a tríplice responsabilização

    No caso da poluição decorrente do desabamento da ponte, os responsáveis pela carga (ácido sulfúrico e defensivos agrícolas) dificilmente serão punidos na esfera penal e administrativa, haja vista que elas são subjetivas, ou seja, necessitam da comprovação de culpa ou dolo. 

    O crime ambiental seria o tipificado no artigo 54, da Lei nº 9.605/98 (Lei de crimes ambientais), qualificado pelo fato de ter causado poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade:

    Art. 54. Causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora:
    
    Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.
    
    ...
    
    § 2º Se o crime:
    
    ...
    III - causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade;
    
    Pena - reclusão, de um a cinco anos.
    Lei nº9.695/98
    

    Ao que tudo indica, não houve culpa ou dolo por parte dos donos ou transportadores da carga, pois o colapso da ponte foi repentino e imprevisível.

    Mas esses mesmos agentes podem e devem sim ser condenados na esfera cível, haja vista que a responsabilidade civil ambiental é objetiva, ou seja, independe de culpa ou dolo.

    O fundamento legal da responsabilidade civil ambiental está no artigo 14, §1º, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente:

    Art. 14 - Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental sujeitará os transgressores:
    ...
    
    § 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente. 
    
    (Lei nº 6.938/81)

    A responsabilidade civil ambiental, ou seja, de reparar os danos causados ao meio ambiente, além de objetiva (independe de culpa ou dolo), é solidária e fundamentada na teoria do risco integral, que é uma teoria extremada do risco, onde o nexo de causalidade é fortalecido (ver informativo STJ nº 545). 

    Mesmo atos lícitos podem ensejar a responsabilização. Além do mais, a pretensão de reparação do dano ambiental é imprescritível, conforme jurisprudência pacificada dos tribunais superiores, em especial o tema 999 do Supremo Tribunal Federal.

    TEMA 999 do STF: É imprescritível a pretensão de reparação civil de dano ambiental

    Como bem destacado na ementa do RE 654.833:

    O meio ambiente deve ser considerado patrimônio comum de toda humanidade, para a garantia de sua integral proteção, especialmente em relação às gerações futuras. Todas as condutas do Poder Público estatal devem ser direcionadas no sentido de integral proteção legislativa interna e de adesão aos pactos e tratados internacionais protetivos desse direito humano fundamental de 3ª geração, para evitar prejuízo da coletividade em face de uma afetação de certo bem (recurso natural) a uma finalidade individual.

    A reparação do dano ao meio ambiente é direito fundamental indisponível, sendo imperativo o reconhecimento da imprescritibilidade no que toca à recomposição dos danos ambientais

      

    Papel do Poder Público na Responsabilidade Ambiental

    Em relação ao poder público, ele pode também ser enquadrado como poluidor, e, portanto, responsável pela obrigação de reparar os danos causados, tendo em vista que o conceito de poluidor é abrangente, abarcando tanto pessoas físicas quanto jurídicas, de direito privado e de direito público, conforme artigo 3º, IV, da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81):

    Art. 3º - Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
    
    ...
    
    IV - poluidor, a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental;
    
    (Lei nº 6.938/81)

    Como a ponte que caiu pertence à União, ela seria a diretamente responsável pelo acidente, devendo ser responsabilizada pelo enorme dano ambiental causado.

    O tema da responsabilidade é fundamental para o direito ambiental, e tem sido cobrado de forma recorrente nas provas das mais diversas carreiras jurídicas (magistratura, ministério público, procuradorias, delegado, defensor).

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