TJ-MG determina quebra de sigilo bancário em ação de divórcio

TJ-MG determina quebra de sigilo bancário em ação de divórcio

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, através de sua 4ª Câmara Cível Especializada, atendeu ao pedido de uma ex-esposa, determinando a quebra de sigilo bancário do ex-marido em uma ação de divórcio.

A mulher alegou que o ex-marido sempre ocultou seu verdadeiro patrimônio e seus rendimentos, encobrindo sua capacidade financeira.

Sustentou, ainda, que, além de exercer a função de inspetor de pinturas, o homem recebe valores significativos pelo aluguel de um sítio e de um haras.

Entendimento do magistrado

O desembargador ressaltou que a quebra do sigilo bancário é medida excepcional. Porém, ela seria aplicável ao caso porque não havia como auferir, de forma precisa, a real capacidade econômico-financeira do ex-marido.

Ressaltou o desembargador:

“Neste contexto, as pesquisas no SISBAJUD revelam-se como medida capaz de elucidar os fatos narrados pelas partes, resguardando a observância do trinômio necessidade/possibilidade/razoabilidade e possibilitando a fixação do justo valor da pensão, o que não trará qualquer prejuízo ao agravado ou a terceiros, porquanto determinada em processo que tramita sob segredo de Justiça”.

Além do mais, o magistrado considerou presentes os requisitos do art. 300 do código de processo civil, necessários para o deferimento da liminar, a saber: probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

CPC

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Quebra de sigilo bancário

No caso dos autos, a quebra foi utilizada com base na suspeita de que o ex-marido estaria ocultando sua verdadeira capacidade econômico-financeira, a fim de prejudicar o pedido de pensão alimentícia da ex-mulher.

Sigilo bancário

O sigilo bancário é um direito fundamental, que deriva do direito à privacidade e ao sigilo de informações. Protege, portanto, o direito à intimidade e à vida privada da pessoa.

CF

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

...

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

...

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal;

O artigo 1º, da LC 105/2001, trata do dever de sigilo bancário por parte das instituições financeiras.

LC 105/2001

Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.

Segundo o artigo 1º, §3º, da LC 105/2001, não constitui violação do dever de sigilo:

I – A troca de informações entre instituições financeiras, para fins cadastrais, inclusive por intermédio de centrais de risco, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

II - O fornecimento de informações constantes de cadastro de emitentes de cheques sem provisão de fundos e de devedores inadimplentes, a entidades de proteção ao crédito, observadas as normas baixadas pelo Conselho Monetário Nacional e pelo Banco Central do Brasil;

III - O fornecimento das informações relativas à antiga CPMF;

IV - A comunicação, às autoridades competentes, da prática de ilícitos penais ou administrativos, abrangendo o fornecimento de informações sobre operações que envolvam recursos provenientes de qualquer prática criminosa;

V – A revelação de informações sigilosas com o consentimento expresso dos interessados;

VI – A prestação de informações nos termos e condições estabelecidos na própria Lei Complementar;

VII - O fornecimento de dados financeiros e de pagamentos, relativos a operações de crédito e obrigações de pagamento adimplidas ou em andamento de pessoas naturais ou jurídicas, a gestores de bancos de dados, para formação de histórico de crédito, nos termos de lei específica.

Jurisprudência

O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência entendendo ser incabível a quebra desse sigilo como medida executiva atípica para a satisfação de interesse particular.

O colegiado, de forma unânime, firmou tal orientação ao dar parcial provimento ao recurso especial em que um credor, em ação de execução de título extrajudicial, pediu a quebra do sigilo bancário, a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e a retenção do passaporte, entre outras medidas executivas atípicas, contra seus devedores (REsp 1.951.176).

Segundo o requerente, as medidas seriam cabíveis diante do esgotamento dos meios tradicionais de penhora e em razão do longo período de tramitação da execução sem a efetiva satisfação do seu crédito.

O tribunal de origem negou o pedido, e considerou desproporcional a suspensão das CNHs e a retenção dos passaportes dos devedores. A quebra de sigilo bancário também foi indeferida.

A jurisprudência do STJ considera cabíveis, com base no art. 139, IV, os chamados meios de coerção indiretos, desde que existam indícios de que o devedor tem patrimônio expropriável e que o juízo adote e fundamente tais medidas de forma subsidiária pelo juízo.

Requisitos

Mas, em relação ao sigilo bancário, o relator pontuou que a LC 105/2001 permite sua quebra em três situações:

  • Apuração de ilícito criminal;
  • Apuração de ilícito administrativo; e
  • Procedimento administrativo fiscal.

Portanto, não se poderia utilizar a quebra do sigilo bancário para atender um interesse privado, disponível.

De acordo com o relator do REsp 1.951.176, ministro Bellizze, não é possível a quebra do sigilo bancário para a satisfação de um direito patrimonial disponível, tal como o adimplemento de obrigação pecuniária, de caráter eminentemente privado, mormente quando existentes outros meios suficientes ao atendimento dessa pretensão.

A quebra de sigilo bancário destinada tão somente à satisfação do crédito exequendo (visando à tutela de um direito patrimonial disponível, isto é, um interesse eminentemente privado) constitui mitigação desproporcional desse direito fundamental – que decorre dos direitos constitucionais à inviolabilidade da intimidade (art. 5º, inciso X, da Constituição) e do sigilo de dados (artigo 5º, inciso XII) –, mostrando-se, nesses termos, descabida a sua utilização como medida executiva atípica.

ADI 7276

Em 2024, o Supremo Tribunal Federal julgou a ADI 7276, validando, por maioria, regras de convênio do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ). Tais regras obrigam as instituições financeiras a fornecer aos estados informações sobre pagamentos e transferências feitos por clientes (pessoas físicas e jurídicas) em operações eletrônicas (como Pix, cartões de débito e crédito) em que haja recolhimento do ICMS.

A relatora, ministra Cármen Lúcia, destacou que os deveres previstos no convênio não caracterizam quebra de sigilo bancário, constitucionalmente proibida, mas transferência do sigilo das instituições financeiras e bancárias à administração tributária estadual ou distrital.

A ministra ressaltou, ainda, que os dados fornecidos são utilizados para a fiscalização do pagamento de impostos pelos estados e pelo Distrito Federal. Tais entes devem continuar a zelar pelo sigilo dessas informações e usá-las exclusivamente para o exercício de suas competências fiscais.

As regras visam dar maior eficiência aos meios de fiscalização tributária, tendo em vista a economia globalizada e o crescente incremento do comércio virtual.

O STF, no julgamento conjunto das ADIs 2390, 2386, 2397 e 2859, declarou que a transferência de dados bancários por instituições financeiras à administração tributária não viola o direito fundamental à intimidade

Ótimo tema para provas de direito constitucional, direito penal e direito processual civil.


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