Princípios Contratuais
PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

Princípios Contratuais

PRINCÍPIOS CONTRATUAIS
PRINCÍPIOS CONTRATUAIS

No direito contratual contemporâneo, os princípios ganharam relevância devido à constitucionalização do Direito Civil. A partir da irradiação dos valores e das normas constitucionais para todo o sistema jurídico, os princípios contratuais passaram a ser lidos à luz da dignidade da pessoa humana, da solidariedade social e da igualdade substancial.

Isso significa que a liberdade contratual, a autonomia privada e a força obrigatória dos contratos, antes vistos como valores quase absolutos, passaram a ser ponderadas com outros interesses relevantes, como a função social do contrato, a boa-fé objetiva e o equilíbrio contratual.

Os princípios da autonomia privada, da função social, da boa-fé objetiva e do equilíbrio econômico formam a base axiológica da teoria geral dos contratos, orientando a criação, a interpretação e a aplicação das normas contratuais.

Esses princípios refletem a mudança de paradigma do direito contratual, que deixou de ser um instrumento de satisfação de interesses egoísticos para se tornar um instrumento de promoção da solidariedade, da justiça e do bem comum.

Assim, a compreensão e aplicação desses princípios é essencial para a construção de relações contratuais mais equilibradas, éticas e socialmente responsáveis.

Autonomia privada

A autonomia privada (ou autonomia da vontade) é o princípio contratual que confere às partes a liberdade de autorregulamentar seus interesses por meio do contrato. Ela se manifesta na liberdade de contratar (decidir se e com quem contratar) e na liberdade de estipular o conteúdo do contrato.

A autonomia privada é corolário da livre iniciativa e da autodeterminação individual, permitindo que as pessoas e empresas realizem operações econômicas e jurídicas de acordo com suas necessidades e conveniências.

Dela decorrem as máximas da intervenção mínima e da excepcionalidade da revisão contratual, a presunção de paridade e simetria, além da liberdade para celebração de contratos atípicos:

CC/2002 Art. 421.  A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato.

Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual. 

CC/2002 Art. 421-A.  Os contratos civis e empresariais presumem-se paritários e simétricos até a presença de elementos concretos que justifiquem o afastamento dessa presunção, ressalvados os regimes jurídicos previstos em leis especiais, garantido também que: 

I – as partes negociantes poderão estabelecer parâmetros objetivos para a interpretação das cláusulas negociais e de seus pressupostos de revisão ou de resolução; 

II – a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada; e 

III – a revisão contratual somente ocorrerá de maneira excepcional e limitada. 

(…)

Art. 425. É lícito às partes estipular contratos atípicos, observadas as normas gerais fixadas neste Código.

Força Obrigatória dos Contratos

O princípio da força obrigatória, denominado classicamente pacta sunt servanda, traduz a natural cogência que deve emanar do contrato, a fim de que se lhe possa reconhecer utilidade econômica e social:

CC/2002  Art. 427. A proposta de contrato obriga o proponente, se o contrário não resultar dos termos dela, da natureza do negócio, ou das circunstâncias do caso.

O princípio continua previsto em nosso ordenamento jurídico, mas, com o advento das teorias revisionistas, esse princípio, antes visto como absoluto, passa a ser mitigado frente a outros valores considerados importantes para o equilíbrio das relações sociais.

Com base na cláusula rebus sic stantibus (permanecendo as coisas assim) se permite a alteração das bases contratuais quando há modificação superveniente dos fatos que ensejaram a formação dos contratos e alteram o equilíbrio contratual.

Diante disso, surgem possibilidades de relativização do pacta sunt servanda para revisar cláusulas contratuais ou extinguir contratos em vista da alteração prejudicial das condições pactuadas inicialmente.

Dessa forma, têm se que os princípios contratuais da autonomia privada, da liberdade contratual e da força obrigatória dos contratos não são princípios absolutos, encontrando limites na lei, na ordem pública, nos bons costumes e, sobretudo, nos demais princípios contratuais.

Função Social dos Contratos

A função social dos contratos é um princípio de ordem pública que implica que os contratos devem servir não apenas aos interesses das partes envolvidas, mas também aos interesses da sociedade como um todo, sendo um limitador do princípio da liberada contratual:

CC/2002 Art. 421.  A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. 

De acordo com esse princípio, os contratos devem ser interpretados e executados de maneira a promover o bem-estar social, a justiça distributiva e a equidade.

Isso significa que as partes devem considerar não apenas seus próprios interesses, mas também os impactos mais amplos que o contrato pode ter sobre terceiros e sobre a comunidade em geral, inserindo-se em uma lógica de respeito aos direitos humanos e realização de justiça social.

A eficácia interna da função social dos contratos está pautada na ideia de manutenção do equilíbrio entre as partes.

A eficácia externa da função social do contrato é a irradiação de seus efeitos para além das partes que o pactuaram, privilegiando a proteção dos direitos difusos e coletivos e a tutela externa do crédito.

Princípio da Boa-Fé Objetiva

Um dos princípios contratuais mais relevantes no debate atual é o da boa-fé objetiva. A boa-fé divide-se em:

Boa-fé subjetiva

Também chamada de concepção psicológica da boa-fé, a boa-fé subjetiva constava no Código Civil de 1916 com natureza de regra de interpretação do negócio jurídico.

Denomina-se “subjetiva” porque, para a sua aplicação, deve o intérprete considerar a intenção do sujeito da relação jurídica, o seu estado psicológico ou sua íntima convicção.

A boa-fé objetiva se refere ao conhecimento ou à ignorância da pessoa em relação a certos fatos, sendo levada em consideração pelo direito para a proteção daquele que imagina estar agindo conforme o direito, apesar de ser outra a realidade.

Boa-fé objetiva

Também denominada concepção ética da boa-fé, a boa-fé objetiva representou uma inovação do Código Civil de 2002 e acarretou alteração no direito obrigacional clássico.

Classifica-se como regra de conduta e deixa de ser apenas princípio geral de direito (preceito amplo e abstrato que orienta a interpretação e aplicação das normas jurídicas) para transformar-se em cláusula geral de boa-fé objetiva (norma jurídica mais específicas que, embora não detalhe, estabelece critérios gerais para a aplicação do direito em casos concretos). É, pois, fonte de direito e de obrigações, tendo força normativa.

A boa-fé objetiva é uma cláusula geral para a aplicação do direito obrigacional, que impõe ao contratante um padrão de conduta: agir com retidão, probidade, honestidade e lealdade de forma a garantir previsibilidade, segurança jurídica e justiça nas relações contratuais:

CC/2002 Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.

Percebe-se que o legislador tratou a observância dos princípios de probidade e boa-fé como verdadeira obrigação dos contratantes. Falhou, todavia, ao prever que a boa-fé somente seria observável quando da conclusão e durante a execução do contrato. Deverá esse princípio incidir mesmo antes e após a execução do contrato, isto é, nas fases pré e pós-contratual.

Funções da boa-fé objetiva

Função interpretativa  

Os negócios jurídicos devem ser interpretados os conforme a boa-fé. Essa função guarda íntima conexão com a diretriz consagrada na regra de ouro do art. 5º da LINDB, segundo a qual o juiz, ao aplicar a lei, deve atender aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

CC/2002 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua celebração.

LINDB  5o  Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Função integrativa

A boa-fé serve como suporte de colmatação para orientar o magistrado em caso de integração de lacunas.

A colmatação ocorre quando um princípio geral, como a boa-fé objetiva, é especificado e aplicado de maneira mais direta e detalhada através de uma cláusula geral.

Assim, o Código Civil de 2002 ampliou e tornou mais eficaz a aplicação da boa-fé objetiva ao transformá-la em uma cláusula geral. Isso permite que a cláusula de boa-fé objetiva seja invocada de forma mais precisa em diversas situações jurídicas, proporcionando maior segurança e previsibilidade nas relações jurídicas.

Essa função protege a relação dos participantes do negócio jurídico, na medida em que a boa-fé integra qualquer relação obrigacional.

Função criadora de deveres anexos

A boa-fé objetiva tem a função criadora de deveres anexos ou de proteção, sendo fonte autônoma de obrigação.

Isso porque, se exige dos integrantes da relação jurídica contratual não apenas obrigações negativas de abstenção à prática de atos que poderiam conduzir ao inadimplemento, como também obrigações positivas relacionadas à correta e esperada consecução do objeto contratual.

Os deveres anexos mais conhecidos são:

(I) lealdade

(II) confiança;

(III) assistência;

(III) informação;

(IV) sigilo ou confidencialidade.

Fala-se em violação positiva do contrato quanto a obrigação principal é cumprida, mas os deveres anexos são violados.

Função de controle

A função de controle é limitadora do exercício de direitos e visa a corrigir eventuais desequilíbrios que podem aparecer na relação jurídica, como, por exemplo, a vedação ao abuso de direito (art. 187 do CC), a aplicação da teoria da imprevisão (Art. 317), da teoria da onerosidade excessiva (art. 478), da teoria da base objetiva (CDC) e do adimplemento substancial. Há, portanto, uma limitação do exercício de posições e faculdades contratuais diante da vedação à prática de conduta abusiva.

Nesse contexto, cumpre destacar que a violação da boa-fé objetiva pode acarretar diversas consequências jurídicas, tais como: a responsabilidade civil por perdas e danos, a invalidade de cláusulas ou do próprio contrato, o dever de indenizar pela ruptura injustificada das tratativas, o direito da parte lesada de requerer a resolução do contrato por inadimplemento de dever anexo, entre outras.

O STJ já decidiu no sentido de que o descumprimento de deveres laterais, decorrentes da incidência do princípio da boa-fé, pode ensejar a resolução do contrato, se for capaz de comprometer o interesse do credor na utilidade da prestação.

Equilíbrio Contratual

Outro princípio contratual é o do equilíbrio econômico (ou equivalência material), que busca assegurar a justa distribuição de direitos e obrigações entre os contratantes, evitando a excessiva onerosidade para uma das partes.

Esse princípio se manifesta em diversos institutos, como a lesão, a revisão judicial dos contratos por fato superveniente e a vedação de cláusulas abusivas nos contratos de adesão.

Dessa forma, o equilíbrio econômico é um imperativo de justiça comutativa, que visa corrigir os desequilíbrios provocados pela desigualdade de poder negocial entre as partes ou por circunstâncias extraordinárias e imprevisíveis.

Ele permite a adaptação do contrato às mudanças das condições fáticas, preservando a equivalência entre as prestações e evitando o enriquecimento sem causa de um contratante em detrimento do outro.

Conclusão

Diante do exposto acerca dos princípios contratuais, pode-se concluir que o conceito atual de contrato pode ser construído como negócio jurídico bilateral obrigatório em que há acordo de vontades para realização de determinados objetivos convergentes, regidos pela autonomia da vontade e liberdade contratual, mas limitados pelos princípios da boa-fé, da função social dos contratos e da preservação do equilíbrio contratual.

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