Sou o professor Marcos Gomes, Defensor Público do Estado de São Paulo, Coordenador da Coleção Defensoria Pública Ponto a Ponto e Especialista em Direito Público.
Trouxe abaixo uma análise para reflexão sobre o tema: Pedido de Impeachment contra Lula já tem mais de 120 assinaturas na Câmara.
Pedido de Impeachment:
Após a fala do presidente Lula comparando a reação de Israel contra o grupo terrorista do Hamas ao holocausto dos judeus realizado na Alemanha nazista, o pedido de impeachment em face de Lula já possui mais de 120 assinaturas na Câmara dos Deputados[1].
O impeachment consiste em uma infração político-administrativa, prevista no art. 85 da Constituição Federal e regulamentada pela Lei n. 1.079/50. Ao que se tem notícias, o pedido estaria baseado no fato de que as declarações seria um ato de hostilidade contra uma nação estrangeira, que teria exposto a República ao perigo da guerra e comprometido a neutralidade.
O que pode acontecer:
De fato, em que pese a denúncia poder ser realizada por qualquer cidadão (art. 14, Lei n. 1.079/50), caberá ao Presidente da Câmara receber ou não a denúncia. Trata-se de um imenso poder conferido ao Presidente da Câmara, pois é ele quem irá definir quando irá analisar o pedido de impeachment.
Nesse ponto, caso a petição seja aceita, o Supremo Tribunal Federal não poderá intervir no mérito do pedido, mas tão somente em eventuais diretrizes procedimentais, pois caberá ao Parlamento definir se houve ou não o enquadramento do fato à hipótese legal.
Procedimento:
Além dos balizamentos legais e constitucionais, o procedimento bifásico perante a Câmara dos Deputados e do Senado Federal contou com julgados do Supremo Tribunal Federal para sua definição. Vejamos:
Procedimento na Câmara (art. 51, I):
- Denúncia por qualquer cidadão (art. 14, Lei n. 1.079/50).
- Presidente da Câmara recebe ou não a denúncia.
- Se recebida, será formada uma Comissão Especial.
- A Comissão poderá arquivar ou não a denúncia.
- Se não arquivar, remessa ao Presidente da República – contestação.
- Encaminhamento ao Plenário da Câmara com parecer.
- Autorização ou não do processo contra o Presidente (juízo de admissibilidade – 2/3 dos deputados para autorização).
Procedimento no Senado (art. 52, I):
- Encaminhamento no Senado.
- Comissão especial – parecer – arquivamento ou encaminhamento ao Plenário.
- Plenário: Juízo de Acusação – Maioria simples para recebimento da denúncia (ADPF n. 378/2015).
- Plenário: Juízo de Pronúncia (instrução e contraditório). Decisão por maioria simples (ADPF n. 378/2015).
- Plenário: Julgamento. Necessidade de 2/3 para condenação (MS n. 21.689/93 – Não cabe ao Judiciário analisar o mérito da decisão).
- Aplicação da penalidade
Conclusão:
Em caso de condenação, aplica-se o disposto no art. art. 52, parágrafo único, da Constituição Federal, o qual é cristalino ao dispor que:
“Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis”.
Todavia, há precedente do Senado Federal realizando um fatiamento da votação e das penas, contrariando, de forma evidente, o texto constitucional, enfraquecendo sobremaneira a força normativa da Constituição. Desde já, nos manifestamos contrariamente ao referido fatiamento, que tornou letra morta o texto constitucional em prol de interesses políticos. Trata-se de latente caso em que prevaleceu os fatores reais de poder em detrimento da força normativa da Constituição.
[1] Disponível em https://noticias.r7.com/brasilia/pedido-impeachment-lula-camara-assinaturas-20022024. Acesso em 21 de fevereiro de 2024.