Aos berros, juíza exige que testemunha a chame de excelência

Aos berros, juíza exige que testemunha a chame de excelência

Sou o professor Allan Joos, defensor público do Estado de Goiás, professor universitário e de pós-graduação, pós-graduado em Direito Público, coordenador e professor no Estratégia Carreira Jurídica. 

Nos últimos dias viralizou nas redes sociais um vídeo em que uma juíza bastante desequilibrada exige de uma testemunha que ela responda “o que a senhora deseja, excelência”, aos gritos e na sequência o retira da sala virtual e desconsidera o seu depoimento apenas por não dar a resposta que ela deseja. 

Diante da repercussão dos fatos e da curiosidade de muitos alunos acerca das implicações jurídicas da referida conduta, faremos uma análise técnica dos fatos, em especial apontando os dispositivos legais que a magistrada violou e as possíveis consequências dos fatos.

Além de ser uma postura bastante lamentável é evidente que a referida juíza viola uma série de dispositivos legais que vão desde normas processuais até a Lei Orgânica da magistratura.

No que tange à Lei Orgânica da Magistratura (Lei Complementar nº 35 de 1979) a referida juíza desrespeitou o artigo 35, inciso IV, que lhe traz o dever de tratar com urbanidade as partes, os membros do Ministério Público, os advogados, as testemunhas, os funcionários e auxiliares da Justiça.

Além da LOMAN, a magistrada violou o dever de cortesia insculpido no Código de Ética da Magistratura Nacional em  seu artigo 22, caput, e parágrafo único. Vejamos:

Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.

Parágrafo único. Impõe-se ao magistrado a utilização de linguagem escorreita, polida, respeitosa e compreensível.

Ainda, percebe-se que a postura bastante desrespeitosa e arbitrária com a testemunha indica violação de um outro dever da magistrada, que é o de agir com dignidade, honra e decoro, também previsto no Código de Ética da magistratura (artigos 37 e 39). Vejamos:

Art. 37.Ao magistrado é vedado procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções.

[…]

Art. 39. É atentatório à dignidade do cargo qualquer ato ou comportamento do magistrado, no exercício profissional, que implique discriminação injusta ou arbitrária de qualquer pessoa ou instituição.

Não podemos esquecer também os denominados “princípios de Bangalore” que representam um verdadeiro código global de postura dos magistrados. São princípios de Conduta Judicial de Bangalore: a) independência; b) imparcialidade; c) integridade; d) idoneidade; e) igualdade; e f) competência e diligência. Neste ponto, percebe-se que a juíza demonstrou evidente postura desigual, além de não agir com a necessária competência e diligência para o ato, tratando a testemunha com bastante desrespeito e excluindo-a do ato judicial apenas por não tê-la respondido como ela queria.

No que tange às possíveis disposições processuais, podemos citar inúmeros que determinam à juíza o dever de agir com a necessária urbanidade. Dentre eles, o artigo 360, inciso IV, do CPC que diz:

 Art. 360. O juiz exerce o poder de polícia, incumbindo-lhe: 

IV – tratar com urbanidade as partes, os advogados, os membros do Ministério Público e da Defensoria Pública e qualquer pessoa que participe do processo;

Sobre as sanções processuais, o cerceamento do depoimento da vítima deverá, certamente, ensejar a anulação da audiência realizada. Não há de forma clara informações sobre a natureza da ação, mas é evidente que a magistrada viola o princípio do contraditório e da ampla defesa, ainda que a testemunha tenha sido arrolada pela parte autora do processo.

Já no que tange à própria juíza, o artigo 42 da LOMAN, prevê as seguintes punições: 

Art. 42 – São penas disciplinares:

        I – advertência;

        II – censura;

        III – remoção compulsória;

        IV – disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço;

        V – aposentadoria compulsória com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço;

        VI – demissão.

A gravidade dos fatos indica que certamente a referida juíza agiu de forma muito diversa do que se espera de um magistrado, ao praticamente coagir a testemunha a responder algo como ela queria, além de chama-la de “bocudo” e retirá-lo da audiência sem nenhuma justificativa legal para isso.

Sobre a pena de demissão, é importante ressaltar que a aludida sanção, no olhar de boa parte da doutrina institucional, não foi recepcionada pela Constituição Federal porque esta conferiu aos juízes a garantia da vitaliciedade.

Por outro lado, a mais graves das punições atualmente previstas, a pena de aposentadoria compulsória, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço é a mais rigorosa das sanções aplicáveis. Vejamos o que diz o artigo 56, inciso II, da LOMAN:

  Art. 56 – O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, do magistrado:

[…]

        Il – de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções;

Em qualquer outra instituição, ou função em que não se lhe assegurasse a vitaliciedade, a postura da juíza certamente poderia ensejar a pena de demissão. No caso, como inaplicável à magistrada, a sanção de aposentadoria compulsória parece ser a mais ajustada, na medida em que a juíza não demonstra possuir postura digna da responsabilidade de sua função. 

O que se noticiou até o momento é que, imediatamente após ciência dos fatos, o TRT da 12ª Região suspendeu a magistrada da realização de audiências a abriu procedimento para investigar a sua postura.

Independentemente do contexto dos fatos que levou à magistrada a se exaltar daquela maneira, é evidente que se trata de uma postura desrespeitosa, antiética e bastante lamentável.

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