Improbidade Administrativa: o tema 1.257 que revogou 2 repetitivos do STJ (Informativo 840)

Improbidade Administrativa: o tema 1.257 que revogou 2 repetitivos do STJ (Informativo 840)

Divulgado no último informativo 840 do STJ de 18/02/2025, um repetitivo muito importante chama a atenção para a revogação de outros dois temas sobre improbidade administrativa.

Vamos lá, o que decidiu o STJ, agora?

As disposições da Lei n. 14.230/2021 são aplicáveis aos processos em curso para regular o procedimento da tutela provisória de indisponibilidade de bens, de modo que as medidas já deferidas poderão ser reapreciadas para fins de adequação à atual redação dada à Lei n. 8.429/1992.

STJ. 1ª Seção. REsp 2.074.601-MG, REsp 2.089.767-MG, REsp 2.076.137-MG, REsp 2.076.911-SP e REsp 2.078.360-MG. Rel. Min. Afrânio Vilela. Julgados em 06/02/2025. DJEN 13/02/2025. (Tema 1.257 – Informativo 840).

Ok, mas como era antes, e o que mudou?

Calma, vamos lá.

Primeiramente, lembre que:

Improbidade administrativa é…

  • um ato praticado pelo agente público,
  • com ou sem a participação de um particular,
  • e que gera enriquecimento ilícito,
  • causa prejuízo ao erário ou
  • atenta contra os princípios da Administração Pública.

Existem quatro dispositivos na CF/88 que versam sobre o tema: art. 14, § 9º; art. 15, V; art. 37, § 4º; art. 85, V. Deve-se mencionar ainda o art. 97, § 10, III, do ADCT.

Para fins de direito administrativo, a previsão mais importante é a do art. 37, § 4º:

Art. 37 (...)

§ 4º Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Pois bem, vamos para o que mudou substancialmente.

Indisponibilidade de bens na improbidade

Em que consiste?

Para garantir que a pessoa que praticou ato de improbidade responda pelas sanções previstas em lei, o art. 16 da Lei nº 8.429/92 prevê a possibilidade de ser decretada a indisponibilidade dos seus bens. Assim, veja o que diz a Lei:

Art. 16. Na ação por improbidade administrativa poderá ser formulado, em caráter antecedente ou incidente, pedido de indisponibilidade de bens dos réus, a fim de garantir a integral recomposição do erário ou do acréscimo patrimonial resultante de enriquecimento ilícito.

A indisponibilidade é uma sanção?

NÃO. A indisponibilidade de bens não tem caráter sancionador. Possui natureza de medida cautelar.

Seu escopo é perpetuar a existência de bens que asseguram o integral ressarcimento do dano, com inegável caráter preventivo (REsp 139.187-DF, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, julgado 24/02/2000).

(DPE/MA CESPE 2011) A indisponibilidade de bens não constitui propriamente uma sanção, mas medida de garantia destinada a assegurar o ressarcimento ao erário. (Certo)

Quem formula o pedido de indisponibilidade de bens?

O Ministério Público (MP).

O MP pode formular o pedido a partir de uma provocação (“representação”) da autoridade que tiver conhecimento da prática do ato de improbidade ou, então, de ofício. Nesse sentido, confira o que diz o novo § 1º-A do art. 16:

Art. 16 (...)

§ 1º-A O pedido de indisponibilidade de bens a que se refere o caput deste artigo poderá ser formulado independentemente da representação de que trata o art. 7º desta Lei.

Relembre agora o que diz o art. 7º da LIA (Lei de Improbidade Administrativa), com redação dada pela Lei nº 14.230/2021:

Art. 7º Se houver indícios de ato de improbidade, a autoridade que conhecer dos fatos representará ao Ministério Público competente, para as providências necessárias.

Quem decreta essa indisponibilidade?

O juiz, a requerimento do Ministério Público.

Não se pode decretar de ofício.

Para que se decrete a indisponibilidade dos bens da pessoa suspeita de ter praticado ato de improbidade, exige-se a demonstração de fumus boni iuris e periculum in mora?

• Antes da Lei nº 14.230/2021: NÃO. Basta que se prove o fumus boni iuris, sendo o periculum in mora presumido (implícito). Assim, é desnecessária a prova do periculum in mora concreto, ou seja, de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade.

A medida cautelar de indisponibilidade de bens, prevista na LIA, consiste em uma tutela de evidência, de forma que basta a comprovação da verossimilhança das alegações, pois, pela própria natureza do bem protegido, o legislador dispensou o requisito do perigo da demora.

Conforme explica o Ministro Mauro Campbell Marques, em trechos de seu brilhante voto:

“as medidas cautelares, em regra, como tutelas emergenciais, exigem, para a sua concessão, o cumprimento de dois requisitos: o fumus boni juris (plausibilidade do direito alegado) e o periculum in mora (fundado receio de que a outra parte, antes do julgamento da lide, cause ao seu direito lesão grave ou de difícil reparação). (...)

No entanto, no caso da medida cautelar de indisponibilidade, prevista no art. 7º da LIA, não se vislumbra uma típica tutela de urgência, como descrito acima, mas sim uma tutela de evidência, uma vez que o periculum in mora não é oriundo da intenção do agente dilapidar seu patrimônio e, sim, da gravidade dos fatos e do montante do prejuízo causado ao erário, o que atinge toda a coletividade. O próprio legislador dispensa a demonstração do perigo de dano, em vista da redação imperativa da Constituição Federal (art. 37, §4º) e da própria Lei de Improbidade (art. 7º). (...)

O periculum in mora, em verdade, milita em favor da sociedade, representada pelo requerente da medida de bloqueio de bens, porquanto esta Corte Superior já apontou pelo entendimento segundo o qual, em casos de indisponibilidade patrimonial por imputação de conduta ímproba lesiva ao erário, esse requisito é implícito ao comando normativo do art. 7º da Lei n. 8.429/92. (...)

A Lei de Improbidade Administrativa, diante dos velozes tráfegos, ocultamento ou dilapidação patrimoniais, possibilitados por instrumentos tecnológicos de comunicação de dados que tornaria irreversível o ressarcimento ao erário e devolução do produto do enriquecimento ilícito por prática de ato ímprobo, buscou dar efetividade à norma afastando o requisito da demonstração do periculum in mora (art. 823 do CPC), este, intrínseco a toda medida cautelar sumária (art.789 do CPC), admitindo que tal requisito seja presumido à preambular garantia de recuperação do patrimônio do público, da coletividade, bem assim do acréscimo patrimonial ilegalmente auferido” (STJ. 1ª Seção. REsp 1319515/ES, Rel. p/ Acórdão Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22/08/2012).

 • Depois da Lei nº 14.230/2021SIM.

Pressupostos

Quais são os pressupostos para se decretar a indisponibilidade de bens do réu?
Antes da Lei nº 14.230/2021Depois da Lei nº 14.230/2021
Somente o fumus boni iuris (indícios de que o réu praticou o ato de improbidade).

Para o STJ, bastava que o MP demonstrasse o fumus boni iuris.

periculum in mora era considerado presumido (implícito). Assim, a decretação de indisponibilidade de bens dispensava a demonstração do periculum in mora, bastando a demonstração do fumus boni juris, que consiste em indícios de atos ímprobos. STJ. 2ª Turma. AREsp 1812026/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 08/06/2021.
Passou a ser indispensável a demonstração, no caso concreto, do:
a) fumus boni iuris (juiz deve estar convencido da probabilidade da ocorrência dos atos descritos na petição inicial com fundamento nos respectivos elementos de instrução);
b) periculum in mora (deve estar demonstrado, no caso concreto, o perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo).

Veja o novo § 3º que foi incluído:
Art. 16 (…) § 3º O pedido de indisponibilidade de bens a que se refere o caput deste artigo apenas será deferido mediante a demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo, desde que o juiz se convença da probabilidade da ocorrência dos atos descritos na petição inicial com fundamento nos respectivos elementos de instrução, após a oitiva do réu em 5 (cinco) dias.
Jurisprudência em Teses (Ed. 38)
12) É possível a decretação da indisponibilidade de bens do promovido em ação civil pública por ato de improbidade administrativa, quando ausente (ou não demonstrada) a prática de atos (ou a sua tentativa) que induzam a conclusão de risco de alienação, oneração ou dilapidação patrimonial de bens do acionado, dificultando ou impossibilitando o eventual ressarcimento futuro.
Essa tese está superada.
A Lei agora exige expressamente a “demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo”.
Assim, o MP deve demonstrar que o réu está se desfazendo do seu patrimônio e, por essa razão, seria necessária a decretação da indisponibilidade.  

Então, pode-se decretar a indisponibilidade dos bens ainda que o acusado não esteja se desfazendo de seus bens?

• Antes da Lei nº 14.230/2021

SIM. A indisponibilidade dos bens visa, justamente, a evitar que ocorra a dilapidação patrimonial. Logo, não é razoável aguardar atos concretos direcionados à sua diminuição ou dissipação. Exigir a comprovação de que tal fato esteja ocorrendo ou prestes a ocorrer tornaria difícil a efetivação da medida cautelar e, muitas vezes, inócua (Min. Herman Benjamin).

Improbidade

Vale ressaltar, no entanto, que a decretação da indisponibilidade de bens, apesar da excepcionalidade legal, expressa da desnecessidade da demonstração do risco de dilapidação do patrimônio, não é uma medida de adoção automática, devendo o magistrado fundamentá-la adequadamente, sob pena de nulidade (art. 93, IX, da Constituição Federal), sobretudo por se tratar de constrição patrimonial (REsp 1.319.515/ES).

 • Depois da Lei nº 14.230/2021

NÃOA Lei agora exige expressamente a “demonstração no caso concreto de perigo de dano irreparável ou de risco ao resultado útil do processo”. Assim, o MP deve demonstrar que o réu está se desfazendo do seu patrimônio e, por essa razão, seria necessária a decretação da indisponibilidade.

Multa: pode incluir a multa civil na indisponibilidade administrativa?

O STJ fixou uma tese a respeito do tema:

É possível a inclusão do valor de eventual multa civil na medida de indisponibilidade de bens decretada em ação de improbidade administrativa, inclusive nas demandas ajuizadas com esteio na prática de conduta prevista no art. 11 da Lei nº 8.429/92, tipificador da ofensa aos princípios nucleares administrativos.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.862.792-PR, Rel. Min. Manoel Erhardt (Desembargador convocado do TRF da 5ª Região), julgado em 25/08/2021 (Recurso Repetitivo – Tema 1055) (Informativo 706).

Ainda que inexistente prova de enriquecimento ilícito ou lesão ao patrimônio público, é possível a decretação da providência cautelar, notadamente pela possibilidade de ser cominada, na sentença condenatória, a pena pecuniária de multa civil como sanção autônoma, cabendo sua imposição, inclusive, em casos de prática de atos de improbidade que impliquem, tão somente, violação a princípios da Administração Pública.

Essa providência de inclusão da multa civil na medida constritiva em ações de improbidade administrativa exclusivamente amparadas no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não implica violação do art. 7º, caput e parágrafo único, da citada lei, pois destina-se, de todo modo, a assegurar a eficácia de eventual desfecho condenatório à sanção de multa civil.

OBS: Depois da Lei nº 14.230/2021 foi incluído o § 10 para afastar expressamente essa possibilidade:

Art. 16 (...)

§ 10. A indisponibilidade recairá sobre bens que assegurem exclusivamente o integral ressarcimento do dano ao erário, sem incidir sobre os valores a serem eventualmente aplicados a título de multa civil ou sobre acréscimo patrimonial decorrente de atividade lícita.

Em outras palavras, o que fez a nova lei de improbidade administrativa?

Alterações nos requisitos para decretação da indisponibilidade de Bens

Antes da Lei nº 14.230/2021:

  • Presunção do periculum in mora:

A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendia que, para a decretação da indisponibilidade de bens, bastava a presença de indícios da prática de ato ímprobo (fumus boni iuris), sendo o periculum in mora presumido.

Assim, não era necessária a demonstração concreta de risco de dilapidação patrimonial.

Esse entendimento foi consolidado no Tema 701 dos recursos repetitivos do STJ.

Depois da Lei nº 14.230/2021:

  • Exigência de demonstração concreta do periculum in mora:
  • A nova redação da LIA passou a exigir, expressamente, a demonstração, no caso concreto, de perigo de dano irreparável ou risco ao resultado útil do processo para o deferimento da medida de indisponibilidade de bens.
  • Além disso, o juiz deve estar convencido da probabilidade da ocorrência dos atos descritos na petição inicial, com base nos elementos de instrução apresentados, e, em regra, após a oitiva do réu no prazo de cinco dias. Essas disposições estão previstas no art. 16, §§ 3º e 4º da LIA.

Limitação da indisponibilidade ao valor do dano

Antes da Lei nº 14.230/2021:

  • Abrangência da multa Civil:
  • Era possível que a medida de indisponibilidade de bens abrangesse não apenas o valor necessário para o ressarcimento do dano ao erário, mas também valores correspondentes à eventual multa civil a ser aplicada. Esse entendimento foi consolidado no Tema 1.055 dos recursos repetitivos do STJ.

Depois da Lei nº 14.230/2021:

  • Restrição ao valor do dano ao erário:
  • A nova legislação estabeleceu que a indisponibilidade de bens deve recair exclusivamente sobre os bens necessários para assegurar o integral ressarcimento do dano ao erário, não incidindo sobre valores destinados ao pagamento de multa civil ou sobre acréscimos patrimoniais decorrentes de atividades lícitas.
  • Essa limitação está prevista no art. 16, § 10 da LIA.

O que chegou ao STJ, agora?

A dúvida era se essas alterações seriam de cunho material ou processual, isto é, se só poderia ser aplicadas aos processos de 2021 para frente, ou se poderia ser aplicada para todos os processos anteriores a inovação legislativa.

Aplicabilidade Imediata:

O STJ, ao julgar o Tema 1.257, decidiu que as disposições introduzidas pela Lei nº 14.230/2021 aplicam-se aos processos em curso, inclusive àqueles iniciados sob a vigência da redação anterior da LIA.

Isso significa que medidas de indisponibilidade de bens já deferidas podem ser reavaliadas para adequação às novas exigências legais, especialmente no que se refere à necessidade de demonstração concreta do periculum in mora e à exclusão da multa civil do montante indisponível.

Comparativo das Alterações

Por fim, para facilitar a compreensão, segue uma tabela comparativa das principais mudanças:

AspectoAntes da Lei nº 14.230/2021Depois da Lei nº 14.230/2021
Requisitos para IndisponibilidadePericulum in mora presumido; não exigida demonstração concreta de risco. (Tema 701)Necessária demonstração concreta de perigo de dano irreparável ou risco ao resultado útil.
Abrangência da MedidaIncluía valores para ressarcimento do dano e multa civil. (Tema 1.055)Restrita ao valor necessário para ressarcimento do dano ao erário; exclui multa civil.
Aplicação a processos em curso – novas medida de 2021 podem ser aplicadas retroativamente?Sim.Novas disposições aplicáveis imediatamente a processos em curso, com possibilidade de revisão. (Tema 1.257)

Perceba então que o STJ revogou o tema 1055 e tema 701!

Eu não tenho nenhuma DÚVIDA que isso vai cair e muito nas provas e concursos!

Fiquem ligados totalmente!!!


Referências

CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A indisponibilidade pode ser decretada em qualquer hipótese de ato de improbidade e deve abranger o pagamento da multa civil. Buscador Dizer o Direito, Manaus. Disponível em: <https://buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/0e230b1a582d76526b7ad7fc62ae937d>. Acesso em: 20/02/2025.


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