* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.
Senado aprova PEC
O Plenário do Senado aprovou, em primeiro e segundo turnos, a proposta que inclui as guardas municipais e os agentes de trânsito entre os órgãos de segurança pública previstos na Constituição.
A proposta é a PEC 37/2022, de autoria do senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). Em seguida, ela será encaminhada à Câmara dos Deputados para análise.
Segundo o art. 144, da CF, a segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
VI - polícias penais federal, estaduais e distrital.
A PEC acrescenta os incisos VII e VIII ao artigo 144, da CF/88:
CF/88
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
...
VII - guardas municipais;
VIII – de Segurança Viária, com seus Agentes de Trânsito, conforme §10 deste artigo.
Atribuições e nomenclatura
Ademais, o parágrafo 5º, do mesmo artigo 44, complementa:
Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
De acordo com a proposta de emenda, os municípios poderão constituir guardas ou polícias municipais, com atribuições de:
- Proteção de seus bens, serviços, instalações;
- Policiamento ostensivo local e comunitário;
- Exercício de ações de segurança em seus territórios; e
- Apoio e colaboração com os demais órgãos de segurança pública.
A PEC prevê, ainda, que os municípios serão autorizados a alterar, mediante lei, a nomenclatura de suas guardas para “polícia municipal“, “guarda civil“, “guarda civil municipal“, “guarda metropolitana” ou “guarda civil metropolitana“.
O texto da PEC também determina que o preenchimento do quadro de servidores das guardas municipais que optarem pela mudança de nomenclatura será feito, exclusivamente, por meio de:
- Concurso público ou
- Transformação dos cargos isolados ou dos cargos de carreira dos atuais guardas municipais.
Por fim, o Plenário do Senado rejeitou um destaque que incluía o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) entre os órgãos de segurança pública. O fundamento foi de que tal inclusão acabaria provocando um conflito de competência com o patrulhamento rodoviário, feito hoje pela Polícia Rodoviária Federal.
Consequências
O objetivo da PEC é reconhecer formalmente as guardas municipais e os agentes de trânsito como partes integrantes do sistema de segurança pública, alinhando a legislação com a prática já existente.
Um dos maiores argumentos utilizados na discussão da PEC foi o sentimento de insegurança sentido pela população.
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, defendeu a PEC: “há verdadeiramente uma sensação de insegurança na sociedade brasileira”.
O senador Eduardo Braga ressaltou o apoio de toda a bancada do MDB à PEC, e disparou: “o Brasil tem carência de força policial e de prevenção ao crime nas ruas, sobretudo nas regiões mais pobres… A relação efetivo policial versus população é uma relação absolutamente abaixo da média mundial. Não é à toa que o Brasil apresenta índices pavorosos de homicídios. A PEC dará instrumentos aos estados e aos municípios para incrementar a presença do poder público e dar segurança ao cidadão”.
Podemos citar, como principais consequências da PEC:
- Para as guardas municipais e os agentes de trânsito -> haverá um reconhecimento formal de suas funções como parte da segurança pública, o que pode resultar em maior valorização e possivelmente melhores condições de trabalho.
- Para os municípios, estados e o Distrito Federal -> a inclusão desses agentes no rol de segurança pública pode exigir ajustes administrativos e orçamentários para atender às novas demandas e responsabilidades.
- Para a sociedade -> a medida pode aumentar a eficiência e a coordenação das ações de segurança pública, melhorando a proteção dos bens, serviços e instalações municipais, além de promover uma mobilidade urbana mais segura.
Tema 656 do STF
Importante lembrar que o Supremo Tribunal Federal decidiu, julgando o TEMA 656, que as Guardas Municipais podem atuar como polícia ostensiva, realizando, inclusive, prisões em flagrante.
As Guardas Municipais devem, entretanto, respeitar as atribuições das demais forças de segurança pública (polícia militar, polícia civil), que possuem competências reguladas pela Constituição e por normas estaduais.
Dessa forma, a Suprema Corte fixou o entendimento de que os Municípios podem criar leis que prevejam competências próprias de segurança urbana para as Guardas Municipais, em especial:
- Policiamento ostensivo;
- Policiamento comunitário;
- Prisões em flagrante;
- Agir diante de condutas lesivas a bens, pessoas e serviços.
Entretanto, os Municípios devem observar algumas balizas.
LIMITES ÀS GUARDAS MUNICIPAIS
1º) Não podem se sobrepor às competências da Polícia Militar;
2º) Não possuem poder de investigação;
3º) Atuação limitada às instalações municipais;
4º) Submetem-se à fiscalização do Ministério Público.
Por fim, a tese de repercussão geral firmada foi a seguinte:
“I. É constitucional, no âmbito dos municípios, o exercício de ações de segurança urbana pelas guardas municipais, inclusive o policiamento ostensivo comunitário, respeitadas as atribuições dos demais órgãos de segurança pública previstas no artigo 144 da Constituição Federal e excluída qualquer atividade de polícia judiciária, sendo submetidas ao controle externo da atividade policial pelo Ministério Público, nos termos do artigo 129, inciso 7º, da Constituição Federal.
II. Conforme o artigo 144, parágrafo 8º, da Constituição Federal, as leis municipais devem observar normas gerais fixadas pelo Congresso Nacional”.
Combate à criminalidade

A ideia central, com esse julgamento do Supremo, é fortalecer o combate à criminalidade através do reconhecimento de competências próprias de polícia ostensiva às Guardas Metropolitanas, que devem ser, cada vez mais, capacitadas, treinadas e armadas para garantir a segurança a que todos têm direito.
O grau de sofisticação e capilarização do crime, em especial o organizado, não permite abrir mão dos esforços das Guardas Municipais no combate dos ilícitos penais nos centros urbanos, não se mostrando razoável a atuação separada, estanque, de cada uma das forças policiais existentes em nosso país.
SUSP
Inclusive é importante destacar que, desde a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 995, o STF entende que as Guardas Municipais fazem parte do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP).
A ADPF 995 foi julgada procedente para, nos termos do artigo 144, §8º, da CF, conceder interpretação conforme à Constituição ao art. 4º, da Lei 13.022/14 e ao art. 9º, da 13.675/18, declarando inconstitucional todas as interpretações judiciais que excluam as Guardas Municipais, devidamente criadas e instituídas, como integrantes do Sistema de Segurança Pública.
Portanto, o entendimento do STJ de que as Guardas Municipais, apesar de integrarem o sistema de segurança pública, não possuem atribuições típicas de polícia, restou totalmente superado.
Após o julgamento do Supremo Tribunal Federal, podemos diferenciar bem a guarda municipal de uma guarda patrimonial.
GUARDA MUNICIPAL | GUARDA PATRIMONIAL |
Integra o Sistema Único de Segurança Pública | Não integra o sistema de segurança pública |
Pode atuar tanto na proteção do patrimônio quanto na função de polícia ostensiva | Pode atuar apenas na proteção do patrimônio (prédios, instalações, edifícios, empresas) |
Atua com poder de polícia | Pode apenas auxiliar autoridades |
Criada por lei municipal | Não necessita de lei para sua criação |
A PEC 37/2022, portanto, visa alinhar o texto da Constituição Federal ao entendimento do Supremo e à realidade fática existente no Brasil.
Importante acompanhar o desenrolar dos fatos. Isso porque o texto da PEC, agora, vai para a Câmara dos Deputados, necessitando ser aprovada em 2 turnos de votação.
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