Você já deve ter passado por isso no noticiário. A Fazenda ajuíza uma execução fiscal contra empresa e sócios, depois um deles consegue sair do processo através de exceção de pré-executividade.
Aí vem a dúvida: quanto cobrar de honorários a ser fixado pelo Poder Judiciário?
Pois bem, o Superior Tribunal de Justiça acaba de resolver essa divergência de uma vez por todas.
No dia 14 de maio, a Primeira Seção julgou o Tema 1265 e definiu que nesses casos os honorários devem ser fixados por equidade. Acabou a discussão.
O Ministro Herman Benjamin relatou a decisão, tendo como relator para acórdão o Ministro Gurgel de Faria. E olha, não foi uma decisão qualquer – foi por maioria, depois de muito debate entre os Ministros.
O caso que virou exemplo
Vamos usar um exemplo bem prático para entender melhor.
Imagine que a Fazenda Nacional processou a empresa JP Ltda e seus dois sócios, Jorge e Paulo, cobrando R$ 900 mil de tributos.
Paulo olhou a Certidão de Dívida Ativa e percebeu que seu nome nem constava como responsável.
O que ele fez?
Apresentou exceção de pré-executividade alegando ilegitimidade passiva. Basicamente disse ao juiz: “Olha, eu não tenho nada a ver com essa dívida, meu nome nem está na CDA”.
O juiz então concordou e tirou Paulo da execução. A empresa e Jorge continuaram no processo, mas Paulo foi dado por ilegítimo. Agora vem a pergunta que todo advogado faz: quanto cobrar de honorários?
Mas afinal, o que é exceção de pré-executividade?
Essa é uma dúvida básica que vale explicar. A exceção de pré-executividade é uma defesa mais simples que os embargos à execução.
Como explica Fredie Didier, no começo ela só servia para questões que o juiz poderia conhecer de ofício. Mas com o tempo a jurisprudência evoluiu.
Hoje você pode usar exceção de pré-executividade para qualquer defesa que possa ser provada com documentos que já estão nos autos e que o juiz conheça de ofício.
A Súmula 393 do STJ é clara: "A exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória".
Na prática, questões como ilegitimidade passiva, prescrição, nulidade da CDA – tudo isso pode ser arguido por exceção de pré-executividade.
A Ministra Assussete Magalhães já explicou bem a diferença: “enquanto os Embargos à Execução podem envolver qualquer matéria, a Exceção de Pré-Executividade limita-se a versar sobre questões cognoscíveis exofficio, que não demandem dilação probatória”.
Voltando ao caso concreto: a Fazenda tem que pagar honorários? (cuidado, apenas nos casos em que a Fazenda Nacional reconhece a procedência sem contestar alegação de ilegitimidade pois nesse caso não há honorários)
SIM, sem dúvida.
Isso já estava pacificado desde o Tema 961. O STJ decidiu que “é cabível a fixação de honorários advocatícios, em exceção de pré-executividade, quando o sócio é excluído do polo passivo da execução fiscal, que não é extinta”.
O raciocínio é simples. Para apresentar exceção de pré-executividade você precisa de advogado – é ato postulatório. Se a defesa é acolhida e o cara sai do processo, o advogado trabalhou e tem direito aos honorários. Quem deu causa à inclusão indevida foi a Fazenda, então ela paga a conta.
É o princípio da causalidade funcionando. Como diz a Súmula 153 do STJ: “A desistência da execução fiscal, após o oferecimento dos embargos não exime o exequente dos encargos da sucumbência”.
As duas teses que o STJ rejeitou
Agora vem a parte interessante. Como calcular esses honorários?
O STJ analisou duas teses que vinham sendo defendidas nos tribunais e rejeitou as duas.
Primeira tese rejeitada: calcular sobre o valor total da execução. No nosso exemplo, seria aplicar os percentuais do CPC sobre os R$ 900 mil integrais. O STJ disse não. Por quê? Imagina uma execução complexa com dez, quinze executados. Se cada um que sair tiver direito a honorários sobre o valor total, a Fazenda vai pagar uma fortuna. Em alguns casos, os honorários poderiam custar mais que a própria dívida.
Segunda tese rejeitada: dividir o valor da execução pelo número de executados. Alguns advogados argumentavam assim: “São três executados e a dívida é de R$ 900 mil. Logo, cada um responde por R$ 300 mil. O cálculos dos honorários de Paulo devem ser sobre esses R$ 300 mil”.
O STJ também rejeitou. Por quê? Porque na execução fiscal as coisas mudam muito. Hoje são três executados, amanhã podem ser seis (por redirecionamento), depois podem voltar a ser dois. Não dá para fazer conta assim.
A solução: proveito econômico inestimável
O STJ chegou a uma conclusão técnica importante. Quando Paulo sai da execução fiscal, qual é exatamente o benefício econômico que ele obtém?

Na verdade, ele não ganha dinheiro. Ele ganha tempo. A dívida continua existindo, continua sendo cobrada da empresa e do Jorge. Paulo simplesmente posterga um eventual pagamento futuro.
E esse tempo ganho é inestimável. Como disse o próprio Tribunal, esse benefício “é inestimável, pois o sucesso da pretensão do devedor não terá, em tese, nenhum impacto sobre o cálculo do débito inscrito em dívida ativa, já que atualizável na forma da lei”.
Ademais, mesmo que Paulo tivesse patrimônio para responder, ele só seria afetado até o limite dos seus bens expropriáveis. Isso também complica a conta do proveito econômico.
Como fica na prática?
Com essa decisão, quando um sócio conseguir sair (por ilegitimidade) de execução fiscal via exceção de pré-executividade (sem questionar o mérito da dívida), a fixação dos honorários ocorreria por equidade conforme o artigo 85, § 8º, do CPC.
Isso significa que o juiz vai considerar:
- A complexidade da questão
- O trabalho desenvolvido pelo advogado
- O tempo gasto
- A relevância da matéria
- As circunstâncias específicas do caso
Pode resultar em valores menores que os percentuais tradicionais do CPC, mas pelo menos há previsibilidade e segurança jurídica.
Não confunde com outras situações
Atenção: essa regra só vale quando a exceção de pré-executividade visa apenas tirar alguém do processo por ilegitimidade. Se houver questionamento do mérito da dívida – tipo dizer que o tributo é ilegal (mérito ou conteúdo do crédito) ou que não houve fato gerador – aí o benefício econômico pode ser mensurável e os honorários seguem as regras normais do CPC.
Outra situação diferente: quando a exceção é acolhida por prescrição intercorrente. Nesse caso, segundo o Tema 1229, nem honorários cabem. O princípio da causalidade tem suas nuances.
Compatibilidade com o Tema 1076
Alguns podem perguntar se essa decisão não contraria o Tema 1076, que limitou bastante o uso da equidade para honorários. A resposta é não.
O Tema 1076 estabeleceu que só cabe equidade quando “o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório”. É exatamente isso que acontece quando alguém sai de execução fiscal sem questionar a dívida.
Como explicou o relator: “a questão aqui definida – caráter inestimável do proveito econômico decorrente da exclusão de coexecutado do polo passivo da execução fiscal – é compatível com a conclusão alcançada no Tema 1076”.
A tese que vale para todo o Brasil
O STJ aprovou a seguinte tese, que agora é lei para todos os tribunais do país:
"Nos casos em que da Exceção de Pré-Executividade resultar, tão somente, a exclusão do excipiente do polo passivo da Execução Fiscal, os honorários advocatícios deverão ser fixados por apreciação equitativa, nos moldes do art. 85, § 8º, do CPC/2015, porquanto não há como se estimar o proveito econômico obtido com o provimento jurisdicional".
Ponto final. A discussão acabou. Agora é só aplicar na prática e ver como os juízes vão arbitrar esses valores por equidade.
Uma coisa é certa: o direito tributário brasileiro ficou mais organizado com essa decisão.
Trata-se de precedente que certamente influenciará positivamente a dinâmica das execuções fiscais, demonstrando o amadurecimento do sistema judicial brasileiro na análise de questões tributárias complexas e equilibrando adequadamente os interesses de todos os envolvidos no processo executivo fiscal.
Quer saber quais serão os próximos concursos?
Confira nossos artigos para Carreiras Jurídicas!