* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.
O Ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, votou para condenar um dos réus pelos atos golpistas de 8 de janeiro, que subtraiu uma bola de futebol autografada por Neymar, pertencente ao acervo da Câmara dos Deputados.
A pena imposta por Moraes é de 17 anos de prisão.
O julgamento se deu na AP 2.422, e tem como um dos réus Nelson Ribeiro Fonseca Júnior, acusado pelo Ministério Público Federal de ter participado ativamente da invasão e depredação do Congresso Nacional.
O homem está sendo acusado dos seguintes crimes:
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L do CP);
- Golpe de Estado (art. 359-M);
- Dano qualificado com violência (art. 163, parágrafo único, I, III e IV);
- Furto qualificado – Bola assinada por Neymar (art. 155, § 4º, I);
- Associação criminosa armada (art. 288, parágrafo único); e
- Deterioração de patrimônio tombado (art. 62, I da lei 9.605/98).
O caso
De acordo com o Ministério Público, o réu entrou no prédio da Câmara dos Deputados e retirou uma bola de futebol exposta no Salão Verde.
O objeto, avaliado como item de valor histórico, foi levado à cidade de Sorocaba/SP e devolvido vinte dias depois da invasão.
A jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores é pacífica no sentido de que a restituição voluntária do bem subtraído, ainda que após a consumação do delito, autoriza a aplicação do benefício legal do arrependimento posterior, com redução da pena de 1/3 a 2/3, desde que presentes todos os requisitos do art. 16 do Código Penal, a saber:
- Crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa;
- Reparação do dano ou restituição da coisa até o recebimento da denúncia ou da queixa;
- Ato voluntário do agente.
Tal entendimento se fundamenta na política criminal que valoriza a conduta reparadora do agente e busca incentivar a recomposição do dano causado à vítima, no caso, o patrimônio público da União.
Mas o reconhecimento do arrependimento posterior não afasta a tipicidade da conduta nem exclui a responsabilidade penal do agente.
Trata-se de causa obrigatória de diminuição de pena que reconhece e valoriza juridicamente a conduta posterior meritória do réu, harmonizando a necessária resposta penal estatal com os princípios de proporcionalidade e ressocialização que orientam o sistema punitivo brasileiro.
Inclusive, parte considerável dos estudiosos do Direito penal e do processo penal enxergam a pena como exagerada e desproporcional.
Dosimetria da pena
A questão de discussão, portanto, é a relativa à dosimetria da pena.

O objetivo da dosimetria da pena é garantir que a pena seja proporcional ao crime cometido e que aja como uma forma eficaz de prevenir futuros crimes.
O código penal brasileiro adotou o sistema trifásico de dosimetria da pena, conforme determina o artigo 68. Assim, temos a seguinte dinâmica:
Fases
1ª Fase – Fixação da pena-base: são levadas em consideração as circunstâncias que envolvem o crime, previstas no artigo 59, tais como culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade do agente, motivos, circunstâncias e consequências do crime, bem como o comportamento da vítima.
2ª Fase – Fixação da pena provisória: após a fixação da pena-base, o juiz avaliará as circunstâncias legais atenuantes e agravantes.
Circunstâncias
Circunstância atenuantes -> estão previstas no artigo 65 do Código Penal, e são:
- o agente ter menos de 21 anos ou mais de 70 na data da sentença;
- desconhecimento da lei;
- cometer o crime por motivo de relevante valor social ou moral;
- se o agente minorar as consequências do crime ou, antes do julgamento, reparar o dano de forma espontânea;
- se o crime for cometido sob coação a que podia resistir ou em cumprimento de ordem de autoridade superior;
- sob violenta emoção provocada por ato injusto da vítima;
- se confessar a autoria do crime de forma espontânea;
- se o crime for cometido sob a influência de multidão, caso não tenha provocado o tumulto;
Circunstância agravantes -> estão previstas no artigo 61 do Código Penal, e são:
- reincidência;
- motivo fútil ou torpe;
- se o crime for cometido para assegurar a execução, ocultação, impunidade ou vantagem de outro crime;
- mediante traição, emboscada ou dissimulação;
- com emprego de veneno, fogo, explosivo, tortura ou outro meio cruel;
- contra ascendente, descendente, irmão ou cônjuge;
- com abuso de autoridade;
- prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hostilidade;
- com violência contra a mulher;
- com abuso de poder;
- contra criança, maior de 60 anos, enfermo ou mulher grávida;
- quando o ofendido estava sob proteção de autoridade;
- em caso de incêndio, naufrágio, inundação ou calamidade pública, ou desgraça particular do ofendido;
- em caso de embriaguez preordenada.
3ª Fase – Fixação da pena definitiva: após a fixação da pena provisória, é calculada a pena definitiva, sendo aplicadas as causas de aumento ou diminuição da pena, chamadas de minorantes ou majorantes.
As causas de aumento ou diminuição da pena estão espalhadas na parte geral e na parte especial do Código Penal e podem aumentar a pena acima do limite máximo ou reduzi-la abaixo do mínimo.
Teoria das margens
A grande dificuldade na dosimetria da pena, no sistema trifásico, é o quantum que o juiz deve estabelecer na primeira e na segunda fases, porque não há um valor certo previsto na legislação.
Na primeira e na segunda fases, não há o limite mínimo e o máximo, em termos de fração, para o juiz elevar a pena-base acima do mínimo legal ou até mesmo, em eventual agravante, elevar na segunda fase. É um critério discricionário do juiz.
A aplicação da pena, portanto, é uma atividade discricionariamente vinculada, ou seja, o juiz, dentro dos limites e das balizas legais, tem liberdade para analisar o caso concreto, podendo aplicar pena máxima, intermediária ou mínima, dentro da sua discricionariedade.

Temos, ademais, o princípio da individualização da pena, pelo qual a pena deve ser individualizada nos planos legislativo, judiciário e executório, evitando-se a padronização da sanção penal. Para cada crime tem-se uma pena que varia de acordo com as circunstâncias do crime e características dos agente.
Conclusão
Voltando ao caso de Nelson, que participou dos atos de 08/01, a pena aplicada por Moraes ficou assim:
- Abolição violenta do Estado Democrático de Direito: 4 anos e 6 meses de reclusão.
- Golpe de Estado: 5 anos de reclusão.
- Dano qualificado com violência: 1 ano e 6 meses de detenção e 50 dias-multa.
- Furto qualificado (Bola assinada por Neymar): 3 anos de reclusão e 30 dias-multa.
- Associação criminosa armada: 1 ano e 6 meses de reclusão.
- Deterioração de patrimônio tombado: 1 ano e 6 meses de detenção e 50 dias-multa.
Ótimo tema para ser cobrado em provas de direito processual penal!
Quer saber quais serão os próximos concursos?
Confira nossos artigos para Carreiras Jurídicas!