STF decide que normas que isentam o pagamento de honorários advocatícios em ações contra a União são inconstitucionais, garantindo a devida remuneração aos advogados.
*João Paulo Lawall Valle é Advogado da União (AGU) e professor de direito administrativo, financeiro e econômico do Estratégia carreira jurídica.
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Entenda o caso – Pagamento de honorários
O Supremo Tribunal Federal, por maioria dos seus membros, firmou entendimento pela inconstitucionalidade de normas que dispensavam o pagamento de honorários advocatícios em ações judiciais envolvendo a União.
A decisão foi proferida no bojo da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.405, ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB). Na ação de controle concentrado de constitucionalidade, o CFOAB questionou diversas normas dispostas em leis federais que previam a dispensa do pagamento desses honorários em casos de adesão a parcelamentos ou acordos com o poder público.
As normas impugnadas pela Ordem dos Advogados do Brasil forma as seguintes:
- Lei 11.775/08: art. 8º-A, § 5º.
- Lei 11.941/09: art. 6º, § 1º.
- Lei 12.249/10: art. 65, § 17.
- Lei 12.844/13: arts. 8º, § 21; 8º-B, II, § 4º; 8º-E, § 5º; 9º, § 12; 10, parágrafo único; e 21.
- Lei 13.043/14: art. 38.
O autor da ADI sustentou que os atos normativos impugnados violam os artigos 1º, III, 5º, caput e incisos XXII, XXXV e XXXVI; e 133 da Constituição Federal. Alegou que tanto os honorários contratuais quanto os de sucumbência possuem natureza remuneratória e, portanto, alimentar, motivo pelo qual a dispensa de pagamento desses valores pelo legislador infraconstitucional seria incompatível com a dignidade da profissão, violando o princípio da dignidade humana e a indispensabilidade do advogado para a administração da justiça.
O CFOAB trouxe, ainda, os seguintes argumentos principais para fundamentar a alegada inconstitucionalidade:
Não se pode cogitar da realização de trabalho sem a devida contraprestação, sendo que os honorários sucumbenciais fixados em sentença seriam parte do patrimônio do advogado, a quem caberia exclusivamente dispor sobre a verba;
As normas questionadas seriam incompatíveis com o princípio da inafastabilidade do Poder Judiciário, visto que ao advogado vencedor de uma ação devem ser concedidos os honorários sucumbenciais;
A estipulação de condição – dispensa dos honorários sucumbenciais estipulados em sentenças transitadas em julgado – para o deferimento de parcelamentos e renegociações de dívidas importaria em contrariedade à coisa julgada, bem como ao princípio da isonomia, por limitar o poder de negociação do devedor.
A ADI 5.405 foi incluída no Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal e a Corte, em 13/02/2025, formou maioria para declarar a inconstitucionalidade dos dispositivos legais questionados que restringiam o pagamento de honorários advocatícios em ações judiciais envolvendo a União.
No momento do fechamento deste texto já há 6 votos favoráveis à declaração de inconstitucionalidade das normas acima referidas.
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O ministro Flávio Dino proferiu voto vogal na ADI 5.405 divergindo parcialmente do relator e conferindo interpretação conforme ao § 1º do art. 6º da Lei nº 11.941/2009, ao § 17 do art. 65 da Lei nº 12.249/2010, ao § 21 do art. 8º, ao § 12 do art. 9º, bem como ao parágrafo único do art. 10 da Lei nº 12.844/2013, afastando a aplicação da restrição dos honorários em face da União em relação a processos judiciais nos quais os honorários sucumbenciais tenham sido fixados em sentença. Caso não haja tal condenação, entendeu o Ministro que os honorários tratam-se de mera expectativa, não havendo inconstitucionalidade.
Análise Jurídica
O Supremo Tribunal Federal foi demandado a analisar a compatibilidade dos dispositivos legais acima citados que, em tese, restringem o direito dos advogados de receberem honorários advocatícios em ações judiciais propostas em face da União.
Os parâmetros para análise de (in)constitucionalidade foram os seguintes dispositivos constitucionais:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
III - a dignidade da pessoa humana;
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXII - é garantido o direito de propriedade;
(...)
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;
Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.
O Estatuto da OAB (Lei 8.906/1994) estabelece que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado que, exercendo suas funções laborais em um determinado processo obtém sucesso em favor de seu cliente:
Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.
Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor.
Os honorários pertencem aos advogados e decorrem do seu trabalho, possuindo natureza remuneratória e alimentar, o que confere a eles especial proteção, em deferência ao serviço prestado pelos advogados, privados ou públicos.
A jurisprudência do STF é firme e estável no sentido de que os honorários sucumbenciais pertencem aos advogados, do que decorre que podem executar os respectivos valores de forma independente da execução do valor principal do processo. O entendimento está cristalizado na Súmula Vinculante nº 47:
Os honorários advocatícios incluídos na condenação ou destacados do montante principal devido ao credor consubstanciam verba de natureza alimentar cuja satisfação ocorrerá com a expedição de precatório ou requisição de pequeno valor, observada ordem especial restrita aos créditos dessa natureza.
Na mesma linha, o atual Código de Processo Civil prevê o seguinte:
Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.
(...)
§ 14. Os honorários constituem direito do advogado e têm natureza alimentar, com os mesmos privilégios dos créditos oriundos da legislação do trabalho, sendo vedada a compensação em caso de sucumbência parcial.
§ 19. Os advogados públicos perceberão honorários de sucumbência, nos termos da lei.
Os honorários de sucumbência são titularizados pelos advogados, públicos ou privados, e possuem especial proteção, pois remuneram esses profissionais pelos serviços prestados, decorrendo disso o caráter remuneratório e alimentar dessa verba, com os privilégios disso decorrentes.
O Supremo Tribunal Federal já teve a oportunidade de se manifestar sobre casos de dispensa, diminuição ou flexibilização dos honorários sucumbenciais, e neste contexto reafirmou o entendimento consagrado segundo o qual os honorários de sucumbência são verbas titularizadas pelos advogados e têm natureza remuneratória e alimentar.
No mesmo sentido, em outro caso, no qual as partes litigantes celebraram acordo homologado judicialmente, o Tribunal acolheu embargos do advogado da parte vencedora para fixar que são devidas as verbas de sucumbência quando há homologação de transação celebrada sem a participação do patrono da causa, uma vez que somente o titular dos honorários pode transigir sobre a respectiva remuneração.
Conclusão – Pagamento de honorários
É possível afirmar, com alto grau de segurança, que é pacífico no Supremo Tribunal Federal, o entendimento no sentido de que os honorários de sucumbência pertencem ao advogado que atuou nos autos, não importando se advogado público ou privado, uma vez que a sucumbência perfaz contraprestação por serviços prestados e, portanto, possui natureza remuneratória e alimentar, sem distinção em relação a eventual vínculo do advogado com o poder público.
Vale destacar que conforme entendimento da Corte, os honorários advocatícios são disponíveis pelo advogado a que pertencem, e não pela pessoa por ele representada, seja a Fazenda Pública, seja o cliente particular.
Com base em sua jurisprudência consolidada, o STF formou maioria para conhecer da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.405 e declarar a inconstitucionalidade do:
- Art. 38 da Lei nº 13.043, de 13 de novembro de 2014.
- Art. 8º-A, § 5º, da Lei nº 11.775, de 17 de setembro de 2008;
- Art. 6º, § 1º, da Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009;
- Art. 65, § 17, da Lei nº 12.249, de 11 de junho de 2010;
- Arts. 8º, § 21; 8º-B, inciso II, § 4º; 8º-E, § 5º; 9º, § 12; 10, parágrafo único; e 21 da Lei nº 12.844, de 19 de julho de 2013; e
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