Análise jurídica do Informativo 830 do STJ sobre a devolução de valores recebidos por decisão judicial precária em matéria previdenciária.
Imagine a seguinte situação:
João é aposentado do INSS e recebe R$ 3.000,00 mensais.
Acreditando que seu benefício foi calculado incorretamente, ele ingressa com uma ação judicial pedindo a revisão de sua aposentadoria.
O juiz, convencido pelos argumentos apresentados, concede uma tutela provisória de urgência determinando que o INSS pague R$ 4.000,00 mensais. Após dez meses, contudo, a Turma Recursal reforma a decisão, revogando a tutela e julgando o pedido improcedente.
A questão que se coloca é:
João terá que devolver os R$ 10.000,00 que recebeu a mais durante esses dez meses?
Devolução de valores
1ª Fase – 2014: O entendimento inicial
Em 2014, o STJ enfrentou essa questão ao julgar o Tema 692, fixando o entendimento de que:
“a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos”.
Entretanto, esta decisão gerou inicialmente algumas controvérsias, especialmente porque o STF tinha precedentes em sentido contrário, reconhecendo a irrepetibilidade dos valores em razão de seu caráter alimentar.
No entanto, o próprio STF, ao julgar o Tema 799 da Repercussão Geral, esclareceu que a matéria tinha natureza infraconstitucional, reconhecendo a competência do STJ para definir a questão.
Além disso, a Lei 13.846/2019 trouxe importante modificação ao art. 115, II, da Lei 8.213/91, passando a prever expressamente a possibilidade de desconto de valores recebidos por força de decisão judicial posteriormente revogada, limitado a 30% do benefício.
2ª Fase – 2022: Primeira complementação
Em maio de 2022, o STJ reafirmou o entendimento e acrescentou o limite percentual para desconto, passando a tese a ter a seguinte redação:
“A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago.”
3ª Fase – 2024: Segunda complementação
Em outubro de 2024, através dos Embargos de Declaração na Pet 12.482/DF, o STJ foi provocado pelo INSS a esclarecer um ponto específico:
Como proceder à cobrança quando não há benefício ativo para realizar o desconto?
De fato, o Ministro Afrânio Vilela, ao analisar a questão, identificou que embora o acórdão anterior já mencionasse a possibilidade de liquidação nos próprios autos (com base no art. 520, II, do CPC/2015), a tese não tinha incorporado expressamente essa orientação.
Tese final do Tema 692
A Primeira Seção do STJ acolheu parcialmente os embargos de declaração do INSS e fixou a redação final do Tema 692:
“A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% (trinta por cento) da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidando-se eventuais prejuízos nos mesmos autos, na forma do art. 520, II, do CPC/2015 (art. 475-O, II, do CPC/1973).”
Vamos lá, mas, professor, o que mudou com a nova complementação?
- De início, houve um esclarecimento processual: Isto porque, ficou expressamente reconhecida a possibilidade de liquidação nos próprios autos do processo original
- Ou seja, no fundo, houve uma simplificação procedimental: assim, não há necessidade de ajuizamento de nova ação para cobrar os valores
- E qual será o rito? A liquidação deve seguir o art. 520, II, do CPC/2015
Voltando ao caso de João, o INSS agora tem duas opções para reaver os R$ 10.000,00:
- Se João ainda receber benefício ativo: desconto mensal limitado a 30% do valor.
- Se não houver benefício ativo: liquidação no próprio processo onde houve a revogação da tutela
Como o tema já caiu em concursos:
CESPE – 2016 – PGE-AM – Procurador do Estado
De acordo com a jurisprudência do STJ, a posterior reforma de decisão judicial que, tendo antecipado a tutela pleiteada, tiver possibilitado o imediato gozo do benefício previdenciário obrigará o autor da ação a devolver os valores indevidamente recebidos
Gabarito oficial: Certo
Devolução de valores
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