Danos materiais e transporte internacional – Tema 1.366 de Repercussão Geral no Informativo 1164

Danos materiais e transporte internacional – Tema 1.366 de Repercussão Geral no Informativo 1164

No informativo 1164 do STF de 2025, o segundo do ano, o Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do Ministro Luís Roberto Barroso, consolidou um importante precedente sobre a responsabilidade civil no transporte aéreo internacional de cargas, sob à luz do Tema de Repercussão Geral:

1)A pretensão indenizatória por danos materiais em transporte aéreo internacional está sujeita aos limites previstos em normas e tratados internacionais firmados pelo Brasil, em especial as Convenções de Varsóvia e de Montreal;

2)É infraconstitucional e fática a controvérsia sobre o afastamento da limitação à pretensão indenizatória quando a transportadora tem conhecimento do valor da carga ou age com dolo ou culpa grave.

RE 1.520.841/SP, relator Ministro Presidente, julgamento finalizado no Plenário Virtual em 03.02.2025 (segunda-feira)

Mas, professor, o STF já não tinha entendido algo semelhante, né?

É justamente sobre isso que vamos tratar, sobre os precedentes do STF nos casos de transporte aéreo internacional, ok?

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Caso concreto que originou o Tema 1.366

Danos materiais

A discussão iniciou-se quando a AKAD Seguros ajuizou ação regressiva contra a KLM – Companhia Real Holandesa de Aviação buscando o ressarcimento integral de valores pagos em razão de danos ocorridos durante o transporte aéreo internacional de carga.

Para ficar mais claro: suponha que eu/você fazemos uma viagem internacional, certo? O fato é que, pode ser que percam nossa bagagem. Pode ser que haja o extravio e o desaparecimento da bagagem, ok?

Suponha que haja um prejuízo seu comprovado de R$ 50.000,00 de danos materiais.

Uma empresa determinada entrou com uma ação contra a empresa de “seguro” que ela contratou para caso se acontecesse algum problema com o transporte internacional dela. A empresa de seguro teve que pagar os R$ 50.000,00 de danos materiais ao consumidor.

E aí, a empresa de SEGURO ingressou com ação de REGRESSO contra a companhia aérea pedindo os R$ 50.000,00, entendeu?

E aí, como ficam os danos materiais, professor?

Vamos voltar ao caso concreto.

O Tribunal de Justiça de São Paulo havia limitado a indenização com base na Convenção de Montreal, decisão que foi contestada pela seguradora.

A recorrente argumentava que o Tema 210/RG (RE 636.331) não seria aplicável ao transporte de cargas, pois trataria apenas de bagagens de passageiros.

Além disso, sustentava que o Código Civil brasileiro, com seu princípio da reparação integral, deveria prevalecer sobre as convenções internacionais.

Um adendo – Tema 210 de Repercussão Geral

É o seguinte.

A Convenção de Montreal, incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto nº 5.910/2006, estabelece limites de responsabilidade para as companhias aéreas em casos de danos materiais relacionados ao transporte aéreo internacional. Esses limites são expressos em Direitos Especiais de Saque (DES), uma unidade monetária internacional cujo valor é determinado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).

  • Limite de Responsabilidade: em casos de destruição, perda, avaria ou atraso de bagagem registrada, a responsabilidade da transportadora está limitada a 1.288 DES por passageiro, salvo se o passageiro fizer uma declaração especial de valor no momento da entrega da bagagem e pagar uma quantia suplementar, se aplicável.
  • Para converter DES em reais (BRL), é necessário verificar a taxa de câmbio atual. Por exemplo, considerando uma taxa hipotética onde 1 DES equivale a R$ 7,50, o cálculo seria: 1.288 DES x R$ 7,50/DES = R$ 9.660,001.

Em 2017, STF decidiu que no caso de transporte aéreo internacional de passageiros, as Convenções de Varsóvia e Montreal prevalecem em relação ao CDC (Tema 210):

Nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor.

STF. Plenário RE 636331/RJ, Rel. Min. Gilmar Mendes e ARE 766618/SP, Rel. Min. Roberto Barroso, julgados em 25/05/2017 (Repercussão Geral – Tema 210) (Informativo 866).
O que isso significa?

Que caso haja indenização por danos materiais de bagagem aérea, o valor fica limitado ao que estiver no Tratado Internacional, pouco importa, o valor exato que você tinha na bagagem.

Em embargos de declaração, o STF decidiu que o entendimento acima não se aplica no caso de danos marais (atualização da tese fixada no Tema 210).

Recapitulando. A indenização decorrente de extravio de bagagem e de atraso de voo internacional está submetida à tarifação prevista na Convenção de Montreal?

  • Em caso de danos MATERIAIS: SIM.
  • Em caso de danos MORAIS: NÃO.

O que isso significa?

Que caso haja indenização por danos MORAIS em transporte internacional, o valor NÃO fica limitado ao que estiver no Tratado Internacional, é possível que a quantificação seja conforme o que se entender devido, conforme normas brasileiras.

Ok, entendi. Vamos voltar ao caso concreto, o caso não foi igual ao tema 210?

Não.

O Tema 210 (RE 636.331), julgado em 2017, e estabeleceu que as convenções internacionais (Varsóvia e Montreal) prevalecem sobre o Código de Defesa do Consumidor em casos de transporte aéreo internacional de passageiros, especificamente quanto à indenização por danos materiais decorrentes de extravio de bagagem.

Já o Tema 1.366 (RE 1.520.841), julgado em 2025, expandiu esse entendimento, confirmando que a mesma lógica se aplica ao transporte aéreo internacional de cargas. Ou seja, as convenções internacionais também prevalecem sobre a legislação nacional (Código Civil e CDC) nas indenizações por danos materiais relacionados a cargas e mercadorias.

Em essência, enquanto o Tema 210 tratou da relação com passageiros e suas bagagens, o Tema 1.366 estendeu a mesma ratio decidendi para o transporte de cargas, consolidando um entendimento uniforme sobre a prevalência do direito internacional em toda a matéria de transporte aéreo internacional.

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Qual foi a razão do STF? Por que prevalecem as Convenções?

Porque a Constituição Federal de 1988 determinou que, em matéria de transporte internacional, deveriam ser aplicadas as normas previstas em tratados internacionais. Veja:

Art. 178. A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade.

Assim, em virtude dessa previsão expressa quanto ao transporte internacional, deve-se afastar o Código de Defesa do Consumidor e aplicar o regramento do tratado internacional.

Um detalhe importante

Assim, ficou consignado a segunda parte da tese:

2)É infraconstitucional e fática a controvérsia sobre o afastamento da limitação à pretensão indenizatória quando a transportadora tem conhecimento do valor da carga ou age com dolo ou culpa grave.

Veja na íntegra o que disse o Ministro do seu voto:

“O recurso, contudo, não pode ser conhecido na parte que discorre sobre a não sujeição aos limites impostos pela Convenção de Montreal quando a transportadora tem conhecimento dos valores das mercadorias. Essa é uma controvérsia de natureza infraconstitucional e fática. Cuida-se de um debate sobre a interpretação do regramento previsto na Convenção Internacional e sobre as circunstâncias fáticas da conduta relacionada ao dano material no transporte aéreo internacional de carga. Assim sendo, não é cabível recurso extraordinário para saber se a limitação à pretensão indenizatória deve ser afastada quando a transportadora tem conhecimento do valor da carga ou age com dolo ou culpa grave, porque é uma controvérsia que pressupõe o exame de matéria fática e infraconstitucional”.

Professor, e qual foi sua interpretação?

Veja, novamente a restrição na convenção:

  • Limite de Responsabilidade: em casos de destruição, perda, avaria ou atraso de bagagem registrada, a responsabilidade da transportadora está limitada a 1.288 DES por passageiro, salvo se o passageiro fizer uma declaração especial de valor no momento da entrega da bagagem e pagar uma quantia suplementar, se aplicável.

Regra geral:

A responsabilidade do transportador está limitada a 1.288 Direitos Especiais de Saque (DES) por passageiro.

Exceção:

Se o expedidor fizer uma declaração especial de valor da entrega no destino e pagar uma taxa suplementar, caso necessário, o transportador será responsável até o valor declarado, exceto se provar que este valor é superior ao real interesse do expedidor na entrega

Uma empresa precisa transportar equipamentos eletrônicos avaliados em R$ 500.000,00, com peso de 100kg.

Neste caso, ela tem duas opções:

A) Não fazer declaração especial:

  • A indenização ficaria limitada ao valor. Ainda que a transportadora soubesse informalmente do valor, prevaleceria este limite…

B) Fazer declaração especial:

  • Declarar o valor de R$ 500.000,00; Pagar eventual taxa suplementar; Garantir indenização pelo valor total em caso de dano ou perda

Veja, obviamente, isso dependerá da análise que os Tribunais Estaduais interpretarem e eventualmente o STJ. Mas, na minha concepção interpretando o tratado internacional, caso a parte faça a “declaração especial”, tanto a parte pode pedir o reembolso integral da companhia aérea, como também, os seguros podem solicitar em ação de regresso o valor total.

Professor, o STF disse isso?

Não disse.

Deixou para os tribunais decidirem pois o tema é “infraconstitucional”.

E você, o que acha?

Um abraço!

Como tema já caiu em provas

(2023 - CEBRASPE - JUIZ TJDFT) Os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, formalizados ou atualizados após o CDC, ainda que menos favoráveis ao consumidor, têm prevalência em relação a esse diploma legal.

Gabarito: Certo.
(MPE-RO – Promotor de Justiça Substituto – VUNESP – 2024)

Sobre o entendimento do STJ acerca de regras constantes do Código de Defesa do Consumidor, assinale a alternativa correta.

A) Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor em resolução de contrato de compra e venda de imóvel com garantia de alienação fiduciária registrado em cartório, na hipótese de inadimplemento de devedor constituído em mora.

B) Há possibilidade de responsabilizar órgão de proteção ao crédito por incluir em seus registros elementos constantes em banco de dados públicos de cartório de distribuição do judiciário.

C) É de cobertura obrigatória pelos planos de saúde a cirurgia plástica de caráter reparador ou funcional indicada pelo médico assistente em pacientes pós-cirurgia bariátrica, visto ser parte decorrente do tratamento da obesidade mórbida.

D) A ausência de informação relativa a preço, por si só, caracteriza publicidade enganosa.

E) A condenação por danos a mercadoria ou carga em transporte aéreo internacional, contratada em território nacional, não está sujeita aos limites previstos nas convenções e nos tratados internacionais, sendo aplicável o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Gabarito: C.

  1. Pré-Postagem Internacional 2.8.12. Correios. Disponível em: <https://efi.correios.com.br/app/moeda/moeda.php>. ↩︎

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