O concurso público na jurisprudência dos Tribunais Superiores: parte 1
Realizando provas de concurso público

O concurso público na jurisprudência dos Tribunais Superiores: parte 1

Realizando provas de concurso público.

Olá turma, como estão os estudos? Aproveitando o clima de CNU, vamos relembrar alguns casos examinados pela jurisprudência do Tribunais Superiores (STJ e STF) envolvendo a temática dos concursos públicos.

Os concursos públicos na jurisprudência do Tribunais.

O concurso público, como meio de acesso aos cargos efetivos da Administração Pública, está previsto especificamente (e até com alguma carga de detalhamento) na própria Carta Constitucional de 1988 (CF/88), ganhando status de verdadeiro “princípio”, nos termos do art. 37, I, II, III e IV, da CF:

  • Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
  • I – os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei;  
  • II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração;
  • III – o prazo de validade do concurso público será de até dois anos, prorrogável uma vez, por igual período;
  • IV – durante o prazo improrrogável previsto no edital de convocação, aquele aprovado em concurso público de provas ou de provas e títulos será convocado com prioridade sobre novos concursados para assumir cargo ou emprego, na carreira;

Deve-se ressaltar que o concurso público é um método ou um instrumento de seleção de cidadãos para a ocupação de cargos e empregos públicos, visando à efetivação dos princípios da igualdade e da impessoalidade no âmbito da Administração Pública, pois sua regulamentação exige critérios objetivos de aprovação/reprovação e classificação, o que tende a evitar apadrinhamentos políticos ou nepotismos.

Segundo decidido pelo STF, em repercussão geral, “a força normativa do princípio do concurso público vincula diretamente a Administração. É preciso reconhecer que a efetividade da exigência constitucional do concurso público, como uma incomensurável conquista da cidadania no Brasil, permanece condicionada à observância, pelo Poder Público, de normas de organização e procedimento e, principalmente, de garantias fundamentais que possibilitem o seu pleno exercício pelos cidadãos.”

O princípio constitucional do concurso público é fortalecido quando o Poder Público assegura e observa as garantias fundamentais que viabilizam a efetividade desse princípio, tais como as garantias de publicidade, isonomia, transparência, impessoalidade, entre outras, que garantem a plena efetividade do princípio do concurso público (RE 598099, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 10-08-2011, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-189 DIVULG 30-09-2011 PUBLIC 03-10-2011 EMENT VOL-02599-03 PP-00314 RTJ VOL-00222-01 PP-00521).

Vamos aos entendimentos do STJ e do STF sobre alguns aspectos desse instituto e de sua regulamentação.

O concurso público na jurisprudência dos Tribunais Superiores: o direito adquirido

No primeiro caso, lembramos de um entendimento do STJ e STF acerca do direito adquirido à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do concurso.

Nesse contexto, reconhece-se que a discricionariedade da Administração Pública se limita a estabelecer o momento da nomeação do candidato, respeitando-se o prazo de validade do concurso previsto em edital (STJ. AgInt no RE no AgInt no RMS n. 62.013/MG, relator Ministro Jorge Mussi, Corte Especial, julgado em 16/11/2020, DJe de 19/11/2020).

Esse entendimento, cujos primeiros precedentes foram estabelecidos no ano de 2011 (Tema 161/STF), teve o efeito de garantir segurança jurídica aos concurseiros aprovados dentro das vagas editalícias, porém ensejou uma consequência negativa, consistente na publicação de editais de concurso com pouquíssimas ou nenhuma vaga prevista, limitando-se ao cadastro de reserva, como é de conhecimento notório daqueles, como nós, que estão envolvidos na área dos concursos públicos.

Ocorre que, mesmo nas hipóteses de aprovação dentro do número de vagas, há discricionariedade administrativa quanto ao momento da nomeação, conforme admite o STJ: “enquanto não expirado o prazo de validade do concurso público, o candidato aprovado, ainda que dentro do número de vagas, possui mera expectativa de direito à nomeação, dependente do juízo de conveniência e oportunidade da Administração Pública, salvo se comprovada preterição, o que não ocorreu nos autos” (AgInt no RMS n. 68.794/PR, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 7/10/2022).

Por fim, no mencionado precedente de 2011, definiu ainda o STF que “Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos servidores”.

Para justificar o excepcionalíssimo não cumprimento do dever de nomeação por parte da Administração Pública, é necessário que a situação justificadora seja dotada das seguintes características:

  • Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do edital do certame público;
  • Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital;
  • Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital;
  • Necessidade: a solução drástica e excepcional de não cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária, de forma que a Administração somente pode adotar tal medida quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível.

“De toda forma, a recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário”[1].

O concurso público na jurisprudência dos Tribunais Superiores: a expectativa de direito

Paralelamente ao direito adquirido do candidato aprovado dentro do número de vagas fixado em edital, há a expectativa de direito daquele que foi aprovado fora do número de vagas.

Nesse contexto, o âmbito de discricionariedade da Administração Pública é maior, pois poderá escolher se nomeia ou não tais candidatos (AgRg no REsp n. 1.233.644/RS, relator Ministro Hamilton Carvalhido, Primeira Turma, julgado em 3/3/2011, DJe de 13/4/2011).

Ocorre que, em situação peculiares, a jurisprudência dos Tribunais Superiores sobre concurso público tem reconhecido o direito adquirido mesmo do aprovado fora do número de vagas previsto em edital, o que pode ocorrer em hipóteses de preterição ou outro motivo excepcional que transmude essa mera expectativa em direito do candidato.

Com efeito, segundo a jurisprudência do STF, sob o regime de repercussão geral (RE 837.311/PI, Rel. Ministro LUIZ FUX, TRIBUNAL PLENO, DJe de 15/04/2016), “como regra, o candidato aprovado em concurso público, como excedente ao número de vagas ofertadas inicialmente no edital do certame (cadastro reserva), não tem direito público subjetivo à nomeação, salvo na hipótese de surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso, durante a validade do concurso anterior, e ocorrer a preterição, de forma arbitrária e imotivada, pela Administração, cumprindo ao interessado, portanto, o dever de comprovar, de forma cabal, esses elementos” (AgInt no RMS n. 59.182/RS, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 11/12/2023, DJe de 18/12/2023).

Eis a tese do Supremo Tribunal Federal (Tema 784):

  • “O surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato”.

Assim, o direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado em concurso público exsurge nas seguintes hipóteses:

  • 1 – Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital;
  • 2 – Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação;
  • 3 – Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima.

O STJ admitiu esse direito excepcional à nomeação, em hipótese na qual surgiram novas vagas e houve manifestação inequívoca da administração sobre a necessidade de seu provimento, bem como inexistia prova de restrição orçamentária ou de qualquer outro obstáculo de ordem financeira, a ser provado pelo poder público, para tal nomeação (MS n. 22.813/DF, relator Ministro Og Fernandes, Primeira Seção, julgado em 13/6/2018, DJe de 22/6/2018).

Ademais, o STJ entendeu também que “A desistência de candidatos convocados, dentro do prazo de validade do concurso, gera direito subjetivo à nomeação para os seguintes, observada a ordem de classificação e a quantidade de vagas disponibilizadas” (AgRg no RMS 30776/RO, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, julgado em 17/09/2013, DJe 11/10/2013).

Ainda nesse sentido, pode ensejar preterição de candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital, com a consequente convolação de sua expectativa de nomeação em direito subjetivo, a existência de contratações precárias pela Administração Pública, aliada à comprovação, pelo candidato, da existência de cargos vagos (AgRg no AREsp 453742/RO, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 04/04/2014).

Por outro lado, “A simples requisição ou a cessão de servidores públicos não é suficiente para transformar a expectativa de direito do candidato aprovado fora do número de vagas em direito subjetivo à nomeação, porquanto imprescindível a comprovação da existência de cargos vagos” (AgRg no RMS 40676/AC, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/06/2013, DJe 11/06/2013).

Nesse sentido, a remoção de servidores já concursados também não caracteriza a preterição de candidatos aprovas em novo certame público (RMS n. 39.271/TO, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 15/10/2013, DJe de 22/10/2013).

E também não ocorre preterição se “a convocação para próxima fase ou a nomeação de candidatos com posição inferior se dá por força de cumprimento de ordem judicial” (RMS 44672/ES, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/03/2014, DJe 17/03/2014).

Ainda não ocorre preterição com a contratação de servidores temporários ou o emprego de servidores comissionados, terceirizados ou estagiários, por si sós, situações que também não autorizam a conclusão automática de que “tenham surgido vagas correlatas no quadro efetivo, a ensejar o chamamento de candidatos aprovados em cadastro de reserva ou fora do número de vagas previstas no edital” (AgInt no RMS 49084/RJ, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 25/06/2018).

Assim encerramos a primeira parte do artigo sobre os concursos públicos na jurisprudência dos Tribunais Superiores. Esperamos que esse rol exemplificativo de casos seja útil para estudos e revisões. Para maiores detalhes, os acórdãos dos julgados citados estão disponíveis por meio dos links constantes do texto e caso saibam de mais algum julgado interessante na jurisprudência do STJ e do STF sobre o tema, podem citar nos comentários.

Bons estudos e até a próxima!


[1] RE 598099, Relator(a): GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 10-08-2011, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-189 DIVULG 30-09-2011 PUBLIC 03-10-2011 EMENT VOL-02599-03 PP-00314 RTJ VOL-00222-01 PP-00521.

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