Tribunal afasta responsabilidade da concessionaria por colisão com Capivara

Tribunal afasta responsabilidade da concessionaria por colisão com Capivara

Decisão judicial exclui concessionária de rodovias de responsabilidade por colisão com Capivara. Saiba mais sobre o caso e o entendimento do tribunal.

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

colisão com Capivara

Entenda o caso colisão com Capivara

O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que a concessionária da rodovia não deverá indenizar o motorista que colidiu com capivara na pista, entendendo que a entrada inesperada do animal na pista equipara-se ao caso fortuito ou de força maior.

Segundo o relator, o desembargador Joel Birello Madelli, a responsabilidade da concessionária só é atraída no caso de falha na prestação do serviço público, o que entendeu não ter ocorrido.

Para o desembargador, não havia medidas a serem adotadas pela empresa para evitar a colisão, considerando que o animal, de porte semelhante ao de um cachorro, possui grande agilidade e pode se mover rapidamente.

“Não se vislumbra qualquer providência ou cautela que pudesse ser adotada pela concessionária para evitar o acidente…
Nem mesmo a existência de defensas metálicas (“guard rail”) evitariam o incidente, pois seria possível que passasse por debaixo ou acima do aparato. Diferente seria se o caso versasse sobre a presença de um bovino ou outro animal de maior porte (animal confinado), cuja aproximação não ocorre subitamente”

Não seria razoável, segundo o magistrado, exigir da concessionária um monitoramento contínuo e ininterrupto de todas as rodovias sob sua administração, sob risco de torná-la uma seguradora universal dos veículos.

Caso Fortuito e Força Maior – colisão com Capivara

A entrada inesperada do animal equipara-se ao caso fortuito ou de força maior, rompendo o nexo de causalidade e excluindo a responsabilidade da empresa, mesmo sob as normas do CDC.

Não há unanimidade quanto aos conceitos exatos de caso fortuito e de força maior, mas podemos dizer que que o caso fortuito é o evento que não se pode prever e que não pode ser evitado. Já os casos de força maior seriam os fatos humanos ou naturais que podem até ser previstos, mas da mesma maneira não podem ser impedidos.

Importante ressaltar que a responsabilidade civil das concessionárias de serviço público é objetiva, à luz do artigo 37, § 6º, da Constituição Federal.

CF/88

"Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

...

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".

Mas, segundo o julgador do caso, essa responsabilidade passa a ser subjetiva em caso de falta na prestação do serviço público, conforme a teoria francesa do faute du servisse.

Não restou configurada falha na adoção de qualquer medida que pudesse caracterizar a omissão estatal (“faute du service”) e, portanto, fundamentar a adoção da teoria da culpa anônima.

Teoria da culpa anônima

Segundo a teoria da culpa anônima, tendo o Estado obrigação de exercer uma atividade em razão de lei, sua omissão, quer pela inexistência, má prestação, ou retardamento do serviço, gera dever de indenizar.

Necessária, portanto, a comprovação da conduta omissiva e culposa (negligência na atuação estatal, ou a má prestação do serviço), o dano e o nexo causal entre ambos.

Segundo o código civil, em seu artigo 393, o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado, e o caso fortuito ou a força maior verifica-se no fato necessário, cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.

Distinção entre animais silvestres e domésticos nas rodovias

Não confundir o caso em análise, relacionado a um animal silvestre (não doméstico), com o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça no TEMA 1.122:

TEMA 1.122 do STJ:

As concessionárias de rodovias respondem, independentemente da existência de culpa, pelos danos oriundos de acidentes causados pela presença de animais domésticos nas pistas de rolamento, aplicando-se as regras do Código de Defesa do Consumidor e da Lei das Concessões.

E isso porque, no caso do TEMA 1.122, o entendimento aplica-se para acidentes envolvendo animais domésticos.

Segundo o ministro Villa Bôas Cueva, mesmo considerando a grande extensão das rodovias, as atividades de fiscalização, sinalização, manejo e remoção de animais das pistas são desenvolvidas em espaço “determinado e inalterável”, sendo aplicável, ainda, o princípio da prevenção (ou seja, quando se conhecem os riscos e são exigidas medidas para combatê-los ou mitigá-los).  

E é justamente em decorrência dessa previsibilidade que os contratos de concessão já incluem, de forma expressa, a obrigação de apreensão dos animais nas faixas de domínio, inclusive com a utilização de veículos apropriados.

No caso de animal doméstico, aplica-se o artigo 6º, VI, do Código de Defesa do Consumidor, que prevê como um dos direitos básicos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.

Neste caso específico, envolvendo animal doméstico, não seria lícito afastar a responsabilidade civil das concessionárias e submeter a vítima de um acidente ao martírio de identificar o suposto proprietário do animal que ingressou na pista de rolamento, demandá-lo judicialmente e produzir provas sobre a propriedade do semovente.

Também não há que se falar que a responsabilidade seria dos órgãos públicos, a quem caberia a apreensão e remoção dos animais que ingressam nas rodovias, para fins de afastamento da responsabilidade da concessionária da rodovia, pois, segundo o artigo 25, da Lei nº 8.987/1995 (dispõe sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos previsto no art. 175 da Constituição Federal), incumbe à concessionária a execução do serviço concedido, cabendo-lhe responder por todos os prejuízos causados ao poder concedente, aos usuários ou a terceiros, sem que a fiscalização exercida pelo órgão competente exclua ou atenue essa responsabilidade.

Não esqueça!

Importante, ao final, não confundir o acidente em rodovia envolvendo animal doméstico e o acidente envolvendo animal silvestre. 

No caso de animal doméstico, aplica-se o TEMA 1.122 do STJ, atraindo a responsabilidade objetiva da concessionária da rodovia.

No caso de animal silvestre, a princípio a jurisprudência tem aplicado a responsabilidade subjetiva, através da teoria francesa do faute du servisse. 

Tema muito interessante, e que pode ser facilmente cobrado em provas de direito administrativo ou de direito civil. Portanto, muita atenção!

colisão com Capivara

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