Comissão da Câmara examina propostas para limitar os poderes do STF, vamos entender cada uma delas.
PEC 8/2021 – Limitação de decisões monocráticas no STF/STJ
Atualmente, tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm a prerrogativa de tomar decisões monocráticas em diversas situações. Isto porque, essa possibilidade está prevista em seus respectivos regimentos internos e em leis específicas, baseando-se essencialmente no acesso à justiça.
No caso do STF, o Regimento Interno, em seu artigo 21, estabelece que o Relator tem poder para, monocraticamente, negar seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente ou contrário à jurisprudência dominante.
Além disso, o artigo 5º, §1º, da Lei 9.882/1999, que regulamenta a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), permite que o relator conceda liminar em caso de extrema urgência ou perigo de lesão grave.
Já no STJ, o artigo 34 de seu Regimento Interno confere poderes similares aos relatores, permitindo-lhes decidir monocraticamente em diversas situações, como negar provimento a recurso contrário a súmula do STJ ou STF, ou dar provimento a recurso contra decisão em manifesto confronto com súmula ou jurisprudência dominante.
A PEC 8/2021 propõe uma mudança significativa nesse cenário.
Ela visa adicionar ao artigo 97 da Constituição Federal, que trata da chamada “cláusula de reserva de plenário nos Tribunais Superiores”, a seguinte redação:
"§ 1º-A É vedada a concessão de decisão monocrática que suspenda a eficácia de lei ou ato normativo com efeito geral ou que suspenda atos dos Presidentes da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Congresso Nacional."
Esta alteração impediria que um único ministro, seja do STF ou do STJ, suspendesse a eficácia de leis ou atos normativos de alcance geral, bem como atos dos chefes dos outros Poderes. Tais decisões passariam a ser obrigatoriamente colegiadas.
O relator, deputado Marcel van Hattem, recomendou a aprovação do texto (apresentou parecer pela admissibilidade).
“Citando apenas um único exemplo, em 2014, um magistrado da Suprema Corte concedeu liminar que autorizou o pagamento de auxílio-moradia a juízes. A decisão só foi derrubada após quatro anos, em 2018, por outra decisão liminar do mesmo ministro”, exemplificou Van Hattem.
“Esse tipo de situação infelizmente não é incomum naquele tribunal. Ora, por óbvio, não é juridicamente viável que dessa forma isso permaneça. Não pode apenas um magistrado concentrar em si o poder decisório que deve ser resguardado ao colegiado”, criticou o deputado.
Além disso, a proposta também acrescenta outros parágrafos importantes:
"§ 1º-B No caso de urgência ou de perigo de grave e irreparável dano, o Presidente do tribunal poderá, durante o recesso forense, e ad referendum do Plenário ou do Órgão Especial, conceder a medida cautelar referida no § 1º-A, devendo o tribunal julgar a medida no prazo de 30 (trinta) dias após a retomada dos trabalhos, sob pena de perda de sua eficácia."
Ademais, este dispositivo visa garantir que, em casos excepcionais e urgentes, especialmente durante o recesso forense, ainda seja possível uma decisão rápida, mas com a necessidade de confirmação posterior pelo colegiado.
"§ 1º-C O processo que tenha por objeto decisão sobre a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo com efeito geral, ainda que em sede cautelar, será apreciado diretamente pelo Plenário do tribunal, que deverá julgar o mérito da ação no prazo máximo de 6 (seis) meses, sob pena de a matéria ser incluída automaticamente em pauta, com preferência sobre os demais processos."
Por fim, este parágrafo busca acelerar o julgamento de mérito em ações de inconstitucionalidade, evitando que decisões liminares se prolonguem indefinidamente sem análise do plenário.
De acordo com os debates, vamos resumir os dois lados.
Pontos positivos:
- Fortalece o caráter colegiado das decisões judiciais importantes.
- Pode reduzir o chamado “ativismo judicial” ilícito de ministros individuais.
- Potencialmente aumenta a segurança jurídica e a previsibilidade das decisõe
Pontos negativos:
- Pode tornar o processo decisório mais lento, especialmente em casos urgentes.
- Pode sobrecarregar o plenário dos tribunais com decisões antes resolvidas individualmente.
- Pode dificultar a resposta rápida do Judiciário em situações que exijam ação imediata
EC 28/2024 – Autorização para o Congresso derrubar decisões do STF
No sistema constitucional brasileiro vigente, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem a função precípua de ser o guardião da Constituição, conforme estabelecido no artigo 102 da Constituição Federal. Isso significa que o STF tem a palavra final sobre a interpretação e aplicação das normas constitucionais.
Atualmente, não existe um mecanismo formal que permita ao Congresso Nacional derrubar ou sustar os efeitos de decisões do STF. O princípio da separação dos poderes, consagrado no artigo 2º da Constituição, estabelece que os Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário são independentes e harmônicos entre si.
Sistema de freios e contrapesos
Por outro lado, lembremos como funciona o sistema de freios e contrapesos atual:
- O Congresso Nacional pode aprovar leis e emendas constitucionais que, em certa medida, podem contornar decisões do STF. Por exemplo, a chamada “PEC da Bengala” (EC 88/2015) alterou a idade de aposentadoria compulsória dos ministros do STF, algo que havia sido objeto de decisão anterior da Corte.
- O STF, por sua vez, pode declarar a inconstitucionalidade de leis aprovadas pelo Congresso, seja por meio do controle concentrado (ações diretas de inconstitucionalidade) ou do controle difuso (em casos concretos).
- Em casos de decisões liminares (cautelares) em Ações Diretas de Inconstitucionalidade, o artigo 10 da Lei 9.868/1999 prevê que a medida cautelar, em regra, deve ser concedida por decisão da maioria absoluta dos membros do Tribunal, exceto em caso de excepcional urgência.
- O Senado Federal tem a prerrogativa, conforme o artigo 52, X, da Constituição, de suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do STF. No entanto, isso se aplica apenas a decisões em controle difuso e tem sido pouco utilizado na prática.
- As decisões do STF em controle concentrado de constitucionalidade têm efeito vinculante e eficácia contra todos, conforme o artigo 102, § 2º, da Constituição.
Neste contexto, as decisões do STF, especialmente em matéria constitucional, são consideradas definitivas e não estão sujeitas a revisão por outro órgão do poder público. Assim, o atual sistema não prevê um mecanismo direto para o Legislativo “derrubar” decisões do Judiciário, baseando-se na premissa de que cada Poder tem sua esfera de competência definida constitucionalmente.
O que faz essa PEC então? – Poderes do STF
O texto prevê que, caso o Congresso Nacional considere que uma decisão do STF “exorbita do adequado exercício da função jurisdicional e inova o ordenamento jurídico como norma geral e abstrata, poderá sustar os seus efeitos pelo voto de dois terços dos membros de cada uma de suas Casas Legislativas, pelo prazo de dois anos, prorrogável uma única vez por igual período”.
Segundo a proposta, em caso de anulação da decisão por parte do Legislativo, conforme a proposta, o STF poderá manter sua decisão inicial pelo voto de quatro quintos de seus membros, ou seja, o tema poderá retornar ao plenário da Suprema Corte.
Pontos positivos:
- Pode fortalecer o sistema de freios e contrapesos entre os Poderes.
- Potencialmente restringe o que o Congresso considere como excesso do STF.
- Pode incentivar um diálogo mais intenso entre Legislativo e Judiciário.
Pontos negativos:
- Risco de interferência excessiva do Legislativo no Judiciário, comprometendo sua independência.
- Pode gerar instabilidade jurídica, com decisões sendo constantemente revistas.
- Potencial para criar crises institucionais entre os Poderes.
PL 4754/16 – Ampliação dos crimes de responsabilidade de ministros do STF
Em síntese, este Projeto de Lei busca expandir o rol de crimes de responsabilidade aplicáveis aos ministros do Supremo Tribunal Federal.
Entre as condutas que passariam a ser tipificadas estão a usurpação de competência do Congresso Nacional, o julgamento em casos de suspeição ou impedimento, o uso de prerrogativas para benefício próprio ou de terceiros, a manifestação de opinião sobre processos pendentes e a violação da imunidade parlamentar.
A proposta reflete uma preocupação com o que é percebido como extrapolação das funções do STF por parte de alguns parlamentares.
Pontos positivos:
- Pode promover maior cautela e responsabilidade nas ações dos ministros do STF.
- Potencialmente reforça o princípio da separação dos Poderes.
- Pode aumentar a transparência e a accountability no Judiciário.
Pontos negativos:
- Risco de intimidação dos ministros, afetando sua independência.
- Pode gerar conflitos interpretativos sobre o que constitui “usurpação de competência”.
- Potencial para ser usado como instrumento de pressão política sobre o STF.
PL 658/2022 – Restrição à manifestação pública de ministros do STF
Por fim, este Projeto de Lei propõe tornar crime de responsabilidade a manifestação pública de ministros do STF sobre processos pendentes de julgamento ou a expressão de juízos depreciativos sobre decisões de outros órgãos judiciais ou atividades dos demais Poderes.
Na verdade, a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN) – Lei Complementar nº 35/1979, que se aplica a todos os magistrados, incluindo os ministros do STF, já estabelece em seu artigo 36, III:
"É vedado ao magistrado: III - manifestar, por qualquer meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento, seu ou de outrem, ou juízo depreciativo sobre despachos, votos ou sentenças, de órgãos judiciais, ressalvada a crítica nos autos e em obras técnicas ou no exercício do magistério."
Nessa linha, já existe uma vedação, entretanto, a proposta visa preservar a imparcialidade dos ministros e evitar que suas declarações influenciem indevidamente a opinião pública ou o andamento de processos, estabelecendo que em caso de descumprimento seja uma hipótese de crime de responsabilidade dos Ministros do STF.
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