De início, vamos comentar o seguinte julgado do STJ:

Perceba, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça examinou, no REsp 2.167.979/PB, uma situação que afeta diretamente quem financia imóveis e acaba inadimplente, e às vezes vai a leilão.
Nessa linha, a Ministra Nancy Andrighi enfrentou uma questão simples, mas que gera consequências na prática. Assim, o caso envolveu um cidadão que financiou a compra de um terreno com a Caixa Econômica Federal.
Entretanto, acontece que, na época em que firmou o contrato de alienação fiduciária, aquele “terreno” já tinha uma casa em construção.
Porém, lá no papel, continuou registrado apenas como terreno mesmo.
Logo, anos depois, quando veio o inadimplemento, a Caixa realizou o leilão extrajudicial daquele imóvel.
Porém, a adivinhe qual foi a descrição que constou no edital? Isso mesmo, apenas “terreno”, sem qualquer menção à casa que já estava pronta naquele momento.
Logo, o imóvel foi arrematado por apenas 23% do seu valor real.
Vamos entender por que isso acontece e qual foi a solução dada pelo STJ.
Descrição do imóvel
(Atenção LEILOEIROS) Por que a descrição do edital não pode simplesmente copiar o contrato antigo?
Ora, quando você financia um imóvel pelo sistema de alienação fiduciária, o banco exige que conste no contrato uma descrição completa do bem que está sendo dado em garantia.
Isso está previsto no artigo 1.362, inciso IV, do Código Civil.
Logo, essa descrição serve para identificar exatamente qual imóvel responderá pela dívida caso você não pague.
Acontece que entre o momento da assinatura do contrato e o eventual leilão podem se passar anos.
Nesse intervalo, muita coisa pode mudar. Aquele terreno pode ter recebido uma construção… Aquela casa pequena pode ter ganhado um segundo andar. E por aí vai…
Assim, o STJ deixou claro que o edital de leilão não está amarrado à descrição antiga do contrato.
Isto porque o artigo 886, inciso I, do Código de Processo Civil manda que o edital contenha “a descrição do bem penhorado, com suas características”.
Veja bem, o bem atual, não o bem de cinco anos atrás.
Dessa forma, o contrato de alienação fiduciária e o edital de leilão são documentos independentes, cada um com sua função própria.
Logo, o contrato serve para constituir a garantia lá no início. Já o edital serve para divulgar o bem e atrair compradores no momento da venda. São momentos diferentes, realidades diferentes.
O que acontece quando o edital traz informação desatualizada
Imagine a seguinte situação.
Você está procurando um imóvel para comprar e encontra no jornal o anúncio de um leilão de “terreno” localizado em determinado bairro. O preço inicial está relativamente baixo…
Porém, se o edital dissesse a verdade e descrevesse “casa de três quartos, dois banheiros, garagem coberta”, aí sim você teria interesse.
Nesse caso, provavelmente apareceriam muito mais compradores interessados, e o preço do lance subiria naturalmente pela disputa entre eles.
Perceba o prejuízo que causa para o devedor essa descrição errada.
O bem dele acaba sendo vendido por um valor ridículo, muito abaixo do que realmente vale, simplesmente porque os potenciais compradores não sabem o que estão comprando.
Isto posto, foi exatamente isso que aconteceu no caso julgado pelo STJ.
O imóvel tinha uma casa construída, mas foi leiloado como se fosse terreno vazio.
Resultado: arrematação por míseros 23% do valor real.
Um prejuízo brutal para o devedor, que perdeu quase 80% do valor do seu patrimônio desnecessariamente.
A questão do preço vil
Ademais, existe outro conceito importante que precisa ser explicado aqui.
A jurisprudência do STJ considera que existe “preço vil” quando o imóvel é arrematado por menos da metade do seu valor de avaliação.
Inclusive, mesmo no segundo leilão, onde a lei autoriza a venda pelo valor da dívida, ainda assim não pode haver arrematação por preço vil.
Logo, quando o edital traz descrição incorreta ou desatualizada do imóvel, acaba gerando uma avaliação completamente equivocada.
Veja bem, se o perito avalia o bem como “terreno”, vai atribuir determinado valor.
Se avalia como “casa construída”, o valor será muito maior. Dessa maneira, a descrição errada contamina todo o processo de avaliação.
Nesse sentido, o que o STJ decidiu é que não adianta o credor argumentar: “mas foi o próprio devedor que descreveu o bem como terreno lá no contrato”. Ora, isso não importa. O que importa é a realidade atual do imóvel no momento do leilão.
A Ministra Nancy Andrighi foi muito clara ao explicar que o leilão precisa buscar dois objetivos ao mesmo tempo.
Por um lado, conseguir o maior valor possível para pagar o credor.
Por outro lado, evitar onerosidade excessiva para o devedor.
Esses dois objetivos só são alcançados se o edital descrever corretamente o bem.
Conclusão
Assim, do ponto de vista dos bancos e instituições financeiras que realizam leilões extrajudiciais, essa decisão traz uma exigência clara. Não basta mais simplesmente copiar a descrição do contrato antigo quando for elaborar o edital. É preciso mandar alguém até o imóvel, verificar a situação atual, ver se houve benfeitorias, reformas, ampliações.
Ademais, essa verificação não é apenas uma formalidade processual. Trata-se de requisito essencial para a validade do leilão. Se o edital trouxer descrição errada e o imóvel for arrematado por preço vil em razão disso, o leilão será anulado:
Na hipótese de ocorrer uma valorização expressiva do imóvel em função de uma obra ou benfeitoria significativa, é necessário que a descrição do bem no edital de leilão extrajudicial acompanhe a situação fática atual, em prol da efetividade da execução e da menor onerosidade ao devedor.
REsp 2.167.979-PB, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, por unanimidade, julgado em 9/9/2025, DJEN 17/9/2025.
Portanto, a tese fixada pelo STJ nesse julgamento deixa muito claro que, havendo valorização expressiva do imóvel por obra ou benfeitoria significativa, a descrição do bem no edital de leilão extrajudicial precisa acompanhar a situação fática atual. Isso acontece em favor da efetividade da execução e para evitar onerosidade excessiva ao devedor.
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