* Marcos Vinícius Manso Lopes Gomes. Defensor Público do estado de São Paulo. Professor de Direito Constitucional do Estratégia Carreiras Jurídicas.
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Atentado contra Donald Trump – entenda o caso
No dia 13 de julho de 2024, em evento realizado na Pensilvânia, ocorreu um atentado contra Donald Trump, candidato Republicano à presidência dos Estados Unidos. O atentado reacendeu o debate envolvendo a necessidade de fortalecimento das democracias. O presidente Lula destacou que o atentado “empobrece a democracia”. O ex-presidente Bolsonaro, realizou comparação ao seu atentado sofrido em 2018 e prestou solidariedade ao candidato Donald Trump. No presente artigo, almejaremos trazer aos nossos alunos temas importantes envolvendo democracia para os concursos de carreiras jurídicas.
Democracia x Autocracia
Os regimes políticos podem ser democráticos ou não democráticos. Dentre os regimes não democráticos destacamos as monarquias absolutistas e as ditaduras. Como exemplo de ditaduras, podemos ter os regimes autoritários, que não admitem competição política, sufocando qualquer movimento que busque pluralizar o pensamento político, bem como os regimes totalitários, que além de não admitirem a competição política, buscam conformar o povo a sua imagem, impondo ideologias, religiões, etc.
Destacam-se algumas características dos regimes autocráticos: a) Exercício do poder em nome próprio (do próprio Estado); b) Marcado pelo autoritarismo (de cima para baixo); c) Não reivindica legitimação pelos governados; d) Buscam reduzir o pluralismo político e ideológico.
Por seu turno, vejamos algumas características dos regimes democráticos: a) O exercício do poder emana do povo; b) Reivindica legitimação pelos governados com participação; c) Com competitividade política, direitos políticos e pluralismo ideológico; d) Reconhecimento de direitos fundamentais e limites aos governantes. Portanto, participação, liberdade e dignidade são três fatores importantíssimos para o fortalecimento das democracias contemporâneas.
De fato, o atentado contra Donald Trump é um ato que abala e enfraquece a democracia, notadamente porque, além de ser um atentado contra a dignidade da pessoa humana, almeja enfraquecer a liberdade, a competitividade política, os direitos políticos e o pluralismo ideológico, pilares de um Estado de opção democrática.
Discursos de Intolerância, de Ódio e Antidemocrático
No Brasil, em que pese o Supremo Tribunal Federal permitir o discurso de intolerância (realizado sem sinalização de violência, dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais), não vem admitindo o discurso de ódio (que realiza apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias) e nem o discurso antidemocrático (que objetivem a abolição do Estado de Direito e o impedimento, com graves ameaças, do livre exercício de seus poderes constituídos e de suas instituições). Vejamos como isso se relaciona com a democracia:
Democracia e Discurso de Intolerância – STF – RHC 134682 / BA – BAHIA. Julgamento: 29/11/2016. Ementa: RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DIREITO PENAL. CRIME DE RACISMO RELIGIOSO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INOCORRÊNCIA. IMPRESCRITIBILIDADE. PREVISÃO CONSTITUCIONAL EXPRESSA. LIVRO. PUBLICAÇÃO. PROSELITISMO COMO NÚCLEO ESSENCIAL DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO RELIGIOSA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. (…) 7. Hipótese concreta em que o paciente, por meio de publicação em livro, incita a comunidade católica a empreender resgate religioso direcionado à salvação de adeptos do espiritismo, em atitude que, a despeito de considerar inferiores os praticantes de fé distinta, o faz sem sinalização de violência, dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais.
Democracia e Discurso de Ódio – STF – HC 82424 / RS – RIO GRANDE DO SUL. Julgamento: 17/09/2003. HABEAS-CORPUS. PUBLICAÇÃO DE LIVROS: ANTI-SEMITISMO. RACISMO. CRIME IMPRESCRITÍVEL. CONCEITUAÇÃO. ABRANGÊNCIA CONSTITUCIONAL. LIBERDADE DE EXPRESSÃO. LIMITES. ORDEM DENEGADA. 1. Escrever, editar, divulgar e comerciar livros “fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias” contra a comunidade judaica (Lei 7716/89, artigo 20, na redação dada pela Lei 8081/90) constitui crime de racismo sujeito às cláusulas de inafiançabilidade e imprescritibilidade (CF, artigo 5º, XLII).
Discurso Antidemocrático – STF – AP 1044/DF – A liberdade de expressão existe para a manifestação de opiniões contrarias, jocosas, satíricas e até mesmo errôneas, mas não para opiniões criminosas, discurso de ódio ou atentados contra o Estado Democrático de Direito e a democracia. A Constituição garante a liberdade de expressão, com responsabilidade. A liberdade de expressão não pode ser usada para a prática de atividades ilícitas ou para a prática de discursos de ódio, contra a democracia ou contra as instituições. Nesse sentido, são inadmissíveis manifestações proferidas em redes sociais que objetivem a abolição do Estado de Direito e o impedimento, com graves ameaças, do livre exercício de seus poderes constituídos e de suas instituições. Ademais, conforme jurisprudência do STF, a garantia constitucional da imunidade parlamentar (1) incide apenas sobre manifestações proferidas no desempenho da função legislativa ou em razão desta, não sendo possível utilizá-la como escudo protetivo para a prática de atividades ilícitas.
O discurso de ódio é uma limitação da liberdade de expressão. De acordo com Daniel Sarmento, trata-se de “manifestações de ódio, desprezo ou intolerância contra determinados grupos, motivadas por preconceitos ligados à etnia, religião, gênero, deficiência física ou mental e ordenação sexual, dentre outros fatores.
Concordamos com a proibição do discurso de ódio e do discurso antidemocrático. Aliás, os reiterados discursos de ódio e antidemocráticos, que devem ser combatidos e rechaçados, podem até mesmo culminar em atentados contra a vida, tal como o ocorrido contra o candidato Donald Trump.
Efeito Resfriador e Democracia
A democracia almeja pluralizar, democratizar o debate e incrementar a cidadania, incluindo-se as opiniões e manifestações de grupos minoritários. Destacamos acima que o direito a liberdade possui limitações. Porém, temos que tomar alguns cuidados em sua restrição. No que tange ao efeito resfriador, inibidor ou silenciador (Chilling Efect), trata-se da inibição ou desencorajamento do exercício de legítimos direitos, culminando em autocensura no caso do direito à liberdade. Assim, em virtude da ameaça de sanções jurídicas por parte do Poder Público, seja em virtude de ato do Poder Executivo, do Legislativo ou do Judiciário, ocorre um resfriamento da liberdade de expressão e do debate de ideias. O tema já foi abordado no Supremo Tribunal Federal:
STF – RE n. RE 600063 / SP – (Voto do Ministro Roberto Barroso): (…) Naturalmente, o ideal seria que tais funções fossem exercidas sem ofensas pessoais, centrando-se nos fatos e argumentos expostos, e não em seus interlocutores. Contudo, mesmo quando tal não ocorre, quis a Constituição proteger os parlamentares da reprimenda judicial[8]. Isso para evitar que a ameaça de persecução cível e penal gerasse um efeito resfriador de seus discursos (chilling effect) e, consequentemente, prejudicasse a livre exposição de pensamentos na esfera legislativa, vocacionada que é ao debate público.
Assim, temos que ter cuidado com eventuais excessos na limitação da liberdade de expressão, notadamente se partir da Suprema Corte, cujo excesso em determinadas situações poderá culminar em verdadeiro efeito resfriador, inibindo o debate de ideias e violando o direito a liberdade, pilar de um Estado de opção democrática. Demonstrando a mesma preocupação, a doutrina mais técnica e ponderada destaca que “não obstante, deve haver um cuidado especial para que não se asfixie além da conta a liberdade de expressão ainda que por propósitos elevados”.
Fortalecimento das democracias
Reiteramos nosso posicionamento totalmente favorável a necessidade de reforço das democracias. Importante destacar que o combate aos atos antidemocráticos deve ocorrer fortalecendo a democracia e não por meio de um Estado de exceção e subterrâneo, muito menos desrespeitando-se direitos fundamentais.
A democracia, em apertada síntese, deve ser concretizada por meio do fortalecimento de quatro pilares fundamentais: a) dignidade da pessoa humana; b) participação popular; c) liberdade; d) igualdade. Assim, poderemos alcançar os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: art. 3º, da Constituição Federal: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
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