Moraes afasta PGE do MA por descumprimento de ordem judicial

Moraes afasta PGE do MA por descumprimento de ordem judicial

* Thiago de Paula Leite é procurador do Estado de São Paulo e professor de direito ambiental e agrário do Estratégia.

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou o afastamento imediato do Procurador-Geral do Estado do Maranhão, Valdênio Nogueira Caminha, e a consequente suspensão de salário e benefícios, em decorrência do descumprimento de ordens do STF.

A decisão se deu no bojo da Reclamação 69.486, e abarca também a proibição do PGE-MA de ocupar funções em qualquer um dos Poderes estaduais.

Segundo Moraes, o Procurador-Geral do Maranhão tomou medidas para atrasar ou inviabilizar a decisão de suspender a nomeação de servidores por nepotismo.

Nepotismo

Nepotismo é o favorecimento de parentes em detrimento de outros candidatos mais qualificados, especialmente em nomeações ou contratações para cargos públicos ou privados. Essa prática é considerada antiética e ilegal, pois viola princípios como impessoalidade, moralidade e igualdade de oportunidades.

Temos, basicamente, 2 tipos de nepotismo:

  • Nepotismo direto: quando um agente público nomeia ou contrata diretamente um familiar.
  • Nepotismo cruzado: quando dois agentes públicos trocam favores, nomeando ou contratando parentes um do outro.

O nepotismo pode levar a sanções administrativas, civis e penais, dependendo da gravidade do ato e da legislação aplicável. O combate a essa prática é importante para:

  • Garantia da igualdade de acesso: a proibição do nepotismo garante que todos os cidadãos tenham as mesmas oportunidades de acesso a cargos públicos, baseadas no mérito e na qualificação.
  • Garantia da transparência e probidade: a vedação ao nepotismo contribui para a transparência e a probidade na administração pública, evitando o uso da máquina pública para favorecer interesses pessoais ou familiares.
  • Combate à corrupção: o nepotismo pode ser um caminho para a corrupção, pois privilegia interesses pessoais em detrimento do interesse público, por isso sua proibição é fundamental para a integridade da administração pública.

Descumprimento de decisão do STF

Em outubro de 2024, Alexandre de Moraes havia suspendido a nomeação de cinco parentes do governador do Maranhão, Carlos Brandão (PSB), em órgãos e empresas públicas do estado. O ministro entendeu que as contratações caracterizavam nepotismo, prática vedada pela Súmula Vinculante 13 do STF.

Súmula vinculante 13: “A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”

O Supremo Tribunal Federal possui, ainda, 2 teses de repercussão geral relacionadas ao tema do nepotismo. Vejamos:

Tema 29 do STF → Leis que tratam dos casos de vedação a nepotismo não são de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo.

Tema 66 do STF → A vedação ao nepotismo não exige a edição de lei formal para coibir a prática, dado que essa proibição decorre diretamente dos princípios contidos no art. 37, caput, da Constituição Federal.

Mesmo após essa decisão, o partido Solidariedade, autora da Reclamação, informou ao STF que o Procurador-Geral do Maranhão havia autorizado a continuidade do pagamento de salário a um desses servidores e teria atrasado deliberadamente a exoneração de outro.

Procurador

Ao analisar o caso, Moraes entendeu que houve uma “evidente violação” à decisão do Supremo, caracterizada pelo descumprimento parcial da ordem de maneira intencional.

De acordo com o ministro, o Procurador-Geral não tinha prerrogativa para interpretar a determinação, especialmente no que diz respeito à manutenção da remuneração.

Moraes disparou:

“Logicamente, não cabe ao Poder Judiciário moldar subjetivamente a Administração Pública, porém a constitucionalização das normas básicas do Direito Administrativo permite ao Judiciário impedir que o Executivo molde a Administração Pública em discordância a seus princípios e preceitos constitucionais básicos.”

Observância aos princípios

O ministro afastou a alegação do PGE do Maranhão de que a ordem dada pela Suprema Corte refletiria apenas no afastamento dos servidores, mas sem reflexos nos salários, ante o princípio da irredutibilidade dos vencimentos, tendo em vista que a irredutibilidade de vencimentos só se aplica às parcelas remuneratórias inerentes ao cargo efetivo, diferente do caso, que traz a hipótese de exercício de cargos em comissão de livre nomeação, sem vínculo com a administração, com recebimento de remuneração estritamente ligada ao exercício da atividade.

Ou seja, a consequência lógica do afastamento do servidor comissionado é a suspensão dos respectivos vencimentos, não cabendo ao Procurador-Geral do Estado fazer qualquer interpretação extensiva do decisum, em favor de quem quer que seja.

A finalidade da revisão judicial é impedir atos incompatíveis com a ordem constitucional, inclusive no tocante as nomeações para cargos públicos, que devem observância não somente ao princípio da legalidade, mas também aos princípios da impessoalidade, da moralidade e do interesse público.

Como bem ressaltado por Moraes, o princípio da impessoalidade está diretamente relacionado com o princípio da supremacia ou preponderância do interesse público, também conhecido por princípio da finalidade pública, consistente no direcionamento da atividade e dos serviços públicos à efetividade do bem comum e constituindo-se em verdadeiro vetor de interpretação do administrador público na edição dos atos administrativos.

O princípio da moralidade administrativa exige que os agentes públicos atuem de maneira ética, proba, com boa-fé, sob pena de afronta à Constituição e cometimento de improbidade administrativa.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro, de forma brilhante, leciona:

“Sempre que em matéria administrativa se verificar que o comportamento da Administração ou do Administrado que com ela se relaciona juridicamente, embora em consonância com a lei, ofende a moral, os bons costumes, as regras de boa administração, os princípios de justiça e de equidade, a ideia de honestidade, estará havendo ofensa ao princípio da moralidade administrativa”.

O princípio da moralidade administrativa pode ser entendido sob três aspectos distintos1:

a) Dever de atuação ética (princípio da probidade): o agente público deve ter um comportamento ético, transparente e honesto perante o administrado. Assim, o agente público não pode sonegar, violar nem prestar informações incompletas com o objetivo de enganar os administrados. Não pode um agente se utilizar do conhecimento limitado que as pessoas têm sobre a administração para obter benefícios pessoais ou prejudicar indevidamente o administrado;

b) Concretização dos valores consagrados na lei: o agente público não deve limitar-se à aplicação da lei, mas buscar alcançar os valores por ela consagrados. Assim, quando a Constituição institui o concurso público para possibilitar a isonomia na busca por um cargo público, o agente público que preparar um concurso dentro desses ditames (proporcionar a isonomia) estará também cumprindo o princípio da moralidade;

c) Observância dos costumes administrativos: a validade da conduta administrativa se vincula à observância dos costumes administrativos, ou seja, às regras que surgem informalmente no quotidiano administrativo a partir de determinado condutas da Administração. Assim, desde que não infrinja alguma lei, as práticas administrativas realizadas reiteradamente, devem vincular a Administração, uma vez que causam no administrado um aspecto de legalidade.

Conclusão

Nos atos administrativos discricionários, a opção conveniente e oportuna deve ser feita legal, moral e impessoalmente pela Administração Pública. Ou seja, é na legalidade, na moralidade e na impessoalidade que a oportunidade deve ser apreciada pelo Poder Judiciário.

E a Constituição Federal permite a apreciação dos atos administrativos discricionários pelo Poder Judiciário, quando o órgão administrativo se utilizar de seu poder discricionário para atingir fim diverso daquele que a lei fixou. Ou seja, quando ao utilizar-se indevidamente dos critérios da conveniência e oportunidade, o agente desvia-se da finalidade de persecução do interesse público.

Por fim, o ministro Alexandre de Moraes, constatando a ocorrência de desvio de finalidade do ato do Poder Executivo Estadual de nomeação de Valdênio Nogueira Caminha para o cargo de Procurador-Geral do Estado do Maranhão, em inobservância aos princípios constitucionais da impessoalidade, da moralidade e do interesse público, determinou seu imediato afastamento do cargo.

Tema superinteressante para provas de direito administrativo. Portanto, muita atenção!  


  1. PATRIOTA, Caio César Soares Ribeiro Borges. O princípio da moralidade administrativa. JUSBRASIL. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/artigos/o-principio-da-moralidade-administrativa/433140195>. ↩︎

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